terça-feira, junho 25, 2013

PASSADEIRA VERMELHA (09 ABRIL 2013)

1- Em termos ofensivos, há dois tipos de jogadores: os que desequilibram e os que engasgam. Os segundos não correm riscos, mas também não abrem defesas fechadas; os primeiros perdem várias bolas, mas resolvem jogos. É próprio dos treinadores fracos preferirem os segundos. Vítor Pereira é um desses treinadores: prefere um Varela, um Defour ou um Lucho a arrastar-se, pois eles dão-lhe aquele futebol mastigado, ruminante, (circulado, como gosta de dizer), que ele confunde com superioridade táctica. Ontem, contra o Braga, mais uma vez se repetiu a história: sem Varela ao dispor, voltou a insistir num quarteto a meio-campo, incluindo Lucho e Defour, e foi só na iminência do desastre que acabou por se decidir a meter Atsu e Kelvin. Ganhou, mas só então convenceu. E é certo e sabido que, na próxima oportunidade, regressam Varela ou Defour, ou ambos. E é por isso que eu acho que a época já está decidida e perdida.

Em Olhão, o Benfica ganhou quando quis, como quis e por quantos quis. Mais uma vez ficou à vista a tremenda diferença de capacidade entre Benfica e Porto, por um lado, e todos os restantes 14 clubes, por outro: mesmo em relvados sem dimensão e sem a qualidade mínima aceitável para jogos de uma primeira liga, mesmo gerindo o cansaço de jogar em várias frentes simultaneamente, enquanto os outros descansam uma semana inteira, o Benfica e o Porto (agora em menos frentes) passeiam-se a seu bel prazer neste campeonato — que, para acrescentar ainda mais à sua patética competitividade, se prepara para satisfazer os sonhos do actual presidente da Liga e dos que o apoiam e alargar-se para mais dois clubes e dois quintais.

Felizmente e graças à intervenção de um amigo, que cobriu a incapacidade do seu presidente, evitou-se o mal maior e chocante que teria sido a falta de comparência do Olhanense ao jogo com o Benfica. Os habituais adeptos da conspiração e que vêem a mão de Pinto da Costa em tudo o que contrarie os desígnios benfiquistas (até mesmo numa tempestade que se abate sobre Setúbal e faz adiar o jogo do FC Porto) não deixaram de ver aqui também a mão de Pinto da Costa: o amigo que pagou o dinheiro para que os jogadores do Olhanense fossem a jogo seria ele. E que fosse, pergunto eu? Onde está o grande escândalo? O escândalo, do meu ponto de vista, é que o Benfica estivesse à espera de ganhar em Olhão sem ter de jogar. Escândalo seria uma vitória de secretaria num momento decisivo do campeonato, perante a indiferença da Liga. Se o amigo era, de facto, ligado ao FC Porto, então a Liga bem pode agradecer-lhe ter evitado a barracada e os benfiquistas bem podem agradecer-lhe a possibilidade de terem ganho em campo e não na secretaria, o que é mais bonito e mais sério. Até porque, como se viu, o jogo era de risco nulo. E, agora, atenção benfiquistas, porque vou dizer uma coisa que, em circunstâncias inversas, vocês nunca viram nem verão dito por um benfiquista: eu acho que o campeonato já está entregue ao Benfica e, em minha opinião, com todo o mérito e toda a justiça. Claro que eu podia questionar aqueles dois jogos, quase consecutivos, no período recente em que Benfica e Porto seguiam par-a-par, e que terminaram ambos com a vitória encarnada por 1-0 resultante de penalties mais do que duvidosos - em especial, o penalty que deu a vitória contra a Académica, aos 96 minutos. Esses quatro pontos foram decisivos e evitaram que o Porto descolasse numa altura crucial do campeonato. Mas também foram decisivos os quatro pontos que o FC Porto desperdiçou em dois penalties falhados por Jackson Martinez — pelo que até se poderia dizer que o campeonato ficou decidido pela capacidade de converter penalties. Mas o penalty é, cada vez mais, um lance corrente dos jogos: treina-se e tem regras técnicas que, se bem executadas, o tornam quase sempre indefensável; e, no limite, cabe a um treinador perceber quem são os seus jogadores que têm competência técnica para tal. Quando um jogador falha um penalty por evidente falta de capacidade técnica, a seguir falha segundo de forma idêntica, e o treinador ainda insiste nele para falhar terceiro, a culpa já não é do jogador até porque há excelentes jogadores que não cobram penalties.

Mas seria de todo injusto resumir a razão do mais que provável título do Benfica a uma questão de penalties. Até porque, como todos constatam, vivemos esta época num anormal clima de paz em relação às arbitragens, no que diz respeito à disputa do título. Nem Benfica nem FC Porto andaram em cruzadas ao melhor estilo sportinguista contra os árbitros, nem os seus presidentes e dirigentes andaram a fomentar ódios e incêndios. Dirão que ambos estão de parabéns por isso, mas não é verdade: quem está de parabéns é o FC Porto e a sua gente. Porque, se fosse ao contrário, se se tivesse começado a perceber, aí por alturas da 20ª jornada, que era o FC Porto que marchava tranquilamente para o título, o clima seria diferente. Pois que, como disse, salvo erro, Artur Jorge, ano em que o Benfica vai à frente é ano em que, subitamente, a arbitragem vive num mar de rosas. Ou seja: o FC Porto sabe perder, o Benfica não.

E, porque isto é mesmo verdade, quero reafirmar que acho que o Benfica foi claramente a melhor equipa desta época: a mais versátil, a mais imaginativa, a mais ofensiva, a de futebol mais atraente e eficaz, simultaneamente. Jorge Jesus fez uma gestão perfeita dos jogadores ao seu dispor, conseguindo que eles entrassem e saíssem da equipa sem se notar as alterações no futebol exibido. Ao contrário de Vítor Pereira que, avesso a qualquer novidade ou risco, apostou de princípio a fim num núcleo duro, por mais desgastados ou desinspirados que alguns dos seus componentes estivessem, Jesus conseguiu, de facto, ter uma equipa formada por 20 jogadores — e, por isso, não só vai à frente, como está excelentemente colocado para conseguir o triplete que Villas Boas conseguiu há dois anos: campeonato, taça, Liga Europa. E isso é tanto mais notável quanto o Benfica não tem, em minha opinião, melhor equipa que o FC Porto — e viu-se isso no jogo da Luz, o único em que o Benfica abanou de alto a baixo entre-portas. Mas Jorge Jesus não apenas soube rodar muito melhor o espólio que tinha, soube adaptar muito melhor jogadores a novas posições e funções, como também, dando-se conta da imensa superioridade interna face aos outros 14 adversários, introduziu um estilo de jogo de cavalgada para a vitória, que contrasta, de forma gritante com o estilo de jogo adoptado por Vítor Pereira: posse, posse e mais posse, até que o golo apareça.

Diz-se que no futebol tudo pode acontecer — o que não é bem verdade. Mas pode acontecer que, contra toda a lógica e todas as minhas expectativas» o Benfica perca na Luz com o Sporting e no Dragão e que o FC Porto leve tudo de arrasto até final, recorrendo àquele quid de vitória e de coragem que hoje está adormecido, mas que eu sei que ainda lá mora. Pode ser que sim. Mas, não só não acho nada provável, como também não sei se acharia justo (o que para o caso, confesso, pouco me incomodaria, se a reviravolta fosse sem espinhas).

DE OLHO NO OLHANENSE (02 ABRIL 2013)

1- Confesso a minha ignorância: até ele ter aparecido como candidato vencedor à presidência da Liga de Clubes, nunca tinha ouvido falar de Mário Figueiredo. Desconhecia, e continuo a desconhecer, que passado, que qualificações e que competências tinha ele acumulado no futebol para aspirar a representar os interesses dos clubes profissionais. Mas a sua entrada de chico esperto não dava muito que enganar. O senhor nao tinha, que eu tivesse reparado, projecto ou ideia alguma que não a de conquistar aquele pequeno grande poder para si mesmo. E fê-lo, claro, da pior maneira disponível: com a promessa de proceder a um alargamento da primeira Liga e a lançar uma batalha contra a Olivedesportos (uma guerra sempre muito popular) para obter uma redistribuição dos direitos televisivos, em favor dos pobres clubes pequenos. Sabendo que na Liga cada clube vale um voto e a maioria está sempre carente de promessas e oportunidades que os façam sonhar alto e dispensar penosas subidas até ao topo, a eleição tornou-se-lhe fácil. Felizmente, a tentativa de alargamento da primeira Liga foi sumariamente chumbada pela Federação — coisa que não incomodou por aí além o novo presidente da Liga, assegurado que estava o seu verdadeiro objectivo, que era o de se fazer eleger.

Mas o episódio marcou o início de uma relação necessariamente conflituosa entre a Liga e a Federação e que, nos últimos dias, tem proporcionado ao sr. Mário Figueiredo várias oportunidades de bem demonstrar a sua vacuidade e uma arrogância que não se funda em qualquer competência reconhecida como tal. E, enquanto ele se distrai em episódios de um conflito que não diz nada a quem se interessa por futebol, a seus olhos desenrola-se um verdadeiro episódio de gravidade potencialmente extrema e que não lhe mereceu ainda uma palavra que fosse. Refiro-me à situação do Olhanense, um entre tantos outros pequenos clubes que, por mais respeito que se lhes tenha, apenas confirmam que a primeira Liga não devia ser para qualquer um e que as teses do alargamento são propostas incendiárias de quem se está nas tintas para a qualidade dos espectáculo e a seriedade da competição. Se o Olhanense, como alguns outros, está há quatro ou cinco meses sem pagar salários aos seus jogadores, isso significa simplesmente que não tinha e nunca teve condições para se sustentar numa liga profissional, muito menos a primeira. E significa também que quem tinha a responsabilidade de o certificar, que era a Liga de Clubes, fez vista grossa aos sinais que lá estavam — provavelmente, porque o Olhanense foi um dos eleitores do sr. Mário Figueiredo. Ou, dito de forma simples: é uma vergonha para a Liga que haja clubes na situação do Olhanense. E o que menos releva é a desculpa do seu presidente de que se arruinou nas obras do Estádio José Arcanjo pois que, apesar de ter a quinze quilómetros de distância, um dos magníficos estádios do Euro-2004 às moscas e à disposição, preferiu antes gastar dinheiro num estádio velho e bem pior, mesmo à custa dos salários dos seus profissionais. Para quem, como a Liga, tem a responsabilidade de assegurar que os clubes têm condições de sustentabilidade, que não exploram os seus atletas e garantem a seriedade da competição, as desculpas dos clubes são irrelevantes. O que é relevante é que jogadores que passam fome estão obviamente à mercê de tentativas obscuras daquilo que sabemos. O que é relevante é saber que, se os jogadores forem para diante com a anunciada greve ao jogo com o Benfica, o campeonato fica irremediavelmente inquinado. E que, se houver jogo e, por conveniência financeira, ele for afinal disputado no Estádio do Algarve, e não no José Arcanjo, o Benfica sai objectivamente beneficiado.

Neste panorama, o silêncio do homem que se fez eleger prometendo o paraíso ao maior número possível de clubes como o Olhanense, é todo um programa.

2- Parece que Luís Ferreira teve uma arbitragem, vamos chamar-lhe desequilibrada, no Sporting-Benfica de equipas B. Acontece. Talvez não mereça desculpa, mas está desculpado pela oportunidade que proporcionou ao novo presidente do Sporting para, como se diz, se posicionar perante a sua massa associativa. Quando afirma que é preciso correr com os « pássaros» do futebol português, ele está a falar para dentro e a vestir desde já a farda do Quixote travestido de Calimero, cujo uso é absolutamente obrigatório a quem quer ser alguém no Sporting. À noite, na SIC, vi também de passagem o sportinguista Rui Santos dissertar sobre uma espécie de Tordesilhas que teria sido estabelecido entre Porto e Benfica para controlarem a arbitragem (curiosamente, depois de um Académica-Porto em que assisti a uma coisa única: a primeira falta, completamente banal, de um portista, aconteceu aos 32 minutos e deu logo direito a uma amarelo; e a terceira falta, que aconteceu só aos 70 minutos de jogo e igualmente banal, deu direito a segundo amarelo e impedimento do seu autor para o próximo jogo, como Braga).

Está, pois, estabelecido o padrão para o mandato de Bruno de Carvalho e o mínimo que se pode dizer é que ele não promete nada de novo em relação ao habitual e tradicional. De cada vez que o Sporting for prejudicado por uma arbitragem, lá desenterrarão os fantasmas da perseguição, que não os deixam chegar às vitórias que o seu brilhante desempenho desportivo e de gestão manifestamente justificariam. De cada vez, porém, que o Sporting for beneficiado, como já sucedeu várias vezes esta época - como contra Braga e Guimarães, em Al- valade — cairá sobre o assunto o silêncio dos justos. Renovação sim, mas sem abdicar das tradições do clube.

