sábado, maio 26, 2007

PARABÉNS A TODOS ( 22 Maio 2007)

JESUALDO DEVE CONTINUAR MAS TÊM DE MEDITAR.


O FCPORTO teve contra si o «factor Carolina Salgado/Apito Dourado», que se traduziu num campeonato inteiro em que, tendo sido vítima de vários erros de arbitragem, não teve a seu favor, e correspondentemente, uma única decisão favorável em jogadas controversas. Da 1.ª à 30.ª jornada, na dúvida, na mais pequena dúvida, todos os árbitros, sem excepção, decidiram sempre contra o FCPORTO.



FCPORTO

O FC Porto foi campeão — à tangente, sofridamente, com o credo na boca e o coração nas mãos, mas foi. Comandou da primeira à última jornada e teve um momento decisivo, pela positiva: quando foi à Luz, já com a morte encomendada, e mostrou a fibra de que se fazem os campeões. Era o grande favorito à partida e o que maiores obrigações tinha, porque dispunha do maior orçamento e da melhor equipa. Mas perdeu Anderson durante meio campeonato, Quaresma em quatro jogos e Pepe noutros quatro. Até Fevereiro, acumulou o campeonato com uma boa prestação na Liga dos Campeões e, não fossem as fatídicas férias de Natal, o fatídico jogo de Leiria, com a expulsão de Quaresma e duas derrotas consecutivas, a incapacidade demonstrada na recuperação fisica dos jogadores e uma inesperada instabilidade psicológica no final do campeonato, e poderia ter terminado tranquilamente o passeio que fez na 1.ª volta.

Porque, se as últimas imagens são as que mais perduram, é bom que as pessoas não se esqueçem que um campeonato são 30 jogos e não apenas os dez últimos. Por outro lado, e de uma forma que foi flagrante para qualquer observador atento e de boa-fé, o FC Porto teve contra si o factor Carolina Salgado/Apito Dourado, que se traduziu num campeonato inteiro em que, tendo sido vítima de vários erros de arbitragem, não teve a seu favor, e correspondentemente, uma única decisão favorável em jogadas controversas: nem um golo mal validado, um penalty mal assinalado, uma expulsão forçada de um adversário.

Da 1.ª à 30.ª jornada, na dúvida, na mais pequena dúvida, todos os árbitros, sem excepção, decidiram sempre contra o FC Porto — mesmo na última jornada, no Dragão, onde o golo do Desportivo das Aves, que podia ter valido um campeonato, foi obtido em offside. Quinze dias antes, no mesmo palco e contra o Nacional da Madeira, o que teria sido o primeiro golo do FC Porto foi invalidado por offside inexistente…

Campeão pela primeira vez, campeão merecidamente, com uma equipa que não fez e uma pré-época que não foi sua, Jesualdo Ferreira confirmou a regra de que no FC Porto qualquer um se arrisca a ser campeão. Há quinze dias, nesta crónica, defendi a sua continuação, qualquer que fosse o desfecho do campeonato. Agora, continuo a defendê-la, obviamente, mas estou mais à vontade para dizer que Jesualdo — ultrapassado esse Rubicão e as razões de um nervoso, às vezes quase paralisante, que se transmitia à equipa — tem agora muito que meditar.

Tem de deixar de ser tão conservador e previsível — por exemplo na aposta em jogadores a quem dá o estatuto de inquestionáveis, mesmo quando eles não estão em forma, como Lucho ou Helton— e tem de saber jogar a época com um plantel de 18/20 jogadores e não de 13/15. Tem de dar sinais claros de que sabe ler o jogo em andamento, não substituindo apenas por substituir, mas para influir no jogo, tem de esclarecer de uma vez por todas o que é e para que serve o meio-campo, para não ter de voltar a viver pesadelos como os do jogo com o Sporting, no Dragão, onde o meio-campo do FC Porto foi quase enxovalhado pelo do Sporting. Resta saber, é claro, quantos do seu trio genial— Pepe, Quaresma, Anderson— é que a nova/velha Direcção do clube vai vender este Verão…


SPORTING

Paulo Bento foi o treinador do ano. Inquestionavelmente. Partiu com o mais baixo orçamento dos três grandes, uma equipa de miúdos, que levou meio campeonato a afinar e a ensinar o que era jogar para a vitória. Por pouco, por muito pouco, tinha conseguido um triunfo que teria sido deveras impressionante e pedagógico. Ao intervalo do FC Porto-Desportivo das Aves, sabendo que o Sporting já vencia o Belenenses por 2-0 e observando mais uma melancólica exibição do FC Porto, eu já estava a mentalizar-me para aceitar que o Sporting seria um justo campeão. Porque a sua recuperação, o seu campeonato sem nenhuma derrota fora, a sua atitude de conquista, a sua crença, a sua capacidade de pôr pressão sobre o Porto e a sacudir de si próprio, o justificavam. Mas (felizmente!) o FC Porto entrou para a segunda parte do seu jogo de cara lavada e vontade de ser campeão. Isso não impede que se reconheça o grande campeonato feito pelo Sporting e a grande condução levada a cabo por Paulo Bento.

Mas há um reverso da medalha. Eu sei que, durante anos, os sportinguistas vão dizer que não ganharam o campeonato porque, no Sporting-Paços de Ferreira, da 2.ª jornada, o Paços ganhou com um golo marcado com a mão. E são esses detalhes, essa imagem de marca dos sportinguistas, que irritam os outros: o Sporting vive a queixar-se, a reclamar, a lamuriar-se, a encontrar sempre uma culpa alheia para os desaires próprios. É verdade que o Paços ganhou em Alvalade com um golo marcado com mão. Se isso não tem acontecido, o Sporting tinha empatado: perdeu aí um ponto. Mas, logo na jornada anterior, a 1.ª, venceu no Funchal o Nacional com um golo precedido de falta: se tem sido anulado, como deveria, teria empatado e não vencido: ganhou aí dois pontos. No Dragão, no jogo que relançou o campeonato, marcou o único golo na cobrança de uma falta que não existiu e, no último segundo, Pedro Hdenriques não teve coragem de assinalar penalty flagrante de Polga sobre Pepe. O mesmo Pedro Henriques, no jogo da Luz, perdoou duas vezes a expulsão a Caneira, e Lucílio Baptista, o árbitro preferido em Alvalade, perdoou penalty claro a Liedson, na penúltima jornada em Coimbra, quando havia 0-1. Mas já todos sabemos que memórias destas não constam do arquivo sportinguista.

