quarta-feira, fevereiro 27, 2013

A GESTÃO INTELIGENTE (27 MARÇO 2012)

1- Ponto prévio: já tinha decidido não falar hoje de arbitragens, antes mesmo de conhecer a devassa pessoal e terrorista de que os árbitros portugueses estão a ser alvo na Net, e para a qual não pode haver qualquer espécie de contemporização nem ensaio justificativo. A minha decisão, porém, é anterior a isso e prende-se com a constatação de que a eterna discussão sobre arbitragens não só não conduz a lado algum (eu penso uma coisa, um benfiquista pensa outra e um sportinguista outra ainda, sem que jamais se atinja um consenso), como também contribui para que os principais culpados de resultados inconvenientes sacudam a água do capote para cima dos árbitros. Sempre defendi que as queixas da arbitragem só têm justificação quando uma equipa manifestamente fez tudo o que podia e devia por um bom resultado e só não o alcançou por influência directa de erros grosseiros de arbitragem (e isso não inclui, por exemplo, o fora de jogo de centímetros ou o penalty que ninguém pode garantir ter sido mão na bola e não bola na mão).

Ora, o que vemos, no meio desta imensa cacofonia dos últimos tempos é que, na Luz, para a Taça da Liga, o FC Porto teve o Benfica totalmente à sua mercê e retraiu-se, não lhe sabendo ou ousando dar a estocada final e mandando a culpa da derrota para cima do árbitro, enquanto que contra a Académica e contra o Paços de Ferreira, deu-se ao luxo de desperdiçar toda a primeira parte, consentiu dois empates e depois queixou-se do árbitro. O Sporting não jogou nada contra o Gil Vicente, perdeu 2-0 e reagiu como se tivesse sido o árbitro a impedir-lhe uma vitória merecidíssima. O mesmo fez o Benfica em Coimbra e em Olhão - onde até acusou um árbitro que deu nove minutos de descontos na segunda parte(!) de ter «pactuado com o antijogo do adversário». Excepção feita ao Benfica-Porto da Taça da Liga, aquilo que apetece dizer é «Não têm vergonha de jogar tão pouco? E se os árbitros arbitrassem como vocês jogam?"

Não vou, pois, falar das arbitragens dos dois últimos jogos do FC Porto para não ajudar mais a uma festa que tem tido aspectos verdadeiramente ridículos, algumas vezes, graves. Falarei apenas do caso do Sporting com Bruno Paixão, a sua recente descoberta, e porque é revelador da coerência de alguns. Há anos que toda a gente sabe e vê que o árbitro de Setúbal não tem competência mínima para actuar na primeira Iiga. Desde Campo Maior, onde um central emprestado pelo Benfica e quase promovido a herói nacional, esteve à beira de até enforcar o Jardel perante a complacência de Bruno Paixão, que se tornou claro que ele aliava a falta de competência à falta de isenção. Mas lá foi seguindo paulatinamente a sua carreira e a sua ascensão até internacional, perante o encolher de ombros geral e apenas por uma razão: porque era inimigo de estimação do FC Porto. Nesse jogo de Campo Maior, o FC Porto perderia dois pontos que vieram a ser decisivos para as contas finais de um título agarrado pelo... Sporting! E, ainda há um mês atrás e também em Barcelos, Bruno Paixão foi determinante na perca de três pontos pelo FC Porto, os quais, talvez venham também a revelar-se decisivos nas contas finais deste título. Comparada com essa, a actuação de Bruno Paixão no Gil-Sporting foi verdadeiramente soft - tanto mais que ali o Sporting não jogava nada e nada tinha já a perder. Mas foi o que se viu: um charivari de todo o tamanho, pedidos de audiência ao ministro, ameaças de morte anónimas a Bruno Paixão e à sua família, como se o Sporting é que tivesse perdido um título em Campo Maior e se arriscasse a perder outro em Barcelos, graças a este árbitro. E o mesmo se diga de Lucílio Baptista, um árbitro que anos a fio prejudicou o FC Porto e que, num feito digno do Guinness, foi quatro vezes consecutivas nomeado para arbitrar jogos do Porto com o Sporting, em todos errando sistematicamente a favor dos leões. A ele deve o Sporting uma Taça de Portugal ganha ao Porto, no Jamor, e no final da qual, Mourinho exclamou : «Não sei se o problema deste árbitro é comigo ou com o FC Porto...» Mas foi preciso Bruno Paixão marcar dois penalties consecutivos contra o Sporting em Barcelos (um dos quais inquestionável),e foi preciso Lucílio Baptista atribuir uma Taça da Liga ao Benfica, numa final com o Sporting, para que os sportinguistas, subitamente, se dessem conta da sua existência, como se ambos não tivessem um historial antes disso...

2- É muito raro de ver, mas aconteceu: Pinto da Costa foi o primeiro responsável pela derrota do FC Porto na Taça da Iiga. Ao antecipar que aquilo não era importante e que se deveriam rodar jogadores, ele disse exactamente o que Vítor Pereira queria ouvir. Desresponsabilizado previamente por mais uma competição falhada, o treinador portista avançou para aquilo que chamou «uma gestão inteligente» do plantel, que lhe assegurava uma win win situation: se ganhasse, era um mestre; se perdesse, tinha desculpa. Mas o que não teve desculpa foi a «inteligência» da sua gestão: em obediência ao princípio da rotação na baliza, que, pelos vistos é mais importante do que o princípio de tentar ganhar títulos (nos últimos tempos, e com Nuno Espírito Santo na baliza, perdemos assim uma Taça de Portugal e uma Taça da Liga), substituiu o Helton polo Bracali, guarda-redes fraco e baixinho, que tratou de encaixar três bolas na trave e três golos, todos com defesa, a troco de nada. Continuando sem perceber que o Maicon é o melhor central que tem, resolveu geri-lo no banco, esquecendo-se até que ele era o único que não precisava de descanso, porque estava castigado para Paços de Ferreira. Em lugar dele, meteu o Mangala, verde de mais para jogos destes, e responsável directo por dois golos do Benfica. Num meio-campo misteriosamente despovoado em Janeiro, resolveu insistir no Lucho, de principio a fim - pagando a factura em Paços de Ferreira. Em contrapartida, deixou o jovem James, que toda a Europa cobiça, a descansar uma vez mais no banco e, com ele no flanco esquerdo, em vez de Alvaro Pereira, teria arrumado o Benfica, quando estava a ganhar 2-1 e todo o lado direito da defensiva benfiquista era uma Avenida da Liberdade. Foi penoso ver como, desta vez e sem demoras, os jogadores mostraram que queriam ganhar e que tinham vindo para isso, enquanto que no banco estava um treinador que já partiu derrotado e que não soube ajudar a equipa do fora, quando ela precisou de um mínimo de lucidez estratégica. E assim continua Vítor Pereira: já perdeu ou foi afastado rapidamente do cinco competições e só lhe resta, como consolação, uma vitória pífia sobre o Guimarães, que valeu uma Supertaça nacional. E tudo feito com um ar de naturalidade a que não estávamos habituados.

3- Em Paços de Ferreira, a sensacão foi a de sonhar pela enésima vez o mesmo sonho mau: um campo apertado, tornado ainda mais pequeno por uma equipa em que todos defendiam atrás da linha da bola; um guarda redes pronto para fazer a exibição da época; um FC Porto que inevitavelmente entra a passo, sem pressa e sem rasgo, convencido que o tempo tudo resolve; um meio campo sem força que não pode ser rendido por ausência de reforços; uma segunda parte já jogada a sério e com sucessivas oportunidades desperdiçadas para matar o jogo; até que, com zero ocasiões de golo do adversário, antes ou depois, aparece um canto (um, um canto!): bola batida para a linha da pequena área, o Helton tranquilamente entre os postes, como sempre, e o Rolando batido lá em cima, como de costume, por um jogador com menos 15 centimetros do que ele. E assim se entregam dois pontos. Nunca o campeonalo nos pareceu tão fácil de ganhar e nunca nos pareceu tão próximo de se perder.

terça-feira, fevereiro 26, 2013

A REVOLTA DOS PEQUENOS PRESIDENTES (20 MARÇO 2012)

1- Os jogadores do Vitória de Guimarães, do Vitória de Setúbal e do União de Leiria não recebem ordenados há três meses: entram em campo para lutar pela vitória ou pelos pontos sem saberem quando e se alguma vez verão o dinheiro estipulado nos seus contratos. E falo apenas dos casos mais conhecidos, pois consta por aí que os salários em atraso atingem a quase totalidade dos clubes da primeira e segunda divisão. Esperava-se que o novo presidente da Liga de Clubes se preocupasse com isso, que tomasse medidas para evitar essa vergonha ou, pelo menos, para impedir que clubes com dívidas a jogadores possam continuar tranquilamente a contratar outros - o que é também uma forma de concorrência desleal. Mas não, o que preocupa o novo presidente da Liga é assegurar aos chamados pequenos clubes o cumprimento da sua promessa eleitoral do alargamento da primeira divisão, para repor uma competição a 18 para a qual o país não tem população que o justifique e o nosso futebol não tem capacidade desportiva ou financeira que o sustente. Em lugar de reduzir a primeira divisão a doze clubes, jogando a quatro voltas (primeiro, todos; depois, em duas séries, dos seis primeiros e dos seis últimos), num sistema que toda a gente de bom senso e boa-fé reconhece ser o mais adequado e competitivo, atraindo mais publico e mais receitas, Sua Excelência promove o alargamento. Não para defender o futebol, como lhe competia, mas para defender os interesses dos clubes que o elegeram, tirando-o do absoluto anonimato, em troca dessa miserável combinação.

O Dr. Mário Figueiredo, na pele de um Robin Hood do futebol português, é simplesmente ridículo. Claro que, em teoria, todos defendemos que haja maior igualdade e competitividade entre os grandes e os pequenos: não há ninguém que não goste de ver um Braga a lutar pelo título, por exemplo. Mas isso não se faz artificialmente, por regras adoptadas ad-hoc e em ambiente comicieiro de assembleias gerais a que chamam democráticas. Por mais que o Sr. Figueiredo e os seus compères queiram alargar para 18 ou para 20 a primeira I.iga, por mais que ameacem a Olivedesportos de queixas e processos ou que ameacem os grandes com greves (como esse génio do presidente do Gil, que tantos benefícios tem trazido ao futebol português), restam os factos, os míseros factos, que contrariam as suas ambições: onde estão as infraestruturas, onde está o público, onde estão os patrocinadores e os anunciantes, onde está alguém interessado em concorrer com a Olivedesportos pelos direitos televisivos do nosso campeonato, que possa sustentar esses pequenos numa primeira divisão, de outra forma que não seja a de não pagarem impostos nem salários? Nós vemos um jogo em Birmingham, do campeonato inglês, em Hannover, do campeonato alemão, ou em Málaga, do campeonato espanhol, e o que vemos? Estádios quase sempre cheios, relvados impecáveis e de dimensões máximas, equipas pequenas a jogarem aberto e para ganhar. Mas vemos um jogo em Barcelos, em Setúbal, em Leiria, e o que vemos? Bancadas vazias, campos sem a dimensão máxima, equipas a jogarem o jogo do autocarro. E esperam assim ter público, ter sócios, ter anunciantes, ter disputa pela cobertura televisiva dos jogos? Não, eles esperam apenas duas coisas: aproveitar os jogos com os grandes para facturarem os direitos televisivos e os bilhetes ao preço máximo, e conseguirem o miraculoso pontinho que lhes pode vir a ser muito útil para continuarem ao mais alto nível. Uma greve dos pequenos aos jogos com os grandes, como promete o Sr. Fiúza, seria uma coisa assustadora. E que tal uma greve dos grandes aos jogos com os pequenos?

Nunca dei para o peditório nacional dos coitadinhos dos pequenos do nosso futebol, devorados pelos grandes. E não dei, por uma razão simples: porque o problema não está nos nossos grandes, que não são grandes de mais; o problema está nos pequenos, que são pequenos de mais. Porto, Benfica e Sporting estão muito aquém do nível de clubes médios dos campeonatos que interessam, e tomaram eles que os pequenos assegurassem bem mais competitividade e interesse do público. Mas, infelizmente, os nossos pequenos estão muito aquém de qualquer clube de segunda divisão dos campeonatos competitivos. Umas vezes, por razões inelutáveis, de ordem econó- mica, demográfica ou social. Outras vezes, a maior parte delas talvez, por razões de má gestão, ambições não sustentadas e total falta de respeito pela qualidade dos espectáculos que proporcionam. Não penso que seja função do Porto, do Sporting, do Benfica e até do Braga, ter de apoiar os desejos de vaidade de alguns patos bravos, amigos do autarca local e ansiosos por reconhecimento púbico e promoção social, auto-erigidos em dirigentes desportivos, sem qualquer competência que os recomende para tal.