3- Já disse, na entrevista a A BOLA TV, o que pensava sobre as postas de pescada debitadas por Paulo Bento em relação a Pinto da Costa. Apenas queria reafirmar que, por pior que seja o português em que o selecionador se exprima, a ideia é clara e não é original: face aos resultados mais do que medíocres, às exibições inaceitáveis, ao perigo real de falhar a qualificação para o Brasil e ao número crescente daqueles que perguntam o que anda o seleccionador a fazer, Paulo Bento ensaia a escapatória de comprar uma guerra com o FC Porto para ver se distrai as atenções e reganha popularidade fácil. Scolari fez o mesmo quando aqui chegou e desatou a perder todos os jogos de preparação para o Euro. Mas no fim só se safou graças aos jogadores do FC Porto.

4- Por razões de trabalho, não poderei ver e tenho de escrever antes do Braga-Sporting. É um jogo determinante para o Braga, que a seguir irá ao Dragão e que tem o persistente Paços de Ferreira sempre em cima. Desperdiçar a oportunidade de ir à Champions num ano em que só teve a concorrência do Paços para o terceiro lugar, será um desenlace desastroso num percurso sempre em ascensão. Talvez a esta hora, e ainda mais depois da lesão de Eder, António Salvador esteja arrependido de ter deixado sair Lima para o Benfica a preço de feijões e já depois de ter deixado sair Artur a custo zero. O Benfica, por seu lado, bem que tem razões para lhe estar eternamente agradecido.

quinta-feira, junho 13, 2013

E HOJE, TAMBÉM NÃO É DECISIVO? (26 MARÇO 2013)

1- Quando teve os seus navios alinhados em coluna pronta a executar a sua célebre manobra de ataque em V, frente à Armada espanhola, no Cabo Trafalgar, Lord Nelson transmitiu a todos os navios a sua última ordem: «A Inglaterra espera de cada um que cumpra o seu dever». A bordo dos navios, Nelson tinha um equipagem de marinheiros e fuzileiros de assalto altamente treinados, mas que viviam em condições de uma dureza difícil de acreditar para os dias de hoje, mal alimentados, mal pagos (quando o eram), meses sem ir a casa (os que não morriam), e sofrendo horrores quando feridos e tratados a bordo, num tempo em que não havia anestesias nem antibíóticos e o tratamento mais comum para os ferimentos eram a amputação e as ligaduras. Mas todos sabiam que, se vencessem a Invencível Armada em Trafalgar, como venceram, as Ilhas Britânicas estariam mais uma vez a salvo de um inimigo vindo do mar.

Em, Telavive, frente a um adversário infinitamente mais fraco que a Selecção portuguesa, num jogo que era imperioso ganhar e com uma equipa composta por meninos de ouro, pagos milionariamente e com prémios de presença, de vitória e de qualificação à sua espera, viajando em classe executiva de voos fretados, dispensados de todas as demoras e diligências nos aeroportos e instalando-se em hotéis de luxo rodeados de mordomias, o que lhes disse o seleccionador Paulo Bento? Disse-lhes que o jogo não era decisivo e que estavam desde já dispensados de pensarem no primeiro lugar do grupo, que dá apuramento directo para o Brasil, pois isso causaria um desgaste desnecessário nos seus espíritos tão ocupados com coisas bem mais importantes como o sejam decidir o desenho da próxima tatuagem ou a escolha do último modelo de penteado inspirado no ca- tálogo de arbustos das florestas do Bornéu. Na opinião avisada do seleccionador, a 6º selecção do ranking da FIFA não tinha, de forma alguma, estrita obrigação de regressar com uma vitória frente à 74ª selecção do mesmo ranking. Dito e feito: recebida a mensagem e com um golo caído do céu aos 80 segundos, os meninos de ouro dedicaram-se a passear a sua classe em campo. Em breve estavam a perder por 3-1 e só um milagre imerecido lhes permitiu, no último sopro do jogo, escapar a uma derrota enxovalhante.

A Selecção Nacional de Paulo Bento está transformada na Decepção Nacional. Tal como escreveu o Rui Moreira, não joga nada e, pior ainda, não se percebe o que faz Paulo Bento em troca de beneficiar de um dos mais fantásticos lugares que o país tem para dar, na relação trabalho/remuneração, só talvez ultrapassado pelo lugar de Eduardo Catroga no Conselho de Supervisão da EDP. Não se percebe para que servem coisas como a excursão ao Gabão ou os particulares com Equador e quejandos, onde a Selecção desperdiça prestígio e aliena adeptos. Vai para mais de um ano que os jogos desta Selecção são penosos exercícios de diletantismo, falta de brio e falta de qualidade. Não é uma questão de atitude, mas sim de mentalidade, explica o seleccionador, numa extraordinária confissão do seu fracasso (pois a quem mais, que não ele, compete mudar as mentalidades, pelos vistos, instaladas na equipa?). Mas será lambem uma questão de mentalidade que não se veja no jogo desta equipa nada de treinado e ensaiado, nem sequer livres ou cantos? Que não haja um fio de jogo, nem uma organização defensiva aceitável, nem plano de ataque que vá para além de esperar que o génio de Ronaldo resolva tudo por si só? Será uma questão de mentalidade continuar a apostar em jogadores que já ultrapassaram o seu prazo de validade útil e estão na fase em que já não lhes resta outra montra que não a da Selecção? E que mentalidade se pretende alterar quando é o próprio Paulo Bento que aparece a justificar a vergonhosa exibicão de Telavive com o golo madrugador que «penalizou» a equipe e com a incapacidade de saber «gerir o resultado» (ou seja, a ganhar por l-0, o único objectivo deveria ter sido o de defender essa preciosa vantagem...). Entre tão complexas mentalidades e tão delicadas susceptibilidades, talvez se pudesse explicar à equipa que, se bem que a invasão da pátria não esteja em jogo, ninguém está pronto a compreender e desculpar que a 6ª Selecção da FIFA não esteja presente entre as 32 que vão estar no Brasil. Nem os brasileiros nos perdoarão a nossa ausência: para eles, se Portugal não se conseguir qualificar num grupo tão fácil, é porque não houve vontade de estar no Brasil.

Mas vá lá que houve uma excepção: ao decidir viajar até Baku, mesmo impedido de jogar, o capitão Cristiano Ronaldo mostrou a Paulo Bento como é que se mudam as mentalidades. E devo dizer até que as suas habituais fracas exibições na Selecção (que não foi o caso em Israel), me começam a parecer mais justificáveis, à luz do dilema que ele deve viver em campo: jogar sozinho ou jogar para uma equipa que ele sente que não sabe jogar?

2- Desejo ardentemente que a nova direcção do Sporting se aguente por muitos e bons anos. Porque assim estaremos livres de tão depressa voltar a viver o ridículo espectáculo mediático das eleições no Sporting, que a comunicação social tratou como se de eleições presidenciais se tratasse. Vi o debate entre os candidatos na SIC, que permitiu perceber que nenhum deles tinha qualquer acordo com os bancos ou qual quer investidor disponível para injectar dinheiro no Sporting (e não se percebe a troco de quê o fariam ou farão). Também deu para ver que entre a candidatura patética de Carlos Severino, um Bruno de Carvalho que, em várias coisas, faz de facto lembrar Vale e Azevedo, e a candidatura de José Couceiro, a deste último, sem trazer também qualquer solução, me pareceu a única capaz de, pelo menos, não piorar as coisas. Na hora da vitória, vi os sócios apoiantes de Bruno de Carvalho celebrarem como se a conquista do campeonato da Liga estivesse já ali, ao virar da esquina. Dá-me ideia que ainda não realizaram que o campeonato é outro e, nesse, a vitória é tudo menos certa. O grande projecto de que falavam todos os candidatos sem o ousarem dizer, resume-se a uma única palavra: sobreviver.

3- Ao ver Higuaín e Messi (Real Madrid e Barcelona) abraçados em três ocasiões do Argentina-Venezuela - no golo de Messi e nos dois de Higuaín, assistido por ele - ao ver os jogadores do Real e do Barça irmanados no apoio e respeito a Del Bosque, percebe-se como Mourinho andou mal ao acusar de batota a eleição que consagrou Del Bosque como o melhor treinador do ano para a FIFA. Em primeiro lugar, porque não se fazem acusações dessas refugiado em fontes que preferem manter o sigilo - e a única que não o fez, Pandev, foi desmascarado como aldrabão. Em segundo lugar, porque não se entende como é que Mourinho pode justificar a sua ausência na cerimónia com o facto de ter sabido que tinha havido votações adulteradas, quando as votações, de quem em quem, só são divulgadas após a cerimónia. Em terceiro lugar, porque, mesmo que tal tivesse acontecido, teriam sido necessários 40 votos adulterados para lhe roubar a vitória, e não «dois ou três», como ele disse. Em quarto lugar, porque sendo a escolha do melhor treinador do ano necessariamente subjectiva, sempre há alguns critérios objectivos que, neste caso, abonavam a favor de Del Bosque: Mourinho foi campeão de Espanha com o Real (coisa que Del Bosque já tinha sido várias vezes), e este foi campeão da Europa com a Espanha, depois de ter sido campeão do mundo: não é comparável. E, em quinto lugar e finalmente, porque sendo Mourinho indiscutivelmente um dos melhores ou, se quiserem, o melhor treinador do mundo, só lhe ficava bem saber ganhar e saber perder e saber respeitar os adversários e os concorrentes com maior naturalidade e fair play. Como é que um homem tão inteligente e tão talentoso naquilo que faz, se desperdiça assim em guerras inúteis que só o desprestigiam e causam mal estar à sua roda?

quarta-feira, junho 12, 2013

NA HORA DA VERDADE PETER NÃO FALHA (19 MARÇO 2013)

1- O Principio de Peter estabelece uma regra cristalina: todos nós temos o nosso patamar de competência, acima do qual as coisas ainda podem correr bem durante uns tempos, mas fatalmente hão-de correr mal na hora da verdade. Em Málaga, Vítor Pereira deu uma eloquente demonstração práctica da actualidade do Princípio de Peter, mostrando que não é impunemente que se salta do banco do Santa Clara, da 2ª Liga, para o de um clube que é crónico candidato ao título e passageiro habitual da Liga dos Campeões. Como escrevi quando ele foi escolhido, compreendi a escolha à luz da deserção de Villas Boas e da urgência em encontrar treinador, já com a equipa a iniciar o estágio de pré-época, no Verão de 2011. Mas não compreendi a extensão do vínculo para o ano em curso. Durante estas duas épocas, Vítor Pereira deu a quem quis ver variadíssimas demonstrações da sua insuficiente competência técnica para estar à frente de uma equipa de luxo, como é a do FC Porto. Repito que, pessoalmente, não tenho dúvidas de que se trata de uma pessoa séria, trabalhadora e bem intencionada — mas isso não chega, como não chegou ao Papa Francisco para treinar o San Lourenzo de Almagro.

Nestes dois anos, vi Vítor Pereira andar à toa, primeiro limitando-se a deixar que fosse a equipa e a categoria dos seus jogadores a carrega-lo às costas para o que contou muito a superior capacidade de Hulk de resolver jogos sozinho e o famigerado espírito do balneário portista. Foram eles que lhe deram o título do ano passado, mas não podiam dar-lhe o que ele não tem, por si mesmo: uma competência técnica que seja capaz de retirar o melhor de cada um e o melhor da equipa. Como não me canso de escrever, duvido que perceba alguma coisa de futebol um treinador que deve ser o único apreciador do jogo em todo o planeta que não entende que James Rodriguez e Cristian Atsu são infinitamente melhores do que Silvestre Varela. Mas isso é apenas um exemplo, embora extremo e elucidativo. Nestes dois anos, Vítor Pereira também se revelou incapaz de potenciar quase todos os novos jogadores que despontaram no clube, desprezando-os ou abrindo mão deles: Atsu, Iturbe, Sérgio Oliveira, Djalma, Souza, Delatorre. Agarrou-se a um núcleo duro de jogadores, que explorou até à exaustão, porque são os que lhe garantem o tal jogo de «posse de bola», triste imitação de um Barcelona, sem escola nem Messi, e que ele, à falta de melhor, resolveu apresentar como resultado do seu ano de aprendizagem. Ele acha que, enquanto tiver a bola, a equipa não corre riscos e, por isso, detesta jogadores que arriscam, que rompem com aquele colete de forças inócuo, e prefere outros que lhe dão uma falsa sensação de segurança e controlo do jogo: Defour, Fernando, Varela, Castro, ou um Lucho rebentado ou em fim de ciclo. Toda a gente saudou a refundação táctica que Vítor Pereira tinha engendrado para um FC Porto sem Hulk. Mas todos fingiram não ver que o esquema dependia de três nomes e não existia sem eles: Moutinho, como pivot de tudo; James (que ele não entende), como criador de desequilíbrios; e Jackson Martinez, como finalizador.