Felizmente, abortou a tentativa de conseguir ganhar o campeonato na secretaria, graças à repetição do jogo de Leiria — fundada em razões e expedientes jurídicos tão rebuscados e descarados que nada abonam à suposta atitude de cavalheiros que os sportinguistas acham que os caracteriza. Mas a mensagem foi clara: cavalheiros sim, mas para ganhar vale tudo, mesmo aquilo a que em direito se chama «litigância de má-fé». E foi pena, porque, como o disse, acho que, por aquilo que se viu em campo, o campeonato também não teria ficado mal entregue ao Sporting. Mas em campo, não na secretaria.


BENFICA

Os benfiquistas vão cair em cima de Fernando Santos, que é o elo mais fraco e mais fácil de atacar. Em minha opinião, muito injustamente. É certo que não foram campeões e que nem ao segundo lugar chegaram. Mas ficaram a um ponto do segundo e a dois do primeiro — o que é notável para a equipa que Fernando Santos teve ao seu dispor. Durante a primeira volta, e várias vezes vi o Benfica jogar um grande futebol, só que — como aconteceu também com o FC Porto e não aconteceu com o Sporting — o Benfica teve azar com as lesões e defendeu durante muito tempo uma campanha europeia de sucesso. O que sucede no Benfica é que há um desfasamento claro entre a arrogância do discurso constante do presidente e os meios que ele faculta aos seus para darem corpo à sua ambição. Fernando Santos não foi campeão no futebol — e o vólei, o basquete, o hóquei, o andebol? Em que é que o Benfica é campeão, para além do futebol de salão?

Até à última batida ( 15 Maio 2007)

HELTON NÃO É GUARDA-REDES PARA UMA GRANDE EQUIPA.


Meus amigos: se querem ser campeões para a semana, mudem de atitude radicalmente, desliguem os telemóveis aos vossos agentes daqui até Domingo, respeitem a multidão que vos têm acompanhado jogo após jogo e deixem-se de desculpas com a pressão ou outras coisas mais próprias de equipas de derrotados.


1- Há quatro ou cinco jornadas que me venho repetindo: isto só está ganho para o FC Porto depois do apito final do último jogo. Ao contrário do que disse Jesualdo Ferreira, não é fácil entender as razões de tanta instabilidade e tanta falta de consistência do futebol azul-e-branco. Pressão? Claro que há pressão, há sempre pressão quando se tem de ganhar um jogo e um campeonato, mas se há coisa para que o FC Porto está preparado desde há largos anos é para viver sob pressão.

Pelo contrário, eu penso que, se calhar, aquilo que tem faltado é a consciência da pressão de ganhar. Veja-se este jogo contra o Paços de Ferreira: desde os três minutos que os jogadores já sabiam que, como habitualmente, o Sporting estava a ganhar em Coimbra, fruto de uma oferta do adversário. Logo, desde os três minutos que os jogadores portistas sabiam que tinham de lutar pela vitória: o empate não apenas deixava as coisas mais complicadas, como era um resultado perigoso para manter até final. E que fizeram eles, face a isso? Nada. Passaram 20 minutos a trocar a bola displicentemente, sem pressa alguma, sem nenhum esforço para ligar minimamente uma jogada, e com alguns deles, como Lisandro (que época desastrada!), a jogarem tão mal que mais parecia terem caído ali por engano.

Então, sucedeu aquilo que já se tornou um hábito, desde os tempos de Co Adriaanse e desde que Helton agarrou a titularidade da baliza portista: nos jogos contra equipas mais fracas, fora de casa, quando o FC Porto não entra logo para matar, acontece invariavelmente que, no primeiro remate à baliza feito pelo adversário, sofre um golo. Mal batido no golo do Paços, Helton (que não foi o único culpado), confirmou uma suspeita que venho alimentando: que ele é um grande guarda-redes para uma equipa mediana como o Leiria, mas que não é guarda-redes para uma grande equipa, habituada a jogar ao mais alto nível.

A sua especialidade são as defesas impossíveis, que, numa equipa mediana, significam pontos e vitórias. Mas, numa grande equipa, só muito raramente o guarda-redes é chamado a defesas impossíveis. O que se lhe pede é que não falhe nenhuma das possíveis, que não cause sobressaltos no jogo aéreo ou com os pés, que saiba comandar a defesa e que transmita absoluta tranquilidade para que a equipa se possa ocupar livremente daquilo que mais tem de fazer: atacar e atacar.

No Leiria, Helton terá ganho inúmeros pontos para a equipa, graças às suas defesas; no FC Porto, lembro-me de algumas grandes defesas, mas não me lembro que alguma delas tenha segurado resultados.

A perder desde os 20 minutos, num campo pequeno de mais para o espaço que talentos como Quaresma e Anderson precisam, a ter de arrostar com duas enxurradas de granizo, uma em cada parte, eu cheguei a crer, durante uma hora a fio, que 2700 sportinguistas teriam de honrar a sua palavra e nunca mais voltarem a entrar num IKEA, comprando os seus móveis na indústria local de Paços de Ferreira. Diga-se que nunca mais o Paços acertou um remate na baliza — o golo, de livre, foi o único que acertou em todo o jogo —, mas que, se a bola não tem ido de encontro à perna de Adriano, o campeonato teria ficado perdido ali, submerso naquele lençol de água, com um ar de fatalidade quase natural.

Pelo que, meus amigos: se querem ser campeões para a semana, mudem de atitude radicalmente, desliguem os telemóveis aos vossos agentes daqui até domingo, respeitem a multidão que vos tem acompanhado jogo após jogo e deixem-se de desculpas com a pressão ou outras coisas mais próprias de equipas de derrotados, que não é o caso. Se querem ser campeões, até aos 20 minutos têm de estar a ganhar por 2-0 ao Aves e depois não podem descansar no resultado.

2 - Ano após ano, torci em vão pelo regresso do Leixões à I Divisão. Não apenas porque é do Porto (ou quase…), porque é um clube simpático e popular, porque tem uma massa de adeptos que merece o melhor, mas também porque o nome do Leixões faz parte integrante das minhas memórias de infância e juventude. 19 anos depois, ei-lo de volta e eu só desejo que para muitos e bons anos.

