sexta-feira, fevereiro 22, 2013

NÃO HÁ MILAGRES, MAS HÁ FAVORES (21 FEVEREIRO 2012)

1- Depois de uma deplorável fase de grupos na Champions, o FC Porto, por força de uma igualmente péssima prestação do Zenit, viu-se chegado ao último jogo, em que recebeu os russos no Dragão, com uma enorme possibilidade de seguir em frente e até de terminar em primeiro no grupo. Precisava que o Apoel perdesse em casa, como perdeu, e de vencer o Zenit. Durante todo o jogo, o Zenit não fez mais nada do que defender o 0-0 que lhe servia, enquanto que os portistas, arrancando finalmente uma boa exibição, tentaram durante 90 minutos marcar um golo que fosse: mas tudo esbarrou contra a fantástica exibição do guarda-redes russo. O Zenit passou, o Porto desceu à Liga Europa e, como nem sequer conseguiu ser cabeça de série (ele, que era e ainda é o detentor do troféu!), eu já adivinhava que a falta de sorte, em parte merecida, iria prolongar-se no sorteio subsequente. Assim foi e logo aqui escrevi que achava que o FCP não teria hipóteses contra o líder do campeonato inglês, o clube em que o Xeque Mansour investiu 470 milhões de euros para obter resultados à força. Aliás, contra equipas inglesas, sejam quais forem as circunstâncias, o FCP não tem hipóteses - já parte derrotado à partida (a única excepção, com Mourinho e contra o Man. United, valeria uma Champions).

No percurso europeu também é preciso ter sorte. Que o diga o Benfica, que apanhou um grupo mais fácil na Champions, onde a única equipa forte, o Manchester United, se apresentou como caricatura, e que nos oitavos- de-final apanhou o mesmo Zenit que afastou o FC Porto, mas com substanciais alterações de circunstâncias: não só vinha do defeso russo e jogava o primeiro jogo oficial da nova época, como viu vários titulares, entre os quais Danny, incapazes por lesão. Mas, sobretudo, teve a sorte de ver o mesmo guarda-redes adversário que garantira o zero no Dragão lesionar-se também e ser substituído por um suplente que, pura e simplesmente, ofereceu os dois golos dos encarnados.

O que se passou no Dragão, quinta-feira passada, foi assim tudo o que antevira e temia. Podemos queixar-nos dum penalty por marcar quando havia 0-0, podemos queixar-nos da lesão do Danilo, podemos queixar-nos do autogolo de Álvaro Pereira (que foi mais responsabilidade do Helton que do defesa), mas, no final, tudo acabou com uma sensação de inevitabilidade: de uma forma ou de outra, a equipa do Xeque Mansour haveria sempre de ganhar, se não o jogo, pelo menos a eliminatória. Porque é melhor que o Porto e, a menos que o Porto encontrasse uma estratégia capaz de contrariar essa superioridade, haveria sempre de acabar por nos ganhar. Ora, o FC Porto, não só não encontrou essa estratégia, como acabou por pagar também por erros na gestão do plantel, que têm sido gritantes ao longo da época:
— planeou-se uma época sem um ponta-de-lança digno desse nome: Kleber, entrado a 20 minutos do fim, conseguiu a proeza de não ter tocado na bola, uma vez que fosse; e Walter, o duvidoso substituto, foi emprestado no mercado de Janeiro em troca de Janko, que tem a particularidade extraordinária de não poder jogar a Liga Europa. Resultado, voltou-se ao esquema que Vítor Pereira inventou de pôr o Hulk no centro, com isso perdendo-se um extremo precioso sem ganhar um ponta-de-lança (da primeira vez que Hulk se libertou para o flanco, nasceu a assistência para o golo portista; jogando emparedado entre os centrais, jamais criou sombra de perigo).
— com um meio-campo que já era fraco ofensivamente, chamou-se de volta o Lucho, o que foi uma boa decisão. Mas, em contrapartida, emprestou-se também o Sousa, o Guarín e o Belluschi, reduzindo-se o plantel a quatro médios (!), dos quais apenas o Lucho sabe servir o ataque. Assim, quando ele e Moutinho deram o berro, à entrada da segunda parte, o FC Porto entregou a iniciativa do jogo ao Manchester, porque tudo o que tinha no banco para os substituir era o Defour — que, manifestamente, não faz mal a uma mosca.
— mas o generoso espírito de Natal com que a direcção do FC Porte abordou o mercado de Janeiro levou-a a emprestar também o Fucile, ao mesmo tempo que Vítor Pereira exilava Sapunaru. Assim, quando Danilo teve de sair, ainda na primeira parte, foi forçoso recorrer à outra invenção de Vítor Pereira; o Maicon a lateral-direito. Dessarte, desmanchou-se o centro da defesa (o que viria a ser determinante), sem se repor um lateral-direito, que ele não é.

