segunda-feira, dezembro 28, 2009

ESTRANHA FORMA DE JORNALISMO (15 DEZEMBRO 2009)

1- A situação repete-se desde há anos e gostaria que alguém ma esclarecesse: porque será que de cada vez que há desordens nas bancadas durante um jogo de futebol transmitido na televisão, nós somos pudicamente postos visualmente à margem dos acontecimentos? Será que há «instruções superiores» para ocultar a violência nos estádios, de modo a fazer crer que essa coisas não existem por cá, ou de modo a não nos impressionar? Não sei, mas seria bom sabê-lo porque, para todos os efeitos, estamos perante um acto de censura, deliberado e em directo. E, perante um anti-jornalismo, que, confrontado com a notícia a acontecer nesse momento, opta por desviar o olhar e assobiar para o ar, fingindo que nada de importante se está a passar.

Sábado, em Olhão, viveu-se mais uma situação dessas, em que durante largos minutos, quinze ou vinte, o relator e o comentador da Sport TV iam fazendo vagas referências às «cenas lamentáveis» que se estavam a viver na bancada, sem ousarem dizer ao certo do que se tratava e, sobretudo, com o realizador a ter um extremo cuidado para evitar mostrar qualquer imagem da cena. E durante largos minutos, foi possível apenas ao espectador aperceber-se da gritaria que vinha das bancadas, da chegada de constantes reforços policiais e até mesmo da apreensão patente nos rostos de jogadores e árbitro - a certa altura, chegando mesmo a suspender o jogo por instantes. O pudor foi ainda levado ao ponto de ocultar quem estava a protagonizar os desacatos - embora não fosse difícil de adivinhar, visto que eles tinham começado logo após o golo inaugural do Olhanense. Mas, a certa altura, houve um ligeiro descuido do realizador e durante breves segundos lá foi possível ver uma entusiasmada claque benfiquista lançando cadeiras e tudo o que tinha à mão para cima da bancada dos sócios do Olhanense.

A esta hora, talvez o presidente do Olhanense já não esteja tão certo que foi uma boa decisão, «uma homenagem aos sócios do clube», renunciar a jogar antes no inútil monumento do Estádio dos Contribuintes do Algarve. Afinal de contas até, e como vem sendo habitual, a anunciada enchente que sempre se anuncia com as visitas do Benfica afinal traduziu-se em meia-casa, se tanto. Este é , aliás, um fenómeno curioso: porque será que quando o Benfica visita um clube «pequeno» se anuncia sempre uma enchente que depois nunca ou quase nunca se confirma? Será que há alguma relação entre isso e o comportamento habitual das claques benfiquistas?


2- Outra coisa que também já entrou nos hábitos futebolísticos nacionais são as declarações do presidente do Benfica na véspera destes jogos. Recebido e apaparicado nas Casas do Benfica ou nos Paços do Concelho locais, Luís Filipe Viera aproveita sempre para dar início ao jogo do dia seguinte ou dessa noite, com um pouco subtil jogo de pressão psicológica. E uma das coisas recorrentes nas suas jogadas prévias são as queixas de que estes adversários costumam jogar muito contra o Benfica - coisa que, para Vieira, é altamente suspeita... Também desta vez, em Olhão, o presidente do Benfica voltou a queixar-se da «motivação extra» dos adversários quando jogam contra o Benfica. Essa motivação extra (contra o Benfica e contra os outros grandes) que, aqui e em todo o lado, é reconhecida por jogadores e treinadores e saudada como coisa louvável por todos os comentadores, isso que, por exemplo, dá origem ao tal «espírito da Taça», para o presidente do Benfica é uma coisa lamentável e motivo de suspeitas. «Não podemos confirmar, mas sabemos o que se passa e como se fazem as coisas...» - disse ele, a propósito, e lançando mão dessa linguagem da insinuação tão cara ao futebol português.

Assim, o principal responsável pelo autoproclamado maior candidato ao título deste ano estranha e lamenta que o Olhanense, por exemplo, não facilite quando enfrenta o Benfica. Aqui está alguém que verdadeiramente contribui para o fair-play e para a «verdade desportiva».

O que valeu ao Benfica em Olhão foi, como é habitual também, os últimos minutos do jogo, um fiscal de linha desatento à posição de Nuno Gomes no golo do empate e um árbitro atento ao facto de domingo haver um Benfica-Porto, quando se encaminhou para Cardozo, depois de expulsar Djalmir, e pelo caminho mudou o vermelho a Cardozo para amarelo.


3- Para aqueles que insistem em continuar a não perceber, o F.C.Porto voltou a mostrar em Madrid porque razão é o único clube com dimensão europeia do nosso futebol. Com ou sem crise do Atlético, não é qualquer um que chega a Manzanares e dá uma lição de bola ao Atlético, acompanhada de um retumbante 3-0, que ainda podia ter sido mais. Quem conta no futebol espanhol viu certamente com muita atenção a portentosa exibição de Bruno Alves e aquele incrível golo a frio, o pânico que Hulk conseguia gerar entre a defesa colchonera, e a facilidade exuberante com que Fucile meteu ao bolso Simão Sabrosa, deixando-o reduzido ao habitual expediente de se atirar para o chão na área - que tão bons resultados dava com árbitros portugueses e ao serviço do Benfica, mas que na Europa só leva os árbitros a aconselhar-lhe juizinho.

As grandes equipas, como os grandes jogadores, são as dos grandes jogos. Esta época, a equipa tem sido medíocre nos jogos menos importantes (ainda anteontem, contra o Setúbal), mas, nos momentos a sério - como em Stamford Bridge, contra o Chelsea - nota-se a diferença. Mas, para ter um lugar certo entre o clube dos dez mais da Europa, faltam a esta equipa algumas peças essenciais: um guarda-redes de top e dois médios de ataque criativos. Depois, falta que Cristián Rodríguez comece a jogar qualquer coisa e que Fernando deixe de ser apenas um bom médio defensivo, alargue o seu raio de acção no jogo, perca o medo de ir à frente e melhore muito a qualidade dos seus passes. Mas, para já, conquistou o seu habitual lugar, pelo menos, nos dezasseis avos-de-final da Champions, já cobrou 18 milhões de proveitos e, pela situação actual do campeonato, já tem praticamente garantida a participação na Champions do ano que vem, mesmo que fique em segundo lugar (porque, como cabeça de série, é de prever uma eventual qualificação acessível).

4- O que acima escrevi, significa que acho que o Sporting já foi e que o Braga não chegará lá - aos dois primeiros lugares do campeonato. Uma e outra coisa venho aqui prevendo desde o início do campeonato. O Sporting, porque toda a gente vê, a olho nu, que não tem equipa e, quando assim é, não bastam a vontade ou a fé. O Braga, porque muito tem já feito - e muita coisa com alguma sorte - mas não acredito, não vejo, que a equipa tenha a consistência e a resistência de um líder. Um líder tem de jogar sempre para ganhar e, para tal, precisa de individualidades que resolvam os jogos que o conjunto não consegue resolver. Para isso é preciso ter um Saviola ou um Hulk, e o Braga não tem. Ao longo de trinta jornadas, isso acaba por fazer diferença.

5- O «Apito Dourado» morreu de vez, esta semana, no Tribunal da Relação de Coimbra, com a confirmação da absolvição de Pinto da Costa e restantes co-arguidos, no caso do suposto suborno do árbitro do Beira-Mar-FC Porto de 2004 - um jogo que já não contava para nada, excepto para alimentar a inveja e maledicência nacionais. Olhando para o teor dos acórdãos, qualquer um pode concluir facilmente que, se tivesse tido um mínimo de isenção e bom-senso, nunca o Ministério Público teria assumido aquela acusação, pela simples razão de que tudo o que tinha baseava-se apenas na vendetta pessoal de uma testemunha que merecia zero de credibilidade. Porque escrevi isso aqui desde o primeiro dia, sinto-me também vencedor do processo. E só lamento que os notavelmente vencidos não assumam agora as suas responsabilidades. O único que o fez foi o pateta do Platini - mas, tal como agora se retratou, também antes acusou e difamou sem fazer ideia do que estava a falar. Mas a dr.ª Maria José Morgado, o dr. Pinto Monteiro e o dr. Ricardo Costa nem essa desculpa têm. O que lhes vale é que este é o país da impunidade.

"MENGO"! (08 DEZEMBRO 2009)

1- Corria o ano de 1992 quando o Clube de Regatas Flamengo, do Rio de Janeiro, se sagrou campeão brasileiro pela última vez. Nessa altura, recebia o Rio a Cimeira da Terra, onde 108 Chefes de Estado do mundo inteiro foram fingir estarem muito preocupados com a saúde do planeta. Dezassete anos depois e no dia em que em Copenhaga se abre a Cimeira Mundial do Clima, o Flamengo chegou outra vez, e pela sexta na sua história, ao título de campeão federal ﷓ ou seja, campeão nacional do Brasil. Entre uma e outra data decorreram dezassete anos, catorze dos quais os mais quentes de sempre. O planeta avançou dramaticamente no caminho do aquecimento global e o Flamengo nunca mais foi campeão. Dezassete anos é muito tempo: foi o tempo que o F.C.Porto esteve sem ganhar um campeonato, entre a minha infância e a idade adulta; foi o tempo que também o Sporting esteve depois sem ganhar um campeonato, nos anos da imparável hegemonia portista.