Também o Vitória de Guimarães faz parte das minhas boas memórias futebolísticas de sempre e, por isso, foi também por ele que eu torci este ano. E o Vitória de Guimarães, com uma falange de adeptos de uma dedicação e militância raras, bem merece também este regresso aos grandes. Não só pelos adeptos, mas também por uma outra razão: a dignidade com que encarou a sua descida impensável ao escalão secundário. E vale a pena, a propósito, comparar a atitude do Guimarães com a do Gil Vicente. O Guimarães desceu, sem um protesto, sem uma desculpa esfarrapada, com a consciência de que a descida fora merecida e de que só havia um caminho: trabalhar para um regresso tão rápido quanto possível. Trabalhou e acreditou até ao fim e teve a justa compensação. Agora, o Gil Vicente? O Gil Vicente quis transformar uma batota desportiva numa vitória de secretaria. Acicatado por um presidente populista, que os sócios transportavam aos ombros como herói, embalado nos malabarismos jurídicos de uma ilustre equipa de causídicos, o Gil convenceu-se que, mais depressa parava o futebol em Portugal do que órgão algum os obrigava a jogar na Honra. A arrogância e a cegueira litigante, sem qualquer traço de razão desportiva, foram tão grandes, que o presidente do clube nem recuou perante a irresponsabilidade de mandar a equipa faltar aos três primeiros jogos da Liga de Honra, só cedendo quando o treinador e os jogadores lhe fizeram ver que, a partir daí, iam todos para o desemprego. Resultado: o Gil perdeu logo de entrada a possibilidade de lutar pela subida em pé de igualdade com Leixões e Guimarães, por exemplo; o futuro financeiro e desportivo do clube é negro; o presidente-herói pôs-se ao fresco; e só os advogados parece que continuam a litigar — agora para que as faltas de comparência voluntárias não contem como tal, ao abrigo da interpretação adequada do parágrafo X, do artigo Y, da lei Z. E a verdade é esta: se, no final de tudo, o Gil for desaparecendo aos poucos, ninguém verterá uma lágrima por ele.

PS — O Conselho de Justiça, presidido por aquele ilustre magistrado que achou mais importante uma partida de bridge com os amigos do que dar uma sentença desportiva em tempo útil, concluiu (ainda na sentença do caso Quaresma), que «Ricardo Quaresma não tem registo de serviços relevantes prestados ao futebol português». A gente lê isto e fica sem saber se é de rir com a ignorância demonstrada, se é de ficar chocado com a pesporrência exibida. Mas há uma coisa que eu reafirmo, e ao contrário da opinião dominante: se eu mandasse, dispensava todos os ilustres juristas do futebol. A eles, sim, é que não consigo encontrar-lhes sinal de qualquer serviço relevante prestado ao futebol português.

Vamos com calma, Porto! ( 8 Maio 2007)

Já imaginaram um autocarro de adeptos do Benfica ser impedido pela polícia de passar além de Vila Nova de Gaia?


1- Jesualdo Ferreira tem reagido mal às poucas críticas de que é alvo em voz alta. Passei a semana a ouvir recados sobre as injustiças das minhas críticas, que afinal se têm resumido a duas coisas: a deficiente condição fisica de que a equipa dá mostras desde a pausa natalícia, e o facto de Jesualdo Ferreira preferir meter o Anderson só nas segundas partes dos jogos, quando já tudo está resolvido. Escrevi que, se ele não tem ainda condição física para um jogo inteiro, fazia mais sentido metê-lo de início do que no final, porque ele faz parte do restrito número dos que são capazes de resolver os jogos, enquanto eles estão por resolver.

Contra o Nacional, viu-se como Anderson continua a ser um desequilibrador decisivo e como, enquanto teve forças, foi ele quem resolveu o jogo. E viu-se também que, não só Anderson, mas mais três ou quatro jogadores acabaram o jogo a arrastar-se no campo (Lucho desde os 20 minutos…). Mas não é isso que transformou em justas as minhas críticas. As críticas, desde que sérias e isentas, podem estar certas ou erradas, mas jamais poderão ser injustas pelo simples facto de existirem. Ninguém é perfeito e ninguém está acima da crítica. É evidente que Jesualdo estava errado em relação ao timing da utilização de Anderson e é evidente que o FC Porto é, de há meses para cá, das equipas com pior condição fisica do campeonato. Dizer isso é apenas constar um facto, não é ser injusto.

Aliás, e para que fique claro, eu devo dizer, se ainda não se percebeu, que tenho gostado do trabalho de Jesualdo Ferreira à frente do FC Porto. Mais (e estas coisas devem ser ditas antes e não depois): mesmo que o campeonato se perca na recta final, eu defendo a continuidade de Jesualdo Ferreira à frente do FC Porto. Defendo que ele deve ter a oportunidade que não teve este ano de escolher a equipa e fazer a pré-época. Acho que não lhe podem ser cobrados os dois desaires mais marcantes da época: a eliminação às mãos do Chelsea, mais do que previsível e precipitada pela ausência de Anderson e o frango de Helton, e a escandalosa eliminação na Taça, contra o Atlético, inteiramente da responsabilidade dos jogadores que estiveram em campo. Jesualdo conseguiu ultrapassar a fase de grupos da Champions e fez uma primeira volta do campeonato simplesmente notável. As longas férias de Natal desfizeram a coesão da equipa e estranhamente, por razões que talvez ele queira explicar um dia, trouxeram de volta uma equipa a quem o público tem de levar ao colo — como sucedeu este sábado no Dragão — para que ela se tente aguentar em jogo os 90 minutos.

Para Paços de Ferreira, Jesualdo vai ter finalmente quase toda a equipa livre de castigos e lesões. É o penúltimo passo para o título e agora acredito firmemente que não o vai falhar. Isso é que não seria justo.

2- Pela quinta vez consecutiva, um adversário do Sporting entregou-lhe o jogo mal soou o apito inicial. Parece que têm pressa em perder, o que, obviamente, facilita e de que maneira os triunfos leoninos: mal começam os jogos, a equipa fica aliviada de pressão, sem ter de correr contra o tempo nem contra a sorte. No Dragão, o FC Porto chegou ao intervalo empatado a zero, depois de ter falhado uns seis ou sete golos e de ter marcado dois que não valeram — um dos quais, ninguém sabe porquê. Em Alvalade, com um minuto de jogo, canto e autogolo. Faz uma diferença, uma grande diferença.

Em última análise, a coisa até é injusta para o próprio Sporting, que assim vê de alguma forma diminuido o mérito das vitórias alcançadas. E a verdade é que o Sporting fez contra o Vitória uma primeira parte esplendorosa, apenas minimizada pela fraqueza da oposição encontrada. Da mesma maneira que o facto de a defesa do Vitória ter deixado suicidariamente Liedson à solta por duas vezes, não pode apagar mais uma demonstração da classe deste ponta-de-lança — o melhor do nosso campeonato e agora sem rival, desde que McCarthy rumou para Inglaterra, onde passeia a sua classe e golos.

