quarta-feira, setembro 30, 2009

ERROS VELHOS, MÁ FORTUNA (08 SETEMBRO 2009)

1- Ainda não foi desta que ficou esclarecido se estaremos ou não no Mundial do ano que vem, na África do Sul. Temos que continuar a fazer contas, esperar mais um jogo pelo menos, ter fé na aritmética e nos milagres. Enfim, o nosso fado habitual.

Mas, desta vez, ninguém pode dizer que não nos batemos pela vitória e contra o destino até ao último minuto e até ao último fôlego. Os 25 minutos finais, quer da primeira, quer da segunda parte, foram jogados ao nível exigível a quem quer estar num Mundial. A Dinamarca pode agradecer a todos os deuses ter conseguido uma vitória e um empate nos dois jogos contra Portugal, em que foi claramente dominada de ambas as vezes. Quando se remata 35 vezes à baliza, acertando catorze e apenas se marca um golo, enquanto que o adversário remata treze vezes e acerta uma que logo dá em golo, é legítimo queixar-se da sorte. Não a tivemos, de facto. Nem em Lisboa nem em Copenhaga. E que somos melhor equipa que a Dinamarca, não me parece terem ficado dúvidas a ninguém.

O problema é que os verdadeiros vencedores não podem estar dependentes da sorte ou das decisões dos árbitros. Podemos queixar-nos do penalty que Busacca não viu ou do azar das oportunidades perdidas. Podemos queixar-nos uma, duas vezes. Três já é demais: parece o Sporting. Os verdadeiros vencedores jogam contra a sorte e contra os árbitros, jogam o suficiente para se colocarem ao abrigo de factores aleatórios. E, quer em Lisboa, quer em Copenhaga, jogámos o suficiente para ficarmos fora do alcance dos factores aleatórios. Jogámos, sim: mas jogámos, como sempre, um futebol estéril.

Se ficarmos fora do Mundial não é porque não tenhamos equipa para lá estar. É porque a cultura do remate para golo não existe no nosso futebol. Somos óptimos a fintar, a simular, a fazer tabelinhas, a fazer circular a bola, a arrancar toques e números circenses que entusiasmam a plateia. Mas rematar à baliza para marcar golo, e não apenas por rematar, isso não sabemos fazer. Na hora de matar a jogada e o jogo, somos absolutamente indigentes, incompetentes. Eu, se fosse seleccionador, preocupava-me muito pouco com tácticas e estratégias e losangos e linhas de passe e tudo o resto: gastava quatro quintos de cada treino a ensaiar remates à baliza até os jogadores suplicarem misericórdia, mas aprenderem de olhos fechados a dimensão da baliza, a sua localização na hora do remate, a posição do corpo ao chutar, etc. - noções básicas e essenciais do jogo que qualquer profissional devia saber. A coisa mais banal de ver num jogo de futebol em Portugal é ser aceite com toda a normalidade (a começar pelos próprios jogadores) que 80 por cento dos remates à baliza não acertem no alvo - como se ele não tivesse 9,15 de comprimento por 2,30 de altura.

Também acho injusto crucificar Carlos Queiroz. Se os jogadores não acertam por sistema na baliza ou, quando acertam, é inofensivo, a culpa não é dele, pois o mal vem muito lá de trás e tem raízes e explicações mais complexas. E o resto é a falta de baraka que ele tem - sobretudo se pensarmos no seu antecessor, Scolari, que é o tipo com mais sorte ao jogo que eu alguma vez vi. Desta vez e quanto muito, podemos questionar porque razão o seleccionador, depois de ter jogado a cartada oportunista do Liedson, resolveu não o meter de início: eternamente ficaremos a pensar que com o Liedson no lugar do Simão, não teríamos desperdiçado aqueles dois golos fáceis que o Simão desperdiçou na primeira parte. Será que foi uma afirmação de autoridade cientifica, pelo facto de todos os jornalistas que acompanham a Selecção terem apostado que o Liedson jogava de início? Se foi, pagámos caro a vaidade. O António Oliveira tinha o hábito de fazer isso: mudava a linha de cada vez que a imprensa descobria os seus planos para o onze inicial. Foi assim que ele entrou para o Guinness, nunca repetindo o mesmo onze inicial do F.C.Porto em todas as quinze jornadas da primeira volta de um campeonato. Só que o Oliveira tinha um toque de génio que Queiroz não tem e que vi em raros treinadores: ele conseguia, de facto, transformar a equipa a partir do banco. E não esperava nem 70, nem 60, nem 45 minutos para o fazer: punha o onze errado de entrada só para não satisfazer os jornalistas, mas logo depois corrigia, assim que via que aquilo não estava a funcionar. «Quem sabe, faz a hora, não espera acontecer».

Enfim, venha a vitória em Budapeste e as que faltam, venha o encosto da Suécia em Copenhaga, venha o milagre de que precisamos. Se não é que este país cai mesmo na depressão!


