terça-feira, maio 21, 2013

UM FILME JÁ VISTO DEMAIS (2 OUTUBRO 2012)

1- Em Vila do Conde, o FC Porto repetiu uma cena já demasiadamente vista, e ainda há pouco em Barcelos: moleza, displicência, leviandade insustentável numa equipa paga a peso de ouro, a consumar-se no resultado final de dois pontos perdidos face a um adversário que se balia com armas claramente inferiores. Vítor Pereira criticou duramente os seus jogadores no final, como já o havia feito depois do empate em Barcelos, mas a verdade é que, como reconheceu Sá Pinto depois de também ter assistido a uma exibição semelhante do Sporting, a falta de atitude da equipa é responsabilidade do treinador. Sobretudo, se é recorrente.

Frente ao Rio Ave, o FC Porto começou até por se adaptar razoávelmente bem a um relvado em estado lastimável (quando não são quintais, são batatais, a provar a razão dos que, como eu, há muito defendem que a I Liga devia ter menos clubes, melhores e mais exigentes condições e melhor futebol). Porém, depois de se ter visto a ganhar próximo do intervalo, a equipa reentrou com uma postura de total alheamento, displicência e falta de combatividade confrangedora. Há jogadores, como os internacionais portugueses João Moutinho e Silvestre Varela, que andam por ali em doses mínimas de esforço e talento, nada acrescentando ao jogo da equipa. São casos diferentes dos que nada acrescentam porque não sabem ou não podem. Mas no banco fervilham de impaciência alguns miúdos que, por estatuto, parecem ler os caminhos tapados, mesmo quando se torna evidente que o estatuto não ganha jogos.

E quando, mesmo antes de o Rio Ave, convidado a acreditar e atacar, ter dado a volta ao jogo, Vítor Pereira resolveu mexer na equipa, antecipando-se por uma vez aos acontecimentos que se adivinhavam iminentes, fê-lo, como quase sempre, não para melhorar a equipa. mas para a piorar. Tirou Lucho, o único estratega ofensivo do meio-campo, fazendo entrar Fernando - e assim ficou com um meio-campo integralmente composto por três jogadores de tração atrás, muito bons para tentar defender a vantagem mínima, mas inúteis para matar o jogo. E, para acrescentar aos danos, lá entrou o corpo presente de Varela, para o lugar de mais um criativo (Atsu), com o efeito previsível e habitual de perder um flanqueador em troca de nada.

Assim destroçada a equipa, e enquanto o Rio Ave virava o jogo, Vítor Pereira continuou a preencher páginas de apontamentos - uma jogada de marketing e imagem inventada por Mourinho, que há muito passou de moda, porque, como é evidente, os apontamentos tiram-se depois, ao rever o jogo em vídeo, e não com este a decorrer: ninguém perde tempo a analisar o passado, quando tem o presente para resolver. E assim ultrapassado pelo fluxo dos acontecimentos, Vítor Pereira não se lembrou de nada melhor para fazer prova de vida do que meter Kleber — mais um habitual recurso de urgência, condenado a produzir o mesmo resultado de sempre, ou seja, nada. Um bocadinho, apenas um bocadinho dc concentração no jogo e de lucidez, ter-lhe-¬ iam dito que, em lugar de mais uma estátua sem movimento lá na frente, teria feito melhor em lançar mão de um dos tais miúdos repentistas que morrem de tédio no banco: Kelvin ou Iturbe.

E foi assim que, tirando bom partido de erros alheios, Nuno Espírito Santo conseguiu aumentar o seu historial de danos causados ao FC Porto, desta vez enquanto treinador. Ele que, enquanto guarda-redes já nos havia feito perder uma final da Taça, uma Taça da I.iga e uma classificação na Champions, para além de outros danos que já esqueci. É o nosso João Cravinho, o governante que até hoje mais caro terá saído ao país.