3- Carmona Rodrigues vive os últimos dias na presidência da Câmara de Lisboa, de onde foi publicamente despedido pelo partido que o fez eleger e quando se tornou penosamente evidente que Lisboa já nem sequer estava a ser governada. Parece, todavia, que não se quer ir embora sem aprovar a favor do Sporting um controverso projecto de urbanização que é tudo menos transparente. Mandaria o bom senso que deixasse o assunto para quem se lhe seguir. E mandaria o decoro que, três dias antes de forçar a votação do projecto, não estivesse em Alvalade, sentado ao lado do presidente do Sporting, a assistir ao jogo. Mesmo Carmona Rodrigues, que todos têm como um homem sério, não está ao abrigo da cominação da mulher de César…

4- Em minha opinião, o Vitória de Setúbal é a pior equipa do campeonato e a sua descida aos infernos da Honra é absolutamente natural e justificada. Passa-se com o Vitória a mesma coisa que se passa com a própria cidade de Setúbal. Há 20 anos atrás, Setúbal tinha todas as condições para se transformar numa cidade modelo, em termos de urbanismo e qualidade de vida: dimensão adequada, espaço para se desenvolver harmoniosamente fora do centro, possibilidade fácil de recuperar o centro histórico e ligá-lo ao rio, condições naturais excepcionais, com o estuário do Sado aos pés, o mar em frente, a montanha ao lado, praias magníficas, frente de rio única, avenidas largas, praças suficientes, enfim, tudo ou quase tudo.

Mas vieram os Mata Cáceres e outros artistas do poder local e transformaram Setúbal numa coisa caótica e aberrante, com urbanizações dignas de subúrbio africano, esculturas pseudomodernas horrendas, o triunfo do pato-bravismo, do mau gosto e da gestão sem planeamento nem ideias.

Também o futebol do Vitória chegou a encantar Portugal e a surpreender a Europa. Mas depois, as forças vivas da cidade, ou seja, os mesmos artistas que destruiram a beleza de Setúbal, tomaram conta do clube e demonstraram que eram tão bons a dirigi-lo como a fazer a cidade. Hoje a cidade é uma dor de alma e o clube um cadáver adiado. Que ninguém fale em injustiça.

5- Aconteceu já há uns quinze dias e eu esperei para ver se alguém se indignava publicamente com o assunto. Esperei em vão. E, todavia, foi das coisas mais graves que sucederam ultimamente no desporto português. Depois de o presidente do Benfica, a propósito dos incidentes no Benfica-Porto, ter declarado que, de futuro, o clube se reservava no direito de interditar a presença de adeptos do adversário no Estádio da Luz, depois de o inquérito do MAI ter concluído que os incidentes eram da responsabilidade do Benfica e da PSP, um autocarro com adeptos do FC Porto que vinham assistir ao Benfica-Porto em hóquei em patins, foi interceptado pela polícia em Alverca e impedido de entrar em Lisboa. Apesar de a bordo viajarem inclusivamente adeptos com bilhete já comprado para o jogo.

Concluo assim que a PSP está ao serviço do presidente do Benfica e faz cumprir os seus desejos ou ordens, mesmo quando isso implica vedar o acesso a espectáculos abertos ao público por lei, ou, pior ainda, quando isso implica que cidadãos portugueses sejam impedidos de entrar numa cidade do País. Nem na Idade Média os nobres se permitiam controlar assim o direito de entrada nas suas terras! Já imaginaram um autocarro de adeptos do Benfica ser impedido pela polícia de passar além de Vila Nova de Gaia?

Ah, mas Deus, se existe, não dorme: mesmo assim, o Benfica perdeu o jogo e o campeonato…

Um campeonato para ganhar e uma eleição para esclarecer ( 1 Maio 2007)

Não estou assim tão certo de que a coisa esteja no papo.


1- Os três candidatos ao título de 2006/07 viveram todos um fim-de-semana de frustrações: um não mostrou cabeça nem engenho; outro não mostrou força nem capacidade; e outro não mostrou coragem nem espírito de conquista. Por isso, todos perderam um pouco e bem o mereceram.

O FC Porto, tal como eu tinha previsto, foi encontrar no Bessa um Boavista disposto a fazer o jogo do ano. É sempre assim e os jogadores e treinador já estavam avisados, pelo que não faz sentido falar em surpresa. Mesmo coisas verdadeiramente surpreendentes, tais como ver José Manuel a correr como um doido, ao fim de uma hora de jogo, para marcar o segundo golo do Boavista, ou escutar o próprio Jaime Pacheco a confessar que não sabia onde é que aquela equipa tinha estado escondida, eram de prever: contra o FC Porto, o Boavista desencanta sempre forças escondidas e artes insuspeitas de que depois e antes não faz prova. O FC Porto ia avisado e Jesualdo Ferreira também. Era preciso jogar no seu melhor e com os melhores — o que significa, por exemplo, não insistir mais no Postiga, que já deu o que tinha a dar (um mês de inspiração em onze de temporada), e, sobretudo, não reincidir no crime de pôr o Jorginho em campo e o Anderson no banco, à espera não se percebe bem de quê. Pode ser que o Anderson não aguente ainda um jogo inteiro, mas porque não o colocar na primeira parte em vez da segunda, não o colocar a tempo de poder resolver os jogos, e não quando eles já parecem resolvidos, para o mal ou para o bem? Deve fazer parte dos tais mistérios que o professor Jesualdo Ferreira acha que não estão ao alcance do entendimento de um simples adepto-comentarista…

Como quer que seja, o facto é que o FC Porto poderia ter dado a machadada final na questão do título e afinal acabou a perder um ponto para ambos os perseguidores. É verdade que podia ter sido pior, se o Sporting tem ganho na Luz, e é verdade também que continua a depender apenas de si próprio e até pode ceder um empate, pelo menos. Mas, insisto no que aqui escrevi há oito dias: não estou assim tão certo de que a coisa esteja no papo. Domingo, não há centrais e não há Quaresma. Viu-se no Bessa como a ausência de Pepe foi determinante, agora vai-se medir os efeitos da dupla ausência de Pepe e Bruno Alves; quanto à ausência de Quaresma, basta lembrar que, dos três jogos em que não jogou, dois acabaram em derrota. Se Jesualdo Ferreira insistir em deixar Anderson no banco, sem os centrais para subirem nos cantos e sem Quaresma para cruzar como só ele sabe, não sei quem é que será capaz de criar situações de golo nesta equipa.

O Benfica, a meu ver, fez o que pode e o mais a que está obrigado. Sem Luisão e sem Simão, com Rui Costa a meia-força, ficou limitado a apenas um jogador de verdadeira classe: Miccoli. Ele sozinho sacou o empate, apesar de ter por ali o Nuno Gomes sempre a atrapalhar. Apesar de tudo, na última meia hora do jogo do tudo ou nada, foi o Benfica, e não o Sporting, que mostrou vontade e atitude para querer ir mais além. Não o conseguiu porque uma orquestra de onze não toca bem só com um solista em palco.

