terça-feira, maio 07, 2013

O REGRESSO DAS VITÓRIAS MORAIS (12 JUNHO 2012)

1- Comecemos pelo principio: o Portugal-Alemanha foi um mau jogo de futebol, talvez o pior do Euro até à data. Foi um jogo soporífero até dez minutos do fim, disputado entre uma equipa sem imaginação e outra sem ambição. Claro que a responsabilidade maior é da Alemanha, eterno candidato a todos os títulos e de que se diz ter a melhor selecção dos últimos anos ou décadas.

Não se viu nada disso, mas o facto é que, no fim, ganharam os alemães e a vitória serve para absolver muitas coisas. Já Portugal jogou para o 0-0, tal como é tradição das equipas e da Selecção portuguesas quando jogam contra adversários tidos como mais fortes. Jogar na contencão e nas cautelas e viver feliz enquanto o adversário não marca são a nossa tradição nestas situações. Mas, como já se tinha visto contra a Espanha no Mundial da África do Sul, jogar para o 0-0 acaba quase sempre por resultar na derrota por 1-0, com o adversário a marcar quando já não há muito tempo para reagir. A fortuna não ajuda os não audazes. Como se viu agora nos dez minutos finais do jogo, um pouco mais de fé e de ambição, um pouco menos de medo e cautelas, poderiam ter dado ao jogo um destino diferente. Nenhum jogo está decidido enquanto não for jogado.

Depois, é tempo de parar com os choradinhos habituais: o árbitro e a falta de sorte. O árbitro, não só não teve a mais pequena influência no resultado, como fez também um trabalho absolutamente impecável e imparcial. Só mentalidades benfiquistas ou sportinguistas, viciadas em décadas de reclamação das arbitragens quando as coisas não correm como desejado, é que podem vir desculpar a nossa impotência com uma suposta parcialidade da arbitragem. Com franqueza, já não há pachorra para as conspirações anti-portuguesas sempre inventadas pela nossa imprensa, a lembrança do dr. Marc Batta e outras efabulações que tais. A falta de capacidade de autocrítica e a tentação de transferência para outrem de culpas próprias é a imagem de marca dos cronicamenle derrotados.

Quanto à sorte, é verdade que não a tivemos no remate de Pepe à trave, no último minuto da primeira parte: teria sido um golo caído do céu e em nada justificado pelos insípidos 45 minutos anteriores. Já a bola do Nani na parte superior da barra, se tivesse entrado, teria sido, sim, uma imensa sorte, jã que ele, conforme confessou e todos vimos, apenas falhou o cruzamento. E não lem nada a ver com falta de sorte, mas com falta de jeito, os golos que Ronaldo, Varela e Nani poderiam ter marcado e nao marcaram porque deixaram que os adversários os evitassem.

Ao contrário do que disse Nani, não é «a bola que não quer entrar»: a bola entra quando é rematada para entrar e não tem defesa possível. Não é por acaso nem porque a bola não queira entrar que, nos quatro jogos disputados em 2012, a Selecção empatou dois, perdeu outros dois e apenas marcou um golo. Basta, aliás, vê-la jogar para perceber que o golo, ali, é sempre uma coisa que só parece poder acontecer fruto de um acidente imprevisível. Mesmo sabendo-se que não temos um ponta-de-lança digno desse nome, é um dos principais mistérios e marcas desta Selecção (que, apesar de tudo, tem Ronaldo, Nani, Quaresma) a doentia incapacidade de gerar jogadas de golo e concluí-las.

Não vou atirar as culpas para cima de Paulo Bento, porque julgo que todos reconhecemos que esta é uma fraca Selecção, com pontos bastante vulneráveis e demasiados jogadores banais em várias posições. Mas podemos criticar a Paulo Bento a ausência, nunca explicada, de Bosingwa que tanta falta fez no golo da Alemanha, em que, vendo João Pereira a saltar com Mário Gomez, me lembrei da razão pela qual Mourinho dizia que não queria laterais baixos. E podemos perguntar para que servem afinal os jogos de preparação e para que serviu o ensaio geral contra a Turquia, quando o vimos depois insistir em João Pereira, Miguel Veloso ou Nelson Ohveira. João Pereira mostrara já que está em pior forma do que Miguel Lopes; Miguel Veloso que é pior opção do que Custodio ou que a opção de Meireles a trinco e Hugo Viana no meio-campo ofensivo; e Nelson Oliveira mostrara e voltou a mostrar que, para já, não passa de uma ficção jornalística e uma atenção ao Benfica.