Mas o Flamengo, que podemos considerar o Benfica do Brasil (sendo o Fluminense o Sporting e o Corinthians o F.C. Porto), é mais do que um simples clube, fundado para se dedicar ao remo na Lagoa Rodrigues de Freitas, onde hoje ainda mantém instalações. O Mengo é o mais popular clube do Brasil e uma religião no Rio de Janeiro. É impossível andar na rua ou na praia sem tropeçar a cada momento com alguém vestido com a alvi-negra ﷓ a camisola vestida, por exemplo, pelo imortal «Pelé branco», Zico de sua alcunha, ou por Romário e Bebeto. Pois, este ano e uma vez mais, o Mengo pareceu quase toda a época arredado do título ﷓ que parecia destinado ao campeão S. Paulo, com a perseguição, a distância controlada, do também paulista Palmeiras e do gaúcho Internacional de Porto Alegre. Mas, subitamente, no ultimo terço do campeonato, o S. Paulo começou a acusar stress e cansaço e Inter e Palmeiras chegaram-se à frente, já a uma distância de perigo. E foi então que, aos poucos, foi acontecendo aquilo que às vezes acontece nas maratonas mais emocionantes: vindo lá de trás, vitória após vitória, o Flamengo foi-se chegando à frente e acabou por passar primeiro o Inter, depois o Palmeiras e, na penúltima jornada, beneficiando da derrota do S. Paulo em Goiás e arrancando uma vitória decisiva na visita ao Corinthians, chegou enfim ao topo da classificação. Mas, para ser campeão, precisava de vencer, num Maracanã lotado desde há dias, o Grémio de Porto Alegre. Começou a perder e chegou ao empate antes do intervalo. Nessa altura, a 45 minutos do final de um campeonato de 38 jornadas, quatro equipas estavam empatadas em pontos no primeiro lugar ﷓ coisa jamais vista em lugar algum. A manterem-se as coisas assim, o campeonato iria para o Internacional, que beneficiava das regras do desempate. Contou-me um amigo brasileiro que, na segunda parte do jogo do Maracanã, foi visível, porém, o peso histórico da rivalidade (melhor dizendo, do ódio) existente entre os dois maiores clubes do Rio Grande do Sul: Grémio e Inter. A torcida do Grémio, dizem, não perdoaria aos seus jogadores que roubassem o título ao Mengo para o dar… ao Inter. Parece que à boca da baliza do Fla houve quem não conseguisse fazer o mais fácil, que era marcar golo e acabar com o sonho. E então, o Mengo lá chegou ao 2-1 glorioso e ao título que buscava há 17 anos. Título particularmente importante para o «Imperador» Adriano, fugido do Inter, de Mourinho, para se sagrar o melhor marcador da Copa, e, sobretudo, para o sérvio Petkovic, de 37 anos de idade e cronicamente classificado como um dos melhores do campeonato. O Rio explodiu como se o Brasil tivesse acabado de ganhar a Copa do Mundo. E só lamento que, com 150 mil imigrantes brasileiros em Portugal, a Sport TV tenha estado tão desatenta que não se lembrou de transmitir o jogo do século no Brasil.


2- E muito pouco futebol vi no fim-de-semana. Vi parte dos dois derbies da jornada em Itália: o Roma-Lazio e o Juventus-Inter. E, mais uma vez, fiquei espantado como o calcio consegue manter a sua força com um futebol assim. Tacticamente, como sabemos, é brilhante: tudo aquilo é estudado, ensaiado, nada acontece por acaso e os jogadores parecem saber sempre o que fazer, em cada momento. Tecnicamente, jogam ali os melhores executantes do mundo e isso vê-se bem em cada pormenor: a maneira como dominam as bolas, como rematam, como passam, como cabeceiam. Mas, depois, o jogo é de feios, porcos e maus, cacetada de criar bicho e cenas de sopapo sem mais nem menos, gritos racistas do público, estádios jamais cheios e um espectáculo raramente emocionante. O Inter, de José Mourinho, então, é o paradigma do calcio: ganhar, ganha, jogos e títulos, tudo é mecanizado sem falhas e dirigido a um único objectivo que é o de vencer. Mas eu, francamente, não pagava bilhete para ver aquilo. Ai, Ricardo Quaresma, que desperdício ser suplente naquela equipa de marionetas!


3- Passei o Guimarães-F.C.Porto e logo passei um dos raros jogos em que, pelo menos durante a primeira parte, os portistas não tiveram de viver com o credo na boca. (Deixem-me informar que, quando o F.C.Porto vence em Guimarães, costuma ser campeão). O Sporting de ontem à noite passei também, por razões à vista.

E, assim, o melhor que vi, este fim-de-semana, acabou por ser o Benfica. Volto a dizer que me impressionou muito bem a capacidade de criação de jogo de ataque daquela equipa, em especial Saviola (o Real Madrid é, de facto, uma fábrica de desperdício de talentos, como só os milionários o podem ser…), e Cardozo ﷓ que, na época passada e contra a opinião de muitos benfiquistas, estranhava que ficasse tantas vezes de fora. Sem dúvida que o Benfica teve a sorte do jogo em vários detalhes, começando logo pelo golo marcado aos 6 minutos, no primeiro remate à baliza. E, embora a Académica tenha sido inofensiva em termos de ataque, não se fechou atrás e mostrou qualidade para mais do que aquilo. Mas aí, sim, é que é marcante ver a atitude de conquista e a facilidade de criação de jogadas de golo por parte do Benfica, e, para mais, num terreno difícil, como estava. Vai ser curioso constatar se, daqui a quinze dias, quando receber o F.C.Porto na Luz ﷓ no que será o seu primeiro grande teste de fogo da época ﷓ o Benfica vai conseguir manter a mesma atitude de conquista, face a uma equipa que faz justamente disso o seu grande trunfo. Em minha opinião, vai ser um jogo sem favorito à partida. Porque, se o Benfica me parece bem melhor na frente, é mais fraco atrás ﷓ em especial no flanco esquerdo da defesa, onde David Luiz e César Peixoto oscilam facilmente, se apertados. Caminhamos para um potencial grande jogo e, a quinze dias de distância, só espero que não comecem, dum lado ou do outro, os «jogos por fora» ﷓ porque, quanto ao clima de intimidação e violência criado pelas claques, isso, infelizmente, vai ser como de costume. Que bom que seria um jogo grande sem claques!

DRAGÃO, ALVALADE, BARCELONA (01 DEZEMBRO 2009)

1- «Vicky, Cristina, Barcelona», de 2008, é o pior filme de Woody Allen, um frete comercial pago pelo Ayuntamiento de Barcelona e que ele transformou num pastiche turístico-politicamento correcto sobre a «alma feminina». Tão longe de Manhattan...E Barcelona, essa cidade ressurgida com os Jogos Olímpicos de 1992, nem precisava do frete, porque é, seguramente, uma das três melhores cidades da Europa para se estar e para viver. Por estes dias, Barcelona e a Catalunha vivem em suspenso da decisão do Tribunal Constitucional sobre o novo Estatuto da Catalunha - que, à luz da Constituição Espanhola, só pode ser declarado inconstitucional, porque aquilo é praticamente uma declaração de independência, que faria a inveja de A. J. Jardim. Mas as coisas chegaram a tal ponto, que o próprio Zapatero torce para que o TC não veja o que todos vêem e não ouse afrontar os demónios catalães - mal adormecidos desde que, em 1640, Castela teve de optar entre opor-se à reconquista da independência portuguesa ou enfrentar o autonomismo catalão, e escolheu travar e vencer os revoltosos da Catalunha, deixando Portugal para os Braganças. Não por acaso, as reivindicações autónomas em Espanha estão directamente ligadas à riqueza das regiões: são os ricos do País Basco ou da Catalunha que querem ser independentes do poder fiscal de Madrid, para não terem de pagar impostos a favor dos pobres. Também em Itália, é o norte rico que se quer ver liberto de ter pagar a favor do Mezzogiorno, e em Inglaterra é a Escócia que quer ser independente do Midwest deprimido. A autonomia regional é quase sempre uma revolta dos ricos contra os pobres e contra o Estado central, cuja tarefa fundamental é distribuir a riqueza por todos. É por isso que eu sou ferozmente anti-regionalista, porque não tenho a mais pequena dúvida de que, ao contrário do que imaginam alguns incautos ou oportunistas, a regionalização lançaria Lisboa e o Porto contra todos os outros e ai dos alentejanos ou transmontanos, sem a República a protegê-los!

O que ainda obsta a que a Catalunha se lance num processo sério de independência de Madrid são algumas coisas formais, mas que ganharam força de tradição e acabaram por ser um desafio para os próprios catalães. Uma delas é o futebol: independente de Espanha, o grande e histórico FC Barcelona (o F.C.Porto de Espanha), ficaria reduzido a disputar um campeonato nacional em que o seu principal e único rival seria o Espanhol de Barcelona - um modestíssimo clube de bairro, que nem o Belenenses. E alguém imagina o grande Barça não enfrentar o Real, o Sevilha, o Valência, e, mesmo assim, conseguir receitas para encher Camp Nou e atrair as televisões do mundo inteiro? De onde viria o dinheiro para pagar a Messi ou a Ibrahimovic? Que glória substituiria a glória de ser campeão de Espanha e ir a Chamartin dar 6-2 ao Real, no inesquecível jogo de consagração do título, como sucedeu na época passada?

Terça-feira, assisti, nas Ramblas, ao orgulho dos catalães, depois de terem dado uma lição de bola ao Inter de José Mourinho, mesmo com Messi e Ibrahimovic no banco, a pouparem-se para o Real. E este domingo, vi, pela televisão, o Camp Nou cheio até deitar por fora, na expectativa de mais uma vitória sobre o eterno rival e inimigo, símbolo da tão odiada Castela. Que a guerra se possa fazer eternamente entre as bancadas de um campo de futebol!