Há alturas em que um adepto, vendo confortavelmente os jogos pela televisão, se pergunta por que carga de água, por que ignotos per gaminhos, há alguém, com a faixa de treinador, tem o imenso privilégio de ser o único a decidir os melhores caminhos de um jogo, e que o faz tantas vezes ao contrário do senso comum, a olho nu? Eu sei que os mirones vêem melhor do que quem está lá dentro e sei que há coisas que se ignoram de fora e que só quem anda lá dentro sabe. Mas também hei-de continuar a pensar que, como me disse uma vez José Couceiro, o futebol não é nenhuma ciência oculta e que perceber quem são os jogadoress bons e os que não prestam, os que podem ajudar a resolver um jogo e os que nada acrescentam, não é assim tão complicado: basta tirar apontamentos enquanto se revêm os jogos em vídeo. E, depois tirar daí as consequências.

Por muita simpatia que inspire Sá Pinto e a sua dedicação ao Sporting, Vítor Pereira e a sua dedicação ao FC Porto, e por muito que as suas carreiras estejam apenas no início e possam vir a ser brilhantes no futuro, a verdade é que, no presente e entre os três grandes, só o Benfica é que tem um treinador à altura das suas responsabilidades. Pode-se gostar ou não do estilo de Jorge Jesus, da sua pose, dos seus exageros, mas que percebe muito mais de futebol do que os seus rivais, disso não tenho dúvidas.

2- Conta a anedota que quando Moisés desceu da montanha, depois de ter recebido os mandamentos de Deus, encarou o povo que o esperava e disse-lhe: «A boa notícia é que são só dez; a má notícia é que a proibição do adultério é um deles. » Pois aqui a má notícia é que o Glorioso Sport Lisboa e Benfica se continua a arrogar o direito de vetar árbitros, a boa notícia é que são só sete (em vinte e dois, creio).

A histeria montada pelos incendiários ao serviço do Benfica, a propósito de uma arbitragem de que não tiveram razões fundadas de queixa — como aqui notou Cruz dos Santos (o único imparcial por todos reconhecido nesta matéria) - dá vontade de dizer 'mas venham, venham já os árbitros estrangeiros, para vermos quanto tempo demoram a dizer que eles também estão comprados'. A facilidade com que se crucifica, executa e calunia um árbitro por um penaíty que imagem alguma consegue demonstrar se foi dentro ou fora da área, demonstra a boa-fé desta gente, destes profetas da verdade desportiva. Em particular, a dupla infalível Silva/Sílvio, destilando ódio em cada palavra, revelando um absoluto desinteresse pelo futebol em si mesmo, uma impunidade do insulto total e um soberano desprezo pela fronteira entre verdade e mentira, nem eles sa- bem ou imaginam os danos que causam ao seu clube. Quem odeia espalha o ódio.

3- Partido Javi Garcia, Maxi Pereira tem se revelado um digno sucessor do estilo do ex-benfiquista. É um mês- tre do kickboxing aplicado ao futebol, e já nem os agentes desportivos (os tais que justificaram a suspensão por três meses de Hulk) escapam à sua arte em liberdade. Sim, em absoluta liberdade. Só lhe falta ser subsidiado pelos contribuintes, como outros artistas que se reclamam como tal.

4- Infelizmente, julgo que amanhã, no jogo crucial contra o PSG, Vítor Pereira não vai surpreender ninguém. Vai jogar para a «contenção»,o «controlo do meio-campo», a posse de bola - uma posse de bola que ele vê como um valor em si mesmo e não como um meio para atingir um fim. Vai meter Varela e talvez até se lembre de reforçar no miolo com o Defour. Vai preferir Miguel Lopes a Danilo, que tem a desvantagem de gostar de atacar. Vai deixar todos os miúdos-maravilha no banco, fugindo da surpresa e da audácia como o diabo foge da cruz. E, se estiver à rasca, mete Kléber. E, se tudo fizer assim, arrisco o meu prognóstico: nada irá sair bem. O empate já não será mau. O que faria eu? Uma loucura: Helton; Danilo, Maicon, Rolando e Alex Sandro; Fernando; Lucho e James; Atsu, Jackson e Iturbe.

5- Num discurso muito calmo, lúcido e raro de ver, o treinador do Estoril - Praia, disse que não queria falar da arbitragem, que lhe tirou dois pontos em Alvalade, porque, se o fizesse, também teria de falar dos árbitros quando fosse beneficiado. Depois de duas jornadas consecutivas em que o Sporting só escapou da derrota graças a erros de arbitragem, os sporlinguislas - sempre tão rápidos a protestar quando se sentem prejudicados - deveriam meditar na lição que lhes deu o treinador do Estoril.

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