Em Málaga, como qualquer aprendiz de futebol sabe, a melhor, a única forma, de defender a vantagem de 1-0 era garantir pelo menos a marcação de um golo — tarefa não muito complicada, face a uma defesa sabidamente frágil. Na véspera do jogo, aliás, Vítor Pereira não se dispensou de dizer que a equipa não se iria descaracterizar nem mudar de processo de jogo. Mas, na hora da verdade, o que fez foi exactamente o contrário: borrou-se de medo e montou uma estratégia e uma equipa para defender o 1-0. Já vi este filme inúmeras vezes, posto em exibição por treinadores portugueses sem estaleca para os grandes jogos europeus. Pensam, pensam, dormem a sonhar com tácticas que surpreendam o adversário e, no momento da decisão, mudam a equipa e a sua estratégia de jogo. Invariávelmente, mudam-na para defender e, invariavelmente também, o resultado dessa mudança traduz-se num desastre. Foi o que fez Vítor Pereira em Málaga, com o resultado de ter perdido não apenas uma eliminatória totalmente ao alcance do FC Porto, de ter desperidiçado uma oportunidade caída do céu e do sorteio para seguir para os quartos da Champions, mas também caindo com tamanho estrondo e falta de classe que deixou a equipa destroçada, física, emocional e psiquicamente, como se viu este domingo no Funchal. Ao ponto de, mais do que provavelmente, ter também entregue o título nacional ao Benfica.

Quando optou por entrar em campo em Málaga com um ataque reduzido a Jackson Martinez (visto que Defour nunca foi, nem sabe ser, extremo, e Varela não conta), Vítor Pereira fez o três em um:
- transmitiu aos seus jogadores uma mensagem clara de que estava com medo do adversário e era preciso defender desde o primeiro minuto; reduziu as hipóteses de marcar um golo a factores de pura sorte do jogo;
- rebentou com Jackson Martinez (com consequências que pagaria mais tarde), ao forçá-lo a passar metade do jogo a correr, sem apoio algum, a impossíveis passes de 30 e 40 metros — única estratégia de ataque engendrada.

É certo que depois contou com as traições dc Defour e do departamento médico do FC Porto que, tal como já sucedera com James, demorou muito mais tempo do que o razoável a recuperar João Moutinho e, afinal, entregou-lho sem estar em condições. Mas a traição de Defour é uma história diferente e que um treinador avisado teria evitado. Para começar, é a própria inclusão de Defour que está em causa: trata-se de um jogador absolutamente banal, de equipa do fim da tabela. Tem a seu favor ser esforçado e generoso, mas é tecnicamente limitado, nada esclarecido e precipitado em todas as acções, seja a rematar à baliza ou a entrar ao desarme. A conjugação destas características torna-o um jogador perigoso num jogo daquela importância, para mais se já levou um amarelo e continua de cabeça quente. Sem desculpar minimamente a indesculpável atitude de Defour (três meses sem ordenado seria o mínimo que ele devia pagar ao clube pelos danos causados), é indesculpável também que Vítor Pereira não tenha lido o cuidado elementar de o retirar após o primeiro amarelo. Tanto mais que, já no ano passado contra o Apoel e também na Champions, o FC Porto vivera episódio semelhante com Fucile, que terminou com a sua expulsão, derrota no jogo e eliminação da competição. Ora, um treinador está no banco para aprender com os erros cometidos, para conhecer o temparamento dos seus jogadores e defender a equipa dos seus excessos previsíveis. Não para estar a tirar apontamentos enquanto o jogo decorre ou ficar de mãos nos bolsos, estático e silencioso, a assistir a tudo, como se, bom ou mau, nada houvesse a fazer contra o destino.

Espanta-me que Pinto da Costa - que percebe muito mais de futebol a dormir que Vítor Pereira acordado
não lhe tivesse pedido antes do jogo a equipa que ele ia fazer alinhar em Málaga. E que, se o fez, não lhe tenha logo dito: «esse onze e essa estratégia de medo estão condena-dos ao desastre. Acredite em mim, que já vi isso acontecer antes».

2- Uma única nota para o empate do FC Porto no Funchal. Quando finalmente íamos jogar onze contra onze — isto é, com o Varela no banco — Atsu vai contra a bancada em construção e sai lesionado aos 5 minutos. Depois, quando ia afastar uma bola fácil, Mangala tropeça no relvado, em estilo de chapa ondulada, e permite o golo do empate. Ou seja: o campo foi determinante no resultado. E é extraordinário que o Marítimo e o Governo Regional da Madeira, olhando para o Estádio dos Barreiros — que jamais enchia na sua dimensão anterior e que tem um campo curto, estreito e com um relvado impraticável —, em lugar de fazer obras que o tornassem aceitável para uma primeira divisão, tenham antes optado por uma despesa imensa para aumentar bancadas condenadas às moscas e que, ainda para mais, na ganância de chegarem mesmo em cima do campo, são uma ameaça à integridade física dos jogadores. Assim se percebe porque se joga mal futebol por cá e porque está a Madeira falida.

terça-feira, junho 11, 2013

DAQUI ATÉ AO DRAGÃO (12 MARÇO 2013)

1- Quinze minutos: era tudo o que deveria ter visto do Porto-Estoril. Porque a partir daí e a ganhar por 2-0, o Porto deixou de jogar e o jogo acabou. Sim, já sei que havia o jogo de Málaga no subconsciente dos jogadores, que a época já leva 37 jogos e as pernas começam a pesar, etc. e tal. Mas, do Estoril até Málaga, mediavam seis dias de descanso — uma distância suficientemente grande para apenas um quarto de hora de futebol empenhado. Talvez não seja deslocado recordar que o público paga para ver 90 minutos de espectáculo e não apenas quinze, com artistas que ganham o que ninguém mais ganha em Portugal. E talvez também não tivesse sido má ideia recordar aos artistas do FC Porto que talvez este campeonato se venha a decidir por diferença de golos, o que justificaria o esforço de ir um pouco mais além.

Foi isso que fez o Benfica com o Gil Vicente: marcou cinco e ultrapassou a diferença de goal average que tinha em relação ao FC Porto. Deste jogo, vi apenas os primeiros vinte minutos e depois desisti, impressionado pela eficácia benfiquista: um remate à baliza, dois golos, ambos oferecidos. Quando vejo equipas entregarem assim os jogos ao Benfica, logo para começo de conversa, desisto de ver: também não é espectáculo que se recomende.

Olhando para a diferença abissal entre os dois primeiros e os restantes, eu penso, ao contrário de Jorge Jesus, que é muito possível, e mesmo provável, que o campeonato se decida no Dragão. E, para essa decisão, o Benfica está neste momento, em vantagem. Se ganhar lá, será campeão certamente. Se perder mas lá chegar com 4 pontos de avanço, também. E, se empatar, tem todas as hipóteses a seu favor, se até lá não perder ou a vantagem pontual ou a da diferença de golos. Quer isto dizer que, para ser campeão, o caminho do FC Porto está cada vez mais estreito: não se pode permitir mais nenhum deslize ditado pela displicência, como sucedeu em Alvalade, no Dragão com o Olhanense, e ia sucedendo com o Rio Ave, também no Dragão. E, depois, terá de ganhar ao Benfica. Já vi isto mais fácil. Mas também já vi o FC Porto sair de situações piores.

2- Depois de anunciada a sua ressurreição no jogo com o FC Porto, o Sporting voltou à normalidade em Coimbra: as notícias felizes eram manifestamente exageradas e não tenho, infelizmente, qualquer dúvida de que o assomo de orgulho ferido que se viu contra o FC Porto não se irá repetir contra o Benfica.

Nada mudou no Sporting, a começar por aquela que, ao longo dos anos, aqui venho apontando como a razão primeira do seu declínio: a falta de uma mentalidade competitiva, que nunca procura responsabilidades próprias para os desaires, antes encontra sempre desculpas exteriores. Mais uma vez isso sucedeu no jogo contra o FC. Porto — onde, convém recordá-lo, o Sporting, jogando em casa, esteve sempre, sempre, à defesa, recuado e amedrontado. Mas, ao ver sportinguistas ilustres, como Dias Ferreira ou Eduardo Barroso, atira-rem-se à arbitragem, como tendo sido escandalosa, percebi que a atitude se mantém tal e qual. E porque foi a arbitragem escandalosa? Porque não mostrou o segundo amarelo a Otamendi (numa jogada de que, sinceramente, não me recordo, mas numa altura em que não faria qualquer diferença) e, sobretudo, por ter expulso os dois treinadores do Sporting. Mas algum deles terá escutado as palavras que os treinadores dirigiram ao árbitro e que terão justificado as expulsões? Como podem então concluir que elas foram escandalosas — só por terem acontecido? De Oceano, não se sabe o que terá dito, porque ninguém o referiu. E, de Jesualdo, sabe-se apenas a sua versão, de que terá dito ao árbitro «acaba com isto, antes que isto acabe mal». Não sei se é ou não razão para o expulsar do banco, mas não me parece muito adequado que um treinador se dirija ao árbitro, tratando-o por tu e dando-lhe ordens para acabar com o jogo, antes mesmo dos 90 minutos, sob pena de uma ameaça implícita. E garanto que, se fosse o treinador do FC Porto a jogar em casa um clássico, empatado a zero a poucos minutos do fim, o que eu acharia escandaloso é que ele pedisse ao árbitro para acabar com o jogo rapidamente Mas lá está: são mentalidades competitivas diferentes.

3- Como aqui escrevi a semana passada, o tema da ruptura entre o Benfica e a Olivedesportos/Sport TV e a aposta na rentabilização própria dos jogos caseiros do clube e da Benfica TV é um assunto que me interessa muitíssimo na perspectiva da viabilidade dos principais clubes portugueses, ao nível da alta competição.

Infelizmente, porém e como sempre sucede nas SAD, o estudo de viabilidade que o Benfica terá feito é secreto. Como secreto é até o preço que aceitou pagar pela transmissão dos jogos do campeonato inglês na Benfica TV, invocando uma suposta «cláusula de confidencialidade» (que não impediu, contudo, que o jornal Expresso noticiasse que o Benfica pagou à Liga inglesa o triplo do que pagava a Sport TV: 2,3 milhões por época). Mas foi um texto de Bagão Félix, aqui publicado há dias, que me chamou a atenção para uma perspectiva que ainda não tinha considerado. Escreveu ele que a transmissão dos jogos da Luz na Benfica TV vai permitir servir a «verdade desportiva» . Ou seja, como se adivinha, vai permitir reduzir à opinião dos benfiquistas de serviço à Benfica TV as incidências dos jogos. Ora, para quem como eu, já teve ocasião de assistir ao número cómico-surreal que são os comentários dos locutores da Benfica TV, feitos em directo e sobre jogos que eles não podem mostrar, é fácil de imaginar o que seja a «verdade desportiva» nas mãos daquelas criaturas. Mas, não só: a transmissão da Benfica TV vai passar a ser a única fonte visual dos jogos transmitidos. E imaginem que há, por exemplo, uma jogada duvidosa dentro da área do Benfica e que só o slowmotion e a repetição da jogada permitem concluir se foi ou não penalty: acham que a Benfica TV o vai fazer? Acham que ela se vai preocupar em esclarecer se foi ou não penalty contra o Benfica não assinalado? E se, a seguir, for o FC Porto a transmitir os jogos do Dragão no Porto-Canal (que, diga-se de passagem, não tem nada a ver com a caricatura de jornalismo e tudo o resto que se faz na Benfica-TV)?

O problema destes apologistas da «verdade desportiva» nem é, principalmente, os sucessivos tiros nos pés que eles dão e que reduzem a sua verdade a uma caricatura do que apregoam. O problema maior é que, à força dese tentarem convencer que só a sua verdade é que conta e é «desportiva» , já perderam a noção do ridículo em que caem. É como a raposa de guarda ao galinheiro.