Seis dos dez melhores jogadores do mundo, segundo a lista divulgada no próprio domingo, estiveram em campo no Barça-Real. E, embora não tenha sido um jogo espectacular, foi sempre um jogo jogado ao mais alto nível técnico, com detalhes de jogo só ao alcance dos melhores entre os melhores. O melhor do mundo em título, Cristiano Ronaldo, voltou para jogar este jogo, que não há futebolista no planeta inteiro que não sonhe disputar um dia. E até esteve bem, apesar dos dois golos perdidos, um dos quais quase indesculpável. Do outro lado, e sempre espectacular, esteve o seu anunciado sucessor, Leonel Messi - que há quatro anos aqui saúdo como o melhor jogador da actualidade e que, finalmente, vou ver consagrado como tal pelos «especialistas». Mais vale tarde que nunca!

2- Mais do que natural e previsível a derrota do F.C.Porto com o Chelsea, o destacado líder do campeonato inglês. Se até o Arsenal leva 3-0 em casa do Chelsea, como se pode achar que não seja natural que o F.C.Porto perca também por 1-0? Mas o resultado podia ter sido melhor, com um pouco mais de sorte e um pouco mais de atenção de Jesualdo Ferreira. Eu até aceito que ele tenha deixado o Hulk no banco (apesar de ser o jogador mais temido pelos ingleses) e aceito que mais tarde, com a necessidade de ganhar - era esse o único objectivo útil do jogo - o tenha posto em campo. Só não percebo é que, para tal, tenha desfeito a consistência defensiva do flanco direito, tirando o Varela e deixando o pobre Sapunaru entregue a si mesmo, quando estava à vista de todos que era por ali que o Chelsea queria chegar ao golo. Bastaram três minutos para que Maluda metesse o desamparado Sapunaru ao bolso e cruzasse para o fatal golo de Anelka, que tudo arrumou.

Também contra o Rio Ave, empatado até nove minutos do fim e com a necessidade imperiosa de ganhar, não ocorreu a Jesualdo tirar antes, por exemplo, o Fernando (que, por acaso, nem anda a jogar nada), recuar o Meireles para «trinco» e o Cristian Rodriguéz para nº 10. Mas aí foi ainda mais incompreensível ver o F.C.Porto a precisar desesperadamente de marcar e Jesualdo a manter uma estrutura defensiva de quatro elementos mais um trinco... para enfrentar o João Tomás.

Começa a ser enervante ver a lentidão com que o Professor reage ao jogo e se mantém escravo de regras auto-﷓estabelecidas, das quais nunca se afasta, suceda o que suceder. Por exemplo: nunca faz substituições antes de decorridos 60 minutos, mesmo que sejam gritantemente necessárias; e faz sempre substituições a partir dos 60 minutos, mesmo que sejam inúteis e até contraproducentes. E faz sempre as mesmas, seja quem for o adversário, esteja como estiver o jogo: parece um relógio suíço no pulso de um japonês. Ah, mas nem tudo são más notícias: desapareceu o Mariano González e reapareceram o Varela e o Belluschi e assim voltamos, pelo menos, a jogar com onze; e, após quatro penosos anos de malabarismos e rezas estéreis, o Helton foi remetido para a bancada e o Beto conquistou o lugar. É uma imensa lufada de ar fresco, que começa logo nas reposições de bola em jogo: agora temos um guarda-redes que entende que a reposição da bola pode ser uma oportunidade de contra-ataque ou, ao menos, de começar a organizar o jogo logo à saída, e não uma simples oportunidade de um pontapé à toa para a frente, invariavelmente detido pelos adversários, como tão diletantemente fazia Helton. Aos poucos, o professor vai-se deixando de fantasias e rendendo-se ao óbvio. Eu sempre achei que o futebol é muito menos complicado do que nos dizem os «especialistas». Por exemplo: está na cara de qualquer um que o Falcao não faz ideia de como se deve marcar um penalty: em dois falhou dois e ambos falhados por deficiências técnicas evidentes. Quanto tempo irá demorar Jesualdo Ferreira a percebê-lo também?

3- O «derby» de Lisboa não foi mal jogado, mas foi um jogo «morto», marcado pela falta de coragem de ambas as equipas: o Sporting porque tinha o terror de perder; o Benfica, bastante melhor equipa e jogadores, porque não teve a ousadia de tentar ganhá-lo. Retenho duas coisas: a declaração pertinente de Jorge Jesus sobre o estado do relvado de Alvalade, que, de facto, é inimigo do bom futebol; e o comportamento inqualificável de alguns adeptos sportinguistas, desmentindo a tão proclamada filosofia do clube de «gentlemen». As claques estão a matar o futebol, como espectáculo para gente normal, quanto mais para simples amantes do jogo. Eu sei, e sempre o disse, que o problema é de todos, mas, aqui em Lisboa, insistem em dizer que não, que os selvagens estão todos a norte. Ah, pois é, mas há quanto tempo não há incidentes no Dragão? E há quanto tempo é que não deixa de os haver nos jogos grandes, na Luz ou em Alvalade?

segunda-feira, dezembro 14, 2009

UM LUGAR EM ÁFRICA (24 NOVEMBRO 2009)

1- Num fim-de-semana talhado à medida para ir à caça, a grande notícia foi a eliminação do Benfica da Taça, às mãos do Vitória de Guimarães e em pleno estádio da Luz. Parabéns ao Vitória que, nos últimos dois jogos que disputou, um para o campeonato e outro para a Taça, derrotou os dois líderes do campeonato. O Sporting chegou ao intervalo, na estreia de Carvalhal, a perder miseravelmente com uma equipa de que eu (peço desculpa) nunca tinha ouvido falar, assim tipo-Inválidos do Comércio: e lá deu a volta com um livre directo e um penalty. Quanto ao F.C.Porto, obrigado a ir a jogo em condições inqualificáveis sob pena de ser extraído da Taça por falta de comparência, mas lá conseguiu ver provado, em cima da hora, que tinha razão nos seus protestos. É incrível como a mesma Federação que, com inteira razão, se queixou das condições do estádio e do campo onde Portugal teve de jogar a segunda mão do play-off contra a Bósnia, tenha autorizado que o campeão nacional - uma equipa de profissionais pagos a peso de ouro e tão útil à Selecção - fosse forçada a disputar um jogo a eliminar da Taça naquele inconcebível campo da Oliveirense que as fotografias retratavam. Caramba, pois se está ali mesmo ao lado, o Estádio de Aveiro, eternamente às moscas e que não foi escolhido porque a Oliverirense diz que o aluguer é caro, a Federação que pague o aluguer. Não foi ela, afinal, que se bateu pela existência do luxuoso e inútil Estádio de Aveiro?

2- Felizmente, os meus desejos aqui expressos na semana passada cumpriram-se: vencemos na Bósnia, ganhámos o passaporte para a África do Sul, que tão tremido esteve durante tanto tempo. E ganhámo-lo com uma das mais convincentes exibições de toda a campanha de qualificação. Num ambiente de cortar à faca, num relvado escolhido à medida para prejudicar o melhor futebol, e num estádio preparado para nos intimidar desde o primeiro minuto, a Selecção uniu-se como um só - sem embargo de uns terem sido bem melhores do que outros. Mas, sinceramente, em matéria de esforço, de entrega e de consciência de que aquela era a hora da verdade e já não consentia mais adiamentos, penso que todos foram grandes, dignos da hora. Por uma vez, não entrámos no jogo naquela atitude de ver em que paravam as modas, não nos intimidámos nem demos algumas vezes mostras de ter medo do adversário e medo de ousar vencê-los, e nem sequer, ao contrário do que é regra, deixámos de atacar depois de chegar à vantagem. Ganhámos por um, mas bem merecíamos ter ganho por dois ou três - ao contrário do que sucedera na Luz, cinco dias antes.

3- Não me incomoda nem me regozija que a Selecção que ganhou no play-off a passagem para África não tivesse um único jogador do Benfica no onze inicial de ambos os jogos. A Selecção é a Selecção, e eu já torcia por ela em 66, quando era formada por dez jogadores do Benfica e um guarda-redes do Belenenses. Mas, é claro que gosto de ver uma Selecção com jogadores do meu clube e é claro que fiquei ainda mais feliz por ver que os dois jogadores que facturaram os dois golos da nossa passagem para África eram ambos do F.C.Porto. O Raul Meireles fez, na Bósnia, uma das melhores exibições que já lhe vi e, francamente, acho que é preciso uma grande imaginação ou má-vontade para não o considerar como o melhor de todos nesse jogo decisivo. E o Bruno Alves, com duas soberbas exibições, esse, dá-me um gozo particular, porque agora já não estou sozinho a considerá-lo um dos melhores centrais do mundo e com uma atitude em campo que, desculpem-me lá, é «a escola do dragão» em todo o seu esplendor. Pois, mas quando ele joga pelo F.C.Porto, cá dentro, é apenas um «caceteiro» e um jogador que, se pudessem, passava metade do campeonato de castigo. Mas, quando joga por Portugal, aí todos se calam, porque está bem de ver que, com onze como ele, esta Selecção iria a África para deixar marcas.

4- E agora, uma questão pessoal com o Sr. Eduardo - que, embora o não pareça, tem idade para ser meu filho. Eu escrevi aqui, a semana passada, que, na minha modesta opinião, o Eduardo não me dava confiança para defender a baliza de Portugal, porque domina tão bem o espaço aéreo quanto o seu antecessor Ricardo. Ou seja: não faz ideia onde isso fica nem o que fazer com esse problema. E dei o exemplo das duas bolas cabeceadas à trave da nossa baliza no jogo da Luz - em especial a primeira, onde a responsabilidade dele foi total e que, se tem tido a consequência mais provável, que era ter acabado em golo, talvez agora não estivéssemos a festejar a presença no Mundial do ano que vem. Mas esta foi e é apenas uma opinião técnica e de «treinador de bancada». Outros pensarão diferente, outros (a grande maioria) pensa o mesmo, mas não se atreve a dizê-lo. Porém, foi o suficiente para que, na euforia da vitória na eliminatória (para a qual pouco ou nada contribuiu, para além de ter desviado com os olhos as bolas para a trave), o Sr. Eduardo desembestasse contra os «abutres» que tinham ousado criticá-lo. Ora bem, quero dizer algumas coisas ao Sr. Eduardo.

