Já imaginaram um autocarro de adeptos do Benfica ser impedido pela polícia de passar além de Vila Nova de Gaia?
1- Jesualdo Ferreira tem reagido mal às poucas críticas de que é alvo em voz alta. Passei a semana a ouvir recados sobre as injustiças das minhas críticas, que afinal se têm resumido a duas coisas: a deficiente condição fisica de que a equipa dá mostras desde a pausa natalícia, e o facto de Jesualdo Ferreira preferir meter o Anderson só nas segundas partes dos jogos, quando já tudo está resolvido. Escrevi que, se ele não tem ainda condição física para um jogo inteiro, fazia mais sentido metê-lo de início do que no final, porque ele faz parte do restrito número dos que são capazes de resolver os jogos, enquanto eles estão por resolver.
Contra o Nacional, viu-se como Anderson continua a ser um desequilibrador decisivo e como, enquanto teve forças, foi ele quem resolveu o jogo. E viu-se também que, não só Anderson, mas mais três ou quatro jogadores acabaram o jogo a arrastar-se no campo (Lucho desde os 20 minutos…). Mas não é isso que transformou em justas as minhas críticas. As críticas, desde que sérias e isentas, podem estar certas ou erradas, mas jamais poderão ser injustas pelo simples facto de existirem. Ninguém é perfeito e ninguém está acima da crítica. É evidente que Jesualdo estava errado em relação ao timing da utilização de Anderson e é evidente que o FC Porto é, de há meses para cá, das equipas com pior condição fisica do campeonato. Dizer isso é apenas constar um facto, não é ser injusto.
Aliás, e para que fique claro, eu devo dizer, se ainda não se percebeu, que tenho gostado do trabalho de Jesualdo Ferreira à frente do FC Porto. Mais (e estas coisas devem ser ditas antes e não depois): mesmo que o campeonato se perca na recta final, eu defendo a continuidade de Jesualdo Ferreira à frente do FC Porto. Defendo que ele deve ter a oportunidade que não teve este ano de escolher a equipa e fazer a pré-época. Acho que não lhe podem ser cobrados os dois desaires mais marcantes da época: a eliminação às mãos do Chelsea, mais do que previsível e precipitada pela ausência de Anderson e o frango de Helton, e a escandalosa eliminação na Taça, contra o Atlético, inteiramente da responsabilidade dos jogadores que estiveram em campo. Jesualdo conseguiu ultrapassar a fase de grupos da Champions e fez uma primeira volta do campeonato simplesmente notável. As longas férias de Natal desfizeram a coesão da equipa e estranhamente, por razões que talvez ele queira explicar um dia, trouxeram de volta uma equipa a quem o público tem de levar ao colo — como sucedeu este sábado no Dragão — para que ela se tente aguentar em jogo os 90 minutos.
Para Paços de Ferreira, Jesualdo vai ter finalmente quase toda a equipa livre de castigos e lesões. É o penúltimo passo para o título e agora acredito firmemente que não o vai falhar. Isso é que não seria justo.
2- Pela quinta vez consecutiva, um adversário do Sporting entregou-lhe o jogo mal soou o apito inicial. Parece que têm pressa em perder, o que, obviamente, facilita e de que maneira os triunfos leoninos: mal começam os jogos, a equipa fica aliviada de pressão, sem ter de correr contra o tempo nem contra a sorte. No Dragão, o FC Porto chegou ao intervalo empatado a zero, depois de ter falhado uns seis ou sete golos e de ter marcado dois que não valeram — um dos quais, ninguém sabe porquê. Em Alvalade, com um minuto de jogo, canto e autogolo. Faz uma diferença, uma grande diferença.
Em última análise, a coisa até é injusta para o próprio Sporting, que assim vê de alguma forma diminuido o mérito das vitórias alcançadas. E a verdade é que o Sporting fez contra o Vitória uma primeira parte esplendorosa, apenas minimizada pela fraqueza da oposição encontrada. Da mesma maneira que o facto de a defesa do Vitória ter deixado suicidariamente Liedson à solta por duas vezes, não pode apagar mais uma demonstração da classe deste ponta-de-lança — o melhor do nosso campeonato e agora sem rival, desde que McCarthy rumou para Inglaterra, onde passeia a sua classe e golos.