4- No espaço de três jogos e dez dias, Sergio Ramos, central do Real Madrid, alcançou a proeza, digna do Guinness, de cometer cinco penalties, nenhum dos quais assinalado pelo árbitro: um em Barcelona, no jogo da Taça do Rei, quando havia 0-1; outro em Madrid, verdadeiramente escandaloso, quando havia 2-1 para o Real e faltava um minuto para o fim; e mais três em Manchester, o último dos quais igualmente de bradar aos céus. Junte-se a isso a expulsão de Nani e só se pode afirmar que José Mourinho bem andou em reconhecer a ajuda do árbitro na qualificação para os quartos da Champions. Mas, mais papistas do que o próprio Papa, há jornalistas portugueses que acham que o patriotismo consiste em não dar importância a estas coisas, se elas beneficiam portugueses envolvidos. Mas, se tem sido ao contrário, cinco penalties a favor do Real não marcados em três jogos decisivos consecutivos..., ai meu Deus, o que não se teria escrito!

segunda-feira, junho 10, 2013

TUDO TÃO PREVISÍVEL! (5 MARÇO 2013)

1- Caros correligionários nortistas: querem saber qual é a equipa que Vítor Pereira vai pôr a jogar no próximo encontro? Eu digo-vos. Partindo do princípio que Mangala e Moutinho recuperam das lesões musculares contraídas nos treinos (o que não é nada certo, porque no FC Porto todas as lesões são de cura prolongada), ele vai receber o Estoril com o seguinte onze de entrada: Helton, Danilo, Mangala, Otamendi e Alex Sandro; Lucho, Fernando e Moutinho; Varela, Jackson e Izmailov. Aí pelos 60 minutos, fará o favor dc tirar o lzmailov e meter o James e, se as coisas estiverem mesmo complicadas, tirará o Varela para meter o Atsu. Como é que eu sei? É facílimo: a menos que a derrota abale as suas certezas de forma gritante, Vítor Pereira mete sempre a jogar os mesmos do jogo anterior e aqueles que, desde o início da época, decidiu que seriam o seu onze de escolha. Seja contra quem for o jogo, jogue o adversário como jogar, seja necessário defender ou atacar.

Pode o Manchester United, o Tottenham, o Milan, cobiçar o James, é absolutamente indiferente: para Vítor Pereira, estão todos enganados - bom mesmo é o Silvestre Varela, que, não se entende por que razão, ninguém cobiça. Pode meia Europa andar com o Atsu debaixo de olho e o próprio preferir esperar para ver antes de renovar contrato com o FC Porto, nada disso muda a ideia feita de Vítor Pereira: o lugar de Atsu é no banco, como suplente de Varela e de Izmailov. Pode o sistema de 4x3x3, que ele herdou e manteve, precisar, por natureza, de dois extremos capazes de ir à linha cruzar e assistir o ponta de lança coisa que nem Varela nem Izmailov sabem ou estão dispostos a fazer - pouco importa, ele prefere jogar assim e ficar um jogo inteiro a ver um ponta-de-lança tão excepcional como Jackson Martinez esperar em vão receber jogo das alas.

Foi assim que Vítor Pereira se apresentou em Alvalade. Precisou de uma hora para perceber que o Izmailov não abria jogo e fugia do flanco como diabo da cruz, e precisou ainda de mais dez minutos até se cansar de ver o Varela na sua habitual postura de tratador da relva, que por ali se passeia, sem pressa nem engenho, como se tudo aquilo não fosse nada com ele. Em Alvalade, o FC Porto deixou mais dois pontos devido à estratégia ganhadora do seu treinador.

Por favor senhores jornalistas: quando escreverem que hoje todos os portistas estão já rendidos a Vítor Pereira, lembrem-se de abrir uma excepção para mim, o último dos gauleses a ser subjugado. A posse de bola, que ele tanto privilegia, é, como disse Lucho Gonzalez, tão bonita quanto inútil, se não é capaz de abrir espaços para chegar ao golo. E um treinador que prefere o Varela ao James Rodriguez, como já o havia mostrado no ano passado, para mim é alguém que não distingue um Fiat 500 de um Ferrari. (Sim, eu sei: o James ainda não está na sua forma habitual. E, então, qual foi a última vez que o Varela esteve em forma aceitável?).

2- A única coisa consoladora, vagamente consoladora, do empate em Alvalade, foi constatar o respeitinho que o FC Porto impõe a todos. Mesmo desfalcado de Mangala e Moutinho, mesmo com James e Atsu sentados no banco até mais não dar, o FC Porto teve o dobro de posse de bola do Sporting e o triplo de cantos, ataques, remates e remates perigosos. A única coisa em que ficaram empatados, além do resultado final, foi no número de oportunidades de golo. Mas toda a gente sentenciou que o Sporting tinha feito uma grande exibição e até pareceu que tinha nascido uma alma nova aos devastados leõezinhos. E eu percebo o sentimento, porque, na verdade, todos sabemos que este FC Porto, deveria ter ganho tranquilamente em Alvalade. Com qualquer treinador. Porque, para ser treinador desta equipa, basta não complicar, pôr os melhores a jogar e deixar as coisas correrem por si, naturalmente.

3- Também me serviu de fraco consolo ver o banho de bola que o Benfica levou em Aveiro. A ganhar desde os 15 minutos, com um daqueles pretensos penalties a que jamais me habituarei (desta vez um cabeceamento feito a meio metro contra o braço de um defensor de costas para a jogada), só por uma vez mais o Benfica esteve à beira de poder marcar. No resto do tempo, Costinha cumpriu a sua promessa de não jogar de autocarro: o Beira-Mar teve mais bola, mais ataques, mais remates e mais ocasiões de golo — que, com um ponta-de-lança um pouco mais inspirado e esforçado que Yazalde, teriam ferido de morte a águia e feito justiça ao resultado. E o melhor em campo foi alguém que não me recordo de ter visto jogar antes e que francamente me impressionou: o médio volante aveirense Ruben. Para além dele, que fez gato-sapato do meio campo benfiquista, retive a cotovelada voluntária de Cardozo na cara de um adversário, que, nos saudosos tempos dos sumaríssimos, lhe custaria dois jogos de fora...fosse ele jogador do FCP. Mas quando pontapear um adversário no chão, com o jogo interrompido, e agarrar o árbitro pelos colarinhos só dá um jogo de castigo, como não há-de o bom do Cardozo (que eu até admiro bastante) não se convencer que tudo lhe é permitido? Ah, e gostaria de ter visto, só para tirar umas dúvidas genuínas, a repetição de um lance aos 88 minutos, dentro da área do Benfica, em que Garay salta por cima de um adversário para cortar a bola...

4- Apresentadas as contas de gestão dos três grandes, relativas ao primeiro semestre desta época, confirma-se que o Sporting está tecnicamente falido e que à dívida acumulada e insustentável se junta uma gestão corrente largamente deficitária. Razão tem o presidente do Benfica para desconfiar que se prepara um perdão da banca, como única forma de evitar o estoiro de um dos históricos do futebol português. Quanto aos candidatos à presidência do clube, nem uma palavra de concreto sobre o assunto...

O Benfica saiu positivo com as vendas de jogadores e conseguiu diminuir os custos salariais. Cumprindo uma promessa eleitoral, Vieira prepara se para o salto no vazio que é assumir directamente a transmissão dos jogos do Benfica na Benfica TV, começando, por ora, por anunciar a compra dos direitos do campeonato inglês. Este é um lema de uma importância extrema, que daria material para todo um artigo. Assumindo o desafio numa altura em que o mercado publicitário enfrenta a sua maior crise dos últimos vinte anos, o Benfica corre riscos extremos e, das duas uma: ou a decisão se revelará acertada, premiando visão e coragem, ou redundará num desastroso tiro nos pés. Para já, o que sabe é que, apesar do saldo positivo da conta de exploração do primeiro semestre da época 2012/13, o Benfica prepara-se para ir ao mercado, pedir um empréstimo de 80 milhões, sob a forma de obrigações que deverão andar próximo dos 8% de juros uma brutalidade, que reflecte alguma pressão inadiável.

Quanto às contas do FC Porto, também positivas, contêm, contudo algumas razões de preocupação, pelo menos vistas por alto e não em detalhe. Desde logo, a baixa acentuada das receitas de bilheteira; depois, o crescimento em cerca de 18% da massa salarial numa altura em que não há uma só empresa em Portugal que não tenha reduzido os custos salariais; e, finalmente, a receita anunciada com vendas de jogadores (16 milhões de euros), incrivelmente baixa se considerarmos que ela envolve uma série de vendas, como Guarín, Álvaro Pereira, Belluschi, Hulk (45 milhões só à sua conta) e até Falcao, que o Atlético de Madrid ainda não acabou de pagar.

Mesmo não esquecendo que parte dos passes dos jogadores não pertenciam ao clube, 16 milhões facturados parece incompreensivelmente pouco. Talvez o Conselho Fiscal tenha uma explicação - é para isso que foi eleito.

domingo, junho 09, 2013

CONTRADIÇÕES (26 FEVEREIRO 2013)

1- Bem à sua maneira, Jorge Jesus já tratou de espicaçar o Sporting e, do mesmo passo, desvalorizar uma eventual vitória do FC Porto em Alvalade, sábado que vem. Disse ele que o Sporting estava bem mais forte quando o Benfica lá foi vencer e que agora joga com metade do onze vindo da equipa B. Faz parte dos mind games em que ele é o principal especialista no nosso campeonato. Mas, à vista desarmada, eu não alcanço nenhuma diferença entre este Sporting de Fevereiro e aquele que, ao longo de um campeonato completamente coerente no desastre, ocupa um justíssimo 12º lugar. Todavia, é sabido que se alguma coisa um clássico tem é a capacidade de fazer transcender a equipa que no momento está por baixo. Sendo favorito em Alvalade, o FC Porto não pode e não vai contar com um passeio.

2- E, por falar em passeios, lembrei-me, ao ver o Benfica-Paços de Ferreira, de alguns benfiquistas que conheço, que acham sempre que as outras equipas jogam muito menos contra o Porto do que contra o Benfica. E não o dizem em tom de opinião, mas de suspeita. Pois o Paços, terceiro classificado do campeonato, chegou à Luz e à primeira oportunidade, ao minuto sétimo, abriu uma avenida na zona frontal da defesa, por onde o Benfica chegou ao golo e logo se percebeu que o jogo estava entregue. Daí até final, o terceiro do campeonato apenas mostrou uma defesa macia e simpática e um ataque simpático e macio, com verdadeiro terror de ultrapassar com bola o meio-campo: nem sombra da coragem de que falou o seu treinador. Uma semana antes, a Académica, sem pergaminhos a mostrar, passou 95 minutos a defender a sua grande área com todos os jogadores, de tal modo que o golo salvador do Benfica, nos últimos segundos da partida, nasceu de uma abertura do meio do seu meio campo, feita pelo guarda-redes Artur. Ao menos no Dragão atacou várias vezes com perigo, esteve a ganhar e pregou um valente susto...

3- Mais um valente susto apanhou o FC Porto também contra o Rio Ave. Tal como sucedera quinze dias antes contra o Olhanense, também esteve a perder, mas desta vez conseguiu dar a volta completa, já bem perto do fim. Pedras nucleares da equipa, como Moutinho e Jackson, revelaram o cansaço do jogo com o Málaga, apenas três dias antes (suponho que terá sido a expectativa do jogo da Taça da Liga, marcado para meio da semana mas entretanto adiado, a única explicação racional para não ter jogado contra o Rio Ave domingo ou segunda). Alex Sandro fez muita falta, não obstante a bela estreia de Quiñones; Atsu também deixou saudades e James tarda a encontrar ritmo de jogo, mas, apesar de tudo, foi dele a belíssima assistência para o golo da vitória - coisa que um Varela a tempo inteiro jamais consegue fazer. O meio-campo, zona estratégica para o tipo de jogo implantado por Vitor Pereira, sofre do desastrado momento de forma de Lucho (que nele é sabido acontecer todos os anos, a meio da época), e do regresso de Fernando ao seu pior - passes errados perigosos, atrapalhação constante, debilidades técnicas gritantes, que se tornam patéticas quando decide subir ou rematar. No flanco direito, para colmatar a inutilidade de Varela, está um Danilo que não tem nada a ver com Alex Sandro e muito pouco a ver com os 17 milhões que custou. Correndo o risco de me tomarem por louco, direi que temos quem, actualmente marginalizado e descartado, recorde como bem melhor: Fucile, esse mesmo. Mas também Souza eu achava bem melhor que Fernando e foi mandado embora; e Iturbe é bem melhor que Varela e foi emprestado; e Atsu é infinitamente melhor e não tem lugar cativo. Enfim, dirão que tudo é subjectivo e questão de opiniões, mas a verdade é que também há dados objectivos que permitem analisar friamente o desempenho prático de cada um. E preciso é consultá-los.

Depois de um jogo muito bem conseguido contra o Málaga, apenas com um pouquinho de ambição a menos para chegar ao 2-0 que teria sido justo, o FC Porto repetiu contra o Rio Ave o longo jogo sonolento que lhe custou dois impensáveis pontos contra o Olhanense. Nos últimos quatro jogos, incluindo o da Champions, aconteceu uma coisa rara: Helton não fez uma única defesa. E, mesmo assim, encaixou dois golos, em ambos deixando a sensação de que poderia ter feito mais. Como a equipa vem alternando o bom com o mau, é de esperar que em Alvalade regresse ao bom, antes de se mentalizar para a determinante viagem à Andaluzia.