2- Para um portista, é uma estranha sensação ver os nossos principais rivais seguirem em frente na Europa - um para os quartos da Champions, outro para os da Liga Europa — e nós de fora, a ver passar o comboio. Como já disse, acho que tivemos muito azar no sorteio da Liga Europa, onde nem sequer o facto de sermos o detentor do título nos assegurou um lugar de cabeça-de-série no sorteio dos dezasseis avos finais. Mas, como o Sporting o demonstrou, e brilhantemente, o Manchester City não era invencível. Teria sido necessário estudar melhor o adversário, ultrapassar o terror que nos paralisa face a equipes inglesas e não cometer erros fatais, tais como oferecer um golo aos 20 segundos de jogo. A verdade é que, em vez de termos «jogado à Porto» - como sentenciou Vítor Pereira, depois de levar 4-0 em Manchester - deveríamos era ter jogado à Sporting. Quem o diria!

O Sporting foi compensado com o seu brilharete face ao City, recebendo no sorteio a mais acessível das equipes que lá estavam, aqueles ucranianos com nome de fábrica dos tempos soviéticos. E o Benfica recebeu quem Jorge Jesus queria - e por alguma razão o queria. Um Benfica com uma noite inspirada e outra disciplinada, pode bem levar de vencida o Chelsea.

3- Não prevejo nenhum desfecho em particular para o jogo de hoje à noite na Luz, mas espero que os jogadores portistas não tenham ouvido as palavras de Pinto da Costa, tirando importância ao jogo. Nem consigo perceber como é que o presidente do FC Porto disse tal coisa; então, fomos corridos, sem honra nem glória, da Supertaça europeia, da Taça de Portugal, da Liga dos Campeões, da Liga Europa, tanto podemos ganhar o campeonato como acabar em terceiro, e o presidente do FC Porto acha que não se justifica um esforçozinho para ganhar na Luz e conquistar, pelo menos, o Troféu Lucílio Baptista?

Aliás, contenção de esforços é o que mais temos visto nos últimos jogos, com a Académica no Dragão, e com o Nacional na Madeira, em que só graças a Helton saímos com os três pontos. Não estamos na Europa, não estamos na Taça, andamos poupados no campeonato, que razão sobra para irmos à Luz sem obrigação de tudo fazer para ganhar? Aliás, nem vejo que jogadores principais deveriam ficar a descansar, visto que, e após as generosas cedências e empréstimos da época de Dezembro, nem sequer temos tido 18 jogadores para a ficha técnica dos jogos, sem recorrer aos juniores. (Um dia ainda me hão-de contar quem teve, por exemplo, a avisada ideia de ficar apenas com quatro médios e um ponta-de-lança a meio da época, quando ainda disputávamos a Champions e o resto!).

Pois, eu cá por mim não concedo nada: quero ganhar na Luz logo à noite!

segunda-feira, fevereiro 25, 2013

ESPEREMOS QUE NÃO AQUEÇA DE MAIS… (13 MARÇO 2012)

1- Quando for grande, quero ser como o Rui Gomes da Silva: se não gostar de uma transmissão televisiva de um jogo do Benfica, por achar que ficou por repetir um lance duvidoso contra os encarnados, eu pego no telefone, ligo para A BOLA e a minha indignação ocupa metade da última página, com chamada de primeira página no jornal. Gente importante é assim. Eu, por exemplo, também achei que, no último Benfica-Porto houve uma queda do Djalma na área do Benfica que gostaria de visto repetida e não vi: mas a quem me queixar? Em tempos, o Benfica também protestou contra os comentários da Sport TV, agora protesta contra a própria realização. Imaginem o que seriam os jogos do Benfica transmitidos pela Benfica TV, com o Rui Gomes da Silva na realização e o Sílvio Cervan nos comentários!

Eu compreendo, porém: a coisa está a apertar e o que o dirigente do Benfica pretendeu foi lançar fumo sobre o que realmente aconteceu no Dragão e que contou a sério: mesmo antes do intervalo, o Hulk isola-se desmarcado pelo James e partindo de posição completamente legal finta o guarda-redes e, quando vai encostar para a baliza deserta, apita o árbitro a marcar off-side que não houve. O mesmo Hulk, mais adiante, entra na área, bate em velocidade Nivaldo é derrubado por este e o árbitro decide-se por uma tripla penalização do FC Porto: não marca o penalty, mostra amarelo a Hulk por pretensa simulação (já não se pode cair na área, com ou sem penalty) e, com isso, põe-no fora do próximo jogo, a difícil deslocação ao Nacional. Aliás, e segundo a análise deste mesmo jornal, já antes disso, um outro penalty contra a Académica teria ficado por marcar (e vou dizer uma coisa que jamais Gomes da Silva ou Gervan diriam, em idênticas circunstâncias: não acho que este tenha sido penalty, assim como não acho que o tenha sido a mão do Cardozo na sua área, durante o Benfica-Porto).

Olhão: empate e dois pontos perdidos graças a um erro decisivo da arbitragem; Barcelos: derrota e três pontos perdidos graças a quatro decisões determinantes do artista Bruno Paixão; e, agora, contra a Académica, empate e mais dois pontos perdidos graças a dois erros com influência directa no resultado. E eis que finalmente me sinto irmanado com o meu amigo Eduardo Sete Pontos Roubados Barroso: também nós nos podemos queixar da maldição dos sete pontos. (Atenção, Eduardo: não me estou a meter contigo, por quem tenho grande consideração, e cujo clubismo apaixonado, como o de nós todos, não inclui, por formação, o ódio doentio aos adversários e a arrogância de quem acha que tudo podem e tudo lhes é devido, que escorre do discurso de um Gomes da Silva e de um Sílvio Cervan. São níveis completamente diferentes ).

2- Mas esta reflexão sobre a infeliz arbitragem do Dragão, é apenas a constatação de um facto, para efeitos da actualização das contas e da narrativa com que outros se preocupam tanto. No essencial, e como sempre o defendi, estou de acordo com Vitor Pereira: não se pode queixar da arbitragem quem tão pouco fez para ganhar o jogo. O mistério, que parece ser partilhado pelo próprio treinador portista, consiste em saber porque razão um conjunto de jogadores insuspeito de falta de ambição ou profissionalismo, entra sempre em jogo, contra os mais fracos, com uma atitude de deixa andar, que não há pressa nem perigo.

Durante toda a semana, fui lendo um rol de comentários ao Benfica-Porto que me deixou de boca aberta: afinal, provou-se que Vítor Pereira é um grande treinador e que os seus críticos é que estavam errados. Ora, sendo eu, se não o maior, pelo menos o mais antigo deles, gostaria de me defender chamando a atenção para um facto insólito: aquilo que, do consenso geral, fez Vítor Pereira ganhar o jogo da Luz foi ter feito exactamente o que eu e os seus outros críticos andámos a reclamar tanto tempo - ter tirado o Maicon de defesa direito e colocá-lo ao centro da defesa; ter mandado o Rolando para o duche mais cedo; ter posto o James em jogo. Só para nos contrariar, apareceu até uma teoria deveras extraordinária: se, cada vez que saltava do banco para o jogo, o James tudo mudava para melhor, isso queria dizer que Vítor Pereira era um génio a mexer na equipa durante o jogo pois que tinha descoberto que o James rendia bem era sentado no banco durante uma hora e depois jogando os 30 minutos finais de cada jogo. Francamente! Era como se dissessem que o Guardiola deveria deixar o Messi no banco durante uma hora, porque, assim que ele entrasse, tudo mudaria para melhor! Pois claro!

Contra a Académica, James entrou de início e, de início a fim, foi dos poucos que mexeram com o jogo. Aliás e face aos disponíveis, creio que esta foi a primeira vez que Vítor Pereira começou uma partida com um onze lógico e consensual. O único erro que tenho a apontar-lhe foi ter passado toda a primeira parte a tirar apontamentos e a consultar-se com o seu adjunto, quando o que havia a fazer face ao que estava à vista não precisava de grandes conversas: o meio campo não funcionava, jogava a passo e falhava todos os passes; não ajudava a defesa e não servia o ataque. Fernando estava num daqueles dias em que só fazia asneiras, algumas perigosas; e Lucho passeava-se, ausente, como algumas vezes lhe sucede e é sabido, para quem o conhece. É certo que a suicidária politica de dispensas de Janeiro, deixou a equipa desprovida de alternativas (Sousa, Guarín, Belluschi), mas havia uma alternativa lógica: fazer entrar Djalma, recuar James para nº10 e tirar Lucho. Era ai que Vítor Pereira deveria ter entrado em jogo e antes mesmo do intervalo. Se não consegue explicar porque razão a equipa entra apática em certos jogos, já deveria, pelo menos, ter descoberto a maneira de reagir a isso a tempo, sem se preocupar com os apontamentos nem com as susceptibilidades de intocáveis. Não há intocáveis nem esquemas fixos quando se trata de ganhar o campeonato. Eu sei que, feitas à posteriori, as análises se tornam mais fáceis. Mas por isso é que há os treinadores (que têm de reagir enquanto as coisas estão a acontecer) e os comentadores (que só intervêm depois).

3- Antes do Mundial de 2006, na Alemanha, A BOLA perguntou aos seus colaboradores quem achavam que viria a ser o melhor jogador do Mundial. Respondi Leonel Messi, mas Packerman, o seleccionador argentino, não concordava comigo: deixou Messi de fora quase todo o Mundial. Já na altura, eu achava que Messi era o melhor jogador da actualidade, mas, com o decorrer do tempo, comecei a escrever que não era apenas isso: era o melhor jogador que eu alguma vez tinha visto, o melhor jogador de sempre. Para quem gosta mesmo de futebol e o vê atenção, os cinco golos de Messi ao Bayer Leverkusen não foram apenas fruto de uma noite particularmente inspirada: não há um deles que seja banal, todos são consumados com uma genialidade e simplicidade de execução que nenhum jogador do mundo conseguiu até hoje acumular numa so noite. Tudo foi feito em souplesse, como se fosse fácil, sem uma precipitação, uma hesitação, em cada momento procurando a solução mais imaginativa e não a mais tentadora. Os dois chapéus, de pé esquerdo e pé direito, só estão ao alcance de um predestinado, mas o quinto golo, visto e meditado com atenção, não vem nos livros nem nos nossos melhores sonhos: vem do outro mundo. Estou como disse Rosell, o presidente do Barcelona: «nunca mais vai haver um jogador assim. Só nos resta assistir e desfrutar». E a isto eu acrescento o que também já escrevi e só aumenta a minha infinita admiração por este verdadeiro reinventor do futebol: Leo Messi é um deus, com o mundo a seus pés. Mas não se deslumbra nem se exibe para além da sua suprema arte de jogar futebol como ninguém mais. Não exibe os músculos, nem loiras, nem Ferraris, não tem brincos nem tatuagens, nem sequer gel no cabelo ou penteados foleiros à Moicano ou penteados idiotas à neo-nazi. Ninguém sabe nada da sua vida privada, a não ser que criou uma Fundação - não para fugir ao fisco, como tantos outros, mas para ajudar mesmo crianças necessitadas. Que Deus proteja Leonel Messi! Nunca o futebol deveu tanto a um só homem.

domingo, fevereiro 24, 2013

E DAQUI A UNS DIAS ESTAMOS DE VOLTA! (06 MARÇO 2012)

1- Umas horas antes de começar o Benfica-Porto, disse à BOLA TV que o Benfica era favorito, não apenas por jogar em casa (o que era o menos), mas por ter muito menos jogadores cansados pelos jogos das selecções e respectivas viagens. E, sobretudo, por não ter o seu melhor jogador do momento a regressar de uma viagem transatlântica no próprio dia do jogo e depois de ter jogado uma partida quase inteira 48 horas antes, como sucedia com James, do FC Porto: achei que a estratégica da marcação do jogo para esta data iria ser um factor determinante e contra o FC Porto. Mas tambem acrescentei que esse favoritismo era contrariado pelo que eu sabia ser um espirito de vitória, uma atitude de campeões, que é muito superior no FC Porto e que eu esperava que viesse ao de cima. Tudo ponderado, apostei num 0-0, resultado do cansaço e do temor de ambos em perder o jogo.

