segunda-feira, fevereiro 25, 2013

ESPEREMOS QUE NÃO AQUEÇA DE MAIS… (13 MARÇO 2012)

1- Quando for grande, quero ser como o Rui Gomes da Silva: se não gostar de uma transmissão televisiva de um jogo do Benfica, por achar que ficou por repetir um lance duvidoso contra os encarnados, eu pego no telefone, ligo para A BOLA e a minha indignação ocupa metade da última página, com chamada de primeira página no jornal. Gente importante é assim. Eu, por exemplo, também achei que, no último Benfica-Porto houve uma queda do Djalma na área do Benfica que gostaria de visto repetida e não vi: mas a quem me queixar? Em tempos, o Benfica também protestou contra os comentários da Sport TV, agora protesta contra a própria realização. Imaginem o que seriam os jogos do Benfica transmitidos pela Benfica TV, com o Rui Gomes da Silva na realização e o Sílvio Cervan nos comentários!

Eu compreendo, porém: a coisa está a apertar e o que o dirigente do Benfica pretendeu foi lançar fumo sobre o que realmente aconteceu no Dragão e que contou a sério: mesmo antes do intervalo, o Hulk isola-se desmarcado pelo James e partindo de posição completamente legal finta o guarda-redes e, quando vai encostar para a baliza deserta, apita o árbitro a marcar off-side que não houve. O mesmo Hulk, mais adiante, entra na área, bate em velocidade Nivaldo é derrubado por este e o árbitro decide-se por uma tripla penalização do FC Porto: não marca o penalty, mostra amarelo a Hulk por pretensa simulação (já não se pode cair na área, com ou sem penalty) e, com isso, põe-no fora do próximo jogo, a difícil deslocação ao Nacional. Aliás, e segundo a análise deste mesmo jornal, já antes disso, um outro penalty contra a Académica teria ficado por marcar (e vou dizer uma coisa que jamais Gomes da Silva ou Gervan diriam, em idênticas circunstâncias: não acho que este tenha sido penalty, assim como não acho que o tenha sido a mão do Cardozo na sua área, durante o Benfica-Porto).

Olhão: empate e dois pontos perdidos graças a um erro decisivo da arbitragem; Barcelos: derrota e três pontos perdidos graças a quatro decisões determinantes do artista Bruno Paixão; e, agora, contra a Académica, empate e mais dois pontos perdidos graças a dois erros com influência directa no resultado. E eis que finalmente me sinto irmanado com o meu amigo Eduardo Sete Pontos Roubados Barroso: também nós nos podemos queixar da maldição dos sete pontos. (Atenção, Eduardo: não me estou a meter contigo, por quem tenho grande consideração, e cujo clubismo apaixonado, como o de nós todos, não inclui, por formação, o ódio doentio aos adversários e a arrogância de quem acha que tudo podem e tudo lhes é devido, que escorre do discurso de um Gomes da Silva e de um Sílvio Cervan. São níveis completamente diferentes ).

2- Mas esta reflexão sobre a infeliz arbitragem do Dragão, é apenas a constatação de um facto, para efeitos da actualização das contas e da narrativa com que outros se preocupam tanto. No essencial, e como sempre o defendi, estou de acordo com Vitor Pereira: não se pode queixar da arbitragem quem tão pouco fez para ganhar o jogo. O mistério, que parece ser partilhado pelo próprio treinador portista, consiste em saber porque razão um conjunto de jogadores insuspeito de falta de ambição ou profissionalismo, entra sempre em jogo, contra os mais fracos, com uma atitude de deixa andar, que não há pressa nem perigo.

Durante toda a semana, fui lendo um rol de comentários ao Benfica-Porto que me deixou de boca aberta: afinal, provou-se que Vítor Pereira é um grande treinador e que os seus críticos é que estavam errados. Ora, sendo eu, se não o maior, pelo menos o mais antigo deles, gostaria de me defender chamando a atenção para um facto insólito: aquilo que, do consenso geral, fez Vítor Pereira ganhar o jogo da Luz foi ter feito exactamente o que eu e os seus outros críticos andámos a reclamar tanto tempo - ter tirado o Maicon de defesa direito e colocá-lo ao centro da defesa; ter mandado o Rolando para o duche mais cedo; ter posto o James em jogo. Só para nos contrariar, apareceu até uma teoria deveras extraordinária: se, cada vez que saltava do banco para o jogo, o James tudo mudava para melhor, isso queria dizer que Vítor Pereira era um génio a mexer na equipa durante o jogo pois que tinha descoberto que o James rendia bem era sentado no banco durante uma hora e depois jogando os 30 minutos finais de cada jogo. Francamente! Era como se dissessem que o Guardiola deveria deixar o Messi no banco durante uma hora, porque, assim que ele entrasse, tudo mudaria para melhor! Pois claro!