4- Incapaz de atingir o seu grande objectivo, que era o de travar os anos de conquista do FC Porto, o Apito Dourado desforrou-se no Boavista - que, juntamente com o FCP, constituiu o outro único alvo de tanto empenho. Escrevi na altura que a sanção de despromoção aplicada ao Boavista com fundamento numa nebulosa acusação de tentativa de coacção sobre os árbitros me parecia mais destinada a salvar a face dos justiceiros do que a fazer justiça. Mas o CD da Liga, escudado nas brilhantes teses jurídicas do seu presidente, Ricardo Costa, e num parecer do mestre Freitas do Amaral, foi destemidamente em frente, até às últimas consequências. Obviamente, espero que agora, com a reintegração do Boavista e a obrigação de o indemnizar pelos danos causados com a sua condenação, quem foi responsável seja chamado a pagar solidariamente. Como dizem os brasileiros, «ajoelhou, tem de rezar».

5- Muito tenho escrito sobre o deplorável estado do relvado do Dragão (que ainda no jogo contra o Málaga poderá ter estado na origem de se ter falhado o segundo golo). E também sobre o de Alvalade e outros mais. Pois devo dizer que fiquei estupefacto ao ver o estado do relvado de S. Siro para receber um Milan-Barcelona, ou o do Galatasaray. Como é que a UEFA consente relva dos destes na principal competição mundial de clubes?

6- Há dias, alguém escreveu aqui que uma forte corrente de sportinguistas queria Luís Figo na presidência do clube, devido «ao seu prestigio e forma de estar na vida». Tenho-me lembrado dessa frase ao ler os relatos do julgamento do Tagus Park cuja administraçào, incluindo o actual acionista maioritário do Belenenses, é acusada de ter utilizado dinheiros públicos para pagar 750.000 euros a Luís Figo, em troca do seu apoio eleitoral a José Sócrates. O tal pequeno-almoço mais caro da história. O próprio Luís Figo só não está também no banco dos réus porque generosamente o Ministério Público aceitou a sua explicação de que não sabia que o Tagus Park era uma empresa de capitais públicos - o que, juridicamente, muda a natureza do crime de corrupção. Assinou um contrato em que uma empresa se dispunha a pagar-lhe 750.000 euros ao longo de três anos, mas não teve a curiosidade ou a cautela de se informar de que tipo de empresa se tratava...

Na Assembleia da República, respondendo a uma deputada do Bloco de Fsquerda, que questionava o seu vencimento como presidente do BPI, Fernando Ulrich lembrou-lhe que o seu vencimento era decidido e pago por uma empresa privada e perguntou-lhe por que não questionava ela também o vencimento do treinador do Benfica. Perguntou e respondeu, emudecendo-a: «porque, se o fizesse, podia perder votos e comigo não perde nenhum». É disso mesmo que se trata: o povo escandaliza-se porque um deputado recebe pouco mais de 3.000 euros por mês e um ministro pouco mais de 4.000. Mas já as fortunas que ganham jogadores, treinadores ou dirigentes, isso não escandaliza ninguém. Mesmo que depois os clubes estejam falidos e vão pedir ajudas aos governos. Pagas com o dinheiro de quem paga impostos.

sábado, junho 08, 2013

SINAIS DE PÂNICO (19 FEVEREIRO 2013)

1- Estamos a entrar na altura da época em que, para os grandes clubes, tudo se decide: o desfecho interno e o desfecho europeu de um ano. É nesta altura que, tradicionalmente, o Benfica e os benfiquistas começam a dar sinais de nervosismo crescente. Sinais que este ano não são de nervosismo apenas, mas de verdadeiro pânico: o pânico de falharem mais uma época. Há vários factores objectivos que contribuem para este estado de alarme vermelho:

- a carreira na Champions foi um falhanço total, agravada pelo facto de o FC Porto se manter ainda em prova;

- passou o período em que o Benfica se podia ter adiantado decisivamente ao FC Porto no campeonato, aproveitando o jogo da Luz e os dois meses em que o FC Porto teve de jogar desfalcado de James e Atsu, e o Benfica nada aproveitou, não conquistando um único ponto de avanço que lhe desse alguma margem de folga para o futuro;

- aparentemente, falhou também a tentativa de afastar na secretaria o FC Porto da Taça da I.iga - o tradicional prémio de consolação benfiquista. A perspectiva de poder encerrar a época apenas com a conquista da Taça de Portugal, e quase por sorteio, é um pesadelo;

- como ficou evidente nos últimos jogos, a equipa começa a dar sinais evidentes do cansaço e da desinspiração que a costumam atingir no momento decisivo da época;

- acresce a sensação de que no que toca à valorização de jogadores para venda (o melhor registo de Jorge Jesus nas águias), o Benfica já não dispõe de anéis de valor seguro à vista, em contraste com o FC Porto, que tem, pelo menos, uma meia dúzia de activos ao nível dos 20 milhões para cima, entre Alex Sandro, Mangala, Otamendi, Maicon, João Moutinho, James, Atsu, Jackson Martinez.

Não ganhar o campeonato este ano e ver o FC Porto assinar o tricampeonato seria um desastre de consequências imensas para o Benfica. Se a isto somarmos o péssimo momento em que vai ser necessário renegociar o contrato dos direitos televisivos (numa conjuntura em que, pela primeira vez, nenhuma das três televisões generalistas quis ficar com os jogos da Liga), facilmente se alcança como, de um momento para o outro, os amanhãs que cantavam podem ficar a assobiar baixinho. Daí aos sinais de pânico a distância é curta e mede-se por alguns indícios reveladores:

- a militante entrada em cena da CD da Liga, sempre pronta a acorrer nos momentos de necessidade, e revelada, não só na citada tentativa de afastar administrativamente o FC Porto da Taça da Liga, como ainda em vários outros detalhes, dos quais o mais recente e despudorado foi o castigo de um jogo de suspensão a Cardozo, culpado de ter pontapeado um adversário, com o jogo parado e, a seguir, ter agarrado o árbitro pelo colarinho, só não tendo ido mais avante porque os colegas o seguraram (um interessante precedente disciplinar que, todavia, suponho e espero, não ficará como doutrina mas apenas como excepção adhoc);

- a escolha de João Ferreira (o árbitro expressamente pedido por Vieira a Valentim Loureiro, noutros tempos), para dirigir o Benfica-Porto: o que diriam se, para dirigir o Porto-Benfica da penúltima jornada, fosse nomeado o árbitro preferido de Pinto da Costa?

- uma semana inteira passada a investir contra Pedro Proença, de modo a criar a ideia de que só por culpa dele o Benfica não venceu o Nacional, quando a única coisa de que talvez (talvez...) se possam queixar é da expulsão de Matic... a 30 segundos do fim. Chegaram mesmo ao ponto de pôr na boca de Proença suposta ameaça verbal a Cardozo, cuja testemunha ou testemunhas não foram indicadas.

- a arbitragem do jogo com a Académica: quatro cantos inventados a favor do Benfica; a melhor oportunidade de golo nascida de uma clara falta de Lima, que nem o árbitro nem o auxiliar conseguiram ver; os dois únicos ataques da Académica, por sinal bem perigosos, cautelarmente interrompidos antes do fim por um off-side e falta inexistentes; os cinco minutos de desconto sem cabimento; o penalty salvador ao minuto 90+5, numa disputa de bola em que ambos os jogadores se agarram (foto da página 9 da edição de ontem deste jornal e demais imagens, fotográficas e televisivas).

- as declarações de Jorge Jesus antes e depois do jogo com a Académica, bem reveladoras do ambiente de terror em que ele já vive, por causas externas e pressões internas.

- e, acima de tudo, a intensa e indisfarçada campanha montada pelos jornalistas militantes do Benfica, criando um clima adequado às golpaças e ao branqueamento do que não convém demasiadamente exposto.

Já conheço o ambiente e detecto à légua os seus sinais. Quer dizer que o Benfica, todo o planeta-Benfica, entrou em modo de pânico e lançará mão do que for necessário para evitar a derrota que tanto teme. Mas é justamente nestas alturas, e reagindo ao cerco, que o FC Porto se costuma transcender.

2- Por todas as razões, mas sobretudo por respeito ao que dele conheço, excluo naturalmente Vítor Serpa da criação do ambiente de que acima falei. Mas a sua tese de que Pedro Proença não poderia ser nomeado para um banal jogo de campeonato do Benfica, com o único argumento de que ele é «um árbitro maldito» para o Benfica, apesar de benfiquista assumido, é obviamente insustentável. E não apenas porque Proença é tido actualmente como um dos melhores, se não o melhor árbitro do mundo — o que já seria argumento suficiente para quem defende que os melhores árbitros devem ser chamados à linha da frente. Mas, sobretudo, porque, a valer essa tese, e como já escreveu Rui Moreira, regressamos ao tempos em que os senhores feudais do nosso futebol exercem um direito de veto, ou de escolha, ou de pernada, sobre a nomeação dos árbitros. E, como decerto Vítor Serpa não defende esse direito apenas para o Benfica, terá ele meditado nas consequências do que defendeu?

3- Diferente é, claro, a posição de partida de Fernando Guerra. Num texto aqui escrito, há oito dias, sintomaticamente intitulado « Convergências enigmáticas », Fernando Guerra estafava-se a repisar na tese da perseguição de Proença ao Benfica. E a grande «convergência enigmática» que ele foi de senterrar para tal é o adiamento do jogo do Porto em Setúbal, que tinha Proença como árbitro. Não é original: já outros benfiquistas o defenderam igualmente, mas na sua posição de adeptos apaixonados, que o que querem é ganhar a qualquer preço.

O que eu acho notável é que Fernando Guerra passe alegremente por cima do facto de nesse dia, como foi público e notório, Portugal ter estado debaixo de um temporal extremo, que, inclusivamente, colocou em alerta laranja o distrito de Setúbal, e de o terreno de jogo estar de facto impraticável, tal como foi reconhecido, não só pelo árbitro, como também pelos treinadores e delegados de ambas as equipas, que, de comum acordo, optaram pelo adiamento.

Fazendo tábua rasa de tudo isso, escreve ele que o jogo não se realizou nessa data «porque isso ia ao encontro das conveniências do FC Porto». Não explica porquê, mas também aqui os factos não o ajudam: naquela data, o FC Porto tinha um calendário mais desafogado do que na data de substituição; tinha ao seu dispor Atsu e James, que depois não teve (um, imprevistamente, o outro porque já se sabia que estar no CAN); e não teria de se deslocar duas vezes a Setúbal, mais 800 kms, para disputar o jogo. Porque razão era então mais conveniente o adiamento para o FC Porto? Por uma única razão, que ele destapa quando dá como exemplo um Académica-Porto, no tempo de Villas Boas, disputado, nas palavras do próprio Fernando Guerra, «num autêntico pantanal» . É, pois, isso que ele acha que também devia ter sido feito em Setúbal. Eu, por acaso, dediquei aqui um texto às condições, jamais vistas, em que foi disputado esse jogo, e (mesmo depois da vitória do FC Porto) escrevi que ele só foi até ao fim, arriscando a integridade dos jogadores e sem nada ter que ver com um jogo de futebol, porque o que se pretendia era exactamente que o FC Porto não tivesse condições para jogar. O árbitro chamava-se Bruno Paixão... e está tudo dito. Les beaux esprits se rencontrent...

4- Para logo à noite, só peço duas coisas à partida: que o Varela fique no banco e que o Helton não abra a capoeira.

sexta-feira, junho 07, 2013

O GRANDE ADVERSÁRIO PORTISTA (12 FEVEREIRO 2013)

1- Uma enorme manchado azul dominando a primeira página deste jornal, sexta-feira passada, chamou-me desde logo a atenção: uma manchete gigantesca sobre o FC Porto na A Bola? E a propósito de quê, se a equipa nem sequer tinha actuado na véspera? Fui ler e percebi tudo: afinal, a notícia não era para os portistas, mas sim para os benfiquistas. «FC Porto fora da Taça da Liga» era o título garrafal que deve ter enchido de júbilo os leitores benfiquistas deste jornal. Antes de mergulhar na leitura de arrevesado jurídico que sustentava tal título, detive-me a pensar no sentido mais profundo da coisa: FC Porto e Benfica são, desde há vários anos, os dois únicos emblemas que em Portugal se batem por títulos, numa competição a dois que perderia todo o sentido se um deles fosse afastado por meios não desportivos. Acreditem ou não, não me vejo a retirar qualquer prazer de vencer o Benfica na secretaria. Mas parece que o desconforto não é mútuo: com a inestimável colaboração do maior adversário interno do FC Porto, que é a Comissão Disciplinar da Liga de Clubes, esta é a terceira tentativa, feita pelo CD e saudada pelos benfiquistas, para retirar administrativamente o FC Porto de competições: tentaram roubar-lhe os pontos suficientes para perder na secretaria um campeonato brilhantemente ganho em campo; tentaram afastá-lo, em benefício de Guimarães e Benfica, de um lugar na Champions ganho por mérito próprio; e agora tentam afastá-lo da Taça da I.iga, esse couto reservado do Benfica. E isto para não falar da outra operação, mais sofisticada, para retirar o Hulk e o Sapunaru da competição o tempo suficiente para o Benfica assegurar o título de campeão. Parece que, afastado o FC Porto, o principal rival, os benfiquistas ficarão satisfeitos por poderem ganhar assim. Estranho... estranha forma de entender a competição e o desportivismo.