Primeiro, que é muito feio, quando se quer atacar alguém, começar pelo insulto e nem sequer pôr o nome ao destinatário. Eu, quando quero criticar alguém, como o fiz com ele, não apenas não insulto nem chamo nomes, como também escrevo o seu nome e assino o meu por baixo.

Depois, quero-lhe dizer que ele não deve saber bem o que é um abutre. Um abutre é um animal que se alimenta de cadáveres de outro animal, e eu, tanto quanto me recordo, não considerei o Sr. Eduardo morto para o futebol e ainda menos cadáver: apenas lhe sugeri que aprendesse o que fazer com as bolas altas cruzadas por cima da pequena área, porque desconfio que isso pode ser importante na vida de um guarda-redes. Mas, se ele acha que não é importante ou se se considera a si próprio um cadáver futebolístico, sem ressurreição possível, o problema é seu.

A seguir, queria explicar ao Sr. Eduardo uma coisa óbvia, que ele, todavia, parece não ter ainda percebido: a sua, tal como a minha, é uma profissão de exposição pública constante. Ambos actuamos à vista do público, o qual paga para apreciar ou criticar livremente o nosso desempenho. O mesmo acontece com os artistas de circo, os músicos, os actores de teatro, etc, etc. O que caracteriza a função específica do guarda-redes Eduardo é que ele é muito mais bem pago do que todos os outros - o que faz que seja maior a sua responsabilidade e muito mais exposto à critica o seu desempenho. Ou ele esperava que lá pelo facto de Carlos Queiroz lhe ter confiado a baliza da Selecção, tinha passado a ficar imune à critica, como se fosse uma florzinha de cheiro? Ponha os olhos no Ricardo Carvalho que, na hora da vitória (para qual contribuiu bem mais) afirmou que compreendia e reconhecia razão às criticas que os adeptos da Selecção tinham feito. Não por acaso, o Ricardo Carvalho joga num país que é a mais antiga e nunca interrompida democracia do mundo e onde a crítica futebolística é a sério e não a brincar, feita de salamaleques. Se se acha intocável, acima de qualquer crítica, com direito a passar impune, quer jogue bem quer jogue mal, escolha outra profissão. Há trabalhos mais fáceis - só não são é tão bem pagos.

E, finalmente, queria dizer ao Eduardo o seguinte: para representar Portugal, no futebol ou no resto, não basta estar profissionalmente qualificado para o fazer. É preciso também ter um comportamento cívico à altura da responsabilidade. Hoje mesmo, também eu estou em Barcelona, a representar Portugal, no meu domínio específico: numa conferência literária organizada pelo Instituto Cervantes, de Espanha. Não passa pela cabeça de ninguém que, se no final a minha intervenção for criticada, eu trate os críticos por abutres. Julgo que já lá vai o tempo em que os jogadores de futebol se achavam umas vedetas acima do comum dos mortais, com direito perpétuo a serem venerados, fizessem o que fizessem ou dissessem o primeiro disparate que lhes viesse à cabeça. Acorde, rapaz, o tempo dos cromos da bola já lá vai! E nunca se esqueça disto: quem mantém o futebol vivo não são os dirigentes, nem os patrocinadores, nem sequer os jogadores: são os adeptos. Nós somos os únicos que estamos no futebol por amor à camisola e sem nada esperar em troca. Todos os outros vão e vêm e são sempre substituíveis.

MAIS UM MILAGRE, PRECISA-SE (17 NOVEMBRO 2009)

Sim, precisamos ainda de mais um milagre para chegarmos enfim à África do Sul. Um milagre como o das traves e postes do Estádio da Luz, substituindo, com brilho, a inércia de Eduardo entre os postes, vendo o jogo aéreo passar-lhe em frente do nariz sem se mexer, um milagre como a cabeça salvadora do Bruno Alves já nos descontos, em Tirana, permitindo arrecadar três pontos decisivos, ou a outra cabeça salvadora, sábado passado, na Luz, substituindo, em local que não era seu, a inépcia atacante da Selecção.

Pois, jogador por jogador, nós somos francamente melhores que a Bósnia ou a Dinamarca. Mas, ninguém entende porquê, aquele conjunto de estrelas internacionais, uma vez reunido, não funciona. Certas coisas, nós vemos que resultam de deficiente trabalho de casa: livres e cantos que não foram ensaiados de forma alguma, nenhuma «jogada de laboratório» estudada. Outras coisas, que se esperariam espontâneas, como a inspiração individual ao serviço do colectivo, nunca acontecem: Deco, Cristiano Ronaldo, Simão ou Nani são apenas estrelas desmaiadas, invariavelmente menores na Selecção do que o são nos respectivos clubes. Acontece.

Estava a ver o Portugal-Bósnia junto com uns amigos estrangeiros quando Portugal chegou ao 1-0 e eles comentaram: «Bom, agora é aproveitar e cair em cima deles, para resolver isto já aqui». Expliquei-lhes que não, que não é assim que as coisas funcionam aqui: quando a Selecção consegue chegar ao 1-0, toca a reunir, missão cumprida e trata-se depois e apenas de «gerir a vantagem», como dizem os entendidos. Eles não acreditaram, mas depois viram. Tirando uns doze minutos na segunda parte, culminados com aquela grande oportunidade criada por Liedson a partir do nada (e que Carlos Queiroz comparou ao azar da Bósnia, com três remates na madeira!), nada mais fez a Selecção que justificasse o 2-0. Foi curto, muito curto, para quem quer estar no Mundial do Verão que vem. A verdade, passada já quase uma dúzia de jogos no caminho para África, é que apenas uma vez - e logo no primeiro jogo, frente à Dinamarca - é que a Selecção de Portugal mostrou, sem margem para dúvidas, que merecia estar no Mundial. O resto tem sido uma eterna gestão de «tem-te, não caias», que, tudo indica, vai durar até ao último minuto do último jogo, amanhã, próximo de Sarajevo. E, de todas as vezes, em cada um dos jogos a história repete-se: acreditamos sempre que desta é que é, desta é que a Selecção das tão louvadas vedetas vai finalmente arrancar um jogo que nos faça sentir que temos equipa para chegar ao Mundial e fazer alguma figura. E, depois, mesmo quando tudo começa bem, mesmo quando os deuses estão do nosso lado, parece que se instala ali um cansaço de bem jogar, um indisfarçável tédio de ter que provar, com trabalho e esforço, uma superioridade que todas as estatísticas nos conferem. Enfim, mas isto vai acabar: acaba amanhã. Amanhã, sim, vamos finalmente mostrar ao mundo porque merecemos estar na África do Sul.

Suponho que, não havendo lesionados, Queiroz irá repetir, tal e qual, a equipa da Luz. Assim, e à maneira dos jornais desportivos, vou deixar aqui a minha apreciação individual dos doze da Luz (Tiago e Hugo Almeida não jogaram os minutos necessários para poderem ser avaliados). Esclareço que a minha classificação vai de zero a cinco valores e que sou muito mais exigente que a generalidade dos críticos desportivos, porque adoro bom futebol mas não tenho paciência para mau futebol. Aqui vai, então:

EDUARDO (1) - Quem leu as últimas apreciações que fiz aos seus desempenhos na baliza do Braga, sabe que eu não tenho confiança nele no jogo aéreo, em que é um digno sucessor de Ricardo. Contra a Bósnia e a terminar a primeira parte, ofereceu literalmente o empate, ao permitir um cabeceamento na pequena área a um metro de distância do local onde estava e se deixou ficar, estático. Repetiu o mesmo ao findar o jogo, permitindo novo cabeceamento, embora mais distante, e nova bola na trave. Desculpem-me, mas eu permaneço fiel à «escola Vítor Baía», onde, antes das traves, estavam lá as mãos de Baía. Era bem mais tranquilo. Que o digam os portistas, que também lá têm o Helton…

PAULO FERREIRA (0,5) - Há muito que deixou para trás a forma que permitiu ao F.C.Porto vendê-lo ao Chelsea por 20 milhões. Mal a defender, inexistente a atacar. Alturas houve em que me cheguei a esquecer que estava em campo.

DUDA (1) - Tentou atacar uma ou duas vezes, mas sem rasgo e inspiração. Periclitante a defender, às vezes até despachando a bola para onde estava virado.

RICARDO CARVALHO (3) - Um dos melhores, apesar da diferença de altura para os bósnios e apesar de ter de dobrar frequentemente Paulo Ferreira.

BRUNO ALVES (3) - Leva nota semelhante pelo golo, que pode valer ouro e diamantes (magnífica a crença com que acreditou e acompanhou o ataque, colocando-se na posição sobejante que lhe permitiu marcar), e pelo empenho de sempre. Mas não esteve tão inultrapassável como habitualmente.

PEPE (3) - Primeira parte à deriva, sem atinar com o lugar e a função no jogo, e segunda parte «à Pepe» - decisivo no apoio atrás, na impulsão do jogo para a frente e na motivação extra que deu a toda a equipa que o quis acompanhar.

DECO (0) - Já nos tempos áureos do F.C.Porto, eu achava que ele não devia ter lugar cativo na equipa, de tal maneira o seu futebol é intermitente, capaz do melhor e do desesperantemente mau. Foi o caso, mais uma vez, sábado passado. Estragou jogo sem cessar e ainda insistiu numa coisa que só em Portugal lhe é consentido pelos treinadores: cobrar cantos e livres próximos da área, para o que lhe falta em absoluto qualquer talento.

RAUL MEIRELES (3) - Uma vez mais, e ao contrário de Deco, esteve melhor na Selecção, bem melhor, do que tem estado no F.C.Porto. Teve um fantástico passe longo a isolar Nani, que o desperdiçou por má recepção, e teve um magnífico trabalho na esquerda a oferecer o golo frontal a Deco, que chutou… como de costume.