Nesta última parte, enganei-me redondamente: foi um jogo aberto, emotivo, cheio de golos. Mas não me enganei na outra parte, porque o grande clássico a que se assistiu ficou a dever-se, antes de mais, à atitude de conquista do FC Porto, que, desde o apito primeiro do árbitro, mostrou que tinha vindo para ganhar e não para empatar.

Acreditem ou não, ao longo dos anos tenho desenvolvido uma espécie de premonição sobre o que vão ser os jogos do FC Porto, a partir da postura com que a equipa os inicia. No jogo de sexta-feira na Luz, eu percebi que o FC Porto só muito dificilmente não ganharia o jogo. Enquanto o FC Porto entrou à campeão, o Benfica entrou cheio de medo: medo do passado recente, medo de um adversário sem medo. E com o público a tentar puxar pela equipa assobiando todas as intervenções de jogadores portistas e, em especial, de Hulk, o FC Porto foi construindo uma teia que já se adivinhava como iria acabar: com o fantástico golo do Hulk. Nunca percebi e nunca perceberei porque se assobiam os grandes jogadores, só por serem adversários: o público teve o que merecia. E o Porto disse ao que vinha.

Até aos 20 minutos, só deu Porto e o jogo podia ter morrido aí, se Janko tivesse marcado um golo fácil, depois de isolado por Lucho na cara de Artur, ou se Alvaro Pereira não tivesse também desperdiçado a recarga. Com um pouco mais de fé e de insistência, o Porto tinha arrumado ali um Benfica em que a defesa disparatava em pânico, o meio-campo não segurava a bola e o ataque não existia. Depois, um alivio defensivo de costas de Maxi Pereira resultou num balão que sobrevoou meio-campo e foi encontrar Cardozo isolado na área, em jogo por centímetros: Helton salvou. Subitamente, o Benfica começou a ganhar cartões amarelos e livres próximos da área - o que toda a gente sabe que é a sua mais eficaz arma ofensiva. Por culpa própria, o FC Porto perdeu o controlo do jogo e, sem que o Benfica fizesse muito por isso, deixou-se empatar, num golo de sorte à saída de uma bola parada, com vários ressaltos a encontrar outra vez Cardozo isolado e milimetricamente em jogo. Aimar teve também uma boa oportunidade (a única em jogada de bola corrida do Benfica), mas que nâo chegou a sê-lo porque ele não sabe cabecear. E Moutinho arrancou tinta à trave, na cobrança de um livre que tinha Artur batido. O empate ao intervalo até podia aceitar-se, mas o melhor jogo fora indiscutivelmente do FC Porto.

O Benfica chegou ao 2-1, de novo sem nada fazer por isso, na inevitável cobrança de um livre, mil vezes ensaiado e já visto, mas que Otamendi (tanta insegurança, meu Deus!) ainda não tinha visto: de novo Cardozo, o jogador do Benfica que eu mais temo. Pensei então que o FC Porto podia perder, mas isso não fazia sentido nem tinha ponta de justiça. Felizmente, havia um trunfo guardado: a lesão de Varela não deixava a Vítor Pereira outra hipótese que não meter em jogo James, mesmo com os fusos horários trocados, o sono e o cansaço acumulados. E foi então que Vítor Pereira me surpreendeu pela positiva e talvez pela primeira vez: para a entrada de James fez sair Rolando, confiando que Djalma chegaria para um desinspirado Gaitan, e devolveu Maicon ao seu lugar natural, como central. Com isso, ganhou várias coisas: estabilizou o centro da defesa, onde Maicon é neste momento o melhor elemento, corrigindo o erro recorrente de o desperdiçar a lateral, onde é apenas banal; ganhou um defesa-extremo, na pessoa de Djalma; fez entrar aquele que é actualmente o melhor jogador da equipa e o seu grande desequilibrador e que, por uma vez, se percebia que tivesse ficado no banco de inicio; e, sobretudo, num momento decisivo, mostrou que queria ganhar o jogo, ao contrario de Jorge Jesus. James entrou e, como vem sendo hábito, logo mexeu com o jogo, compensou o abaixamento visível do trio Moutinho-Lucho-Hulk, e lá empatou o jogo, numa grande jogada que iniciou e finalizou, como jamais o Varela ou o Cristian Rodriguez seriam capazes de fazer.

A seguir, veio a expulsão de Emerson e, face à suicidária escolha de Gaitan para lateral-esquerdo, Vítor Pereira percebeu que era por ali que podia ganhar o jogo, com Djalma e Hulk contra Gaitan e, a espaços, ainda com o reforço de James. E ainda trocou o Moutinho pelo Kleber, reforçando a mensagem passada aos jogadores; agora é para ganhar! E foi. É verdade, verdadíssima, que o golo da vitoria do Porto, o merecidíssimo golo de Maicon, nasceu em off-side tangencial, que a televisão mostrou e que ninguém conseguiria enxergar no campo (excepto, é claro, Jorge Jesus). Mas também é verdade que o que decidiu o jogo é a saída falhada de Artur, e também é verdade, verdadissima, que, se se derem ao trabalho de rever, verificará que o livre que dá o segundo golo ao Benfica não existe. Ela por ela. E a convicção de que, se não tivesse sido então e assim, o Porto chegaria à vitória doutra maneira e mais logo.

Foi uma vitória merecida de princípio a fim — no momento da verdade, no jogo do título, contra todas as adversidades e com uma atitude de verdadeiro campeão. Não sei se o FC Porto o será ou não, mas, pelo menos, mostrou que pode vir a selo, contrariando todos os prognósticos (o meu incluído), e finalmente arrancando um grande jogo esta época e dando a todos os portistas uma alegria de há muito tão desejada. Como disse o meu filho, parecia a equipa do ano passado!

Na hora da vitoria, Vítor Pereira foi contido e cavalheiro, mostrando que sabe ganhar. Já Jorge Jesus voltou a mostrar que não sabe perder: descobriu que o FC Porto, além do golo, não teve mais nenhuma oportunidade em toda a primeira parte; descobriu que o segundo golo portista nasceu de uma pretensa falta a oitenta metros de distância, que só ele e o presidente do Benfica enxergaram; conseguiu ver, de onde estava e de frente para um cacho de jogadores em movimento, o off-side no terceiro golo do Porto que «o fiscal de linha não quis marcar»; e descobriu ainda que, «a haver um vencedor, teria de ser o Benfica» (atordoado como estava, nem realizou que tinha havido mesmo um vencedor). Oxalá estejamos a assistir ao remake de um filme que eu já vi a temporada passada e que já sei que acaba bem: a arrogância derrotada pela vontade de vencer.


2- Mesmo para alguém que não é crente, como eu, às vezes há sinais evidentes de uma justiça, que, se não é divina, é para além dos homens. O Benfica, com a conivência da Liga, montou as coisas de maneira a que o FC Porto chegasse à Luz de rastos para o jogo do titulo: afinal, foram eles que acabaram de rastos (Cardozo, Aimar, Gaitan, Garay) e o FC Porto que começou e terminou galopante, com o supremo toque de sadismo de ter sido o jogador mais massacrado pelo jogo e viagem, apenas 48 horas antes, quem despachou o Benfica, com um golo e assistência para outro,

E, enquanto o Porto triunfava na Luz e assumia o comando isolado da Liga portuguesa, Andre Villas Boas - que, sem aviso e em cima da hora, abandonou à sua sorte o clube e o grupo de jogadores que lhe tinham dado tudo o que ele conquistara — consumava o seu falhanço em Inglaterra, despedido por Roman Abrahamovich, após mais uma derrota. Se não é justiça divina, anda lá perto.


Ai, Deus, haja paciência! Até sexta que vem, há que continuar a acreditar em milagres!

sábado, fevereiro 23, 2013

O JOGO E A JOGADA DE SEXTA-FEIRA (28 FEVEREIRO 2012)

1- Jorge Jesus contessou que foi o Benfica que pediu a antecipação do jogo do título para a próxima sexta-feira. Pediu e a Liga deu (como não?). E perguntou o treinador benfiquista se alguém acha que o jogo deveria ser antes no sábado ou no domingo, tendo o Benfica a 2ª mão contra o Zenit na terça-feira seguinte, em Lisboa. Eu respondo: não, nem no domingo, nem no sábado, nem na sexta. Se o Benfica e a Liga estivessem apenas um bocadinho preocupados com a tal verdade desportiva com que enchem a boca até se babarem, tinham proposto ao FC Porto uma data a meio de uma semana em que não houvesse jogos europeus nem das selecções e ambos estivessem assim em pé de igualdade.

Mas, depois de ver as últimas prestações do Benfica, o evidente cansaço e desinspiração de uma equipa cujo futebol já aqui elogiei, eu percebo a jogada: Jorge Jesus conhece bem a equipa e sabe que tem de lançar mão de tudo o que puder para garantir que nâo deixa fugir um campeonato que já parecia ganho, sem problemas. Para nós, portístas, já será uma sorte se não forem buscar o Bruno Paíxáo para árbitro...

Entre os 15/16 jogadores mais utilizadas por ambas as equipas, o Benfica terá quatro deles ausentes ao serviço das selecções, mas jogando à terça e à quarta, com dois e três dias para descansarem antes do clássico; o FC Porto terá oito ausentes, jogando à terça, quarta e quinta, com a maioria a chegar na véspera de terem de viajar para a Luz (além do caso notável de James, que chega no próprio dia, depois de doze horas de voo e qua- tro fusos horários de diferença).

Avisadamente, ambos trataram de arranjar maneira de minimizar os danos com os jogos das selecções: o Benfica, re-lesionando Rodrigo, subitamente recaído da dor na coxa do jogo de há duas semanas em S. Petersburgo – que, todavia, o não impediu de jogar cinco dias depois, em Guimarães (que imprevidência do departamento médico!); o FC Porto, arrancando uma dor muscular a Varela, no jogo do passado domingo contra o Feirense, logo após ter consumado mais uma das suas habituais entregas de bola ao adversário.

Convenhamos que, até nisto, o Benfica leva vantagem sobre o Porto: vale a pena ter o Rodrigo poupado e pronto para o clássico (o pai já garantiu que o filho estará capaz), mas ao FC Porto o que teria valido a pena era ter posto o James a jogar de inicio contra o Feirense, tê-lo deixado resolver o jogo e depois faze-lo sair lesionado, em vez do Varela. Mas isso era se Vítor Pereira conseguisse perceber a diferença abissal de qualidade que existe entre James e Varela, coisa que ele ainda não percebeu, apesar de mais uma eloquente demonstração anteontem.

O que mais me espanta (ou já não espanta!), é que esta golpada com o jogo do título se consume perante o silêncio e a passividade da Direcção do FC Porto — para além de umas piadas inconsequentes de Pinto da Costa. Na verdade, o que me espanta é a passividade total ao longo da época: foi assim agora, como foi assim perante a escandalosa arbitragem de Barcelos, com os insultos que nos dirigiu o Manchester City, declarando- nos carteiristas antes do jogo e racistas depois dele, como foi assim com o total amadorismo com que o plantel foi construído (ou, melhor dizendo, destruído), no mercado de Verão e no mercado de Inverno, ou como se tem pactuado com um treinador que se dá ao luxo de tudo perder e ainda desperdiçar e desmotivar os melhores talentos que lhe foram confiados: James, Ilurbe, Fucile, Belluschi, etc.

Estou desacompanhado, pois, mas repito: a marcação do Benfica-Porto para sexta-feira, na Luz, é das maiores golpadas a que me lembro de ter assistido, desde que olho para esta coisa a que chamam futebol português.

2- Eu que não os conhecesse! A pressão sobre o árbitro do jogo da Luz vai ser outra das armas decisivas para o ataque ao título. E começou por antecipação, como convém, com o jogo de Coimbra: Aimar ganha a frente da jogada a um adversário, trava e espera pelo contacto dele nas costas, impossível de evitar, para se atirar para o chão e pedir penalty. Era assim que queriam ganhar. Ou então com um remate a dois metros do Bruno César que encontrou o ombro (o ombro!) de um adversário e que também, dizem eles, era penalty.

