quinta-feira, julho 14, 2011

UM FUTEBOLZINHO (21 SETEMBRO 2010)

1- Vi um par de horas de grande futebol esta semana: a primeira parte do jogo do Barcelona na liga dos Campeões, com mais um festival desse deus do futebol que é Lionel Messi; a exuberante humilhação a que o Arsenal submeteu o Sp. Braga; e a primeira parte do Chelsea-Blackpool, em que essa máquina arrasadora de bom futebol e golos montada por Carlo Ancelotti mais uma vez deu festival e deve ter deixado José Mourinho com alguma azia retroactiva.


2- Depois, vi futebol nosso e a diferença foi esmagadora. Não apenas a diferença de qualidade — o que até se compreende, porque quem tem mais dinheiro tem melhores jogadores— mas a diferença de atitude, de respeito pelo espectáculo. O Sp. Braga, por exemplo, tentou consolo para o massacre de Londres com uma vitória, que não conseguiu, em Paços de Ferreira: campo com as dimensões mínimas (que insisto que deviam ser proibidos, se queremos evoluir alguma coisa), relva irregular, jogo sem espaços, a proporcionar choques, faltas constantes, ressaltos de bola; um espectáculo feio, que só prende pelo resultado. Não admira que, estreando-se no grande palco da Champions, e logo contra o Arsenal, o Sp. Braga, que aqui faz figura de quase grande, lá tenha feito figura de companhia de circo amadora.

3- Para quem ainda pudesse alimentar ilusões sobre a capacidade do Sp. Braga sobreviver, as primeiras imagens dos jogadores, ainda no túnel, dissipavam-nas por completo: enquanto os jogadores do Arsenal pareciam serenos e contentes por irem jogar, os do Sp. Braga só pareciam suplicar que o jogo passasse depressa. Cabisbaixos, sem falarem entre si, sem olharem as câmaras, envergonhados antes de tempo, eles entraram em campo a rezar entre dentes e a benzerem-se, como se se preparassem para um ataque de um navio pirata. Aos 2 minutos, já poderiam estar a perder, se o árbitro tivesse visto um penalty evidente, mas essa benesse só serviu para adiar o primeiro golo seis minutos mais. Depois, foi o que sabe e não adianta mais repisar: a descida à terra dos Guerreiros do Minho.

4- O grande derby de Lisboa teve um desfecho justo, num jogo sem qualidade, como é de tradição. O Benfica ganhou porque é realmente bom na velocidade e simplicidade de processos atacantes a partir de situações aparentemente mortas do jogo (as transições ofensivas, como é de bom tom dizer-se); porque Fábio Coentrão é um grande trunfo para várias funções; e porque Jorge Jesus superou facilmente qualquer plano estratégico que Paulo Sérgio pudesse ter para o jogo — e de cujo nunca me apercebi.

O Sporting perdeu por uma razão muito simples: porque não joga nada. Porque, e de há anos para cá, não tem nenhuma opção de jogoque não seja a do Liedson resolve. A defesa é totalmente inepta e amedrontada, mais parecendo um grupo de amigos que se juntou para jogar pela primeira vez; no meio-campo, só Maniche sabe vagamente o que anda a fazer; e, na frente, se não é Liedson, não é ninguém mais. Todas essas tretas do losango assim e assado servem apenas para disfarçar uma realidade que salta à vista: ali, não há qualquer ideia de jogo e não há, definitivamente, cultura de vitória. Ir à Luz para fazer o primeiro remate à baliza (onde mora um guarda-redes que não é propriamente fantástico) aos 55 minutos, diz tudo sobre as ambições e potencialidades da equipa. É verdade que, nesse minuto e nesse primeiro remate, liedson poderia ter marcado, mas, sinceramente, acho que com isso o Sporting se contentaria.