Estava já toda a operação jurídica montada, a pretexto de terem faltado quinze minutos às 72 horas alegadamente exigíveis de intervalo entre um jogo do FC Porto B na liga de Honra e outro do FC Porto. Simplesmente, na Taça da Liga, em que três jogadores actuaram em ambos os encontros, quando se descobre que Benfica, Sporting e Marítimo também estavam envolvidos em supostas infracções idênticas. Porém, recebida a denúncia quanto ao Benfica numa quarta-feira, já na quinta-feira o CD a tinha mandado arquivar.

Parece que há uma diferença substancial entre utilizar jogadores num jogo da Liga de Honra, seguido de um jogo da Taça da Liga, ou utilizar jogadores no campeonato da Liga, seguido de um jogo na Taça da Liga. Muito gostaria que os defensores encartados do Benfica citassem a disposição concreta dos regulamentos da Taça da Liga onde esteja escrito que só no primeiro caso, e não no segundo, é exigível o tal intervalo de 72 horas. Seria muito estranho que tal discriminação existisse porque ela não faria o mais pequeno sentido: se o que se pretende é defender o descanso dos jogadores, não se entende que só funcione para umas competições e não para outras; se o que se pretende é defender a competitividade do campeonato da Liga de Honra, evitando que jogadores alinhem pela primeira equipa e logo depois vão fazer uma perninha à equipa B, então para isso era necessário que o jogo da Liga de Honra viesse depois, e não antes, do jogo da Taça da Liga o que não foi o caso com o FC Porto. Enfim, mesmo conhecendo sobejamente a imaginação jurídica que o CD da Liga sempre consegue descobrir no seu afã anti-portista, estava difícil de ver como iriam conseguir impingir a sua doutrina a alguém mais que o José Manuel Delgado.

E estavam já eles a cantar vitória, estava já o Sílvio Cervan a referir-se à vitória administrativa do V. Setúbal por 3-0 no Dragão para a Taça da Liga, como se de uma vitória no terreno de jogo se tratasse, quando começam a circular notícias de que a doutrina do CD da Liga não iria encontrar acolhimento na Federação: um problema chato no horizonte. Mas eis que uma alma justiceira resolve assaltar a sede da Federação e roubar nada mais do que os computadores pessoais do presidente e da sua secretária. Segundo a opinião insuspeita de José Manuel Delgado, uma das explicações para o móbil do assalto pode ter sido exactamente o roubo da acta da reunião do CD da Federação, «onde foi feita tábua rasa das conclusões» do CD da Liga. Com tanta informação privilegiada, só me resta acreditar. Mas, socorrendo-me da minha própria experiência, quando me assaltaram a casa para roubarem também e apenas o computador pessoal (e eu sei quem, para quê e porquê), posso afiançar ao Dr. Fernando Gomes que é garantido que a PJ e a PSP nada descobrirão. Quando o crime já atinge um nível sofisticado em que não se deslinda com escutas, eles não chegam lá.

2- Subitamente, começamos a realizar que é muito possível que esta nossa triste Selecção não esteja no Mundial do Brasil. Há ali jogadores que já passaram o prazo de validade, outros que não se dão a serviços mínimos e outros que nem eles sabem porque lá estão. Entretanto, julgo que a Federação e Paulo Bento fariam bem em poupar-nos a mais destes desoladores jogos de preparação em que não se prepara coisa alguma e apenas servem para afastar o público e aumentar a descrença.

3- O Benfica vai, obviamente, lançar para cima dos ombros de Pedro Proença a responsabilidade pelo semi desaire da Choupana. E, se é certo, que a televisão não mostra as razões da expulsão de Matic, ela só deixou o Benfica em inferioridade numérica vinte segundos — o que parece pouco para tanta indignação. Diferente teria sido se Proença se tem decidido por um penalty a favor do Nacional, quando misteriosamente, Keita, acossado por Luisão, em vez de encostar para o golo, acabou estatelado no chão: muitos árbitros teriam marcado penalty e expulsão e havia 2-2 no marcador... Acho que o Benfica se pode queixar, sim, do terreno de dimensões mínimas e do estado do relvado , uma e outra coisa impedindo as melhores equipas de poder montar o seu futebol. Mas isso, infelizmente, é uma das imagens de marca do nosso campeonato e não apenas no terreno das pequenas equipas: Alvalade parece uma chapa ondulada e mesmo o relvado do Dragão, outrora motivo de orgulho para todos os portistas e uma preciosa ajuda ao futebol da equipa, é hoje um areal seco o irregular, fruto dos tais concertos rock que Pinto da costa tinha jurado nunca autorizar (e já está um marcado para assim que acabe o campeonato).

Já Vítor Pereira, pode queixar-se da sorte, mas também do dia desastrado de jogadores como Danilo, Fernando, Lucho; de uma equipa que tem de atacar sem extremos, visto que Izmailov foge ostensivamente de um lugar que não conhece e não quer conhecer e, do outro lado, joga o confrange dor Silvestre Varela, que Vítor Pereira protege para além do que a minha inteligência consegue entender.

Ainda bem que Jackson falhou o penalty, pois era mais um desses penalties a que não me conformo, de bola na mão. Penalty verdadeiro aconteceu sim no penúltimo minuto, de Maurício sobre Mangala: mas, quando se marca o penalty errado...

4- Se a memória me não falha, o Sporting teve já os seguintes candidatos, anunciados ou confirmados, à presidência: Paiva dos Santos (João e Paulo), Carlos Monjardino, Jorge Coelho, José Maria Ricciardi, Pedro Baltazar, Bruno de Carvalho, Dias Ferreira, José Couceiro, José Eduardo, Carlos Severino, Hermínio Loureiro, Galvão Teles (um deles), Zeferino Boal e Luís Figo. São quinze, quase todos empresários ou gestores, todos já em contactos com a banca e conversas com potenciais investidores e todos apostados num novo Sporting. Só um clube rico, ou um clube à deriva, consegue reunir tanta gente voluntária para tomar conta dele. Há quinze candidatos à presidência, mas só há um jogador verdadeiramente bom na equipa principal de futebol, que se chama Rui Patrício. Talvez esteja aí parte da razão de tantos males e tantos salvadores.

quinta-feira, junho 06, 2013

SHOW DE BOLA É ISTO! (5 FEVEREIRO 2013)

1- Sem que eu saiba explicar bem porque razão, o Vitória de Guimarães sempre foi um dos meus clubes preferidos: talvez pela cidade, talvez pelas tradições do clube no futebol português, talvez pela sua apaixonada legião de fiéis. Para além disso, o Vitória Sport Clube era tradicionalmente um clube amigo do FC Porto. Mas um amigo no bom sentido: sem subserviência de um lado e sem abuso de posição dominante, do outro. Eram dois clubes com uma identidade e matriz própria que, apesar das diferentes dimensões clubísticas, sempre se respeitaram mutuamente. Tudo isso terminou há uns anos atrás, quando a direcção de então do Vitória tomou a decisão estratégica de se aliar à coligação Ministério Público/Benfica/ Comissão Disciplinar da Liga para, com os fanados e falhados pretextos do Apito Dourado, tentarem ambos, Benfica e Vitória, conquistar por baixo da mesa o lugar que o FC Porto havia ganho na Champions de pleno e brilhante direito no terreno de jogo. Arrastado pelo Benfica, seduzido por uma fácil conquista de secretaria, o Vitória colocou assim em jogo grande parte do prestígio ganho em décadas de esforço e mérito. E o apoio que o arrogante Platini, de tudo desinformado, veio dar aos dois clubes portugueses mancomunados pelo interesse e pela inveja, mais fez crer à direcção do Vitória que aquela era uma disputa destinada ao sucesso e, para mais, em nome de um louvável propósito.

Mas os sucessos rápidos e fora do campo do mérito raramente se consumam. Aconteceu que o Apito Dourado foi cilindrado nos tribunais, para extrema humilhação do Ministério Público; o FC Porto continuou a ganhar regularmente e o senhor Platini ainda teve de se submeter ao sacrifício de entregar pessoalmente uma taça da Liga Europa ao tal clube que só ganhava com batota; o Benfica continuou a marchar atrás do FC Porto, em Portugal e além fronteiras; e agora Michel Platini tem de se defender das graves acusações da France Football de que foi corrompido para atribuir o Mundial ao Catar. Quanto ao Vitória de Guimarães, passada a euforia de se julgar associado aos futuros êxitos do Benfica, com direito a duas ou três edições de uma fantochada já extinta chamada Troféu Amizade, a dita amizade em nada se traduziu de útil: teve até de descer ao inferno da 2ª Divisão, antes de regressar ao lugar que é seu e conquistar uma presença no Jamor para disputar uma final da Taça, em que, pese a uma arbitragem amiga, foi esmagado por 6-2... pelo FC Porto. Não há dúvida que, existindo Deus, uma das suas características certas é a de que não dorme em serviço.

Estranhamente, porém, o que resultou para os vitorianos dessa inútil e humilhante vassalagem ao Benfica foi um remanescente ódio ao FC Porto - que, nessa triste história, foi sempre o atacado e nunca o agressor. Se o Vitória não retirou a mais pequena vantagem, antes pelo contrário, da sua submissão ao grande clube de Lisboa (ou ao clube grande de Lisboa), a reacção foi a de se virar contra o mensageiro e não contra a mensagem. E assim, na noite de sábado passado, o FC Porto lá voltou a ser recebido em Guimarães com um ódio que, extravasando das bancadas para o campo, mais uma vez apenas conseguiu produzir o efeito contrário ao pretendido. Porque Deus continua sem dormir, o Vitória sofreu, este sábado e às mãos dos portistas, uma tareia de futebol que só não atingiu o ponto da humilhação porque naquele balneário azul também se transmitem memórias de amizades antigas. Um Vitória em clara ascensão, que vinha de uma série de jogos sem derrota e que só não tinha ganho em Alvalade na última jornada porque o árbitro fez vista grossa a um descarado penalty ao cair do pano (obviamente silenciado pela legião de sportinguistas que, ao menor pretexto, saltam em cima dos árbitros), foi literalmente cilindrado pelo FC Porto e a única oportunidade de golo de que dispôs em 90 minutos resultou de uma daquelas tremedeiras à Helton (de quem o jornal espanhol As dizia esta semana ser o único ponto vulnerável do FC Porto).

Em Guimarães, o FC Porto, mesmo sem James e sem Atsu, fez o jogo perfeito, do primeiro ao último minuto. Não foi apenas o melhor jogo do FC Porto neste campeonato - foi, apesar do seu sentido único, o melhor jogo deste campeonato. Mais do que aquilo não é possível ver por aqui. Como equipa, como futebol encadeado e pensado, jogado com imaginação e velocidade, foi topo de gama, aqui e em qualquer lugar. E com exibições individuais superlativas, como as de Mangala, Danilo, Alex Sandro, Moutinho, Martinez. Até Izmailov mostrou utilidade prometedora e até, caramba, até Varela conseguiu jogar bem e fazer aquilo que há 17 jornadas se esperava que um dia fizesse: um cruzamento que resultou em assistência para golo! E inacreditável pensar como Mangala, aproveitando a lesão de Maicon, conseguiu roubar-lhe o lugar, coisa absolutamente impensável há dois meses atrás. Fantástico como Alex Sandro consegue fazer esquecer Alvaro Pereira (só não é melhor que ele nos cruzamentos). Inacreditável como é que Jackson Martinez (de cuja compra desconfiei, não por ele, que não conhecia, mas pelo preço pago por um quase desconhecido de um desconhecido clube mexicano), consegue entrar melhor na equipa do que Falcão. Jackson é um jogador de área completo — na técnica individual, na capacidade de jogo lateral com a equipa, no poder de elevação e qualidade do jogo de cabeça, na imaginação a finalizar e na humildade que demonstra. Eu tiro o chapéu à equipa de scouting do FC Porto que conseguiu, em cinco anos anos, reunir no clube toda a frente de ataque da Selecção da Colômbia: Jackson, Falcão, James.