Como já o escrevi inúmeras vezes, tenho o maior desprezo por esta nova táctica (porque é disso que se trata) de instruir os jogadores a chutarem contra o corpo dos adversários, em busca de um braço, uma mão, e agora até um ombro, salvador, que possa resolver jogos de uma forma mais eficaz do que o talento e o trabalho. Uma imprensa complacente e uns árbitros que lhes fazem a vontade estão, aos poucos, a mudar a lei e a apostarem no anti-jogo. É curioso ver como o Sporting - o maior reclamante deste tipo de penalties, como de tudo o resto – só conseguiu evitar a eliminação as mãos do Legia e a possibilidade de seguir em frente para a eliminação face ao Manchester City, porque o arbitro do jogo de Alvalade não era adepto do mesmo critério e perdoou a Polga uma braçada, essa sim, com todo o ar de manobra voluntária. Mas, se tem sido ao contrario, num jogo cá do burgo, imaginem quantos comunicados não teria feito a SAD do Sporting?

3- Da próxima vez que um sorteio europeu ditar uma equipa inglesa no caminho do FC Porto, eu acho que devemos ficar em terra e entregar logo a eliminatória na secretaria. Não há nada mais a fazer: de cada vez que o clube atravessa a Mancha, já se sabe que vão para perder, sem apelo nem agravo. E o cagaço já é tanto, que raro é o jogo em Inglaterra onde, a acrescer às dificuldades naturais, não aparece uma oferta portista escandalosa: ou é Helton, ou Bruno Alves, Otamendi, logo aos 20 segundos. Parece que, enquanto não se encontrarem a perder, eles não conseguem sequer respirar e estabilizar um pouco. Mas, de todas as penosas e garantidas derrotas na terra de Isabel II, as que mais me custam a engolir são contra os clubes de Manchester: porque são mal-educados, arrogantes, tratando-nos como selvagens e indígenas - eles, que não passam de novos ricos do futebol, sustentados por milionários do petróleo do Texas, sheiks árabes sem saber o que fazer ao dinheiro, ou oligarcas da máfia russa, em busca de estatuto e máquina de lavar dinheiro sujo. E, quando se tem dinheiro para comprar tudo o que é talento à face do planeta, não é difícil ganhar aos pobres. Nem é preciso ser Sir para isso.

Desta vez, nem sei o que foi pior: se os seis golos sofridos na eliminatória em apenas dez ataques do City; se o golo terceiro mundista sofrido aos 20 segundos; se a facilidade com que os homens do City dispuseram dos nossos a seu belprazer, assim que se aborreciam de nos ver rendilhar, ladear e voltear, todos contentes porque tínhamos a posse de bola ou se o pior de tudo ainda não terão sido as patéticas declarações de Vítor Pereira sobre o «magnifico» jogo que tínhamos feito, a «mentira» do resultado e a «injustiça» da vitória do City. Sinceramente, gostava de ver o que escreve ele naquele caderninho com que se entretém durante os jogos e enquanto consulta aquele adjunto de óculos à Milton, em tom azul. Será um romance? Uma comédia? Um livro de desabafos ou de confissões íntimas, género "Como eu levei 4-0 num jogo que merecia ganhar?, 'Como descobri que o Cristian Rodriguez vale por dois James e o Varela vale por três ', Como passei do comando de uma equipa da terceira divisão para o do campeão nacional, com resultados surpreendentes ou, mais provável mente, o futuro best-seller 'Como consegui destruir uma grande equipa sem dar por nada”

Ai, Deus, haja paciência! Até sexta que vem, há que continuar a acreditar em milagres!

sexta-feira, fevereiro 22, 2013

NÃO HÁ MILAGRES, MAS HÁ FAVORES (21 FEVEREIRO 2012)

1- Depois de uma deplorável fase de grupos na Champions, o FC Porto, por força de uma igualmente péssima prestação do Zenit, viu-se chegado ao último jogo, em que recebeu os russos no Dragão, com uma enorme possibilidade de seguir em frente e até de terminar em primeiro no grupo. Precisava que o Apoel perdesse em casa, como perdeu, e de vencer o Zenit. Durante todo o jogo, o Zenit não fez mais nada do que defender o 0-0 que lhe servia, enquanto que os portistas, arrancando finalmente uma boa exibição, tentaram durante 90 minutos marcar um golo que fosse: mas tudo esbarrou contra a fantástica exibição do guarda-redes russo. O Zenit passou, o Porto desceu à Liga Europa e, como nem sequer conseguiu ser cabeça de série (ele, que era e ainda é o detentor do troféu!), eu já adivinhava que a falta de sorte, em parte merecida, iria prolongar-se no sorteio subsequente. Assim foi e logo aqui escrevi que achava que o FCP não teria hipóteses contra o líder do campeonato inglês, o clube em que o Xeque Mansour investiu 470 milhões de euros para obter resultados à força. Aliás, contra equipas inglesas, sejam quais forem as circunstâncias, o FCP não tem hipóteses - já parte derrotado à partida (a única excepção, com Mourinho e contra o Man. United, valeria uma Champions).

No percurso europeu também é preciso ter sorte. Que o diga o Benfica, que apanhou um grupo mais fácil na Champions, onde a única equipa forte, o Manchester United, se apresentou como caricatura, e que nos oitavos- de-final apanhou o mesmo Zenit que afastou o FC Porto, mas com substanciais alterações de circunstâncias: não só vinha do defeso russo e jogava o primeiro jogo oficial da nova época, como viu vários titulares, entre os quais Danny, incapazes por lesão. Mas, sobretudo, teve a sorte de ver o mesmo guarda-redes adversário que garantira o zero no Dragão lesionar-se também e ser substituído por um suplente que, pura e simplesmente, ofereceu os dois golos dos encarnados.

O que se passou no Dragão, quinta-feira passada, foi assim tudo o que antevira e temia. Podemos queixar-nos dum penalty por marcar quando havia 0-0, podemos queixar-nos da lesão do Danilo, podemos queixar-nos do autogolo de Álvaro Pereira (que foi mais responsabilidade do Helton que do defesa), mas, no final, tudo acabou com uma sensação de inevitabilidade: de uma forma ou de outra, a equipa do Xeque Mansour haveria sempre de ganhar, se não o jogo, pelo menos a eliminatória. Porque é melhor que o Porto e, a menos que o Porto encontrasse uma estratégia capaz de contrariar essa superioridade, haveria sempre de acabar por nos ganhar. Ora, o FC Porto, não só não encontrou essa estratégia, como acabou por pagar também por erros na gestão do plantel, que têm sido gritantes ao longo da época:
— planeou-se uma época sem um ponta-de-lança digno desse nome: Kleber, entrado a 20 minutos do fim, conseguiu a proeza de não ter tocado na bola, uma vez que fosse; e Walter, o duvidoso substituto, foi emprestado no mercado de Janeiro em troca de Janko, que tem a particularidade extraordinária de não poder jogar a Liga Europa. Resultado, voltou-se ao esquema que Vítor Pereira inventou de pôr o Hulk no centro, com isso perdendo-se um extremo precioso sem ganhar um ponta-de-lança (da primeira vez que Hulk se libertou para o flanco, nasceu a assistência para o golo portista; jogando emparedado entre os centrais, jamais criou sombra de perigo).
— com um meio-campo que já era fraco ofensivamente, chamou-se de volta o Lucho, o que foi uma boa decisão. Mas, em contrapartida, emprestou-se também o Sousa, o Guarín e o Belluschi, reduzindo-se o plantel a quatro médios (!), dos quais apenas o Lucho sabe servir o ataque. Assim, quando ele e Moutinho deram o berro, à entrada da segunda parte, o FC Porto entregou a iniciativa do jogo ao Manchester, porque tudo o que tinha no banco para os substituir era o Defour — que, manifestamente, não faz mal a uma mosca.
— mas o generoso espírito de Natal com que a direcção do FC Porte abordou o mercado de Janeiro levou-a a emprestar também o Fucile, ao mesmo tempo que Vítor Pereira exilava Sapunaru. Assim, quando Danilo teve de sair, ainda na primeira parte, foi forçoso recorrer à outra invenção de Vítor Pereira; o Maicon a lateral-direito. Dessarte, desmanchou-se o centro da defesa (o que viria a ser determinante), sem se repor um lateral-direito, que ele não é.

Pagámos por todos esses erros de formação e ajuste do plantel e agora, é só para quem acredita em milagres...

2- O Benfica queixou-se à UEFA de ter tido de jogar em S. Petersburgo, onde estava muito frio: preferia jogar em Moscovo ou, melhor ainda, no Estádio Algarve, onde o Zenit estagia, por estes dias. Conforme se viu no jogo do Sporting em Varsóvia ou nos outros jogos europeus disputados em Moscovo, as coisas estavam iguais por lá e iguais para todos. Mas o Benfica acha sempre que deve ter direito a um tratamento especial: também protestou e insinuou uma data de coisas pelo facto de ter que jogar com o Feirense... em Santa Maria da Feira.

Já quanto às datas dos jogos internos, o Benfica não se pode queixar: teve cinco dias de intervalo para preparar o jogo de Guimarães, enquanto o FC Porto teve menos de 72 horas de descanso do jogo europeu para disputar o de Setúbal. E, quanto ao célebre Benfica-Porto, estranhamente marcado para 2 de Março, prepara-se tranquilamente um escândalo de todo o tamanho. É que, ao contrário do que diz Jorge Jesus, o facto de o jogo se disputar dois dias apenas depois da Selecção Portuguesa jogar em Varsóvia e dois ou três dias depois dos jogos envolvendo outras selecções com jogadores ao serviço de Benfica e Porto «não é igual para ambos os lados»: há muito mais jogadores do FC Porto envolvidos nesses jogos do que do Benfica. E, ao contrário do que candidamente aqui escreveu o José Manuel Delgado, a questão não está no facto de todas as selecções terem jogos marcados nesses dias: a questão é que, como notou Paulo Bento, só a Liga portuguesa é que marcou jogos com clubes com jogadores convocados para dois dias depois. E logo o jogo do título! Que não podia ser no sábado, nem do domingo, nem na segunda-feira seguinte: tinha de ser antecipado para sexta! Escreve o J. M. Delgado que se trata de «nervosismo, preocupação e antecipação de justificações, caso as coisas dêem para o torto. Penso eu de que...». Muito engraçadinho, mas, infelizmente, trata-se de uma questão séria e não de uma brincadeira — pelo menos para quem acha que o desportivismo e a seriedade competitiva ainda devem ser defendidos. Penso eu de que o J. M. Delgado já está mobilizado para justificar esta golpada, como tão entusiasticamente justificou militantemente a do túnel da Luz.

O que irrita nos benfiquistas e nos seus arautos não é que eles ganhem quando o merecem. É que, até quando o merecem, nem assim se dispensem de tomar as vitórias garantidas por jogadas fora do campo: foi o túnel da Luz, uma cilada montada para afastar o Hulk vários meses; são os jogos com os clubes amigos marcados para a data que mais lhes convém, como o de ontem em Guimarães; ou marcados para o local que mais lhes convém, como o jogo contra o Estoril no Algarve; são os jogadores adversários contratados ou aliciados nas vésperas de defrontarem o Benfica; é o Bruno Paixão enviado cirurgicamente para arbitrar o Porto uma vez por ano, ao menos; e é agora o jogo do título marcado para quando se sabe que o adversário não pode estar humanamente em condições de lutar de igual para igual. Não haverá ninguém no Benfica que goste de ganhar de outra maneira?

3- Ia adormecendo a ver o Setúbal-Porto e a contar quantas vezes é que o Varela recebia a bola e logo a perdia para os adversários (foram todas, rigorosamente todas, menos o golo), e ia morrendo de tse-tse a ver vinte minutos do Sporting com o Paços de Ferreira. Mas, felizmente, mudei de canal e pude assistir a mais um festival de bola do Barcelona, contra o Valência. E, confortado, repito o que ando a dizer há seis anos: esta é provavelmente a melhor equipa de futebol que alguma vez vi jogar e Lionel Messi é o homem que vai dividir a história do futebol em duas fases: AM e DM.