Pagámos por todos esses erros de formação e ajuste do plantel e agora, é só para quem acredita em milagres...

2- O Benfica queixou-se à UEFA de ter tido de jogar em S. Petersburgo, onde estava muito frio: preferia jogar em Moscovo ou, melhor ainda, no Estádio Algarve, onde o Zenit estagia, por estes dias. Conforme se viu no jogo do Sporting em Varsóvia ou nos outros jogos europeus disputados em Moscovo, as coisas estavam iguais por lá e iguais para todos. Mas o Benfica acha sempre que deve ter direito a um tratamento especial: também protestou e insinuou uma data de coisas pelo facto de ter que jogar com o Feirense... em Santa Maria da Feira.

Já quanto às datas dos jogos internos, o Benfica não se pode queixar: teve cinco dias de intervalo para preparar o jogo de Guimarães, enquanto o FC Porto teve menos de 72 horas de descanso do jogo europeu para disputar o de Setúbal. E, quanto ao célebre Benfica-Porto, estranhamente marcado para 2 de Março, prepara-se tranquilamente um escândalo de todo o tamanho. É que, ao contrário do que diz Jorge Jesus, o facto de o jogo se disputar dois dias apenas depois da Selecção Portuguesa jogar em Varsóvia e dois ou três dias depois dos jogos envolvendo outras selecções com jogadores ao serviço de Benfica e Porto «não é igual para ambos os lados»: há muito mais jogadores do FC Porto envolvidos nesses jogos do que do Benfica. E, ao contrário do que candidamente aqui escreveu o José Manuel Delgado, a questão não está no facto de todas as selecções terem jogos marcados nesses dias: a questão é que, como notou Paulo Bento, só a Liga portuguesa é que marcou jogos com clubes com jogadores convocados para dois dias depois. E logo o jogo do título! Que não podia ser no sábado, nem do domingo, nem na segunda-feira seguinte: tinha de ser antecipado para sexta! Escreve o J. M. Delgado que se trata de «nervosismo, preocupação e antecipação de justificações, caso as coisas dêem para o torto. Penso eu de que...». Muito engraçadinho, mas, infelizmente, trata-se de uma questão séria e não de uma brincadeira — pelo menos para quem acha que o desportivismo e a seriedade competitiva ainda devem ser defendidos. Penso eu de que o J. M. Delgado já está mobilizado para justificar esta golpada, como tão entusiasticamente justificou militantemente a do túnel da Luz.

O que irrita nos benfiquistas e nos seus arautos não é que eles ganhem quando o merecem. É que, até quando o merecem, nem assim se dispensem de tomar as vitórias garantidas por jogadas fora do campo: foi o túnel da Luz, uma cilada montada para afastar o Hulk vários meses; são os jogos com os clubes amigos marcados para a data que mais lhes convém, como o de ontem em Guimarães; ou marcados para o local que mais lhes convém, como o jogo contra o Estoril no Algarve; são os jogadores adversários contratados ou aliciados nas vésperas de defrontarem o Benfica; é o Bruno Paixão enviado cirurgicamente para arbitrar o Porto uma vez por ano, ao menos; e é agora o jogo do título marcado para quando se sabe que o adversário não pode estar humanamente em condições de lutar de igual para igual. Não haverá ninguém no Benfica que goste de ganhar de outra maneira?

3- Ia adormecendo a ver o Setúbal-Porto e a contar quantas vezes é que o Varela recebia a bola e logo a perdia para os adversários (foram todas, rigorosamente todas, menos o golo), e ia morrendo de tse-tse a ver vinte minutos do Sporting com o Paços de Ferreira. Mas, felizmente, mudei de canal e pude assistir a mais um festival de bola do Barcelona, contra o Valência. E, confortado, repito o que ando a dizer há seis anos: esta é provavelmente a melhor equipa de futebol que alguma vez vi jogar e Lionel Messi é o homem que vai dividir a história do futebol em duas fases: AM e DM.

4- Pouco importa que Rodrigo não se tenha lesionado no pé, com a entrada agressiva de Bruno Alves, mas tenha sim feito uma contusão ligeira na anca ao cair no relvado duro do Zenit. Para efeitos da recepção na Luz, fica o juízo de Sílvio Cervan: foi «uma tentativa de assassínio».

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