2- O dr. Ricardo Costa, presidente do Conselho de Disciplina da Liga, escreveu dois extensos artigos no «Público» onde procurou demonstrar a lógica e a justiça da sua actuação e do órgão que dirige no chamado processo «Apito Dourado». Duas páginas inteiras de jornal é muito, é mais do que suficiente para, ou se demonstrar que se tem razão, ou para se fingir que tem. No primeiro caso, isso depende de se ter mesmo razão; no segundo, depende do talento literário. No caso do dr. Ricardo Costa, foi uma oportunidade perdida: porque não tem razão nem nunca teve e porque não tem talento literário algum.

O seu extensíssimo arrazoado, em estilo burocrático/narrativo, é um texto inextrincável para qualquer ser pensante, juristas incluídos. Duvido que alguém tenha conseguido lê-lo até ao fim e entender do que se tratava sem se perder algures. Eu esforcei-me e consegui ler até ao fim, mas já não consegui entender o que ele dizia, a páginas tantas.

Em substância, percebi que o dr. Ricardo Costa visava, obviamente, explicar o embaraço de ter condenado na justiça desportiva réus que a justiça comum declarou inocentes. E julga ultrapassar essa dificuldade explicando que ambas as jurisdições são independentes entre si. Sem dúvida que sim. Resta que ele - que confessa que todo o seu material de prova lhe foi fornecido pelo Ministério Público, em fase de averiguações - julgou e condenou, clubes e pessoas, com base em factos que os tribunais julgaram não provados. E com base num testemunho que o tribunal acusou de perjúrio. Bem pode até passar a assinar uma coluna semanal no «Público» que jamais ultrapassará isto: os factos em que ele se apoiou para condenar não existiram. O resto é conversa fiada.


3- O Jornal «I» perguntou a alguns ex-craques do futebol quem terá sido o melhor jogador de sempre: Pelé ou Maradona. As opiniões dividiram-se entre ambos, com excepção de Eusébio, que votou em Alfredo Di Stéfano. Entro na escolha para dar a minha opinião de «futebolista de bancada»: para mim, o melhor jogador que alguma vez vi jogar não foi nem Pelé, nem Maradona, nem Di Stéfano, nem o próprio Eusébio, que bem merece estar na short list. O melhor jogador que vi, o mais inteligente, o mais completo, o mais genial, foi um senhor chamado Johan Cruyff, que apareceu para o mundo numa célebre vitória do Ajax de Amesterdão no Estádio da Luz e que explodiu para a História no FC Barcelona.

quinta-feira, setembro 10, 2009

E SERÁ QUE O LIEDSON RESOLVE? (01 SETEMBRO 2009)

1- Estas coisas devem sempre ser ditas antes e não depois de conhecer os resultados: eu sou contra a chamada do Liedson à Selecção Nacional. Não por achar que ele não tem lá lugar (exactamente por achar que tem é que sou contra…), não por achar que ele não possa ser utilíssimo, não por discordar da integração dos imigrantes nos seus países de acolhimento. Mas há imigrantes e imigrantes, integrações e integrações. O Liedson trabalha em Portugal há seis anos, o que não quer dizer que esteja integrado em Portugal, como português, em tudo igual aos outros. Que eu saiba, fala português sem sotaque algum daqui; quando não está a jogar, está no Brasil; quando deixar de jogar, volta para o Brasil; presumo que ignore tudo ou quase tudo sobre a nossa História, a nossa cultura, o nosso regime político-administrativo e que seja mais um - o terceiro - que, no sábado que vem, em Copenhaga, não saberá de cor o hino.

O Liedson não é um português como os outros e não apenas por manter a nacionalidade de origem: é porque construiu o seu nome profissional enquanto brasileiro e não enquanto português, e se o Estado português agora o vai aproveitar ao serviço da Selecção Nacional de futebol, é apenas por razões de oportunidade e conveniência. Acho tão deslocado o Liedson virar português de ocasião porque a selecção do Brasil o não quis e a de Portugal o quer, como a Maria João Pires virar brasileira porque se chateou com o Estado português. Não é bem igual ao caso do Obikwelu, que imigrou para cá para trabalhar nas obras e aqui se começou a fazer atleta de alta competição, depois se naturalizando (e, aliás, ao contrario de Liedson, perdendo a sua nacionalidade de origem).

Mas o pior deste caso, na minha perspectiva, é as circunstâncias em que Liedson é chamado à Selecção, poucos dias após ter concluído o seu processo de aquisição de dupla nacionalidade. Com 32 anos de idade, não é um jogador de futuro para a Selecção. Pelo contrário, é um reforço de ocasião, para acudir a um estado de necessidade. A sua utilização não foi sequer pensada nem integrada numa politica, jamais definida ou sequer discutida pela Federação e pela sociedade, de saber quais e quantos estrangeiros de origem podem representar o futebol português ao seu mais alto nível. Em que condições, com que critérios e consequências. Não, o Liedson foi chamado porque Queiroz está em estado de necessidade - melhor dizendo, em estado de desespero, na iminência de falhar a qualificação para a África do Sul.