SIMÃO SABROSA (1) - Depois do bom desempenho na última chamada à Selecção, voltou à normalidade das más exibições. Nada fez digno de registo positivo.

NANI (0,5) - A começar, parecia que ia justificar a sua reivindicação de lugar cativo, mas rapidamente se deixou de veleidades. Fez tudo ou quase tudo mal e, no final, na flash interview, ainda se permitiu responder em tom sobranceiro, de quem nada ficou a dever a ninguém. Mas ficou, sim, ficou a dever uma boa exibição a todos os adeptos.

LIEDSON (2) - Este, sim, não sabe o que é poupar-se, mesmo e sobretudo se as coisas não lhe correm bem ou se o jogo não lhe chega. Ao contrário do que disse Queiroz, ele não desperdiçou uma oportunidade de golo: ele criou uma oportunidade saída exclusivamente do seu génio e que, se tem entrado, seria um golo para recordar por muito tempo.

FÁBIO COENTRÃO (0) - Li aqui n'A Bola, que «esteve bem tanto à direita como à esquerda». Pois, eu (cada cabeça, sua sentença) acho que esteve tão mal e tão inexistente à esquerda como à direita. Longe, muito longe de confirmar as boas exibições pelo Benfica e de justificar a sua estreia como internacional A. Desde que Queiroz o lançou, o ataque de Portugal morreu, sem remissão. Mas, ao contrário de Nani, teve a humildade de reconhecer que esteve mal - o que é meio caminho andado para que, da próxima, esteja melhor. E tem valor para isso.

TRÊS QUEDAS ANUNCIADAS (10 NOVEMBRO 2009)

Sexta-feira caiu Paulo Bento no Sporting; sábado caiu o Sp. Braga em Guimarães; e domingo caiu o FC Porto no Funchal. Para quem está atento ao futebol, nenhum destes desabamentos do fim-de-semana traz espanto algum.

Paulo Bento caiu por exaustão: mesmo a Senhora de Fátima, que dizem que faz tantos milagres, de vez em quando deve cansar-se. Se um clube não tem dinheiro, não pode comprar bons jogadores; se não tem bons jogadores, não pode ter uma boa equipa; se não tem uma boa equipa, ainda poderá disfarçar durante um tempo, mas fatalmente acabará por não ter bons resultados; e, sem equipa e sem resultados, não há nenhum treinador do mundo que se aguente. Tão simples quanto isto. Muito gostaria de saber o que fariam os tais «terroristas» de que fala Bettencourt, sentados na cadeira de Paulo Bento: conseguiriam transformar o Caicedo ou o André Marques ou o Pedro Silva ou o Postiga em bons jogadores? Ou conseguiriam inventar dinheiro, esgravatando nos já tantas vezes vendidos, revendidos e voltados a vender terrenos de Alvalade? Isto, a curto prazo. Porque, a longo prazo, pode ser que eu esteja enganado, mas mantenho a tese aqui exposta há uns tempos: há duas instituições em Portugal cujo destino inexorável me parece ser a morte lenta (visto que morte súbita não há, por aqui) - o PSD e o Sporting Clube de Portugal. Para já e como se viu, a saída do «suspeito n.º 1» não teve o efeito milagroso que os «terroristas» esperavam…

Caiu o Braga em Guimarães e com toda a lógica e justiça. Pese à simpatia que me merece Domingos Paciência e à infinita gratidão e saudade que tenho pelo seu passado de n.º 9 do FCP, eu tinha-me abstido, até agora, de abordar o desempenho do Braga e, menos ainda, de embarcar no coro de loas de tantos comentadores ávidos pelo aparecimento de mais um «candidato», fora do clube dos três. Compreendo e subscrevo o desejo, mas ele não passa disso: o Braga não é candidato. Não é, como o Guimarães nunca chegou a sê-lo há dois anos e como o Boavista de outros tempos também nunca o foi - excepto nas circunstâncias descritas no livro do Fernando Mendes, sobre o qual tem recaído um eloquente silêncio geral. O Braga não é candidato, como bem se viu em Guimarães, porque lhe falta cultura e atitude de vitória, regularidade na concentração e vontade, capacidade de querer, de acreditar, de ousar. E falta-lhe também uma equipa à altura dos desejos: tinha melhor, bem melhor equipa, no ano passado, quando «o novo Mourinho», como lhe chamou António-Pedro Vasconcelos, não conseguiu melhor do que um quinto lugar no campeonato. Este ano, o Braga tem uma boa defesa, um meio-campo aceitável, um ataque onde só Alan tem verdadeira categoria e um guarda-redes, que é o da Selecção, ilustre continuador da escola do seu antecessor, Ricardo - para quem cada bola aérea é um drama sem solução. É curto, é pouco, a juntar à falta de hábitos de conquista, para justificar uma candidatura ao título. E só lamento, pessoalmente, que a extensão do meu último texto não me tenho permitido dizer isto mesmo a semana passada - justamente após a vitória sobre o Benfica, que não me convenceu.

Enfim, a terceira queda do fim-de-semana foi a do F.C.Porto às mãos do Marítimo. Quem, como eu, segue há tanto tempo e tão atentamente as sucessivas equipas do F.C.Porto, já podia prever facilmente o que ia suceder - e sobre isso, sim, venho escrevendo aqui, há algumas semanas. Bastou-me ver os primeiros quinze minutos de jogo, para mandar um sms a um outro portista: «Hoje perdemos».

Deixem-me ser directo: depois da última época de transacções (o momento futebolístico que eu mais temo em todo o ano!), o F.C.Porto ficou reduzido apenas a quatro bons jogadores: o Rolando e o Bruno Alves, o Falcão e o Hulk (embora a léguas do desempenho do ano anterior). Depois, tem cinco jogadores razoáveis e não mais do que isso: o Fucile, o Fernando, o Belluschi, o Meireles e o Rodriguez (estes dois últimos também em forma deplorável). E dois ou três, como o Nuno André Coelho e o Beto, que ainda não dispuseram de oportunidades para mostrarem o que valem. Tudo o resto são jogadores banais ou menos do que isso. É curto, também.

Ora, acontece, para agravar as coisas, que Jesualdo Ferreira - que tão bom foi a reconstruir equipas em anos anteriores - não parece ter percebido ainda que, desta vez, lhe deram cabo da equipa. E, onde as circunstâncias exigiam capacidade de inovação, de rasgo, de ousadia, tudo tem esbarrado no inamovível conservadorismo de Jesualdo. Jogo após jogo, ele parece preso da expectativa do milagre salvador do Hulk ou do Falcao (como sucedeu em Nicósia), ou então do ainda mais imprevisível milagre de ver gente como o Mariano, o Guarín, o Tomás Costa, o Sapunaru transformarem-se em bons jogadores.

No Funchal, concorreu ainda mais uma das características do seu enervante conservadorismo: ele precisa de 45 minutos inteiros para perceber o que já toda a gente percebeu - que a equipa não está a jogar nada e que é preciso mexer nela. (Contra o Belenenses, a pior equipa do campeonato, nunca consegui recuperar os danos de meio jogo desperdiçado; em Malta, safou-se a cinco minutos do fim; e, no Funchal, lixou-se com toda a lógica, uma vez que a primeira oportunidade de golo só apareceu aos 80 minutos e a segunda e última já nos descontos. E foi uma sorte não ter ido para o intervalo a perder por 3-0, se as baldas habituais de Helton no jogo aéreo tivessem tido as consequências lógicas). Incrível como é que não percebe que o grande problema desta equipa está no meio-campo e como é que, ao menos, não dá uma oportunidade ao miúdo Sérgio Oliveira (que, de castigo por tanto ter prometido no jogo da Taça, nunca mais foi convocado)? Como é que prefere ter o Belluschi, o único criativo, no banco, e o Guarín em campo - como sempre sem perceber sequer onde devia jogar, nem ao menos lhe ocorrendo tapar as auto-estradas abertas pelo Sapunaru, das quais nasceria o golo do Marítimo? Como é que, tendo finalmente entendido que o Guarín era um sitting duck, resolve trocá-lo por outro ainda pior - o Mariano - cuja «disciplina táctica», tão apreciada pelo treinador, é levada tão à letra que, quando recebe ordens para ocupar o flanco direito médio, já não sai mais dali: nem para avançar, nem para vir atrás ajudar!?

Sim, já sei: apesar da «crise de exibições», estamos com os mesmos pontos do ano passado e «apenas» a cinco de Braga e Benfica. E estamos nos oitavos-de-final da Champions. Contra factos não há argumentos? Há, sim, há este outro facto: esta equipa não joga nada. E, quando não se joga nada, o futuro não é risonho. Que o diga o Paulo Bento…

PS: Meu caro Eduardo Barroso: julgas e julgas bem que tenho amizade por ti. Julgas mal que tenho «alguma consideração profissional»: tenho toda, muitíssima mesmo. E uma grande admiração pelo homem a quem ouvi uma das frases-guia da minha vida, naquele célebre debate televisivo com o eng.º Macário Correia, pregando o fascismo antitabagista e exibindo, impante, a sua fantástica saúde de não fumador: «Olhe que a saúde é um estado passageiro que não augura nada de bom!». Mas, francamente, ó Eduardo, quando te vi, aqui há umas semanas, a queixares-te e a suspeitares do árbitro do Porto-Académica, porque ele tinha validado os dois primeiros golos do Porto - os quais tu reconhecias que tinham sido legais, mas que, em tua opinião, podiam perfeitamente ter sido também considerados off-﷓side por um árbitro e um liner menos atentos - eu confesso que tive de ler três vezes para ter a certeza de que não estava enganado! Já não te chega viveres a queixares-te dos erros, reais ou supostos, dos árbitros: agora queixas-te também dos não-erros contra os adversários!