O Sporting perdeu na Luz mais do que uma oportunidade rara de ganhar, tirando partido das ausências de Luisão e de Simão — (ao contrário do próprio Sporting que se apresentou na máxima força, depois de uma época inteira em que, por mérito e por sorte, apenas teve e brevemente um jogador fora de combate: Tonel).

Mais uma vez, e como vem sendo hábito, o Sporting conseguiu ainda marcar logo de entrada, no primeiro remate feito à baliza e ainda o Benfica não tinha ultrapassado a linha do meio campo. Foi uma jogada bem desenvolvida e mais uma demonstração do talento de Liedson, talvez o jogador mais inteligente do campeonato e único, isolado entre quatro jogadores do Benfica, a perceber aonde ia cair a bola centrada por Abel. Mas, por isso mesmo, também foi um golo largamente consentido e mais um golpe de sorte a facilitar a vida aos leões, logo na madrugada do jogo. Há sortes que caem do céu e há outras que se merecem: na Luz, eu achei, mais uma vez, que a sorte do Sporting cai quase sempre do céu e raramente é justificada em campo. Foi o que aconteceu: houve os primeiros quinze minutos em que o Benfica estava entontecido com aquele golpe madrugador, e mais quinze minutos à entrada da segunda parte, em que cheirava outra vez a golo verde. Mas, findo esse período sem segundo golo, toda a equipa e o seu treinador não insistiram mais no assunto, dando a sensação de que até final se iriam limitar a defender o empate, esperando talvez por outro golpe de sorte ou um contra-ataque minimalista, com a bola pontapeada pelo Ricardo lá para a frente e o Liedson a resolver a coisa sozinho. A vitória do Sporting teria sido um desfecho de tremenda injustiça.

E assim chegamos a três jornadas do fim com a sensação de que nenhum dos três candidatos revela uma passada e uma confiança que permita apostar tudo num deles. O FC Porto já teve o campeonato ganho por duas vezes, mas vai acabar com o credo na boca. O Sporting já esteve afastado de tudo e já ressuscitou duas vezes, mas deixa a impressão de que foram mais as facilidades que foi encontrando pelo caminho do que as dificuldades que conseguiu ultrapassar que o mantém ainda com uma ténue esperança. E o Benfica, chupado até aos ossos durante toda a época, mostrou contra o Sporting e contra o FC Porto, como já havia mostrado contra o Espanhol, que o limite da sua capacidade só iria até Fevereiro/Março. Mas às vezes os vencidos levantam-se e os vencedores estatelam-se à vista da meta. E outras vezes, no meio da confusão, sobra a vitória para o pezinhos de lã…

2- Estou muito curioso de ver a lista que Pinto da Costa vai apresentar para o acompanhar em mais um mandato. Quero ver se, ao arrepio de todo o bom-senso, despede os competentes e sérios e mantém os responsáveis pelo descalabro financeiro do clube, e não só. Para já, despediu o presidente do Conselho Fiscal, Domingos Matos, há 23 anos no FC Porto, com o pretexto absurdo de que ele é administrador da Cofina e a Cofina é dona do Record e do Correio da Manhã, jornais que dizem muito mal do presidente do FC Porto (só no mundo democrático do Dr. Jardim, da Madeira, é que a função de um administrador de imprensa é controlar as notícias que os jornais trazem).

Desconfio que a verdadeira razão esteve algures, conforme a escolha de um homem de absoluta lealdade e sem vocação para fazer ondas, como Adolfo Roque, para substituir Domingos Matos, parece indiciar. Quando a gestão financeira não é transparente, convém que o presidente do Conselho Fiscal seja compreensivo.

Também o episódio do Conselho Superior é elucidativo. Formou-se uma lista, que convidou o Dr. Pôncio Monteiro para presidente e ele aceitou. Mas esqueceu-se de dizer a Pinto da Costa quem compunha o resto da lista, e lá dentro estavam alguns que têm levantado estas perturbantes questões sobre a gestão financeira da SAD em reuniões do Conselho Superior. Vai daí, Pinto da Costa promoveu a constituição de nova lista, com o pormenor delicioso (e que eu nem imaginava que os estatutos permitissem) de ser também encabeçada por Pôncio Monteiro — que assim consegue a proeza de concorrer contra si próprio! Imperturbável, o Dr. Pôncio já tratou de esclarecer que toda a gente sabe que deve votar na lista da situação, que é presidida por si, contra a lista da oposição… que também é presidida por si!

A avaliar por estes dois casos, temo o pior. Mas espero para ver e cá estarei para comentar.

Campeão só mesmo no fim ( 24 Abril 2007)

Se o factor sorte vier a ter um papel importante neste desfecho de campeonato, as hipóteses do Sporting parecem-me bem maiores do que as do Porto.


1- Não creio que Jesualdo Ferreira exagere nas cautelas a falar do título, que agora está só a três vitórias de distância. Pelo contrário, acho que ele tem razão, porque nada ainda está decidido a favor do FC Porto — por razões próprias e por razões da concorrência.

Entre as razões próprias, avulta aquela estranha e crónica ambivalência da equipa: é uma coisa nas primeiras partes dos jogos, quase sempre boas, e outra radicalmente diferente nas segundas partes, em que a equipa morre sistematicamente. Que há ali um evidente problema ao nível da preparação física, parece-me indesmentível. Mas que também há um problema psicológico, de atitude, começa-me a parecer também evidente. Aconteceu assim nos últimos dois jogos, contra a Académica e o Belenenses, que um massacre inicial acabou, inexplicavelmente, por se transformar em vitórias quase sofridas, nas segundas partes. Há ali uma incapacidade de dar o Xeque-mate, ou ao menos de gerir tranquilamente os resultados, que é preocupante. É verdade que tem havido demasiadas bolas na trave, demasiados golos fáceis desperdiçados e demasiadas ocasiões em que o adversário consegue marcar na primeira oportunidade para tal. Mas um pouco mais de fé e de convicção talvez conseguisse inverter a sorte, por arrasto. Paralelamente, eu que, regra geral tenho apreciado o trabalho feito por Jesualdo Ferreira desde o início da época (e apreciado muitíssimo, se o comparar ao do louco do Co Adriaanse…), devo dizer, contudo, que às vezes tenho a sensação que Jesualdo Ferreira é um pé frio, quando se trata de mexer na equipe durante os jogos: ou não mexe quando devia e antes de as coisas se complicarem, ou, quando mexe, resulta quase sempre pior. Não me parece que a arte de ler o jogo em andamento e de influir sobre ele esteja entre os seus principais atributos.