Depois de Guimarães, fiquei bem mais confiante e entusiasmado. Nos últimos anos, o jogo de Guimarães tem calhado quase sempre na segunda volta do campeonato e, sempre que lá ganhamos, somos campeões. Mas, apesar de tudo, desespero e sofro para que o departamento médico do Porto nos devolva rapidamente o James, igual ao que sempre foi. Porque, quanto ao Atsu, só resta ir esperando: o Gana segue em frente na CAN e com a sua ajuda, que tanta falta também nos faz.

2- Antes de enfrentar o Paços de Ferreira na meia final da Taça, a meio da semana, o Benfica fez saber do seu interesse em dois centro-campistas do Paços, em especial Vítor. E uma jogada psicológica que se vai tornando um clássico no clube que tanto amor à verdade desportiva derrama. Há dois anos atrás, no próprio dia em que recebia o Olhanense, também para um jogo da Taça, estes desportistas chegaram ao desplante de lhes comprar de manhã o melhor central dos algarvios, Jardel - cujo contrato de compra, celebrado de manhã, implicou que ele já não jogasse à noite pelo Olhanense, apesar de ter mais uns meses de contrato a cumprir com os algarvios. Desta vez, a coisa não foi tão longe — por falta de tempo ou porque era bluff. Mas o rapaz, talvez motivado para se despedir em grande do Paços ou para convencer de vez o seu eventual futuro patrão, tanto entusiasmo pôs numa disputa de bola, que recebeu o vermelho directo e assim, involuntariamente é claro, tornou as coisas mais fáceis para o grande clube de Lisboa ou clube grande de Lisboa. E claro que, fosse ele já benfiquista, como André Gomes, e o árbitro perdoar-lhe-ia, sem sequer lhe mostrar um amarelo, não uma, mas duas entradas semelhantes -como se viu no jogo de domingo, entre Benfica e Vitória de Setúbal. Não joga à Maxi Pereira quem quer, mas quem pode. Uma lição para o jovem Vítor.

quarta-feira, junho 05, 2013

QUINZE MINUTOS DE JUSTIÇA (29 JANEIRO 2013)

1- O furo jornalístico revelado por A BOLA, com honras de manchete na primeira página, de que o FC Porto tinha utilizado irregularmente três jogadores contra o Setúbal, no último jogo da Taça da Liga, vai redundar num mau serviço prestado ao futebol. Vejamos:

De facto, não há dúvida de que três jogadores da equipa B do FC Porto disputaram com um intervalo de 71 horas e 45 minutos um jogo do campeonato da Liga de Honra e outro da Taça da Liga. E não há dúvida de que os regulamentos desta última (que não coincidem neste ponto com os regulamentos das outras competições) exigem um intervalo mínimo de 72 horas. Logo, e por quinze minutos de diferença, o FC Porto infringiu a lei e será condenado a perder os pontos suficientes para ser afastado compulsivamente das meias-finais da Taça da Liga, para que se apurara em campo. Tem sido evidente o júbilo com que os comentadores benfiquistas se apoderaram do assunto para nele verem uma prova de que, afinal, a tão falada organização profissional do FC Porto não é assim tão profissional. E há ate quem veja mais longe: num programa televisivo, perguntava-se aos espectadores, por telefone, se o erro não teria sido mesmo voluntariamente cometido pelo FC Porto — presume-se que para escapar, via secretaria, ao previsível confronto com o Benfica na final da Taça da Liga. Está assim definido o crime: suicídio; encontrado o criminoso: o suicida; e desvendado o móbil: medo de viver.

Mas, se pararmos para pensar um pouco, há várias coisas neste caso que destoam da tese do crime perfeito: primeiro, que os regulamentos não sejam iguais em todas as competições, de forma a evitar confusões ou distracções; segundo, que, tendo o FC Porto solicitado à Liga a marcação do segundo jogo para as 20.15, como vem sendo habitual, a Liga tenha antes marcado o jogo para a absurda hora de 17.30 de um dia de semana (fosse às 17.45 e já não haveria caso...); terceiro, que todos os auto-proclamados defensores da verdade desportiva deviam incomodar-se é quando a Liga obriga a disputar um decisivo Benfica-Porto, sabendo que 48 e até 24 antes, alguns jogadores determinantes na equipa portista teriam estado ao serviço das respectivas selecções cm jogos no estrangeiro e mesmo noutro continente; quarto, que resolver assim a questão das meias-finais da Taça da Liga, afastando, num preciosismo de zelo administrativo, um dos dois principais candidatos, não contribui muito para o prestígio de uma competição jovem e já bastante abalada por outros casos.

Sem o FC Porto na lula, o que resta disputar da Taça da Liga perde grande parte do seu interesse. Ou talvez não, depende da perspectiva: se o interesse é, sobretudo, o de ver o Benfica juntar mais um titulo ao acumulado histórico disputado taco-a-taco com o FC Porto, então, compreende-se. Assim como terá de se compreender se o FC Porto resolver, pura e simplesmenle, deixar de disputar a Taça da Liga. Foi, em parte, por jogadas destas, que o clube desistiu do basquete.

A lei é dura mas é igual para todos — dirão. Sim, eu sei, já ouvi essa ladainha a propósito da emboscada montada ao Hulk e ao Sapunaru no túnel da Luz. Eu sei que a lei é inflexível, eu estudei leis. Mas, por isso mesmo também, sei que a especialidade dos nossos legisladores é fazerem leis ambíguas cuja aplicação fica depois à interpretação flutuante das instâncias de julgamento. Veja-se o caso da lei que proíbe os autarcas de desempenharem mais do que três mandatos consecutivos: está redigida de forma tal, que ninguém pode jurar que a intenção do legislador foi a de o proibir apenas na mesma autarquia ou em qualquer uma. Trata-se de uma ambiguidade muito conveniente agora, pois que a interpretação benigna da lei permite as candidaturas de Luís Filipe Menezes no Porto e Fernando Seara em Lisboa, ambas patrocinadas pelo PSD. E, todavia, está aí, activíssimo, o homem que redigiu essa lei: chama-se Paulo Rangel e é deputado europeu pelo PSD. Porque razão ninguém lhe pergunta qual era a intenção legisladora dele?

Sim, eu sei que a lei é inflexível e igual para todos. Mas é também por saber que o futebol tem a pior legislação e os piores juristas ao seu serviço, que defendo uma justiça desportiva fundada, não apenas na lei, mas também na equidade. De uma coisa, pelo menos, os meus leitores ficaram certos: eu queria ver o FC Porto disputar até ao fim esta edição da Taça da Liga. Mesmo com todas as limitações actuais da equipa e com o transtorno que isso lhe iria causar noutras frentes, eu queria vê-la ir até ao fim na competição. Mas já percebi que há quem não queira. Por quinze minutos de justiça.

2- Também esperei por quinze minutos finais de justiça no Braga-Benfica, mas eles não chegaram. Ainda esteve perto de acontecer, mas duas decisões erradas da arbitragem (a expulsão do central Haas, do Braga, e um fora dc jogo mal assinalado a uma fuga prometedora de João Pedro), tornaram impossível o que já de si não era provável. Ficou a injustiça de um jogo em que o Benfica nunca esteve por cima e nunca mereceu ganhar e onde, também, de meia oportunidade fez dois golos — dois golos oferecidos por Beto, que é um bom guarda-redes, com o defeito de ter tendência a falhar nos jogos mais importantes. Mas, quando tanto se fala no «futebol artístico» do Benfica e no «resultadismo» do FC Porto (que eu subscrevo, em parte), foi curioso ver o Benfica passar toda a segunda parte encolhido atrás, defendendo com dez, perdendo tempo em simulações e reposições de bola e festejando o triunfo como se esse valesse já o campeonato.

3- Ainda sobre justiça e a propósito das duas expulsões de setubalenses no desafio em atraso contra o FC Porto, que tanta indignação causaram a José Mota e ao presidente setubalense: considero-as duas expulsões exemplares e, queira ou não José Mota, é assim que se arbitra ao mais alto nível e é por isso que Pedro Proença chegou ao topo do mais alto nível. A primeira expulsão é de um jogador (Bruno Galo) que, acabado de entrar, tem um pontapé por trás ao tendão de Aquiles de Moutinho: não foi para cortar a jogada, foi para aleijar, e a única discussão possível é se era amarelo ou vermelho directo. Se, um minuto volvido o mesmo jogador volta a ter uma entrada descontrolada sobre um adversário, é óbvio que não entrou para jogar futebol e só pode ser enviado de volta para a cabine. A segunda expulsão, de Jorginho, por segundo amarelo, é ainda mais exemplar: salta a uma bola na área a que não chega c aproveita a proximidade de um adversário nas suas costas para se atirar para o chão agarrado à cara, fazendo o número de procurar sangue no nariz, tudo para simular uma cotovelada que não recebeu. Ou seja,quis fazer batota grosseira e, se o tem conseguido, com o resultado ainda em 0-1, poderia ter mudado o desfecho do jogo. Sinceramente, não vejo a diferença entre isto e um ciclista que se droga para ganhar uma corrida. Eu sei que treinadores como José Mota lutam com armas absolutamente desiguais, que enfrentam problemas de que os adeptos nem suspeitam e que, quando jogam contra os grandes, só lhes resta tentar o impossível. Mas isso não os dispensa de também terem uma obrigação para com a verdade e para com o jogo.

4- 0 massacre infligido pelo FC Porto ao Gil Vicente, na primeira parte do jogo da noite passada, confirma que este é um dos mais desequilibrados campeonatos de sempre: há um campeonato disputado a dois entre Porto e Benfica; um outro disputado a solo pelo Braga; e longe, muito longe, treze equipas que pouco ou nada influem nas contas finais. Foi o melhor e o mais tranquilo jogo do FC Porto neste longo período de transição até voltar a poder jogar com dois extremos de verdade. Um único senão: foi jogo para sete ou oito.

terça-feira, junho 04, 2013

CONSISTÊNCIA: VIRTUDES E FRAQUEZAS (22 JANEIRO 2012)

1- Nas palavras de Vítor Pereira, o FC Porto fez um jogo «consistente» contra o Paços de Ferreira. O Dicionário de Língua Portuguesa da Porto Editora ajuda-nos a perceber exactamente o que quis dizer o treinador portista: por «consistente» entende-se aquilo que é sólido, credível, estável. De facto e olhando o jogo, vencer por 2-0 é credível, sem que o adversário crie uma ocasião de golo é sólido e sem grandes sobressaltos é estável. E, todavia... E, todavia, essa consistência tão cara a Vítor Pereira é uma moeda de duas faces. Na face vista na Luz, ela resultou na melhor estratégia aplicável ao adversário e na melhor tendo em conta os condicionalismos próprios (ausências de James e Atsu). A estratégia de posse de bola, domínio do meio-campo e solidez defensiva, manietou o futebol de cavalgada do Benfica e produziu um jogo em que o empate foi o me- nor dos benefícios colhidos. Mas é forçoso reconhecer que, como dizia um benfiquista, o FC Porto de meia oportunidade fez dois golos embora o Benfica, recheado de soluções ofensivas alternativas, só tenha tido mais uma oportunidade.

Mas, para receber em casa um Paços de Ferreira, que de antemão se sabia que iria jogar fechado e organizado atrás, é óbvio que a mesma estratégia de «consistência» arriscava-se a produzir o que se viu: um jogo tão lento, tão aborrecido, tão falho de interesse que às tantas a câmara da televisão até surpreendeu um jogador do Paços bocejando de sono. E um jogo que o FC Porto só desatou e venceu graças a um pontapé feliz e à total ausência de capacidade ofensiva do adversário.

Acho que, apesar de qualquer um perspectivar um jogo em tudo diferente do da Luz, também cada um de nós, conhecendo o treinador portista, era capaz de adivinhar que ele nada iria mudar em relação ao jogo com o Benfica nem a estratégia nem os seus intervenientes. E assim foi: reincidiu na aposta, já provadamente falhada, de Defour a extremo-direito e, claro, reincidiu na aposta eternamente falhada de Varela. Não por acaso, foi quando os tirou que os seus substitutos mataram o jogo um na assistência, outro no remate.

De uma semana para a outra, Vítor Pereira mostrou o seu melhor e as suas limitações. É bom a dar a tal «consistência» à equipa; é mau a dar-lhe criatividade, a correr riscos necessários, a apostar e a desamarrar os jogadores de desequilíbrio. Com ele à frente, James teve de esperar meia época para conquistar a titularidade a Varela e a Cristian Rodriguez, apesar de ter vindo de uma época, com Vilas Boas, em que fora já o melhor ou um dos melhores da equipa. Com ele, Atsu, Kelvin, Iturbe, Sebá e Tozé esperam e esperarão indefinidamente que o treinador lhes dê um décimo das oportunidades que têm jogadores «consistentes» como, por exemplo, Defour e Varela. Ao contrário de Jorge Jesus no Benfica, Vítor Pereira é um destruidor de talentos no berço.