Olha, mas, nestes tempos dolorosos para ambas as nossas cores, mando-te um abraço solidário pelo desfecho do Nacional de juniores, que o ilustre CD da Liga (o mesmo que quis enfiar o Benfica na Champions pela porta do lixo e à custa do F.C.Porto), queria atribuir ao Benfica. Felizmente não passou no CJ a tentativa infame de fazer campeões através da invasão planeada de campo para evitar a realização do jogo decisivo! E agora, espero que, se forem buscar o André Vilas-﷓Boas à Académica, não o façam à Benfica…

segunda-feira, novembro 30, 2009

Ó LABAREDAS, VOCÊ VIU AQUILO? (03 NOVEMBRO 2009)

1- O Labaredas é o anónimo 'jornalista' do site oficial do F.C.Porto que, à falta de melhor, gosta de implicar comigo. A semana passada, o Labaredas embirrou que eu não poderia ter escrito aqui, como escrevi, que esta é a mais fraca equipa do F.C.Porto dos últimos quatro anos. Manifestamente, e segundo ele, não é. Eu poderia responder-lhe, simplesmente, que ele não percebe nada de futebol e que nem esta sequência de três pungentes exibições em jogos caseiros de dificuldade mínima - APOEL, Académica e Belenenses - conseguiram fazer-lhe entender o que, todavia, entra pelos olhos adentro de qualquer um. Mas essa não seria a resposta adequada, porque o problema do Labaredas não é o facto de ele achar ou não achar que esta equipa é a mais fraca dos últimos anos - o problema é que ele acha que, mesmo que tal seja verdade, não é coisa que um portista escreva, sob pena de crime de lesa-Majestade. No mundo onde pantaneia o Labaredas, tudo o que Suas Infalíveis Majestades fazem está certo por definição: é para isso que lhe pagam, é por isso que ele é a voz do dono.

Muito deve incomodar o espírito acomodado e a espinha curvada do Labaredas que eu viva a escrever há vários anos que todas as épocas Suas Inafalíveis Majestades se dedicam a substituir dois ou três dos melhores por uma camioneta de sul-﷓americanos (dos quais apenas dois ou três têm valor), com isso aumentando o rol das várias dezenas de jogadores emprestados a quem o clube paga ordenados para jogarem por outros, com isso impedindo o aparecimento de valores novos produzidos nas escolas do clube com custos que também o clube paga, mas com isso não conseguindo nem tornar a gestão solvente, nem o passivo dissolvente.

Repare, Labaredas: Deco, Mc Carthy, Maniche, Derlei, Costinha, Carlos Alberto, Luís Fabiano, Alenitchev, Pedro Mendes, Ricardo Carvalho, Jorge Andrade, Nuno Valente, Paulo Ferreira, Diego, Ibson, Anderson, Bosingwa, Ricardo Quaresma, Pepe, Paulo Assunção, Lisandro, Lucho, Cissokho, etc, etc, já aqui vão 22 - duas equipas - sem sequer puxar muito pela memória. Imagine que equipa não teríamos agora, se apenas tivéssemos vendido metade ou mesmo dois terços deles! Ah, mas valeram milhões! Pois valeram: mas onde estão esses milhões, Labaredas? É essa a questão, percebe agora?


2- A boa notícia para logo à noite em Nicósia, é que, excepcionalmente, vamos entrar em campo onze contra onze: o Mariano González não joga porque está castigado. E, embora nos continuem a faltar extremos de categoria (ó SAD, por favor, peçam lá o Quaresma emprestado ao Mourinho!) e médios ofensivos que, entre outros atributos, sejam capazes, de vez em quando, de rematar de meia distância sem enfiar a bola na bancada, o facto de entramos de igual para igual já é uma substancial melhoria. O futebol fez-se para jogar com onze, e não com dez, mais o Mariano González.

Mas a questão é que, tirando o Labaredas, a confrangedora exibição frente ao Belenenses (seguramente a mais fraca equipa que passou pelo Dragão desde há muito) deixou-nos a todos, verdadeiros portistas, completamente deprimidos. E nem adianta o consolo que foi ver o Benfica encostar em Braga ou o Sporting, mais uma vez, encostar em Alvalade. Com o mal dos outros podemos nós bem, mas não é apenas o consumo interno que nos preocupa: somos nós e apenas nós que jogamos a Champions e que temos a missão de prestigiar o futebol português de clubes. Ora, pelo que se viu contra o Beleneneses, e antes contra a Académica, e antes contra o APOEL, a missão afigura-se mais do que problemática.

Eu sei que, como diz Jesualdo Ferreira, vamos melhorar - aliás, só podemos melhorar. Mas, olhando para o actual nível exibicional da equipa, temo que, quando tal suceder, seja já tarde para evitar alguns danos produzidos. É que não é apenas a falta de extremos ou médios de ataque que dêem garantias, não é apenas a falta de um guarda-redes que não comprometa nos jogos mais importantes, ou a baixa de forma gritante de alguns jogadores em quem se confiava: é tudo o resto, também. A aparente deficiente condição fisica, a falta de atitude de conquista, que era a imagem de marca desta equipa nos anos anteriores, e até, estranhamente, a falta absoluta de ideias do que fazer contra equipas que se fecham todas atrás do seu muro, como este triste Belenenses (o Álvaro Pereita deve ter cruzado algumas 20 bolas para a área, 80% a despropósito, 90% mal cruzadas e 100% cruzadas do local errado, e da forma errada, de trás para a frente). Nos três jogos referidos - os últimos três disputados - o F.C.Porto, versão 2009/10 - começou sempre o jogo numa atitude de sobranceria, de descontração e falta de pressa em resolver as coisas. Passes displicentes transviados, remates à baliza dignos de amadores e assumidos como coisa naturalíssima, livres e cantos cobrados sem qualquer imaginação nem sombra de perigo, futebol a passo, sem rasgo nem génio: francamente, se lhes tivessem trocado as camisolas, eu acreditaria que estava a ver jogar o Sporting, sem ofensa.

O que fazer? Pois, começar a ganhar e já hoje. Depois, esperar que a longa e inexplicada ausência do Silvestre Varela chegue ao fim e que Jesualdo não demore mais um mês a integrá-lo, prolongando a penitência do Mariano e a nossa. E depois, se é que queremos bater-nos pelo campeonato e, vá lá, pelos quartos-finais da Champions, ir às compras em Dezembro. Sei que é contra tudo o que aqui venho defendendo há anos, em termos de gestão desportiva e financeira, mas visto que não há alternativa urgente, pois que tantos jogadores bons e úteis foram emprestados e nenhuma promessa dos juniores é aproveitada, não vejo outra saída a curto prazo.


3- Este ano fiz a mim mesmo uma promessa: não falar de arbitragens, enquanto me aguentar. Vamos quase a um terço do campeonato e tenho-me aguentado, não falando nem das arbitragens dos jogos do F.C.Porto nem das dos rivais. E tenho-me aguentado, sorrindo, mesmo quando (e é todas as semanas, sem falhar) leio os delirantes textos do ilustre trio de benfiquistas Leonor Pinhão-Sílvio Cervan-Ricardo Araújo Pereira (Fernando Seara é outro estilo). Eles começam a atacar os árbitros - os deles e os dos outros - antes dos jogos, continuam depois e nunca estão saciados. Tudo, rigorosamente tudo, lhes serve de motivo de suspeita e de tese de argumentação: se o árbitro é de Viana do Castelo, de Leça do Bailio ou de Reguengos de Monsaraz; se gosta de leitão à Bairrada ou de peixe grelhado; se, num anterior jogo de 2004 ou 1997, na opinião deles, não marcou um penalty a favor do Benfica, mas também se, pelo contrário, o marcou (o que significa que da próxima vez não marcará).

Eu leio, sorrio, às vezes apetece-me tremendamente responder-lhes igualzinho, mas depois lá me vou aguentando. Sempre achei e sempre o disse que, em minha opinião, as equipas verdadeiramente vencedoras não perdem tempo a discutir árbitros nem a queixar-se de arbitragens: devem jogar o suficiente para não estar à mercê de um erro do árbitro, que quase sempre acontece. E também acho que quem fala, grita e esbraceja quando se sente prejudicado e se cala muito caladinho quando toda a gente viu que foi beneficiado, quem se dá ao trabalho de fazer contabilidades de pontos 'roubados' pelos árbitros sem incluir nas contas os desfechos inversos ou os prejuízos dos rivais, não merece crédito algum.

Dou apenas um exemplo: já para aí ouvi muitos benfiquistas queixarem-se de terem sido roubados em Braga, devido ao golo do Luisão anulado. Bem, pese embora às explicações que li sobre a existência prévia de uma falta de outro jogador benfiquista na mesma jogada e que terá justificado a anulação do golo, eu, pela televisão, não vi falta alguma. Vamos admitir, então, que o golo foi mal anulado: quem poderia garantir que, se tem sido validado, o Benfica manteria o empate ou chegaria mesmo à vitória? Facto é este: o Braga ganhou 2-0; se o golo tem sido validado, teria ganho 2-1. O resto são contas à Sílvio Cervan.

Agora, atentem no golo que todos concordam ter sido mal anulado ao F.C.Porto, quando havia 0-0. Quem pode garantir que o Belenenses, a perder por 1-0 e com a consequente necessidade de desmontar o Muro de Belém em frente à sua baliza, chegaria ao empate, em lugar de encaixar mais um ou dois golos? Facto: o resultado foi 1-1; se o golo é validado, como deveria ter sido, o F.C.Porto teria ganho 2-1. Ou seja, o resultado da jornada, revisto à luz das arbitragens, acabou por ser excelente para o Benfica: uma eventual má decisão do árbitro que o prejudicou, não lhe roubou, todavia, ponto algum; já uma real decisão errada do árbitro roubou dois pontos ao F.C.Porto. Mas, como costumam dizer os treinadores, não vou por aí: o F.C.Porto perdeu dois pontos porque não jogou nada. E disso, o árbitro não tem culpa.