Sábado, no Bessa, o FC Porto tem um jogo terrível: como todos os portistas sabem, o Boavista pode não estar a jogar nada, como é o caso, pode, como quase sempre, facilitar a vida aos grandes de Lisboa, mas bater-se contra o FC Porto como se se tratasse de uma questão de vida ou morte, isso eles não falham. Espero que Jesualdo Ferreira tenha uma estratégia pensada e lógica para ganhar o jogo — o que, entre outras coisas, passa, por exemplo, por não pôr o Jorginho em vez do Anderson ou em não insistir com o Marek Cech como médio. E espero, sobretudo, que a equipa se aguente 90 minutos a jogar para vencer.

Nos factores externos que podem ainda impedir o FC Porto de ser campeão, o principal é, obviamente, o Sporting — a uma vitória e um empate de distância. Quando digo que o Sporting, pé ante pé, chegou aqui a lutar pelo título, fico espantado por constatar o pouco ou nada que sobre ele escrevi ao longo do campeonato. E a razão é simples: não sei muito bem o que pensar do futebol do Sporting. Reconheço que tem um treinador que tem feito um trabalho notável com o que tem ao seu dispor; que tem alguns grandes jogadores, embora nem sempre de produção regular, como o são um Quaresma ou um Simão; e reconheço que a equipa tem muitas vezes uma atitude e estratégia pensada para a vitória, na forma linear e eficaz como procura o golo quando precisa e como aguenta quando tem de aguentar. Mas a verdade também é que não me lembro de um jogo em que o futebol do Sporting me tenha enchido o olho.

Ao invés do FC Porto, acho que o Sporting tem sabido procurar a sorte, mas caramba, ela não lhe tem faltado! Recordo os últimos jogos que vi:

— venceu no Dragão, no jogo que relançou a equipa na luta pelo título, depois de um jogo em que foi superior ao FC Porto, mas sem criar grandes oportunidades, acabando por marcar o único golo através de um livre frontal que, em minha opinião, não existiu, e beneficiando, no último sopro, de um penalty perdoado graças ao síndrome Apito Dourado;

— venceu em Braga, depois de uma primeira parte muito boa, seguida de outros 45 minutos em que só defendeu e que, com um pouco menos de sorte, teria consentido o empate;

— venceu o Marítimo em dez segundos, como um golo incrivelmente oferecido por uma defesa e um treinador suicidas;

— venceu o Beira-Mar, para a Taça, com duas ofertas do guarda-redes nos primeiros oito minutos, e o resto do tempo dormiu;

— e venceu a Naval da mesmíssima forma.

Ou seja: torna-se difícil perceber o que vale verdadeiramente uma equipa e como é que ela é capaz de ultrapassar as dificuldades, se os adversários entram em campo dispostos a entregar-lhe o jogo, quanto mais depressa melhor.

Eis a razão maior das minhas dúvidas: se o factor sorte vier a ter um papel importante neste desfecho de campeonato, as hipóteses do Sporting parecem-me bem maiores do que as do Porto.

2- A forma como o Belenenses, e sobretudo o Sporting, chegaram à final da Taça (e como antes chegou o Benfica e mesmo no ano passado o FC Porto), tem pouco de mérito e menos ainda de justiça. Se a memória me não falha, em todas as eliminatórias, o Sporting só teve de jogar fora de casa uma vez — contra o Pinhalnovense e, mesmo assim, em campo neutro. No resto, limitou-se a ficar por Alvalade, recebendo e afastando, como mais ou menos dificuldades, equipas menores. Não se percebe como é que em países onde os clubes têm muito mais jogos e bem mais difíceis ao longo da época, a regra da Taça é diferente — como em Espanha, onde é tudo jogado a duas mãos, ou em Inglaterra, onde é a duas mãos ou a uma em campo neutro.

Há muitos anos que defendo um sistema em que, com a eliminatória a uma mão, os jogos fossem sempre em casa do clube de divisão inferior ou, sendo da mesma divisão, daquele que, no momento do jogo, estivesse pior classificado no campeonato. E que, no final, os quartos-finais, ou pelos menos as meias-finais, fossem jogados a duas mãos. Até porque, com a disputa da Supertaça apenas num jogo, não há actualmente nenhuma ocasião de um confronto a duas mãos entre nós, seja em que competição for. E eu pessoalmente, tenho saudades disso. Julgo que desta forma se acrescentaria competitividade, equilíbrio e justiça à Taça, e muito mais mérito ao seu vencedor.

3- O país inteiro viu a desastrada exibição de Lucílio Baptista no Beira-Mar-Benfica. Por uma vez, houve unanimidade da crítica em classificar a sua arbitragem como péssima — o que, aliás, é habitual nele. Há muitos anos que o país inteiro sabe que Lucílio Baptista é, consistentemente, um mau árbitro, além do mais com uma tendência fatal para proteger os grandes de Lisboa. Mas, ao que parece, a carreira de árbitro é como a dos funcionários públicos: são inamovíveis e progridem sempre na carreira, façam o que fizerem, sejam bons, maus ou péssimos. Tudo isso já sabíamos. Mas escusava o observador do jogo de vir classificar essa sua arbitragem como excelente, dando-lhe um 8,5 em 10. É que há uma diferença entre tomar os outros por distraídos ou tomá-los por parvos.

4- Li os dois capítulos finais do contra-livro de Carolina Salgado: Pinto da Costa, luz e sombras de um dragão, da autoria de Felícia Cabrita e Ana Sofia Fonseca. Presumo que, a esta hora, o Procurador-Geral da República, Dr. Pinto Monteiro, e a Drª Maria José Morgado, já andem a ler o livro para poderem investigar a credibilidade da sua testemunha Carolina. Por mim, limito-me a um comentário, seja qual for a verdade daquilo que se conta num e noutro livro: que gente esta com que o presidente do FC Porto andou metido!

Conforme o ponto de vista ( 17 Abril 2007)

Não gostava de estar no lugar do Cristiano Ronaldo e digo-o com sinceridade: acho que a responsabilidade moral de ganhar essas quantias indecorosas apenas por ter nascido com talento para chutar a bola, não me iria deixar gozar o dinheiro em paz.



1- Manuel Machado, treinador da Académica, acha que a sua equipa merecia ter empatado e não perdido com o FC Porto. Em sua opinião, tal só não aconteceu na segunda parte, porque «faltou eficácia e uma pontinha de sorte», tendo acabado por sofrer o segundo golo «de forma pouco ortodoxa», além de que o juiz-de-linha «fez vista grossa» a uma mão de Ricardo Costa dentro da área — «um penalty muito claro», quando havia 0-2. Claro que os treinadores são livres de escreverem a historia do jogo tal como a entendem. Em todo o caso, julgo que, ao fazê-lo, deveriam ter sempre presente que não foram os únicos a ver o jogo nem são uma autoridade especialmente qualificada na matéria. Pelo contrário, milhares de pessoas no estádio e muitos mais milhares em casa, através da TV, vêm melhor o que se passou, em especial os lances duvidosos, do que eles vêm, sentados ao nível do relvado. Ora, anote-se.