4- Pouco importa que Rodrigo não se tenha lesionado no pé, com a entrada agressiva de Bruno Alves, mas tenha sim feito uma contusão ligeira na anca ao cair no relvado duro do Zenit. Para efeitos da recepção na Luz, fica o juízo de Sílvio Cervan: foi «uma tentativa de assassínio».

quinta-feira, fevereiro 21, 2013

O TÍTULO ESTÁ ENTREGUE (14 FEVEREIRO 2012)

1- Tenho uma boa notícia para os benfiquistas: o próximo campeão nacional é o SLB. É claro que nós, os portistas, vamos continuar a dar luta até onde pudermos, que, até ser matematicamente possível, nada está ainda decidido, que até ao lavar dos cestos é vindima, etc. e tal. Conversa fiada: o título está entregue. E está entregue por várias razões:
- primeiro, por mérito próprio. Embora estas coisas nunca sejam retribuídas (ou só muito tardiamente), eu gosto de tentar ser justo e ver com olhos de ver: o Benfica está a fazer um grande campeonato, ao nível do FCP de Villas Boas, na época passada, e não me parece que vá quebrar, que cometa outra vez o pecado da soberba, que tão caro pagou então. Como já aqui o escrevi, reforçou-se muito bem, consegue integrar de forma perfeita os novos reforços na equipa, resolveu excelentemente o problema da baliza, e, quando solta a cavalaria no ataque, é um caso sério.
- segundo, porque o FC Porto é treinado por Vítor Pereira.
- terceiro, porque Bruno Paixão deu um empurrão decisivo no jogo do FC Porto em Barcelos no momento certo, na primeira oportunidade que teve e não desperdiçou. Aliás, para que o mérito deste campeonato do Benfica possa ser reconhecido, mais ou menos pacificamente, convinha que acabassem, com mais de três pontos de avanço sobre o Porto - para que este não fique conhecido como o campeonato do Bruno Paixão, como o anterior ficou conhecido (para nós, portistas), como o campeonato do Ricardo Costa, aquele em que o Hulk foi afastado para garantir um caminho asfaltado até à vitória.
- e, em quarto lugar, porque o jogo do título - o Benfica-FC Porto de 2 de Março — foi marcado excepcionalmente para uma sexta-feira, 48 horas depois de toda a equipa do FC Porto ter estado ao serviço das respectivas Selecções. Sim, eu sei que também haverá muitos jogadores do Benfica na mesma situação, mas no FC Porto são praticamente todos (por exemplo, três no jogo de Portugal em Varsóvia, contra nenhum do Bem- fica). Pelo que é de prever que no dia 2 de Março, no Estádio da I.uz, no jogo que tudo decidirá, o FC Porto tenha de fazer alinhar uma equipa de sonâmbulos esgotados. Vítor Pereira tem chamado a atenção para isso, mas, estranhamente ou talvez não, ainda ninguém parece ter percebido bem o que se prepara para o dia 2 de Março e até que ponto isso pode falsificar o desfecho final deste campeonato. Sobra-me, todavia, uma dúvida, que eu gostaria de ver esclarecida (aqui mesmo, nas páginas de A BOLA, porque não?}: a data do jogo está fi- xada desde o início da época ou foi marcada recentemente? É que, se foi marcada logo no início da época, é pura incompetência do departamento de futebol do FC Porto tê-la aceite então, não antecipando que, nesta altura, pudesse estar o Benfica a disputar a Liga dos Campeões e o FC Porto a Liga Europa; se foi marcada recentemente, então trata-se de uma jogada muito pouco clara e que deve ser explicada por quem de direito.

2- Vítor Pereira tem cara de ser excelente pessoa, excelente pai de família, amigo do seu amigo, trabalhador esforçado e sério. Não tenho nada, absolutamente nada, de pessoal ou profissional, contra ele e desejo-lhe as maiores felicidades na vida e no trabalho. Dito o que confesso que já não aguento mais a sua gritante, óbvia, chocante, incapacidade para o lugar de treinador do FC Porto. E estou a ser brando: acho que ele, não apenas vai perder tudo o que há para perder, como vai dar cabo de uma equipa fantástica que herdou sem saber como nem porquê. Vítor Pereira faz-me lembrar a garagem do Cristiano Ronaldo: tem lá um Lamborghini Aventator, que acabou de comprar por 350.000 euros e que veio juntar-se a um Ferrari, dois Bentleys, um Aston Martin, um Fornasari e quatro Audi, topo-topo de gama, mas não é certo que ele os saiba guiar e que não os espete dentro de um túnel, em Londres. Vítor Pereira também tem lá vários Ferraris e Lamborghinis. mas não os distingue de Fiat Puntos e Renault 5. Ele é, por exemplo, a única pessoa que não percebeu a importância do jogo de um Fucile, um Belluschi, um Guarin ou um Candeias, que agora brilha intensamente ao serviço do Nacional. Ele é o único treinador a quem é oferecida uma promessa como o Iturbe para o potenciar e, em vez disso, encosta-o em casa, condenado à ociosidade e à desmotivação (veja-se a diferença para o que Jesus fez com Rodrigo, da mesma idade). E é, seguramente, a única pessoa de todas as que vê jogar o FC Porto, que ainda não percebeu que tem um génio ao seu serviço chamado James Rodriguez e lhe prefere banalidades como o Cristian Rodriguez, o Varela ou o Djalma. Mesmo que, uma e outra vez, o James demonstre que consegue fazer infinitamente mais em meia hora do que os três juntos em hora e meia, Vítor Pereira lá continua agarrado à sua fé de que há-de conseguir fazer de um jogador mediano ou banal um grande jogador e que há-de conseguir fazer de um extraordinário jogador um jogador desmotivado e revoltado. Quando, no final do jogo contra o Leiria, lhe perguntaram se ele não achava que as coisas tinham mudado com a entrada do James, aos 60 minutos (um golo e duas assistências, face à total nulidade do Varela), ele achou que a pergunta continha um elogio à sua pessoa e tratou de explicar que acabara por o meter porque o jogo estava a precisar de alguém assim, dotado de grande técnica, útil para romper defesas baixas e recuadas. Não per- cebeu que a pergunta era porque razão, então, esperou 60 minutos para o meter em jogo - esteve uma hora à espera de um União de Leiria com defesa alta e espaços abertos? Ou esteve à espera de um Varela rápido, clarividente, rompedor, desequilibrador?

O problema com Vítor Pereira é que ele não percebe e não aprende. Qualquer um, no lugar dele, já teria aprendido imenso em sete meses ã frente do FC Porto. Vítor Pereira, não: continua igual ao que era em Julho passado. Como dizia Einstein, ele acredita que o mesmo o erro, repetido diversas vezes, há-de um dia produzir resultados diferentes. Querem saber o que ele vai fazer contra o Manchester City? Vai pôr o Maicon a defesa direito e o Hulk a ponta-de-lança. E, depois de ler várias críticas coincidentes, vai-se contrariar e meter o James de início, em lugar do Cristian ou do Varela, conforme lhe aconselhava a sua intuição. É um caso perdido, definitivamente é um caso perdido. Excelente pessoa, sem dúvida. Mas o maior falhanço naquelas funções desde que, após uma noite mal dormida, Pinto da Cosia acordou e fez de Octávio Machado treinador do FC Porto.

3- Sejamos justos: Vítor Pereira não foi o único treinador a mostrar a sua insuficiência durante o Porto-Leiria. Manuel Cajuda veio, naquela sua linguagem elíptica, hiperbólica e torcida, queixar-se da expulsão de um seu jogador, como factor determinante do desfecho do jogo. Pois, a expulsão pode ter sido rigorosa ou não, conforme a concepção que se tem do futebol: se, para defender vale tudo, até arriscar a integridade física dos adversários, então a entrada de Shaffer a João Moutinho é apenas uma banalidade do jogo. Mas Cajuda esqueceu-se que, logo a seguir houve um penalty sobre o Hulk não assinalado e que, para o Leiria — que, desde o apito inicial, defendeu sempre com dez jogadores e não criou uma só ocasião de golo — defender com dez ou onze era igual. E tanto assim era que, ao ver-se reduzido a dez, limitou-se a tirar o único suposto avançado e continuar a defender com os mesmos dez: mudou o 5x4x1 para 5x4x0. Não foi por acaso que, dos quatro golos a seguir apontados pelo FC Porto, dois foram por defesas, que já não tinham nada que fazer lá atrás. Cajuda, que se acha um catedrático do futebol e se imagina um génio da estratégia quando o seu guarda-redes evita três golos em enormes defesas, devia talvez, digo eu, usar de maior humildade. Afinal de contas, cada vez acho mais que ser treinador de futebol não é assim uma coisa tão extraordinária. Cada equipa tem um e há muitos que só o são porque cada equipa tem de ter um.

4- Um que deixou de o ser: Domingos Paciência, ao serviço ingrato do Sporting. Tem agora uma porta aberta a norte, do seu clube de sempre e onde as coisas funcionam de outra maneira.

quarta-feira, fevereiro 20, 2013

A CAMINHO DO ABISMO (07 FEVEREIRO 2012)

1- Esta semana ficou a saber-se que o passivo do Sporting atingiu os 370 milhões de euros e os capitais próprios 183 milhões negativos - ou seja, a falência, ainda não declarada; que o Vitória de Guimarães falhou a tentativa de se vender aos árabes e está igualmente falido, não pagando salários há três meses - sensivelmente a mesma situação do seu homónimo de Setúbal; que o Marítimo, clube sustentado pelo dinheiros dos contribuintes via governo regional (como todos os outros da Madeira), pagou a Segurança Social com um cheque careca, publicamente anunciado pelo seu presidente, e mais uma série de casos que seria cansativo estar a enumerar. Ou seja, agora que a banca fechou o crédito, a bolha especulativa do futebol português ameaça rebentar com todo o estrondo. Nada que não fosse de prever e que não tenha sido previsto por muita gente, há muito tempo.

Entre todos os clubes cuja situação financeira se conhece como dramática, avultam dois históricos do futebol português: o Vitória de Guimarães e o Sporting. À sua dimensão, ambos têm sido, nos últimos anos, dois casos lineares de má gestão, todavia com uma subtil diferença: enquanto o presidente do Vitória de Guimarães se pode gabar de ter levado à falência financeira e à irrelevância desportiva um clube que é o quarto em assis-tências, com uma massa associativa notável — portanto, sem atenuantes que se conheçam - o caso do Sporting é diferente. Como aqui o escrevi há tempos, e para grande indignação dos meus amigos sportinguistas, o problema de fundo do Sporting é o de um definhamento progressivo e natural, a partir do momento em que o clube viu ser-lhe roubado pelo FC Porto o segundo lugar em tudo, incluindo no estatuto de challenger do Benfica. O Sporting, por mais que isto custe ouvir aos sportinguistas (mas é apenas a minha opinião...), há muito que perdeu o estatuto de grande do futebol português e eu duvido que algum dia o consiga recuperar. Hoje, discute com o Braga o lugar de primeiro dos clubes médios, fingindo acreditar que ainda pode atingir a galáxia onde vivem Benfica e Porto. E, de cada vez, que o Sporting e os seus dirigentes, num assomo de orgulho fundado em defuntas glórias, tenta recuperar num passe de magia todo o caminho perdido ao longo dos anos como este ano sucedeu com o investimento de tudo ou nada na equipa de futebol — o resultado é afundar-se mais ainda na depressão financeira, sem retorno desportivo. Ou seja: um passo mais em direcção ao abismo.

Julgo que há aqui também uma grande responsabilidade da comunicação social, que assistiu a tudo isto sem nada questionar. Durante muito tempo, por exemplo, interroguei-me aqui sobre o que seria o célebre Projecto Roquette, que nos era apresentado como um ovo de Colombo para a ressurreição do Sporting. Continuo sem saber o que era, mas agora sei o que foi: o princípio do descontrole financeiro e a construção de um estádio que, sob qualquer ponto de vista, foi um erro monumental. O mesmo em relação à gestão de Dias da Cunha, a quem a comunicação social ampliou sempre, sem se interrogar, cada catalinada que ele dizia, em tom de superioridade: hoje sabemos também que a sua gestão foi o golpe final na falência por declarar. Os meus leitores habituais sabem o quanto tenho sempre questionado os actos de gestão da SAD do FC Porto, que me parecem errados, irresponsáveis ou ruinosos. Mas, apesar de tudo, o FC Porto não está na mesma situação do Sporting. Longe disso e com duas importantíssimas diferenças: primeiro, tem obtido resultados desportivos como nunca outro clube português obteve; segundo, dispõe de um good will, como dizem os economistas, que leva a que o nome FC Porto tenha um valor e uma apetência de mercado que tomara o Sporting! Fosse eu sportinguista e aquilo que fui escrevendo teria sido bem diferente... É sem dúvida um triste sinal da situação em que caiu o Sporting que agora se discuta a serio a hipótese de vender o clube aos chineses. Assim como o é o facto de o presidente do Vitória de Guimarães ter jogado todas as suas esperanças (inclusive a de conseguir pagar salários aos jogadores), na hipótese de um qualquer sheik árabe vir aí comprar o clube. Eis o cúmulo da humilhação a que conduziram gestões irresponsáveis: dois dos clubes com maiores pergaminhos no nosso futebol estão reduzidos à condição de suplicantes de dinheiro árabe ou chinês, o que quer que seja, sem lhes importar sequer se esse dinheiro é lavagem de negócios obscuros ou presentes envenenados para servir outros fins. E, enquanto vivem na esperança da quimera de ouro, os seus clubes desabam desportivamente. Seria de esperar outra coisa?