Contra a Académica, James entrou de início e, de início a fim, foi dos poucos que mexeram com o jogo. Aliás e face aos disponíveis, creio que esta foi a primeira vez que Vítor Pereira começou uma partida com um onze lógico e consensual. O único erro que tenho a apontar-lhe foi ter passado toda a primeira parte a tirar apontamentos e a consultar-se com o seu adjunto, quando o que havia a fazer face ao que estava à vista não precisava de grandes conversas: o meio campo não funcionava, jogava a passo e falhava todos os passes; não ajudava a defesa e não servia o ataque. Fernando estava num daqueles dias em que só fazia asneiras, algumas perigosas; e Lucho passeava-se, ausente, como algumas vezes lhe sucede e é sabido, para quem o conhece. É certo que a suicidária politica de dispensas de Janeiro, deixou a equipa desprovida de alternativas (Sousa, Guarín, Belluschi), mas havia uma alternativa lógica: fazer entrar Djalma, recuar James para nº10 e tirar Lucho. Era ai que Vítor Pereira deveria ter entrado em jogo e antes mesmo do intervalo. Se não consegue explicar porque razão a equipa entra apática em certos jogos, já deveria, pelo menos, ter descoberto a maneira de reagir a isso a tempo, sem se preocupar com os apontamentos nem com as susceptibilidades de intocáveis. Não há intocáveis nem esquemas fixos quando se trata de ganhar o campeonato. Eu sei que, feitas à posteriori, as análises se tornam mais fáceis. Mas por isso é que há os treinadores (que têm de reagir enquanto as coisas estão a acontecer) e os comentadores (que só intervêm depois).

3- Antes do Mundial de 2006, na Alemanha, A BOLA perguntou aos seus colaboradores quem achavam que viria a ser o melhor jogador do Mundial. Respondi Leonel Messi, mas Packerman, o seleccionador argentino, não concordava comigo: deixou Messi de fora quase todo o Mundial. Já na altura, eu achava que Messi era o melhor jogador da actualidade, mas, com o decorrer do tempo, comecei a escrever que não era apenas isso: era o melhor jogador que eu alguma vez tinha visto, o melhor jogador de sempre. Para quem gosta mesmo de futebol e o vê atenção, os cinco golos de Messi ao Bayer Leverkusen não foram apenas fruto de uma noite particularmente inspirada: não há um deles que seja banal, todos são consumados com uma genialidade e simplicidade de execução que nenhum jogador do mundo conseguiu até hoje acumular numa so noite. Tudo foi feito em souplesse, como se fosse fácil, sem uma precipitação, uma hesitação, em cada momento procurando a solução mais imaginativa e não a mais tentadora. Os dois chapéus, de pé esquerdo e pé direito, só estão ao alcance de um predestinado, mas o quinto golo, visto e meditado com atenção, não vem nos livros nem nos nossos melhores sonhos: vem do outro mundo. Estou como disse Rosell, o presidente do Barcelona: «nunca mais vai haver um jogador assim. Só nos resta assistir e desfrutar». E a isto eu acrescento o que também já escrevi e só aumenta a minha infinita admiração por este verdadeiro reinventor do futebol: Leo Messi é um deus, com o mundo a seus pés. Mas não se deslumbra nem se exibe para além da sua suprema arte de jogar futebol como ninguém mais. Não exibe os músculos, nem loiras, nem Ferraris, não tem brincos nem tatuagens, nem sequer gel no cabelo ou penteados foleiros à Moicano ou penteados idiotas à neo-nazi. Ninguém sabe nada da sua vida privada, a não ser que criou uma Fundação - não para fugir ao fisco, como tantos outros, mas para ajudar mesmo crianças necessitadas. Que Deus proteja Leonel Messi! Nunca o futebol deveu tanto a um só homem.

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