O F.C.PORTO MAIS FRACO DOS ÚLTIMOS ANOS (27 OUTUBRO 2009)

1- Não me entendam mal: eu não estou zangado com a equipa do meu clube. Sei que não se pode ganhar sempre e, se há alguém que não se pode queixar disso, é um portista. Também sei que o campeonato não nos está a correr propriamente mal - apenas tivemos o empate inicial em Paços de Ferreira e a derrota em Braga com a equipa-sensação desta época - e, na Liga dos Campeões, temos já, ao fim de apenas três jogos, a porta escancarada para os oitavos-de-final. Não estou, pois, zangado, limito-me a dar a minha opinião: este é, até ver, o F.C.Porto mais fraco dos últimos anos, a mais fraca das equipas de Jesualdo Ferreira, a que pior futebol pratica. Também sei que estamos desfalcados de uma série de jogadores, sobretudo Belluschi - que faz muita falta porque escasseiam médios ofensivos criativos - e Silvestre Varela, que estava a ser a revelação da equipa. E sei, claro, que, quando tomamos o termo de comparação óbvio - o Benfica, de Jorge Jesus - é preciso não esquecer que, enquanto eles gastaram mais de 50 milhões a comprar jogadores, nós facturámos 70 a vendê-los. E essas coisas têm de ter consequências. Mas, quando digo que este é o F.C.Porto mais fraco dos últimos anos, nem sequer estou a tomar o Benfica por termo de comparação: estou a comparar este F.C.Porto com o que ganhou os três últimos campeonatos.

Depois dos onze dias de interrupção para as Selecções, os portistas esperavam que essa interrupção servisse para sarar feridas e afinar estratégias, tanto mais que, logo de seguida, o F.C.Porto iria dispor de quatro jogos fáceis e todos eles em casa: contra o Sertanense para a Taça, o Apoel, a Académica, última da classificação, e o sempre-em-crise Belenenses. Afinal, três jogos disputados e quinze dias decorridos, nada disso tem acontecido: os lesionados não foram recuperados, os em baixo de forma (Raul Meireles e Cristian Rodriguéz) não melhoraram, e os dois primeiros dos três jogos fáceis (o Sertanense não conta) acabaram em vitórias tangenciais, desassossego inesperado e exibições confrangedoras.

Jesualdo Ferreira (que já elogiei tanta vez) tem a sua quota de responsabilidade. O seu conservadorismo, a sua aversão à inovação e à mudança, tornam-se especialmente notados e perniciosos nestas alturas em que o seu baralho com as mesmas cartas de sempre dá mostras de não funcionar. Nos últimos tempos, por força do número anormal de lesões e da duração anormal dessas lesões, Jesualdo tem sido obrigado a chamar uma quantidade de juniores aos treinos da equipa principal e até dispôs de uma oportunidade de ouro para os testar no jogo da Taça. Mas é apenas uma formalidade: todos sabemos que ele não aproveitará um único. Quantos juniores lançou Jesualdo na equipa principal nestes mais de três anos? E de quantos jovens que pareciam à beira de se tornarem em certezas já se desfez, mandando-os rodar para outras equipas e deixando a treinadores alheios a tarefa de os tentar transformar em jogadores de categoria? Com Jesualdo tudo é sempre prevísivel: são os mesmos de sempre, uma espécie de clube fechado, onde, em cada ano, não entram mais do que um ou dois dos onze reforços que Pinto da Costa todos os anos, infalívelmente, lhe fornece. É fácil, facílimo, adivinhar as equipas de Jesualdo Ferreira: são os onze óbvios de sempre e, se algum se magoa, avança o Mariano; se se magoam dois, avança também o Tomás Costa; se se magoam três, avança por fim o Guarin. Conclusão: como há sempre alguém castigado ou lesionado, o Mariano, para desespero meu, está sempre em campo, porque ele nunca se magoa. (Mas o Mariano tem a sorte dos inocentes: depois de mais uma desastrada exibição, culminada com expulsão contra o Apoel, lá estava ele, outra vez, no onze incial contra a Académica. Dei-me ao trabalho de anotar escrupulosamente tudo o que fez.

E eis o que fez: tocou na bola pela primeira vez aos 16'20'' (!), depois de ter entrado em jogo com a atitude de quem estava num garden-party. Daí até ao minuto 65, limitou-se a receber e atrasar bolas, a ensaiar algumas fintas falhadas e a conseguir uma boa jogada de envolvimento pela direita que terminou com um cruzamento para a bancada do lado oposto. Mas, ao minuto 65, ao meter uma bola de cabeça para dentro da área, viu esta acabar directa dentro da baliza, sem saber como; e, três minutos volvidos, cruxou rasteiro e direito a um adversário, que falhou o corte e permitiu o golo de Farias. Daí até final, voltou a nada mais fazer, mas foi quanto bastou para que se dissesse que «Mariano resolveu o jogo»). E sexta-feira, contra o Belenenses, lá estará outra vez.

Oh, sim, Lisandro faz muito falta e Lucho ainda mais! Belluschi, tem bons pés mas que não chegam aos calcanhares de Lucho, e Falcão é um excelente ponta-de-lança clássico, mas não um dinamitador de toda a frente de ataque, como Lisandro foi. E basta que Belluschi e Varela estejam lesionados e Meireles em sub-rendimento, para que não haja nem médios capazes de abrirem linhas de passe e de ruptura para a frente, nem extremos capazes de flanquearem jogo (Jesualdo deitou fora uma meia-dúzia deles, nos últimos anos). Se o génio de Hulk não está em dia de sair do frasco e o jeito de Falcão está sumido, acontecem estatísticas como a de o F.C.Porto, ao fim da primeira parte no Dragão, ter três remates à baliza da Académica, contra seis dos estudantes - que só queriam jogar para o 0-0…

2- E acontece ainda ( a verdade é para ser dita) que o Benfica está a jogar um grande futebol, que dá gosto ver. Não é apenas a impressionante média de 3,5 golos por jogo, ou a cadência de jogo ofensivo do quarteto sul-americano do ataque (Di Maria, Aimar, Saviola, Cardozo). É também uma coisa que há muito, muito tempo, não se via ao Benfica: o prazer de jogar, o respeito pelo público, a vontade de fazer cada vez mais e melhor e a sensação de que ali está a nascer uma verdadeira equipa e não apenas um lote de jogadores momentâneamente inspirados. Confesso que estava longe de esperar tanto do Benfica de Jorge Jesus. Não sei se isto é para durar e se continuará assim quando chegarem os jogos a doer - já no próximo fim-de-semana, em Braga. Mas, para já e por enquanto, caramba, que diferença para o Benfica dos últimos anos, que tanto reclamava e apregoava e tão pouco jogava!

3- A notícia de que Nuno Ribeiro, o vencedor oficial da última Volta a Portugal em Bicicleta, se transformou afinal no quinto vencedor a perder o título por posterior análise positiva de doping, já não consegue surpreender, infelizmente, ninguém. Desde há largos anos que o ciclismo se vem suicidando alegremente, por responsabilidade de corredores, directores desportivos e uns bandidos que usam o título de médicos. Mas também não venham depois com a hipocrisia de lançarem as culpas todas para cima dos médicos: quando um ciclista português, para correr a Volta a Portugal, recorre aos serviços de um médico colombiano, está tudo sub-entendido.

Por mim, há muito que desisti de me interessar pelo ciclismo e de seguir as provas. Pelo menos, desde que o nosso ídolo Joaquim Agostinho (apanhado três ou quarto vezes em controlos positivos) teve esta afirmação imortal, numa entrevista dada aqui mesmo: «Eu nunca tomei doping. Mas também que ninguém imagine que se pode subir o Alpe d'Huez só com bife grelhado e Eau d'Evian!». Fiquei esclarecido.

segunda-feira, novembro 09, 2009

PESADELO AZUL (20 OUTUBRO 2009)

Leio sempre com atenção o que Fernando Guerra aqui escreve - e ele escreve bem e pensa bem. Mas, terça-feira passada, creio que ele derrapou e cometeu o erro clássico que, a meu ver, sempre cometem os que, de fora, escrevem sobre Pinto da Costa: ficarem-se pelas aparências, pelos sinais exteriores de qualquer coisa mais funda e que não querem ou não alcançam entender. Eu, que julgo ser insuspeito de alinhar junto dos «que o seguem até de olhos fechados», como escreveu Fernando Guerra, fico sempre admirado por constatar que, após mais de vinte anos de liderança destacada no futebol português, o «fenómeno Pinto da Costa» (porque se trata mesmo de um fenómeno), continue a não ser decifrado por analistas, adversários e rivais.

Confesso que não segui com atenção as tais declarações que o presidente do FC Porto terá feito algures e que levaram Fernando Guerra a classificá-las como «resquício da pequenez que sempre caracterizou a sua política de conflitualidade, avessa à serenidade, à sensatez e à clareza» e decerto motivadas por um «pesadelo vermelho» que esta época estará a perseguir o líder azul. Que eu tenha visto, apenas registei umas declarações, no tom de ironia de que tanto gosta, agradecendo ao Benfica a contratação de Falcao. Se é a isso a que se referia Fernando Guerra, não me parece que justifique tamanho alarido. Basta recordar que o presidente do Benfica, esse sim, gastou os últimos três anos a visitar casas do Benfica pelo país inteiro e em todas elas tinha sempre um discurso de escárnio e ódio contra o FC Porto - com o qual visava desviar as atenções dos sucessivos falhanços desportivos da sua gestão (é, aliás, sintomático que esta época, em que o Benfica desatou enfim a vencer e a jogar futebol, Luis Filipe Vieira se tenha remetido a um silêncio inabitual).