Mas estes são apenas os primeiros sinais e as primeira vítimas de uma ilusão geral, que vai provocar, seguramente, um violento despertar. Há vários sinais que estão aí, para quem os quiser ver, e que ameaçam todos, grandes incluídos: os fundos de jogadores, que têm sido uma panaceia para os nossos clubes irem às compras, estão sob vigilância e suspeita da FIFA; os direitos televisivos são aqueles que o nosso deprimido mercado pode pagar e não o que se sonhava, como o aprendeu o Benfica, depois das suas bravatas com a Olivedesportos; e as vendas milionárias de jogadores aos potentados europeus parecem vir a tornar-se chão que já deu uvas, como acaba de o perceber o FC Porto, que não conseguiu vender nenhum jogador neste mercado de Janeiro, mas apenas emprestar, grátis e à experiência, o Fucile, o Guarín e o Belluschi.

2- Pois, a saída do Guarín e do Belluschi, em troca do regresso de Lucho, é uma jogada de alto risco. Imagine-se que o Lucho se lesiona: quem é que resta como médios de ataque, criativos e capazes de rematar à baliza as segundas bolas? Ninguém: resta o Defour e o Moutinho, dois médios do tipo pare, escute e olhe, com os quais nenhum ataque consegue ser apoiado a partir de trás. O mesmo se diga do risco corrido com a contratação de um ponta-de-lança que não pode jogar a I.iga Europa, deixando o FC Porto, como já sucedera na Liga dos Campeões, entregue à improvável inspiração do Kleber.

Dito isto, foi muito bom ver em acção as novas aquisições do FC Porto, e só foi pena que Vítor Pereira tenha prosseguido o seu processo de destruição e desmotivação de Iturbe - afastado da l.iga Europa, do campeonato e, agora também até da Taça da Liga. É um perigo um treinador que acha que o Maicon é melhor lateral direito que o Danilo, que acha que o Deffour é melhor que o Belluschi e que acha o Cristian Rodriguez melhor que o James (que só joga por pressões da crítica e dos adeptos).

Depois de ver Danilo contra o Vitória de Setúbal, vai ser difícil a Vítor Pereira tirá-lo da equipa. A aposta é que ele o puxe para médio, para poder manter o Maicon a defesa. Será um disparate, sobretudo para consumo interno: a aposta devia ser a do Maicon no lugar do Rolando ou do Otamendi, mas, para isso, é preciso coragem. Já Lucho, que regressou na sua versão de luxo, tornou-se imediatamente intocável. Com ele em jogo, voltámos a lembrar o que é um médio de ataque, capaz de antecipar a jogada seguinte antes de receber a bola, capaz de rematar à baliza sem ser para se desfazer da bola, capaz de levar todo o jogo para a frente com passes ao primeiro toque, de abrir linhas de desmarcação fatais, que só não foram melhor aproveitadas porque nos flancos estavam o Cristian Rodriguez e o Varela, dois pesos pesados, esforçados mas inúteis. (Mas, assim que entrou o James e I.ucho o desmarcou, logo resultou uma assistência para o segundo golo). E até Janko, não tendo deslumbrado (nem ninguém esperava tal), mostrou as qualidades essenciais de um ponta-de-lança coisa de que também andávamos esquecidos. Enfim, tirando o facto de não termos ponta-de-lança para enfrentar o Manchester City, se l.ucho não se magoar e continuar a mostrar o que se viu no seu regresso, pode ser que toda a equipa suba de rendimento, pois até Moutinho e Deffour melhoraram, por contágio, com l.ucho a mostrar como se faz.

terça-feira, fevereiro 19, 2013

BRUNO PAIXÃO E VÍTOR PEREIRA: A FIRMA FATAL (31 JANEIRO 2012)

1- O futebol profissional é hoje um negócio de milhões, que não se compadece nem com amadorismos nem com incompetências larvares. Muitas vezes acontece, e há de continuar a acontecer, um clube ser prejudicado ou beneficiado por determinada arbitragem: aconteceu no sábado ao Benfica, que ganhou um jogo que não mereceu ganhar graças à actuação de um juiz-de-linha que parecia apostado em impedir qualquer hipótese de golo do Feirense. Também aconteceu domingo ao Sporting ganhar ao Beira-Mar com dois golos de um jogador que, segundo as regras em vigor, deveria ter sido expulso no primeiro minuto. São coisas que acontecem, umas vezes é-se beneficiado, outras é-se prejudicado, e o único clube que se acha sempre prejudicado – até quando é beneficiado, como anteontem - é o Sporting Clube de Portugal. Este ano as coisas por cá (e à excepção das eternas lamúrias dos sportinguistas), até estavam a correr razoavelmente bem, com queixas e benefícios repartidos. No que ao FC Porto respeita, toda a gente dos rivais o viu como beneficiado no jogo da 1ª jornada, em Guimarães, ganho de penalty — e em mais nenhum. Porém, a critica foi unânime em considerar que esse penalty existiu mesmo, assim como tinham existido quatro outros não assinalados a seu favor oito dias antes, no jogo da final da Supertaça contra o mesmo Guimarães. De então para cá, vi várias vezes o FC Porto ser alvo de arbitragens hostis (como contra o Guimarães, outra vez, ainda na semana passada), mas a equipa foi ultrapassando os azares com os árbitros sem consequências palpáveis à excepcão do jogo de Olhão, onde deixou dois pontos, graças a um erro de arbitragem.

Porém, tudo muda quando entra em cena um árbitro que já todos conhecem de ginjeira e todos sabem ao que vem. Desde o inesquecível jogo de Campo Maior que não resta dúvida alguma do objectivo que trouxe o sr. Bruno Paixão para o futebol. Porque, de facto, nunca na minha vida tinha visto actuação tão chocante como essa, escrevi então que aquele árbitro devia imediatamente ser afastado do futebol, quando ainda estava no início uma carreira da qual era de esperar o pior possível. Porém, e como é costume lusitano, quando se inicia uma carreira pública não há forma de a parar, sem ser por vontade do próprio. Bruno Paixão lá foi fazendo a sua carreira sempre subindo, claro - apesar de ter sempre mostrado exuberantemente que, tal como era de temer, é capaz de não ter pinga de isenção nem pinga de competência. Ele é, por opinião unânime (excepto, seguramente, a dos benfiquistas de má-fé) o pior árbitro em actividade na primeira categoria. E, quando a isso junta um histórico, sem desfalecimentos, de prejuízo ao FC Porto e benefício ao Benfica, é pura provocação nomeá-lo para um jogo do qual pode depender a escolha do campeão entre Porto e Benfica.

Chamado a Barcelos, Bruno Paixão não falhou na sua missão. De acordo com o consenso geral da critica, teve três erros que influíram directamente no resultado: validou mal um golo ao Gil e perdoou-Ihe dois penalties — o suficiente para que o resultado, em lugar de ter sido 3-1, tivesse sido 2-3. E, como não há dúvidas nesses trés lances, falarei apenas de mais um, também decisivo (e partindo do princípio, que a televisão não conseguiu demonstrar, de que o terceiro golo do Gil não parte de off-side). Esse outro lance é aquele de que resulta o primeiro golo do Gil e que é eloquente da senha de Bruno Paixão contra o FC Porto: dois jogadores, um de cada lado, disputam a mesma bola, levantando o pé exactamente à mesma altura. Decisão dele: livre contra o Porto. Porque, pergunta-se, e a resposta só pode ser uma: porque sim.

Que o FC Porto jogou péssimamente, jogou. Mas que perdeu por que o Gil jogou bem, não é verdade. O Gil Vicente jogou bem contra o Benfica, um jogo que bem mereceu ganhar. Contra o FC Porto, em vão se procurará, alem dos três golos, qualquer outra oportunidade, um remate perigoso, uma defesa apertada do Helton; nada disso existiu. O Gil teve menos de metade de posse de bola que o FC Porto, menos de um terço dos remates à baliza, um quarto dos ataques e zero cantos contra seis. A «eficácia» de que falou Paulo Alves traduziu-se em aproveitar em golo um livre e um penalty mal assinalados.

Não foi o Gil Vicente que venceu o FC Porto e que pôs fim à tentativa de recorde de invencibilidade. Com todo o respeito pelos esforço dos seus profissionais, quem venceu o FC Porto foi Bruno Paixão e ninguém mais. Provavelmente terá conseguido até evitar pela segunda vez que o Porto seja campeão. Um certo futebol, um certo sistema, recordará para sempre seu nome com entusiasmo. E, entretanto, para aí vai continuar, a fazer mais do mesmo, como se nada fosse. Se querem saber como é que Portugal desceu onde desceu, ponham os olhos no caso de Bruno Paixão. A impunidade de que goza é o exemplo acabado da regra de jogo, entre nós.

2- É claro que a «vergonhosa» prestação de Bruno Paixãoe e seus acólitos serviu às mil maravilhas a Vítor Pereira para explicar a derrota. Isso e a péssima primeira parte dos jogadores. Mas basta olhar para a equipa que ele escolheu para a primeira parte para antecipar o que ia suceder. Confrontado com a ausência de Hulk, como eu sempre temi, Vítor Pereira mostrou não ter nenhum Plano B - pelo contrário, pareceu-me mesmo que ele não realizou a necessidade de reforçar o poder desequilibrador ofensivo de outra forma. Só isso explica que mantenha o Maicon a lateral direito, sabendo que ele defende bem mas não ataca. Desfez-se tranquilamente de um lateral da categoria do Fucile, encostou o Sapunaru e, tendo finalmente recebido o Danilo, por quem se pagou uma fortuna, continua a ver «onde é que ele pode encaixar»; no Santos e na selecção brasileira, faz todo o corredor direito; no FC Porto de Vítor Pereira, ainda não se sabe para que serve. Mas Vítor Pereira também não percebeu ainda que só tem um médio criativo de ataque (visto que, misteriosamente também, abdicou do Guarín, que interessa ao Inter e à Juventus, mas não ao clube que lhe paga): esse médio é, como toda a gente sabe, o Belluschi, ao qual ele prefere um jogador completamente banal como Deffour ou outro completamente previsível, como João Moutinho, ainda por cima jogando a um ritmo de Dormicum. Em Barcelos, Vítor Pereira juntou ainda mais uma escolha que mostra a profundidade do seu pensamento estratégico: na hora do tudo ou nada, quando se pedia um jogador repentista no drible e no remate, ele meteu...o Cristian Rodriguez, deixando mais uma vez no banco, em «processo de adaptação», o miúdo Iturbe, de quem meio mundo diz maravilhas e já pensa recuperar de volta, face à inutilidade a que o votou o treinador nortista.

Ao fim da primeira parte do jogo de Barcelos, o FC Porto não tinha criado uma oportunidade de golo e, que me lembre, não tinha sequer feito um remate à baliza. Toda a gente o viu, até Vítor Pereira. A minha pergunta é: para que precisou ele de 45 minutos, dois golos de desvantagem e duas páginas de apontamentos para reagir ao que estava a ver?