2- Ao FC Porto chegou agora um reforço que, pelo que já se viu, deve também fazer parte da categoria dos «jogadores consistentes», tão do agrado de Vítor Pereira: Izmailov. O golo que marcou ao Paços de Ferreira é uma certidão de vida que lhe vai valer grande protagonismo sem grande esforço. Eu confesso que não percebo os elogios que choveram: o golo é de oportunidade e boa execução técnica, que é uma qualidade que todos lhe reconhecem. Mas é também um golo à Varela, isto é, resultante de um momento de sorte e de indisciplina táctica, abandonando o lugar e as funções no jogo que lhe cabiam para vir vaguear dentro da área, à espera de uma bola sobrante que lhe permita, facturando, disfarçar tudo o resto. E o resto, no caso de Izmailov, foi um quarto de hora contra o Benfica e uma meia hora contra o Paços em que se mostrou absolutamente fora do jogo e sem a mais pequena possibilidade de dispor da velocidade e do arranque para uma função de extremo. Mas marcou, está desculpado.

Porém há coisas, neste reforço que me dão que pensar e baixar as expectativas. Não falando já do seu longo historial de indisponibilidade ao serviço do Sporting, faz-me confusão, por exemplo, que, ao fim de cinco anos em Portugal, não seja capaz de pronunciar uma palavra em português e se exprima por uns vagos sussurros em suposto inglês. Depois, custa-me aceitar que um atleta de alta competição, que deve ganhar uns 75 a 100 mil euros/mês (25 a 30 vezes o ordenado médio em Portugal), ao fim de duas semanas de treino e apenas meia hora de jogo, disputado a passo, não tenha pudor em queixar-se, uma, duas, três vezes, do grande cansaço que sente, como se fosse suposto termos pena dele. Que o FC Porto precisava de um reforço no meio campo ofensivo, concordo; que tenha vindo a custo zero é excelente; que seja este, já tenho bem maiores dúvidas.

3- Por razões profissionais, escrevo antes do jogo do Benfica em Moreira de Cónegos. Gostaria de pensar que há uma hipótese de o Benfica perder pontos, mas não acredito nela. Apenas espero do Moreirense que não entregue o jogo tão rapidamente e tão displicentemente como o fez a Académica, na quinta-feira. Há muito que não via uma equipa entregar-se tão galhardamente, para mais quando defendia um título e jogando perante o seu público. Depois admirem-se se ele não comparece à chamada, como sucedeu quinta-feira.

4- Provisoriamente reduzido a dois centrais disponíveis antes de receber o Benfica, no domingo que vem, o Sporting de Braga viu um deles ser expulso, já nos descontos e por falta duvidosa e que, reza toda a critica, a existir, jamais daria direito a um vermelho directo. Segundo o presidente do Braga, que classificou a arbitragem como «dos tempos de Calabole», o «árbitro andou todo o jogo a tentar expulsar quem tinha de expulsar». É uma acusação muito grave que, na parte substancial, vai acabar diluída na atmosfera e, na parte formal, vai acabar com suspensão de trinta dias e multa de mil euros a António Salvador.

5- Espicaçado pelas abundantes notícias acerca da ressurreição súbita do Sporting, lá me dei ao trabalho de ver o jogo contra o Beira Mar. E o que vi serviu-me para confirmar que há uma profunda divergência de opinião entre mim e os sportinguistas: onde eles acham que a crise é inexplicável face ao grande grupo de futebolistas de qualidade de que dispõem, eu acho justamente o contrário que a crise, tendo várias origens e razões, se explica sobretudo pela absoluta falta de qualidade da equipa. Tirando Rui Patrício e a promessa mal aproveitada de Carrillo, não há ali um jogador verdadeiramente de qualidade. Evidente e constante. É só uma opinião, que espero que não me levem a mal.

6- Como tantos outros que já fo escreveram, tambem eu assisti à morte de um dos meus ídolos, com as con-fissões de Armstrong a Oprah. Mas, de facto, não sei por que razão criámos ilusões: de há muito que é sabido que o ciclismo é um desporto quimicamente viciado, de alto a baixo. Pessoalmente, perdi as ilusões há muitos anos, quando li aqui uma entrevista de Carlos Miranda a Joaquim Agostinho, em que este, sempre negando a justiça dos dois controlos positivos em que fora apanhado, acabava, contudo, por se descair: «Mas não esperam, com certeza, que um homem suba o Alpe d'Huez só com eau d´Évian e bife grelhado!».

Armstrong foi um mito que a imprensa alimentou e deixou que crescesse, mesmo sabendo que, como ele diz, fez o mesmo que todo o pelotão do Tom de France fazia e faz. E tanto assim é que se os sete triunfos de Armstrong no Tour ficaram agora desertos de titular é porque todos sabem que os segundos, terceiros ou quartos classificados estavam tão limpos como ele. O ciclismo profissional, pese ao espectáculo que é, à tradição que carrega ou às espectaculares coberturas televisivas do Tour, está morto e enterrado. Podemos é continuar a fingir que aquilo é coisa séria.

segunda-feira, junho 03, 2013

O HOMEM DO JOGO (15 JANEIRO 2013)

1- O homem do jogo foi Vítor Pereira. Antes, durante e depois do jogo, ele esteve sempre por cima e fez com que o derby fosse disputado ao ritmo por si escolhido.

Antes do jogo, porque, não deixando de elogiar Jorge Jesus e o futebol jogado pelo Benfica (uma raridade nas relações entre ambos os clubes), respondeu à letra às provocãçõezinhas do treinador benfiquista («somos a única equipe que está em todas as competições»), lembrando que na Champions, que é a mais importante, já não estão. E podia ter acrescentado que é fácil continuar na Taça quando se joga em casa com equipas da terceira divisão, mas é bem mais difícil quando se joga a eliminatória, a uma só mão, no terreno do Nacional e do Braga, num jogo em que foi necessário fazer poupanças forçadas. Também lembrou que uma coisa é o favoritismo habitualmente atribuído ao Benfica nestes jogos, outra é o desfecho, habitualmente favorável ao FC Porto. E, sobretudo, em nenhum momento Vítor Pereira lamentou a ausência de um jogador fundamental como James Rodriguez, agravada ainda pelas ausências de Atsu e Iturbe — em contraste com Jorge Jesus, que, com aquele desvelo pela verdade desportiva que já o levara a elogiar o «jogo de igual para igual» com o Barcelona (como se fosse igual jogar contra o Barcelona A ou a reserva), tambem declarara catedraticamente que para o FC Porlo era exactamente o mesmo jogar com o James ou sem ele (como se viu na época passada...).

Durante o jogo, Vítor Pereira deu uma banhada táctica em Jorge Jesus. Susteve no meio-campo a cavalgada frenética do ataque benfiquista, mostrando que ali estava um adversário bem mais difícil do que o habitual. E, sem James nem Atsu para abrirem jogo para Jackson Martinez, com dois ocasionais extremos absolutamente inofensivos (Varela e Defour), apostou nas diagonais em aberturas rápidas pelo centro da defesa do Benfica — que só não produziram resultados mortais porque houve um juiz-de-linha que se encarregou do papel de quinto defesa benfiquista. Eu, que me gabo de perceber logo de entrada como vai correr um jogo ao FC Porto, a partir da atitude dos jogadores logo de início, aos 5 minutos já tinha concluído que, em condições normais, aquele jogo não ia ser perdido e, muito provavelmente, iria ser ganho. De facto, só aos 76 minutos, quando uma distracção na defesa em linha permitiu a Cardozo isolar-se perante Helton, é que o Benfica esteve perto de po- der ganhar o jogo. De resto, apenas reagiu bem a uma entrada de dragão, que rapidamente espalhou o temor e a ansiedade pelas bancadas da Luz. Colocando-se na frente por duas vezes e, logo no início do jogo, o FC Porto mostrou ao que vinha e condicionou a confiança benfiquista até final. Seguríssimo atrás (com excepção da retribuição de Helton ao frango de Artur), com Alex Sandro e Mangala imperiais, muilo bem acompanhados por Danilo e Fernando, a defesa portista apenas se mostrou vulnerável nessa jogada de Cardozo e no extraordinário golo de Matic, que é daqueles que não dá para prever nem para evitar. De resto, e não obstante uma noite pouco inspirada de Moutinho e Lucho, o FC Porto ganhou sempre a batalha de meio-campo, apesar de fustigado com faltas inexistentes de cada vez que um benfiquista era desarmado, e a que Jorge Jesus preferiu chamar «faltas técnicas». Onde as coisas falharam, como era de prever, foi no ataque pelos flancos. E eu,de facto, só não dou à performance de Vítor Pereira a nota máxima, porque continuo a não entender a sua fixação em Varela. Com toda a franqueza, pergunto-me se ele não terá um vídeo em que reveja os jogos e em que se dê ao trabalho de ir notando as vezes, em cada jogo, em que Varela tem um bom passe a rasgar, um bom centro, uma finta bem sucedida, um remate perigoso, um sprint ganho a um defesa, uma ajuda decisiva atrás ou, vá lá, em que não perca de imediato a bola para um adversário. Anteontem na Luz, isso sucedeu zero vezes — o que está dentro da média. E, se Defour, visivelmente, não é extremo nem grande jogador, no banco estavam Kelvin e Sebá, que tem, pelo menos, a vantagem de serem jovens, com mais talento à vista e muito mais vontade de mostrar serviço. E pena esta obsessão de Vítor Pereira, porque muitas vezes, como anteontem, a equipe está, de facto, a jogar com dez. E assim é mais difícil.

E, depois de oito meses a ouvir falar até à náusea do golo de Maicon em off-side (esquecendo os erros que favoreceram o Benfica nesse jogo, como o livre inexistente que lhe deu o segundo golo), Vítor Pereira esteve muitíssimo bem, no final do derby de domingo, optando por não calar a sua revolta com o que todos viram. Porque isto de os benfiquistas declararem que a arbitragem foi boa e passa-se adiante, como se a opinião deles fizesse doutrina, é chão que já deu uvas. Houve quatro off-sides mal tirados ao ataque portista três dos quais, começando logo pelo primeiro minuto de jogo, evitaram situações de jogador isolado frente ao guarda-redes. Se isto são erros «sem influência no resultado», estamos conversados... Como disse o treinador portista, não vale a pena passar a semana a treinar jogadas de ruptura no ataque se depois um juiz-de-linha, provavelmente tolhido pelo medo e pela responsabilidade, opta sistematicamente pela opção mais fácil.

Mas foi sobretudo na análise ao trabalho disciplinar do árbitro que Vítor Pereira esteve à altura daquilo que se exige a um treinador do FC Porto. Em relação a Matic, toda a gente viu o mesmo que João Ferreira e toda gente que conhece as regras do futebol sabe que aquilo é amarelo, sem desculpa: se João Ferreira o não mostrou, seguido de vermelho, foi apenas porque não quis. Em relação a Maxi Pereira, a história foi a habitual: algumas faltas maldosas no primeiro tempo, uma entrada ao corpo de Defour quando este ia para a área em boa posição, aos 58 minutos (sem falta assinalada nem amarelo), seguida, dois minutos depois, por uma cotovelada em Mangala, junto à lateral, numa das suas entradas características (e de novo sem falta nem cartão). E, finalmente, aquela entrada de kick-boxing sobre João Moutinho que, em qualquer lugar do mundo onde o futebol é apreciado, terminava com a sua imediata expulsão para os balneários. Mas finalmente alguém disse alto e bom som aquilo que eu próprio já aqui havia escrito: a impunidade de que goza Maxi Pereira é um escândalo na liga portuguesa, onde não há nenhum jogador que se lhe compare na falta de respeito pelos adversários e pela sua integridade física, pelo jogo e pelos espectadores e pelos próprios árbitros, com quem goza de alto, seguro da sua impunidade. É inacreditável que, como disse Vítor Pereira, Maxi Pereira possa continuar a terminar todos os jogos em campo, como se nada de escandaloso se passasse com as suas actuações. Noutros tempos, as suas recorrentes cotoveladas na cara dos adversários e nas barbas dos juízes-de linha, seriam mais difíceis de escamotear. Mas isso era no tempo dos sumaríssimos, que passaram de moda assim que o seu único alvo o FC Porto deixou de ter jogadores cotoveleiros, genuínos ou inventados. Hoje, Maxi Pereira distribui cotoveladas à vontade, toma balanço no ar e desfere pontapés no peito dos adversários, nem sequer se preocupando em saber onde está a bola, para disfarçar, e passa os jogos todos a distribuir pancada para, como explicou Abel Xavier n'A BOLA TV, «ganhar espaço e respeito». Neste caso, a táctica é eficaz: não creio que tenha o respeito dos adversários e dos que gostam de futebol, mas tem o respeitinho dos árbitros portugueses. E o silêncio cúmplice da crítica. Até quando, é a pergunta que se começa a tornar impossível de não ser escutada.