A «pontinha de sorte» sobejou largamente à Académica quando, até à meia-hora de jogo, já tinha visto três bolas baterem-lhe nos postes da baliza e três remates frontais dentro da área desperdiçados pelo ataque portista. Se estivesse a perder por 0-3 ao intervalo, teria sido absolutamente normal face ao que se passou até aí: mas estava a perder apenas por 0-1. A «forma pouco ortodoxa» como o FC Porto chegou ao segundo golo foi através de um fabuloso cruzamento de letra de Ricardo Quaresma, que deixou o centro da defesa dos estudantes aos papéis. Claro que podemos sempre reclamar contra estes jogadores «pouco ortodoxos» que dão cabo das melhores estratégias dos treinadores, mas ainda bem que os há...

Quanto ao pretendido penalty cometido por Ricardo Costa (também referido na critica de A BOLA), ele foi tudo menos evidente, através das imagens televisivas. Mas há uma imagem — aliás, duas, também a do penalty assinalado a Marek Cech, que deu o golo à Académica — que são eloquentes. São duas fotografias de ambos os lances, publicados lado a lado na edição de domingo deste jornal. Na primeira, o reclamado penalty de Ricardo Costa, vê-se a bola a bater-lhe entre o braço e o peito e diz a legenda da fotografia que ele «controla a bola com a ajuda do braço». Talvez sim, mas não é de certeza o que se vê na fotografia. O que aí se vê é o braço do jogador caído ao longo do corpo — não está levantado, não está adiantado nem puxado atrás, não está a fazer o menor movimento de procurar a bola. Está inerte ao longo do corpo e Ricardo Costa está a olhar em frente, sem sequer ver a bola. Se a prova documental é esta fotografia, gostava de saber como é que se consegue garantir que é braço na bola e não bola no braço.

A segunda fotografia, a do penalty assinalado a Cech é ainda mais eloquente, porque essa desmente expressamente a legenda e confirma que não houve penalty algum.
Diz a legenda que «a perna direita de Cech está em contacto com o joelho direito de Filipe Teixeira». Bom, demos de barato a célebre tese de penalty por «contacto», tão cara aos comentadores portugueses. Esqueçamos também a óbvia pergunta de saber porquê que é a perna direita de Cech que está em contacto com o joelho direito de Filipe Teixeira, e não o joelho deste com a perna do outro. Mesmo assim, o que a fotografia mostra, sem margem para dúvidas, é que a perna direita de Cech está meio metro à frente do joelho e do pé do adversário e joga a bola, que aquele não tinha qualquer hipótese de jogar. De resto, não se vê nem jogo de braços, nem inclinação do corpo, nem nada na atitude do jogador portista que indicie qualquer falta — chegou primeiro à bola e jogou-a; o adversário atirou-se para o chão e o árbitro marcou penalty. E Manuel Machado ainda queria mais destes, para justificar a justiça do empate...

2- Foi um jogo de estatísticas curiosas (e socorro-me das de A BOLA). O FC Porto teve 52 por cento de posse de bola contra 48 por cento; teve 8 cantos contra 4; 15 remates contra 7; 7 remates perigosos contra 3; 3 bolas nos postes contra 0; 2 golos contra 1. O resultado justo seria o empate? Bom...

Mas há outra estatística do jogo curiosa: 7 cartões amarelos a jogadores do Porto, contra 1 a jogadores da Académica — a fazer lembrar o Benfica-Porto, em que foram 6 contra 1. Para quem não viu o jogo, o FC Porto deve ter dado um festival de pancadaria em Coimbra. Mas, não, parece que, apesar do maior tempo de posse de bola, mais remates, mais cantos, etc, etc, passou foi o jogo a queimar tempo: nada menos do que quatro jogadores portistas viram o amarelo por causa disso. A coisa fica ainda mais curiosa quando se realiza depois que cinco deles ficaram na fronteira da suspensão após terem visto um amarelo neste jogo. Entre eles, Quaresma e Bruno Alves (este com um cartão verdadeiramente anedótico, mas potencialmente importantíssimo, quando se sabe que Pepe está de fora...). Coincidência? Sem dúvida. Como é coincidência o 5º amarelo que Simão nunca mais viu ou a virada no campeonato proporcionada pelas duas derrotas consecutivas do FC Porto após a expulsão e consequente suspensão do Quaresma, em Leiria.

3- Nunca fui defensor da máxima comunista a trabalho igual, salário igual. Pelo contrário, sempre defendi que não há trabalhos iguais. Há quem trabalhe e quem se limite a estar no emprego; há quem seja bom e quem seja medíocre; há quem seja excelente e quem seja absolutamente excepcional. Cada um deve ganhar conforme o valor do seu trabalho e do seu talento. Mas, entendo que há, todavia, um limite. Um limite de pudor, em termos sociais, que é difícil de justificar, quando ultrapassado. Também acho que Ronaldo é um génio do futebol e provavelmente o melhor jogador do mundo, actualmente. Não ignoro que vê-lo jogar é um prazer planetário, ao alcance gratuito de milhões de pessoas: ele distribui alegria e prazer pelo planeta e isso paga-se. Mas quando penso que uma equipa de três investigadores americanos acaba de descobrir que, bloqueando 57 células do corpo humano, se consegue que os tratamentos de quimioterapia para o cancro sejam mil vezes mais eficazes, podendo assim aliviar mil vezes o sofrimento dos doentes, fico chocado quando comparo o que eles fazem e o que ganham com o que faz e o que ganha Cristiano Ronaldo. Com o seu talento natural e o seu empenho físico, Cristiano pode distrair momentaneamente da dor e da doença milhões de seres humanos; eles, com o resultado de anos a fio de estudo e de investigação solitária, podem curar da doença ou retirar a dor a milhões de seres humanos. Eles ganham mil contos por mês; ele vai ganhar 44 000 por dia, livre de impostos, mais outro tanto em publicidade. Não gostava de estar no lugar do Cristiano Ronaldo e digo-o com sinceridade: acho que a responsabilidade moral de ganhar essas quantias indecorosas apenas por ter nascido com talento para chutar a bola, não me iria deixar gozar o dinheiro em paz.

Anjos e vândalos ( 10 Abril 2007)

Olhem só que futuro radioso: como não se quer ou não se tenta pôr as claques na ordem, propõe-se que no futuro se joguem os Benfica – FC Porto só com benfiquistas no estádio, os FC Porto – Sporting só com portistas e os Sporting – Benfica só com sportinguistas!