3- Há um outro problema a carecer de uma solução urgente neste FC Porto: o sistema de jogo, de há muito implantado e com óptimos resultados, pede um ponta de lança e o sacrifício de Hulk nessa posição não resolve o problema e enfraquece o flanco. E, manifestamente, Kleber não serve. Estamos perante um daqueles casos em que um bom avançado de uma equipa média não resulta numa equipa grande: um avançado-centro de uma equipa como o FC Porto, que faz 47 ataques num jogo, não pode estar até ao minuto 90 para finalmente conseguir um remate à baliza. Kleber, para já, pelo menos (e já é o que interessa), tem o oposto do instinto matador que deve caracterizar qualquer bom ponta-de-lança: nunca consegue que os companheiros o encontrem desmarcado, nunca consegue estar onde a bola vai aparecer. E nenhuma equipa pode aspirar a um título sem um guarda-redes que evite golos e um ponta-de-lança que os invente. Alguém que, como disse Falcão, transforme o impossível em possível — ao menos, de vez em quando. Foi o grande erro de planeamento desta época, cometido pelo FC Porto. Mas, atendendo ao estado de urgência absoluto, não seria de experimentar um júnior?

segunda-feira, fevereiro 18, 2013

O PESADELO DE MOURINHO (24 JANEIRO 2012)

1- Muitos anos depois de deixar de ser treinador, José Mourinho ainda há-de ter pesadelos com o Barcelona de Guardiola, com Messi, Xavi, Iniesta, Fabregas e Cª. Noites a fio, ele há-de procurar em vão o sono, fechará os olhos para dormir e tudo o que conseguirá é ver imagens de um relvado a perder de vista onde um grupo de homens equipados à Barcelona dançam por entre figuras brancas, inertes, passando por elas uma e outra vez, até as fazerem cair para o chão de tonturas. O Barcelona tem sido impiedoso com o Real de José Mourinho: 73% de posse de bola em pleno Chamartin, lições de futebol sucessivas e confrangentes, Messi ofuscando em génio e eficácia um Cristiano Ronaldo desamparado de deuses e homens, reduzido à condição de lebre cega a correr atrás de bolas atiradas lá para a frente em desespero (e a tanlo se resumindo o ataque do Madrid) . Esta cena repete-se jogo após jogo, com a fatalidade das coisas irremediáveis, até chegar inevitavelmente à questão mais angustiante para Mourinho: será este Barcelona de Guardiola que é imbatível ou será este Real Madrid que não consegue encontrar a receita para, ao menos de vez em quando, o conseguir travar?

Não obstante os cinco pontos de avanço no campeonato, não obstante uma primeira fase da Champions 100% vitoriosa, não obstante os 4-1 ao Bilbao anteontem, Mourinho começa a escutar os primeiros assobios das bancadas do Bernabéu. Nada disso é suficiente para a affición madridisla: a guerra Real-Barça, ou Castela- Catalunha, é uma guerra particular, em que nenhumas outras vitórias laterais podem compensar sucessivas humilhações de uma das partes às mãos da outra. E, quando chega a hora da verdade, o Barça, não apenas ganha, como também humilha o Real: redu-lo à condição de equipa menor, mendigante, perdida em campo, não parecendo ter qualquer ideia do que fazer. E, para agravar as coisas, Mourinho não sabe perder, enquanto que Guardiola é um senhor a vencer. Lendo a imprensa espanhola dos últimos dias, percebe-se que Mourinho está agora na angustiante situação em que, quinhentos anos atrás, se encontrou outro português também com o orgulho e a angústia de comandar outra armada de Castela: Fernão de Magalhães. Também então Magalhães teve de arrostar com a surda revolta dos seus capitães espanhóis, que viam em qualquer desaire momentâneo ou em qualquer hesitação sua um sinal infalível da incompetência do português. A determinada altura da sua longa e desesperada busca do paso que ele sabia unir o Atlântico ao Pacífico e às «ilhas das especiarias», algures na ponta meridional do continente americano. Magalhães recolheu-se a uma baía para invernar e aproveitou uma tímida dissensão dos capitães espanhóis para cortar o mal pela raiz: matou dois deles e largou os outros em terra, abandonados de tudo.

Mas Mourinho não pode seguir o exemplo de Fernão de Magalhães nem se pode dar por vencido, porque isso seria deitar ao chão e pisar uma carreira de triunfo e uma aura de vencedor, que são a sua razão de ser. Ele não pode abandonar Espanha antes de ter encontrado o paso para dobrar este incrível Barcelona. Mas, entretanto e friamente, a Espanha agradece-lhe o fracasso: graças a ele, graças às sucessivas tareias futebolísticas que o Barça dá no Real, os desejos independentistas da Catalunha andam adormecidos: fosse a Catalunha independente, e, em lugar destas jornadas gloriosas de Madrid, o FC Barcelona estaria limitado a disputar o título de campeão da Catalunha com o Espanhol de Barcelona. Mais vale reinar em toda a Espanha sem ser independente do que reinar independente no quintal da Catalunha.

2- Quanto ao nosso Pepe, é evidente que, na melhor das hipóteses, estamos perante um caso clínico, do foro psiquiátrico. Por sorte sua, ele é um superdotado para o futebol: se o não fosse, seria certamente um caso triste, na vida comum. Mas, tendo tido a sorte de jogar num clube como o Real Madrid, pago a peso de ouro, com estádios cheios a aplaudi-lo e uma vida de luxo; tendo lido a sorte de representar a Selecção de um país que o acolheu como seu; e tendo tido ainda a sorte de ter sido perdoado, com uma leve pena, para a brutalidade do seu comportamento contra um adversário (Casquero), Pepe não tem mais perdão. Tomara tantos e tantos milhares de miúdos com jeito para o futebol terem tido a sorte que ele teve e as oportunidades de que dispôs! Infelizmente, a dúvida de saber se algum dia ele arrepiará caminho tem toda a razão de ser. E tem-na, sobretudo, porque, quando devia pedir perdão pelo seu ges-to inqualificável sobre Messi, ele preferiu vir dizer que foi sem intenção - como se o mundo inteiro não o tivesse visto a olhar bem para ver onde estava a mão de Messi, para não falhar a pisadela com os pitons. Paulo Bento tem de meditar muito bem se vale a pena continuar a contar com Pepe na Selecção: se vale a pena como estratégia e se vale a pena como exemplo.

3- Outro português às voltas com os castelhanos: Carlos Pereira, presidente do Marítimo e recente vencedor não oficial das eleições para a Liga de Clubes. O mesmo Carlos Pereira que fez a guerra que fez com a ida de Kléber para o FC Porto, que obrigou o jogador a ficar mais um ano, contrariado, no Marítimo, que apregoou que com ele ninguém fazia farinha, o que fez ele agora com a deserção de Babá para o Sevilha, que fez ele com a humilhação de ver o jogador apresentado publicamente em Espanha quando ainda nem sequer tinha rescindido com o Marítimo e não havia acordo entre os clubes? Pois, fez apenas isto: foi a Espanha a despacho, assinar com o Sevilha a cedência do jogador, pelo preço que os espanhóis queriam e nas condições deles! Grandes bravatas... para uso interno.

4- Muito gostava que alguém da direcção do FC Porto viesse explicar o estranho e nebuloso contrato de compra do Danilo ao Santos, envolvendo 18 milhões de euros, seis meses de espera e a cedência gratuita do Fucile por um ano. E gostava de perceber como é, depois de tanta espera e tanto empenho, o treinador Vítor Pereira veio declarar que é preciso ir descobrindo quais são as características do jogador e como é que ele se poderá encaixar na actual equipa. Como, ainda não sabe?

E, já agora, gostava também de perceber porque razão o FC Porto apenas consegue emprestar os jogadores que quer vender, enquanto que a nós ninguém nos empresta ninguém: vendem caro, definitivamente e com contratos de longa duração.

5- Tinha três certezas, antes do FC Porto-Guimarães: que o Hulk não seria recuperado a tempo (porque as avaliações do departamento médico são sempre mais optimistas do que a realidade); que o Danilo não iria jogar de início (porque o treinador não prescinde de o ir «adaptando»); e que, entrando o Danilo, ficaria de fora o Iturbe (pela mesma razão, acrescida). Tudo bateu certo, mas, felizmente, as coisas correram melhor do que o costume. E achei um modelo de anti-desporlivismo as declarações de Nuno Assis, no flash-interview: como é possível conseguir queixar-se de uma arbitragem (mais uma...) tão chocantemente anti-portista que quase conseguia alterar o resultado?

Aquilo que não esperava de todo foi a lição de bola que o Gil Vicente deu em pleno estádio da Luz. Um Benfica totalmente desinspirado ficou a dever a vitória a uma defesa imensa de Artur (o seu melhor jogador) e a um remate feliz de Rodrigo. Duas oportunidades, três golos: espero bem que não seja já a estrelinha de campeão.

6- E uma palavra final para aquele que considero o maior campeão português de todas as modalidades: Nelson Évora. O seu azar foi tremendo, mas a sua força de vontade não fica atrás. Espero bem vê-lo ainda em Londres, no próximo Verão, como ele tanto merece.

domingo, fevereiro 17, 2013

O FIM DE UMA ILUSÃO (17 JANEIRO 2012)

1- Verdade se diga, os sportinguistas nunca se afirmaram claramente como candidatos ao título desta época: apenas disseram que gostariam de o ser ou, pelo menos, de serem levados mais a sério nessa luta do que o são habitualmente. Porém, uma nova direcção, a contratação de Domingos e de quase uma vintena de novos jogadores, a par de evidentes melhorias no futebol jogado, logo levaram muitos a querer concluir diligentemente que tínhamos mesmo candidato e já este ano. Como os leitores sabem, nunca foi o meu caso: a mim, sempre me pareceu evidente que o Sporting estava vários furos abaixo dos seus principais rivais em tudo, como aliás o próprio Domingos reconheceu. E, embora Luís Duque garanta que esta equipa fez já várias coisas «extraordinárias», eu não me consigo lembrar quais: sei sim que, com excepção do jogo da Luz, que perdeu, o Sporting ainda não tinha chegado aos grandes testes na Liga (e para apontar à final do Jamor, na Taça, bastou -lhe um rico sorteio, a displicência de Benfica e Porto e uma vitória caseira sobre o Braga).

Os grandes testes começaram agora... e o Sporting baqueou, embora seja forçoso reconhecer que teve alguns jogadores importantes lesionados na pior altura. Em contrapartida, não encontra a menor desculpa nas arbitragens, antes pelo contrario: só não ficou praticamente afastado do Jamor porque, mais uma vez, se aproveitou da superioridade numérica para recuperar e beneficiou de um golo irregular, já depois da hora (há um off-side posicional que claramente impede o guarda-redes do Nacional de ver a bola). E, no campeonalo, os oito pontos que Eduardo Barroso se queixa que lhes tiraram já não bastariam para os fazer igualar Benfica e Porto... Perdida a luta pelo título, perdida, sem dúvida, a luta pelo segundo lugar, ao Sporting resta levar muito a sério o desafio do Braga e tentar vencer a luta pelo último lugar do pódio e o último a dar acesso à Champions. Aliás, e esquecendo aquelas absurdas estatísticas da tal Fundação das Estatísticas do Futebol, è da mais elementar justiça reconhecer que os últimos anos têm consistentemente afirmado o Braga acima do Sporting, como o quarto grande (ou o outro médio, sendo que então haveria só dois grandes, Porto e Benfica).

No jogo de Braga com um resultado justo e previsível desde o início, mais uma vez constatei esta característica, tantas vezes fatal, dos treinadores portugueses, quando confrontados com um jogo difícil: refugiarem-se em alternativas que privilegiam o reforço do meio-campo e do jogo defensivo com jogadores certinhos e de com- tenção, em prejuízo dos jogadores desequilibradores e mais ofensivos. Querem ganhar o jogo, defendendo, em obediência ao princípio de que o melhor ataque é uma boa defesa. Assim, vimos Domingos Paciência jogar com um lateral adaptado a extremo-esquerdo - o que obrigou ainda Capel a vir para a direita, onde rende manifestamente menos - e deixando no banco aquele que é o único desequilibrador do ataque sportinguista, o miúdo Carrillo.

Para se defender da opção falhada, Domingos usou a mesma desculpa que Vítor Pereira usou em Alvalade para ter deixado James Rodriguez no banco durante 75 minutos: ambos, segundo os respectivos treinadores, tinham passado a semana com febre. Mas, se assim foi, se estavam incapazes, não se percebe porque foram convocados e sentados no banco. E se porventura a sua condição física não lhes consentia o jogo todo, não se percebe porque não arriscaram neles de início, tirando-os quando já não aguentassem, em lugar de os meter só no final, em situação de estado de necessidade. Certo é que, em ambos os casos também, assim que James e Carrillo entraram, logo o ataque das suas equipas ganhou nova alma e novo talento — tarde de mais, porém. E também não percebi porque razão, com 2-0 no marcador e avenidas abertas ao contra-ataque do Braga, Leonardo Jardim resolveu tirar o seu mais talentoso jogador e grande municiador do ataque, Márcio Mossoró, para apostar num médio defensivo, que nada trouxe de novo, apenas convidou o Sporting a vir para a frente, reduzir a desvantagem e ameaçar o empate. São estratégias que me ultrapassam....