Mas Paulo Bento não tem culpa de não ter melhor meio campo, de Raul Meireles andar à toa por ali, de Postiga não conseguir ser diferente do que é, de Ronaldo se eclipsar habitualmente quando joga pela Selecção. Também reconheço que é fácil olhar para os últimos dez minutos do jogo com a Alemanha, quando tivemos de correr atrás do resultado, e concluir que, se calhar, nos faltou ambição mais cedo. Mas será que temos equipa para ambições destas? Veremos já amanhã contra a Dinamarca.

2- Subscrevo o que escreveu Vítor Serpa e acrescento: pobre Selecção, se não aguenta as críticas feitas por Manuel José e Queiroz e se, dos dirigentes aos jogadores, reagem todos como majestades ofendidas. Primeiro, porque somos um País onde a crítica é livre; segundo, porque revela mais coragem e personalidade fazer as críticas antes, do que após conhecer o desfecho; e terceiro, porque as críticas tinham toda a razão de ser. Quem tem juízo, sabe muito bem que o circo em que a Selecçao é passeada antes das competições, a diarreia patriótica de que é alvo e o exibicionismo ridículo em que os jogadores se deleitam, não sei se prejudica ou não a concentração, mas que vai irritando cada vez mais, isso vai. A histeria jornalística na cobertura da Selecção, em especial por parte das televisões, as patéticas campanhas de publicidade das marcas que patrocinam a Selecção e as suas vedetas, a mensagem do ministro Miguel Relvas jurando à Selecção que «vocês são Portugal» ou o discurso do presidente da Federação, Fernando Gomes, comparando os jogadores aos «antigos navegadores» , à «descoberta de novos mundos», tudo isso, pelo menos na parte que me toca, é o retrato plasmado de um País culturalmente sub-desenvolvido e que parece não ter emenda. Mais uma vez e por mais impopular que seja, é preciso repetir que o futebol não é o principal da vida das pessoas nem da vida das nações. É preciso repetir que uma selecção nacional de futebol é a escolha dos seus cidadãos que têm mais jeito para jogar futebol, e apenas isso. Não é uma selecção dos melhores músicos, investigadores, arquitectos, escritores, cirurgiões, ele. Se aqueles são Portugal, estes serão o quê — as sobras da nação?

3- Contrariando a lei do País, jogou-se um decisivo Benfica-Porto em hóquei em patins, num pavilhão da Luz reservado a sócios do Benhca e onde mesmo os portistas portadores de bilhetes foram impedidos de entrar pela polícia. O jogo foi ainda televisionado pelo canal do Benfica, que emite na Meo - que eu, por exemplo, não tenho. Parece que tudo se passou conforme planeado, que pouca gente é testemunha do que, de facto, terá acontecido e pouca gente terá ainda conseguido distinguir a baliza do Benfica, coberta de fumo, quando, ao cair do pano, foi lá cobrado e falhado um penalty a favor do Porto.

No final, o Benfica conseguiu, in extremis, o empate que lhe serve para se tornar campeão e o treinador portista, Tó Neves, perguntou se era aquela «a verdade desportiva que reclama o presidente do Benfica». Não sei, não vi. Mas, no hóquei, como no resto, sei que tudo está bem quando acaba como o Benfica deseja.

4- Segundo Luís Filipe Viera, o Benfica não vai jogar um torneio a Angola, pensado pelo Governo, porque o secretário de Estado da Cultura, Francisco José Viegas, conhecido portista, ousou, num texto escrito enquanto adepto do FC Porto, referir-se ao Benfica como «a outra equipa». Uma ofensa que Vieira não perdoa e que considera, pelos vistos, extensível a todo o Governo. Alguém que comente isto, porque a mim falta-me a imaginação.

5- O presidente da Liga de Clubes, o notável Mário Figueiredo, jurou, por sua vez, que 80% dos clubes profissionais de futebol têm os ordenados em dia. Alguém que se ria, porque eu já não consigo achar graça.

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