1 – A Policia Judiciária e os SIS confirmaram, esta semana, saber que por detrás das ameaças anónimas, via Internet, aos elementos do Gato Fedorento, está a extrema-direita extraparlamentar, ligada às claques de futebol. Esses militantes fascistas e xénofobos estão sediados em Lisboa. A direcção do Partido Nacionalista, contra cujo cartaz afixado no Marquês, em Lisboa, reagiram os Gato Fedorento, está sediada em Lisboa. Não é preciso ser bruxo para concluir de que claques de futebol ou clubes será essa gente – e não são seguramente dos Super Dragões.

Esta semana também, as claques inglesas do Manchester United e do Tottenham deixaram em Roma e em Sevilha marcas da sua passagem e habitual vandalismo. O mesmo se passa um pouco por todo o lado, incluindo a Argentina, de que Jorge Valdano nos deixou aqui há dias um testemunho impressionante do poder que as claques adquiriram em Buenos Aires, ao ponto de já serem detentoras de passes de jogadores.

Hoje, as claques são o alforge dos movimentos racistas de extrema-direita, cliques criminosos que começam por vender bilhetes para os jogos e acabam a vender droga e a prestar serviços de segurança privada e vendettas pessoais, a contrato. Começaram por desempenhar a função útil de apoiar as equipas e manter a animação nos estádios. Hoje, na melhor hipótese, são um factor de perturbação nos estádios e um gerador de permanente instabilidade e insegurança, mobilizando forças pessoais que teriam tarefas bem mais utéis a desempenhar; e, na pior das hipóteses, são escolas de crime organizado.

Toda a gente sabe disso. Toda a gente de bom-senso já percebeu que livrar o futebol das claques é, a prazo, uma questão de sobrevivência do próprio espectáculo. E toda a gente sabe que isso só se consegue se todos os clubes se unirem para definir uma politica e regras comuns nesta matéria. Mas, se casa um entrar no campo do a minha claque é civilizada, a tua é de selvagens, não se chegará a lado nenhum – o que, aliás, serve à perfeição os interesses de alguns dirigentes que usam as claques como guarda pretoriana.

Isto vem a propósito de mais uma infeliz dissertação do presidente do Benfica, que parece ter descoberto agora que a claque Super Dragões é formada por «vândalos» - como se as suas fossem formadas por anjinhos. Talvez convenha, então, recordar-lhe que as claques reconhecidas e apoiadas no Benfica:

- foram as únicas, até hoje, a tornarem-se responsáveis pela morte de um adepto adversário no Jamor, numa final da Taça, contra o Sporting;

- foram as únicas que se envolveram em confrontos violentos entre si;

- foram responsáveis por um dos mais negros espisódios da história do desporto português quando num banal jogo de hóquei na Luz, invadiram o autocarro onde estava a equipa do FC Porto, à porta do estádio, e armados de tacos de basebol e de outros utensílios desataram a agredir toda a gente, deixando um dos atletas em coma com fractura de crânio e às portas da morte – episódio este que passou sem castigo, interno ou externo, tendo mesmo o então presidente do Benfica, o exemplar Vale e Azevedo, declarado arrogantemente que o seu clube não pedia desculpas.

- que no tempo desse moderno Vale e Azevedo, o tão democrático Benfica fazia assembleias gerais onde quem estava contra era intimidade e ameaçado fisicamente por membros das claques ao serviço da direcção. Isto só para recordar porque parece que, neste país, a memória nasce sempre de véspera.

2 – Discute-se de quem foi a responsabilidade dos incidentes durante o recente Benfica – FC Porto. Pois é evidente que, primeiro que todos, a responsabilidade cabe a quem os causou – os elementos dos Super Dragões. Escamotear isto é estar de má fé à partida.

Mas também é evidente que as falhas de segurança, que tornaram prováveis e possíveis acidentes, devem-se ao Benfica e à PSP. Por mais que Luís Filipe Vieira, na sua habitual pose de quero, posso e mando, sou presidente do Benfica!, venha chamar de mentirosa à comissária da PSP, toda a gente percebeu que a responsabilidade da policia foi unicamente a de se ter curvado aos ditames do Benfica, em lugar de ter imposto o esquema de segurança que achava mais adequado.

Salta à vista que os elementos da claque portista nunca deveriam ter ficado no alto do estádio, por cima dos benfiquistas. Nem por cima, nem por baixo. Luís Filipe Vieira deveria meditar na razão pela qual desde que o foi inaugurado o Estádio do Dragão, nunca houve lá um incidente com adeptos adversários – e já por lá passaram alguns dos mais problemáticos da Europa. A razão é simples: porque em todos os jogos lhes está sempre reservado o mesmo sector, que representa um corte de alto a baixo na bancada, fácil de controlar pela segurança. Ao contrário do que sucede com os portistas na Luz, no Dragão as claques adversárias não são tratadas como gado, não têm de passar 4 mil por 3 torniquetes, não são forçados a entrar com 30/40 minutos de atraso (depois de terem pago 70 euros por um bilhete!) e são colocados onde não possam incomodar nem ser incomodados.

Tentar definir em conjunto regras de segurança adequadas, reciprocidade de tratamento, medidas de controle ou de banimento das claques – que interessam ou deveriam interessar a todos – é tarefa que deveria ocupar o presidente do maior clube portiguês. É lastimável que, em vez disso, ele prefira insultar a policia e os elementos da claque adversária, como se os seus fossem uns anjinhos; que proclame que quem manda é ele e que ameace não deixar entrar mais adeptos adversários na Luz, com o argumento notável de que se só houver benfiquistas no estádio, não haverá problemas. E o que diria ele se os benfiquistas fossem também banidos de todos os outros estádios do país?

Olhem só que futuro radioso: como não se quer ou não se tenta pôr as claques na ordem, propõe-se que no futuro se joguem os Benfica – FC Porto só com benfiquistas no estádio, os FC Porto – Sporting só com portistas e os Sporting – Benfica só com sportinguistas!

Por este caminho, chegará o dia em que as pessoas normais, os que gostam de ir ao estádio ver o futebol e não para insultar, atirar cadeiras, despejar a raiva e as frustrações de falhanços de que o futebol não tem culpa alguma, vão ter de virar-se para os dirigente e perguntar-lhes: “importam-se que nós deixemos de ir ao futebol ou tanto lhes faz?”

3 – Sexta-feira, Jorge Nuno Pinto da Costa vai anunciar que se recandidata para mais 3 anos à frente do FC Porto, disposto a cumprir assim 28 anos consecutivos de presidência. Por razões de ordem interna e não externa, por razões que nada têm que ver com o apito dourado mas, sim, com Renterias e Mareques, e por razões que oportunamente exporei, voto contra. E acho que, por maior que seja o reconhecimento e a gratidão, 25 anos chegam. No futebol e em tudo o resto.