Escrevo muito pouco sobre o Sporting porque acho que o Sporting, como dizem os ingleses, is no match. Não vejo como, num futuro próximo, o Sporting há-de conseguir chegar ao título outra vez. Só se, de repente, saírem dois Cristianos Ronaldos ao mesmo tempo de Alcochete e a SAD os consiga manter em Alvalade, ao menos uns dois anos.

5- Um estudo anglo-brasileiro, datado de 2003 e revelado na edição de sábado deste jornal, confirma uma vez mais, aquilo que a percepção comum de há muito já sabia: que o Sporting é, hoje, o terceiro, e não mais o segundo clube português, sob qualquer critério analisado: número de sócios, de espectadores no seu estádio, de adeptos, ou historial de títulos, nacionais e internacionais, conquistados.
O estudo também confirma que a lenda dos seis milhões de adeptos benfiquistas é apenas isso: uma lenda. Vão longe os tempos em que se proclamava que o Benfica tinha seis milhões, o Sporting três e o milhão que sobrava era para dividir entre os adeptos portistas e os de todos os outros emblemas. Vão longe os tempos em que eu dizia que ser portista em Lisboa era como ser muçulmano na Bósnia: hoje, em todo o lado onde vou, em Lisboa e no Sul do País, encontro adeptos do FC Porto em cada esquina, mesmo nas mais imprevistas. Felizmente, e graças ao seus êxitos além- fronteiras, Pinto da Costa falhou o seu projecto inicial, que eu tanto critiquei, de reduzir o FC Porto à dimensão de um clube regional. Esse estudo (e são estudos destes, não declarações propagandísticas para consumo de ignorantes, que servem para os patrocinadores saber quanto vale cada marca de clube), diz-nos que o Sporting tem 2,1 milhões de adeptos, o FC Porto 2,6 milhões e o Benflca 4,l milhões. Repito que o estudo é feito por brasileiros e ingleses, a fonte é insuspeita (este jornal), e a data é 2003. É de presumir, como escreveu A BOLA, que, de então para cá e tendo o FC Porto juntado ao seu curriculum mais cinco títulos de campeão português, um de campeão europeu e outro de campeão mundial de clubes, a sua distância para o Sporting tenha aumentado e a distância para o Benfica se tenha reduzido. Porque os novos adeptos nascem com as novas gerações, que adoptam os vencedores, e essa regra de que filho de benfiquista, benfiquista há-de ser e filho de portista, portista tem de ser, já não é o que era (e eu que o diga, que tenho de conviver com um fanático benfiquista na minha descendência directa!). Eu, se fosse ao Joaquim Oliveira, não me deixaria intimidar, de cada vez que o Benfica ameaça com a ruptura, em nome da suposta força invencível que tem a marca Benfica e os seus seis milhões de supostos adeptos. O mundo move-se devagar. Mas move-se.

6- Acho que A BOLA deve aos seus leitores uma explicação. Explicar como é que aquele inolvidável comunicado dos órgãos sociais do SL Benfica, que se arriscou a matar de ridículo a Instituição no pretérito dia 14 do corrente, supostamente só seria aprovado na noite desse dia pelo plenário dos órgãos sociais do clube, já estava, nessa mesma manhã, publicado, ponto por ponto, na edição deste jornal. Que os ditos órgãos socais do SLB se vejam assim enganados por serem chamados a decidir uma coisa que já estava decidida de véspera, é lá com eles; mas que os leitores de A BOLA se vejam confrontados de manhã com a notícia de decisões que o SLB só irá tomar à noite, isso, realmente, requer uma explicação.

p.s.: Circunstâncias profissionais obrigam-me a apenas ver o Nacional-Porto em gravação, tarde de mais para a hora limite de entrega deste texto. Espero e confio na nona vitória consecutiva da época, mas não estou excepcionalmente optimista. Não gostei do FC Porto-Rapid, apesar do resultado, e, em minha modesta opinião, Villas Boas tarda em experimentar soluções para soluções desgastadas: o caso mais evidente, já o escrevi, é o de Fernando.

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