2- James Rodriguez, aliás, não se fez esperar nem uma semana para (mais uma vez!) mostrar a Vítor Pereira aquilo que ele parece ser o único a não ter ainda entendido bem: que tem nas mãos um diamante fabuloso, que, mesmo que passe uma semana sem se treinar e com febre, vale muito mais do que um Cristian, um Djalma ou um Varela estoirando de saúde. E que não é apenas (e, se calhar, nem é sobretudo) um extremo-esquerdo fixo no lugar, mas um verdadeiro número 10, flutuando nas costas do ataque e decisivo para partidas com equipas recuadas na defesa. Contra o Rio Ave, foi o seu talento puro que resolveu a Vítor Pereira um problema que se começava a tornar preocupante, sobretudo depois da saída de Hulk, e causado por um ataque formado por três extremos-esquerdos, sem ponta-de-lança, sem lateral-direito em apoio e com um jogador tão fabuloso como Hulk deslocado da sua posição natural e fechado num colete de forças entre dois centrais, sem o espaço de que precisa para romper as defesas. A entrega dos jogadores é imensa, o esforço físico também, a motivação está lá, outra vez. Mas, do meio campo para a frente, falta uma ideia de jogo clara e eficiente, que os jogadores possam entender e servir. Se nem de fora se percebe qual é o esquema de jogo!

3- Confesso que não liguei atenção ao assunto e só despertei para ele tarde e graças a uma coisa que escreveu o Rui Moreira e outras coisas que li avulso e como se não tivesse importância. Escrevo, pois, com as cautelas devidas a quem pode estar a escapar alguma coisa. Mas parece (digo parece) que, mais uma vez, o Benfica se dedicou a uma das suas jogadas favoritas: contratar um jogador na véspera de ir defrontar o seu clube. Desta vez, esta prática tão desportiva e reveladora, deu-se na véspera da deslocação a Leiria, com a compra do avançado Djaniny. O mais grave, porém, é que parece também que essa aquisição e o sinal ou preço logo pago pelo Benfica, permitiu à direcção do União pagar aos seus jogadores salários em atraso. Ou seja, quando entra-ram em campo para defrontar o Benfica, os jogadores do União sabiam que deviam ao seu adversário os salários recebidos. Se tudo isto é verdade e aconteceu mesmo assim, será , de facto, um escândalo, que a Liga de Clubes fique em silêncio. Em Inglaterra, uma jogadinha destas teria consequências violentas para o Benfica. Parece que há por lá uma coisa a que eles chamam fair-play.

4- E, por falar em Liga e segundo também percebi, o seu novo presidente deve a eleição à compra de votos no restrito colégio eleitoral da Liga. E digo compra e não conquista (o que seria normal), porque ele ganhou a eleição prometendo aos pequenos clubes o alargamento da primeira liga, em prejuízo dos grandes (cujo problema principal é a sobrecarga de jogos dos seus jogadores, entre clube e Selecção). Foi assim eleito contra o voto dos grandes e contra o interesse da competição - que precisa sim de um campeonato com menos clubes e não com mais, e eventualmente com mais jogos, mas jogos que valham a pena e não apenas oportunidades de transmissões televisivas. Confesso que nunca tinha ouvido falar no Dr. Mário Figueiredo e desconheço por completo qual seja o curriculum que o torna adequado ao cargo. Mas já fiquei a perceber como é que lá chegou. E o que percebi não é grande recomendação.

5- O Sporting, que tão mal tem gerido o assunto das imagens do balneário dos visitantes em Alvalade, resolveu, além de proibir a entrada do jornal Público nas suas instalações, instaurar-lhe uma acção em que, dizem, vai exigir um milhão de euros de indemnização. Pois, acções judiciais qualquer um pode instaurar e pode-se pedir os milhões de indemnização que se quiser, desde que se seja rico, como Sporting é, e se possa deitar fora um dinheirão em custas judiciais: o Estado agradece. Mais difícil é provar os danos causados pela simples revelação de um facto — a divulgação das fotografias do túnel do balneário. Sobretudo, quando são eles próprios a dizer que as ditas fotografias são perfeitamente aceitáveis e banais - aliás, recomendáveis. Em que ficamos, afinal: são óptimas para serem vistas pelos adversários, mas difamatórias se reveladas a terceiros?

sábado, fevereiro 16, 2013

«HÁ QUE LEVANTAR A CABEÇA» (10 JANEIRO 2012)

1- Entrevistado no final do jogo de Alvalade, o brasileiro Hulk - o seu maior protagonista - saiu-se com a frase utilizada dez em cada dez vezes pelos jogadores, após resultados negativos: «Há que levantar a cabeça!» Utilizada por ele, naquele contexto, a frase traduziu aquilo que Hulk concluiu sobre o desfecho do jogo: foi um mau resultado para o FC Porto. Mau, não em função daquilo que o jogo foi, mas daquilo que devia ter sido e não foi.

O FC Porto, tal como O Sporting, não jogou para ganhar: jogou para não perder. O medo da derrota e o respeito mútuo comprometeram o jogo de ambas as equipas e fizeram do clássico dc Alvalade um jogo que não ficará para a história. Três oportunidades de golo para cada lado, ligeiramente mais bola para o Sporting, mas mais ataques e mais remates para o Porto. Um erro do árbitro para cada lado, nenhum com influência. De positivo, o jogo teve ainda poucas faltas, nenhuma entrada de massagistas em campo, nenhum jogador a fazer fitas, ninguém a perder tempo deliberadamente. Já não é mau.

Foi assim que eu vi o jogo, mas já sei que a versão sportinguista é, fatalmente diferente. Para eles, o que marcará o jogo é um off-side supostamente mal tirado a Van Wolfswinkel. que deixaria Elias isolado. Assim, mais uma vez, o Sporting só perdeu pontos por culpa do árbitro, como muito bem notou, aliás, João Pereira - para quem, também, só existiram duas oportunidades de golo e ambas do Sporting. O Sporting saiu do derby definitivamente fora da corrida ao título (não acredito que recupere uma soma de 14 pontos aos dois rivais), mas, apesar de tudo. satisfeito por não ter saído com estrondo, entregando a candidatura em casa, após derrota com o grande rival do norte, como tantas vezes tem sucedido nos últimos anos.

Pode-se dizer, pois, que o Sporting fez melhor (e está a fazer melhor) que o habitual. Quem fez pior foi o FC Porto. Um FC Porto com a ambição a um nível normal teria ganho em Alvalade. Foi nisso que eu apostei, mas, infelizmente, enganei-me. Mas como poderia também imaginar que o James Rodriguez, um jogador fabuloso, infelizmente confiado à gestão de Vítor Pereira, seria relegado para o banco, em detrimento de um sabidamente inútil Cristian Rodriguez? E que, acrescendo a esse erro de casting, mais uma vez, jogando sem ponta de lança, o ataque do FC Porto ficaria transformado numa absoluta confusão táctica, em que toda a esperança residia num golpe de génio solitário de Hulk?

O jogo todo, aliás, girou à roda do fenómeno brasileiro: quando ele pegava na bola, os corações portistas agitavam-se e os sportinguistas gelavam; quando a bola andava longe dele, era outro jogo. com gente normal fazendo esforçadamente o melhor que podiam.

Imaginem uma outra equipa do FC Porto, assim alinhada: Beto; Fucile, Mangala. Souza e Alex Sandro; Danilo, Guarín e James Rodriguez; Varela, Kleber e Iturbe. E, para suplentes, Bracali. Sapunaru, Emídio Rafael, Defour, mais os emprestados ao Rio Ave, Christian Atsu e Kelvin. Sabem que equipa é esta? É a equipa de jogadores não alinhados de início por Vítor Pereira em Alvalade e que, todos juntos, custaram ao FC Porto para cima de 70 ou 80 milhões de euros. Alguns foram emprestados porque não tinham lugar na equipa de Vítor Pereira; outros estão em baixo de forma continuada e, aparentemente, irrecuperável; outros não se sabe porque foram comprados, se não há lugar para jogarem; outro acabou de chegar e não há pressa em experimentá-lo, apesar dos 19 milhões que custou; e outro, que demorou seis meses a chegar e com fama de fenómeno, continua numa fase de adaptação tão prolongada que só estará adaptado quando tudo já estiver resolvido. Se alguém quiser perceber a razão porque a SAD do FC Porto está a viver tamanhos apertos de dinheiro, tem aqui a explicação.

Mas uma coisa é certa: apesar das também mais de 20 contratacões efectuadas pelo Sporting esta época, o que não faltou a Vítor Pereira em Alvalade foi matéria-prima para ganhar o derby tranquilamente, com a autoridade que lhe conferia a diferença de valor entre uma e outra equipa. Diferença claramente favorável aos portistas, excepto numa coisa; com Domingos Paciência no banco azul e branco, tinhamos ganho tranquilamente. A única coisa que falta a este FC Porto é um ponta-de-lança, já não digo à altura de fazer esquecer Falcão, mas a altura daquele que era, até Alvalade, o melhor ataque do campeonato. Mas não fui eu que fiz o plantel, no início da época. Não fui eu que juntei oito (!) extremos-esquerdos (e diz-se que ainda querem o Yannick!), nenhum extremo direito, e um centro de ataque confiado a Walter e a Kleber, de tal modo que foi jogar a Alvalade com um ataque formado por três extremos esquerdos, embrulhados uns nos outros, num novelo táctico que ninguém conseguiu desatar.

Diz Pinto da Costa que quem critica Vítor Pereira não percebe nada de futebol. Deve ser o meu caso - só resta saber o que seja perceber de futebol. Confesso que nunca tinha visto uma equipa, que supostamente queria ganhar um jogo difícil, entrarem campo com uma frente de ataque formada por três extremos-esquerdos. E duvido que haja algum treinador no mundo que, percebendo de futebol, prefira apostar em Cristian Rodriguez para ganhar o jogo, deixando no banco James (ver-se-á quem tem razão quando vierem buscar o James por milhões que jamais foram ou serão oferecidos pelo Cristian). E, ver-se-á, caso o Hulk se for embora, como o es- forçado desenho estratégico montado por Vítor Pereira desaba instantaneamente, sem demora nem apelo. Sobre isso, de não perceber nada de futebol, lembro-me sempre de uma coisa que me disse José Couceiro, quando era treinador do FC Porto e tinha de arrostar com as minhas críticas: «Para quem gosta de futebol e o segue com atenção, não é muito difícil perceber de futebol. Não é nenhuma ciência oculta.»

2- Em contrapartida, tenho visto com atenção como Jorge Jesus vai integrando de forma equilibrada e harmoniosa os sobrantes do seu onze principal, de tal maneira que, quando são chamados a jogo, não se nota que haja ali qualquer corpo estranho infiltrado num clube restrito. Isso foi uma vez mais evidente no tradicional passeio que o Benfica fez de visita ao União de Leiria. Quando solta os cavalos para atacar e ganhar o jogo, em sucessivas avalanches a toda a largura do campo, o Benfica é um caso sério. E só uma coisa me intriga: como é que há benfiquistas que não gostam de Cardozo? Não quererão trocá-lo por uma mão cheia dos nossos? Pois agora e depois de várias vitórias tem-te-não caias, o Benfica aí vai com dois pontos de avanço e dois jogos seguidos em casa pela frente. Uma equipa capaz arranca daqui para o titulo. Oxalá não seja o caso.

3- Pois, meu caro Eduardo Barroso, os meus prometidos parabéns ao Sporting ficam adiados, por razões à vista. Mas dou-lhes os parabéns por terem recebido o campeão nacional sem jaulas, nem grades, nem provocações prévias ou demonstrações de ódio larvar. Houve uns autocarros de adeptos apedrejados, mas isso foi coisa pouca e, infelizmente, banal em todo o lado. Todavia, faço notar que é segundo clássico envolvendo o FC Porto este ano,. depois da recepção ao Benfica, e não houve, nem com a nossa comitiva, os nossos dirigentes ou os nossos adeptos, o mínimo incidente provocado por nós. Pois é, nós temos a fama, mas os outros é que estragam as festas, com as suas claques nazis e os seus túneis e balneários pouco recomendáveis.