1- Confesso a minha ignorância: até ele ter aparecido como candidato vencedor à presidência da Liga de Clubes, nunca tinha ouvido falar de Mário Figueiredo. Desconhecia, e continuo a desconhecer, que passado, que qualificações e que competências tinha ele acumulado no futebol para aspirar a representar os interesses dos clubes profissionais. Mas a sua entrada de chico esperto não dava muito que enganar. O senhor nao tinha, que eu tivesse reparado, projecto ou ideia alguma que não a de conquistar aquele pequeno grande poder para si mesmo. E fê-lo, claro, da pior maneira disponível: com a promessa de proceder a um alargamento da primeira Liga e a lançar uma batalha contra a Olivedesportos (uma guerra sempre muito popular) para obter uma redistribuição dos direitos televisivos, em favor dos pobres clubes pequenos. Sabendo que na Liga cada clube vale um voto e a maioria está sempre carente de promessas e oportunidades que os façam sonhar alto e dispensar penosas subidas até ao topo, a eleição tornou-se-lhe fácil. Felizmente, a tentativa de alargamento da primeira Liga foi sumariamente chumbada pela Federação — coisa que não incomodou por aí além o novo presidente da Liga, assegurado que estava o seu verdadeiro objectivo, que era o de se fazer eleger.
Mas o episódio marcou o início de uma relação necessariamente conflituosa entre a Liga e a Federação e que, nos últimos dias, tem proporcionado ao sr. Mário Figueiredo várias oportunidades de bem demonstrar a sua vacuidade e uma arrogância que não se funda em qualquer competência reconhecida como tal. E, enquanto ele se distrai em episódios de um conflito que não diz nada a quem se interessa por futebol, a seus olhos desenrola-se um verdadeiro episódio de gravidade potencialmente extrema e que não lhe mereceu ainda uma palavra que fosse. Refiro-me à situação do Olhanense, um entre tantos outros pequenos clubes que, por mais respeito que se lhes tenha, apenas confirmam que a primeira Liga não devia ser para qualquer um e que as teses do alargamento são propostas incendiárias de quem se está nas tintas para a qualidade dos espectáculo e a seriedade da competição. Se o Olhanense, como alguns outros, está há quatro ou cinco meses sem pagar salários aos seus jogadores, isso significa simplesmente que não tinha e nunca teve condições para se sustentar numa liga profissional, muito menos a primeira. E significa também que quem tinha a responsabilidade de o certificar, que era a Liga de Clubes, fez vista grossa aos sinais que lá estavam — provavelmente, porque o Olhanense foi um dos eleitores do sr. Mário Figueiredo. Ou, dito de forma simples: é uma vergonha para a Liga que haja clubes na situação do Olhanense. E o que menos releva é a desculpa do seu presidente de que se arruinou nas obras do Estádio José Arcanjo pois que, apesar de ter a quinze quilómetros de distância, um dos magníficos estádios do Euro-2004 às moscas e à disposição, preferiu antes gastar dinheiro num estádio velho e bem pior, mesmo à custa dos salários dos seus profissionais. Para quem, como a Liga, tem a responsabilidade de assegurar que os clubes têm condições de sustentabilidade, que não exploram os seus atletas e garantem a seriedade da competição, as desculpas dos clubes são irrelevantes. O que é relevante é que jogadores que passam fome estão obviamente à mercê de tentativas obscuras daquilo que sabemos. O que é relevante é saber que, se os jogadores forem para diante com a anunciada greve ao jogo com o Benfica, o campeonato fica irremediavelmente inquinado. E que, se houver jogo e, por conveniência financeira, ele for afinal disputado no Estádio do Algarve, e não no José Arcanjo, o Benfica sai objectivamente beneficiado.
Neste panorama, o silêncio do homem que se fez eleger prometendo o paraíso ao maior número possível de clubes como o Olhanense, é todo um programa.
2- Parece que Luís Ferreira teve uma arbitragem, vamos chamar-lhe desequilibrada, no Sporting-Benfica de equipas B. Acontece. Talvez não mereça desculpa, mas está desculpado pela oportunidade que proporcionou ao novo presidente do Sporting para, como se diz, se posicionar perante a sua massa associativa. Quando afirma que é preciso correr com os « pássaros» do futebol português, ele está a falar para dentro e a vestir desde já a farda do Quixote travestido de Calimero, cujo uso é absolutamente obrigatório a quem quer ser alguém no Sporting. À noite, na SIC, vi também de passagem o sportinguista Rui Santos dissertar sobre uma espécie de Tordesilhas que teria sido estabelecido entre Porto e Benfica para controlarem a arbitragem (curiosamente, depois de um Académica-Porto em que assisti a uma coisa única: a primeira falta, completamente banal, de um portista, aconteceu aos 32 minutos e deu logo direito a uma amarelo; e a terceira falta, que aconteceu só aos 70 minutos de jogo e igualmente banal, deu direito a segundo amarelo e impedimento do seu autor para o próximo jogo, como Braga).
Está, pois, estabelecido o padrão para o mandato de Bruno de Carvalho e o mínimo que se pode dizer é que ele não promete nada de novo em relação ao habitual e tradicional. De cada vez que o Sporting for prejudicado por uma arbitragem, lá desenterrarão os fantasmas da perseguição, que não os deixam chegar às vitórias que o seu brilhante desempenho desportivo e de gestão manifestamente justificariam. De cada vez, porém, que o Sporting for beneficiado, como já sucedeu várias vezes esta época - como contra Braga e Guimarães, em Al- valade — cairá sobre o assunto o silêncio dos justos. Renovação sim, mas sem abdicar das tradições do clube.
3- Já disse, na entrevista a A BOLA TV, o que pensava sobre as postas de pescada debitadas por Paulo Bento em relação a Pinto da Costa. Apenas queria reafirmar que, por pior que seja o português em que o selecionador se exprima, a ideia é clara e não é original: face aos resultados mais do que medíocres, às exibições inaceitáveis, ao perigo real de falhar a qualificação para o Brasil e ao número crescente daqueles que perguntam o que anda o seleccionador a fazer, Paulo Bento ensaia a escapatória de comprar uma guerra com o FC Porto para ver se distrai as atenções e reganha popularidade fácil. Scolari fez o mesmo quando aqui chegou e desatou a perder todos os jogos de preparação para o Euro. Mas no fim só se safou graças aos jogadores do FC Porto.
4- Por razões de trabalho, não poderei ver e tenho de escrever antes do Braga-Sporting. É um jogo determinante para o Braga, que a seguir irá ao Dragão e que tem o persistente Paços de Ferreira sempre em cima. Desperdiçar a oportunidade de ir à Champions num ano em que só teve a concorrência do Paços para o terceiro lugar, será um desenlace desastroso num percurso sempre em ascensão. Talvez a esta hora, e ainda mais depois da lesão de Eder, António Salvador esteja arrependido de ter deixado sair Lima para o Benfica a preço de feijões e já depois de ter deixado sair Artur a custo zero. O Benfica, por seu lado, bem que tem razões para lhe estar eternamente agradecido.
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