E agora, das duas uma: ou Liedson se vem a revelar decisivo para inverter o fado da Selecção e levar-nos a África no ano que vem, ou nem ele chega para, desta vez, resolver o problema que outros criaram. No primeiro caso, calar-se-ão todas as vozes criticas; no segundo caso, todos cairão em cima de Madail e de Queiroz - se não mesmo do próprio Liedson.

É por isso que acho importante que as opiniões criticas se manifestem agora, antes de conhecer o desfecho desta jogada de última hora. Eu sou contra, como disse, e acho que o assunto dos naturalizados ao serviço da Selecção deve ser discutido a sério e de uma vez por todas, e não ser apreciado casuisticamente, ao sabor das necessidades e conveniências de cada momento (acho, por exemplo, absolutamente indecoroso que se discutam nomes conforme as necessidades de preenchimento de determinados lugares no onze nacional).

Sou contra a chamada de Liedson e apesar da imensa admiração que tenho por ele enquanto jogador, como também - e antes de consumado o desfecho - me manifestei aqui contra a escolha de Carlos Queiroz para seleccionador. E por uma única razão: porque só lhe conheço um curriculum de perdedor, na Selecção inclusive. Mas como a escolha de Queiroz reuniu quase a unanimidade da critica e da rua, nunca mais falei do assunto e fiquei tranquilamente a assistir ao resultado. Devo, todavia, dizer que, ao contrário de Scolari, Queiroz teve muito pouco tempo, sorte e circunstâncias favoráveis para conseguir triunfar (embora tantos dos que ontem exigiam aos gritos a sua nomeação imperiosa, logo lhe tenham caído em cima, sem piedade alguma…). Mas, infelizmente, não espero que a história acabe bem. Queira Deus que me engane, mas esta cartada do Liedson (mesmo levando em conta a lesão do Hugo Almeida, a retirada do Pauleta, etc.) aparece-﷓me como uma jogada de alguém que está desesperado e não vê alternativa. E o desespero raramente dá bons resultados.


2- Foi um episódio verdadeiramente exemplar para mostrar como se constroem «verdades» no mundo do nosso futebol, quando essas «verdades» servem para atacar o F.C.Porto e o seu presidente. Aos gritos, os jornais, rádios e televisões do País saíram a espalhar o alarido de que o presidente do F.C.Porto tinha tentado atropelar um jornalista à saída do Tribunal do Porto, não se detendo sequer perante as ordens da polícia e deixando o atropelado ferido no chão até ser transportado ao hospital. Até o sério jornal «Público» serviu essa versão sem hesitar e o Sindicato dos Jornalistas pôs cá fora o habitual comunicado sobre a intimidação dos jornalistas e os «nossos» estimados benfiquistas versão-Barbas - a Leonor Pinhão e o Ricardo Araújo Pereira - obviamente não perderam a oportunidade para desenterrarem a lenda do facínora do Pinto da Costa - e assim, por um tempo, desviando as atenções das «acções cívicas» dos No Name Boys e das suas privilegiadas relações com o presidente do Benfica. Eis as minha perguntas idiotas, mas que não vi respondidas em lado algum:

- porque é que quem ia ao volante era o motorista, mas quem quis atropelar foi Pinto da Costa?

- Será que ele - tal como no inesquecível filme de Leonor Pinhão/João Botelho, baseado no testemunho de Carolina Salgado -, costuma dar ordens ao motorista para atropelar gente de que não gosta, de quando em vez?

- E, sendo isso verosímil, porque carga d'água resolveria o presidente do F.C.Porto atropelar um fotógrafo do JN - que não escreve sobre ele e nunca lhe fez mal algum, que se saiba?

- E ia atropelá-lo diante de todas essas testemunhas - jornalistas, polícias, etc.?

- Se queria mesmo atropelá-lo, porque não o apanhou de frente, mas apenas com o espelho retrovisor lateral?

- Se a polícia o mandou parar, porque diz a polícia que não? (Está comprada, claro?)

- Porque não nos disseram ainda quais os graves ferimentos sofridos pela vítima do atropelamento deliberado?

- Já agora, senhores juízes populares: qual era o móbil do crime?

Se alguém quiser esclarecer-me, eu agradeço.


3- Há muitos, muitos anos, que não me lembro de ver uma equipa tão fraca a jogar na primeira divisão como aquela que ontem à noite apareceu equipada de Vitória de Setúbal no Estádio da Luz. Conta-se que o treinador Carlos Azenha andou até ao ultimo dia de inscrições (ontem, exactamente) a fazer «castings» de jogadores que por lá apareciam, até formar uma «equipa». Eis como vai o futebol profissional em Portugal. Será que é este Vitória que vamos ver o campeonato todo, ou foi só uma noite para amostra?