3- Carmona Rodrigues vive os últimos dias na presidência da Câmara de Lisboa, de onde foi publicamente despedido pelo partido que o fez eleger e quando se tornou penosamente evidente que Lisboa já nem sequer estava a ser governada. Parece, todavia, que não se quer ir embora sem aprovar a favor do Sporting um controverso projecto de urbanização que é tudo menos transparente. Mandaria o bom senso que deixasse o assunto para quem se lhe seguir. E mandaria o decoro que, três dias antes de forçar a votação do projecto, não estivesse em Alvalade, sentado ao lado do presidente do Sporting, a assistir ao jogo. Mesmo Carmona Rodrigues, que todos têm como um homem sério, não está ao abrigo da cominação da mulher de César…
4- Em minha opinião, o Vitória de Setúbal é a pior equipa do campeonato e a sua descida aos infernos da Honra é absolutamente natural e justificada. Passa-se com o Vitória a mesma coisa que se passa com a própria cidade de Setúbal. Há 20 anos atrás, Setúbal tinha todas as condições para se transformar numa cidade modelo, em termos de urbanismo e qualidade de vida: dimensão adequada, espaço para se desenvolver harmoniosamente fora do centro, possibilidade fácil de recuperar o centro histórico e ligá-lo ao rio, condições naturais excepcionais, com o estuário do Sado aos pés, o mar em frente, a montanha ao lado, praias magníficas, frente de rio única, avenidas largas, praças suficientes, enfim, tudo ou quase tudo.
Mas vieram os Mata Cáceres e outros artistas do poder local e transformaram Setúbal numa coisa caótica e aberrante, com urbanizações dignas de subúrbio africano, esculturas pseudomodernas horrendas, o triunfo do pato-bravismo, do mau gosto e da gestão sem planeamento nem ideias.
Também o futebol do Vitória chegou a encantar Portugal e a surpreender a Europa. Mas depois, as forças vivas da cidade, ou seja, os mesmos artistas que destruiram a beleza de Setúbal, tomaram conta do clube e demonstraram que eram tão bons a dirigi-lo como a fazer a cidade. Hoje a cidade é uma dor de alma e o clube um cadáver adiado. Que ninguém fale em injustiça.
5- Aconteceu já há uns quinze dias e eu esperei para ver se alguém se indignava publicamente com o assunto. Esperei em vão. E, todavia, foi das coisas mais graves que sucederam ultimamente no desporto português. Depois de o presidente do Benfica, a propósito dos incidentes no Benfica-Porto, ter declarado que, de futuro, o clube se reservava no direito de interditar a presença de adeptos do adversário no Estádio da Luz, depois de o inquérito do MAI ter concluído que os incidentes eram da responsabilidade do Benfica e da PSP, um autocarro com adeptos do FC Porto que vinham assistir ao Benfica-Porto em hóquei em patins, foi interceptado pela polícia em Alverca e impedido de entrar em Lisboa. Apesar de a bordo viajarem inclusivamente adeptos com bilhete já comprado para o jogo.
Concluo assim que a PSP está ao serviço do presidente do Benfica e faz cumprir os seus desejos ou ordens, mesmo quando isso implica vedar o acesso a espectáculos abertos ao público por lei, ou, pior ainda, quando isso implica que cidadãos portugueses sejam impedidos de entrar numa cidade do País. Nem na Idade Média os nobres se permitiam controlar assim o direito de entrada nas suas terras! Já imaginaram um autocarro de adeptos do Benfica ser impedido pela polícia de passar além de Vila Nova de Gaia?
Ah, mas Deus, se existe, não dorme: mesmo assim, o Benfica perdeu o jogo e o campeonato…
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