Fernando Guerra diz que «Pinto da Costa não autorizou que o FC Porto crescesse quanto podia, transformando-o de um grande clube de implantação regional num outro de dimensão verdadeiramente nacional». Extraordinária afirmação esta! Que todos os factos, todos os números e toda a realidade desmentem, ano após ano! É verdade que Pinto da Costa sempre viveu amarrado a um discurso de cariz regional e regionalista, que lhe serviu no início para aglutinar todas as gentes portistas e fazer do FC Porto o grande clube do norte do país, símbolo perfeito do desafio do resto do país à hegemonia de Lisboa - no futebol, como no resto. Mas, ou porque tenha mudado de visão quando percebeu a dimensão imensa que o clube foi adquirindo, ou porque a criatura escapou ao criador, o facto é que isso hoje está longe de ser verdade e chamar ao FC Porto um clube regional sem dimensão nacional não cabe na cabeça de ninguém. O FC Porto é, neste momento, tetracampeão de futebol, depois de ter sido pentacampeão há pouco tempo. Conquista regularmente títulos nacionais em todas as modalidades profissionais (um ano houve em que chegou a acumular o título nacional nas cinco modalidades profissionais); foi, nos últimos três anos, o clube com mais assistências no estádio e tem hoje adeptos e seguidores de norte a sul, ilhas e emigração. Se isto não é um clube de dimensão nacional, o que será tal coisa?

Mas, nos últimos vinte anos, o FC Porto fez mais, bem mais do que isso: transformou-se no único clube português de dimensão internacional, duas vezes campeão europeu e campeão do mundo, segundo clube com mais presenças na Champions, fundador do G-14, onde sediavam os maiores da Europa, conhecido no mundo inteiro e com os seus principais jogadores cobiçados todos os anos pelos potentados europeus. Atendendo à dimensão crítica do nosso futebol, o que o FC Porto conseguiu é um verdadeiro «case study»: não conheço nenhuma empresa portuguesa que tenha adquirido uma dimensão além-fronteiras comparavel à do FC Porto. Que outra empresa portuguesa já foi considerada a melhor da Europa ou a melhor do mundo no seu ramo de negócio? Que outra levou o nome de Portugal aos confins do planeta, como o FC Porto o fez e faz?

Não ver isto, insistir em que tudo foi conseguido pela «pequenez» ou «conflitualidade» (ou por batota, como diz o disco rachado dos rivais vencidos) ou é cegueira em adiantado estado ou é má-fé. Não querer perceber que um êxito continuado só acontece a quem é melhor no planeamento, na organização, no profissionalismo e na motivação, a quem tem como filosofia de vida um grau de exigência e de competitividade acima dos demais, é uma caracteristica bem portuguesa. O sucesso que se destaca é sempre muito mal visto pelo comum dos portugueses e a reacção habitual não é a de tentar perceber as razões do sucesso e imitá-las, mas sim tentar destruí-lo, insinuando razões obscuras para o triunfo. Desde Alfarrobeira que essa é a nossa história. E a razão do nosso atraso sem remédio.

Muito na linha dos adversários portistas, Fernando Guerra acha que tudo foi obra de um homem só e profetiza tranquilamente que tudo se há-de desmoronar, no dia em que Pinto da Costa passar à reforma. Pois, quem viver, verá. Mas se espera, como escreveu, que o resultado das últimas autárquicas (ou das anteriores) na cidade do Porto já é um prenúncio seguro do fim iminente de Pinto da Costa e da hegemonia nacional dos portistas no futebol, o melhor é esperar sentado, porque de novo não percebeu. Não deixa, aliás, de ser eloquente que, enquanto que os cidadãos do Porto distinguem bem o voto muncipal do voto clubistico, sejam os analistas a proceder entusiasticamente a essa confusão. Segundo eles, se Rui Rio, inimigo confesso do FC Porto, ganha as eleições no Porto, é porque o clube está a perder adeptos na sua própria cidade. Do mesmo modo que quando os sportinguistas Jorge Sampaio e Pedro Santana Lopes ganharam a Câmara de Lisboa, isso só podia significar que o Benfica estava a perder adeptos na capital…É certo que eles não hostilizaram o Benfica, como Rui Rio, numa atitude de arrogância gratuita e ridícula, resolveu fazer com o FC Porto. E se também é certo que Rui Rio tem vencido as eleições apesar da sua hostilidade declarada ao maior clube e maior símbolo da cidade, também o F.C.Porto tem vivido muito bem com essa hostilidade: tem ganho títulos nacionais e internacionais e a única consequência é que agora não os festeja frente aos Paços do Concelho, conforme era tradição.

Enfim, para acabar e em abono da verdade histórica, é preciso dizer que não é verdade que o clube (isto é, Pinto da Costa), ao vencer a Liga dos Campeões, «em lugar de festejar com a exuberância justificada… tenha optado por destapar desavenças internas com o objectivo de desvalorizar o trabalho do treinador, José Mourinho, o qual, no regresso da Alemanha, abandonou o aeroporto pela porta do lado, por forma a evitar encontros indesejáveis com a facção mais descontrolada da obediente claque». Não é verdade, simplesmente. Eu estava lá e vi - no estádio, no avião, no aeroporto. Não havia ninguém, do presidente ao mais simples adepto, que quisesse desvalorizar o trabalho de Mourinho e que não quisesse a sua continuação: foi ele que, legitimamente aliás, quis voar outros voos. E foi ele quem optou por não festejar exuberantemente o título europeu - nem no estádio, nem no avião, nem depois, no Dragão. Conforme é mais do que sabido, Mourinho teve um problema de natureza pessoal com parte da claque portista e foi por isso que escolheu sair por uma porta lateral e desaparecer dos festejos. Não discuto se tinha ou não razão para proceder assim: limito-te a corrigir a versão de Fernando Guerra porque ela não é verdadeira e não serve de exemplo à sua tese.

sábado, outubro 24, 2009

O SUAVE MILAGRE (13 OUTUBRO 2009)

1- Na verdade, não foi apenas um, mas sim três suaves milagres que coincidiram no passado sábado para subitamente dissiparem o nevoeiro que envolvia o caminho da Selecção e abrir uma estrada de luz que, agora sim, conduz a direito até à África do Sul, no ano que vem.

Primeiro, foi a vitória da Dinamarca sobre a Suécia, alcançada a 11 minutos do final, colocando logo Portugal ao alcance do terceiro lugar no grupo; depois, foi a própria vitória da Selecção sobre a Hungria, apenas confirmada no último quarto-de-hora e fazendo-nos subir mais um degrau, para o segundo lugar, e, pela primeira vez, ficarmos em posição de qualificação; enfim e igualmente importante, a quebra da invencibilidade da Inglaterra em Kiev, permitindo à Ucrânia ultrapassar a Croácia e, simultâneamente, catapultando-nos para o primeiro grupo do play-off: aquele onde estão os cabeças-de-série, que irão disputar um lugar no Mundial com os mais fracos dos segundos classificados. Uma conjugação de circunstâncias notável, na qual o menor mérito acabou por ser o nosso.

A Selecção entrou no relvado da Luz sabendo já da derrota da Suécia, com 50.000 pessoas nas bancadas, os jogadores aplaudidos e o seleccionador assobiado. Aparentemente, a opinião pública não tinha dúvidas: a equipa, os jogadores, justificam amplamente o Mundial, o problema é o seleccionador, que não sabe aproveitar a belíssima mão-de-obra que tem à disposição. No final do jogo, com a vitória na mão e a qualificação à vista, a opinião mantinha-se. Por exemplo: a grande exibição de Pedro Mendes exemplificava a excelência dos jogadores que temos; a sua convocação só agora demonstra como o seleccionador anda distraído. Bom, distraído devo andar eu, porque não vi ninguém, em lado algum, em momento algum, que se tivesse lembrado de sugerir a convocação de Pedro Mendes...

O que eu vi, isso sim, foi mais uma exibição falhada desta Selecção dita de luxo, em que todos os jogadores, um por um e com raras excepções, jogam sempre pior na Selecção do que nos respectivos clubes. Contra a modestíssima equipa da Hungria - ataque inexistente, meio campo banal e defesa com muitos jogadores mas fraca qualidade - chegámos ao golo através de uma fífia do guarda-redes e dos centrais, no primeiro remate que fizemos à baliza e um dos raros de toda a primeira parte. Tivemos uns bons dez minutos no início da segunda parte e, quando já nos preparávamos para sofrer até final segurando aquele tangencial golo, surgiu o passe de morte de Bruno Alves e o golo feliz de Liedson, que permitiram enfim um imenso suspiro de alívio do Minho a Joannesbourgo.

Mas quem jogou bem, ali, quem mostrou estar ao nível das ambições de um Mundial? Pedro Mendes, primeiro que todos - a grande surpresa e o pilar da equipa; Simão, e apenas ou sobretudo porque esteve de pé-quente na finalização; e os dois centrais, Ricardo e Bruno, impecáveis a defender, excelentes a atacar. Nada mais. Eduardo ia entregando o ouro ao bandido, num jogo em que quase nada teve que fazer, quando saíu em falso e permitiu um cabeceamento à trave da baliza abandonada; os laterais foram um desastre; Liedson e Meireles apagados; Deco simplesmente desastrado e Ronaldo, mesmo levando em conta a lesão e o pouco tempo que esteve em campo, seguia para mais uma exibição falhada ao serviço da Selecção. E este panorama tem-se repetido de jogo para jogo, com a curiosa excepção do jogo inaugural contra a Dinamarca, em que tão bem jogámos e tão mal perdemos. Mas, daí para cá, a Selecção de Carlos Queiroz nunca deu mostras em campo de ter o valor e a capacidade suficientes para lutar pelo seu destino, em lugar de esperar que as coisas acontecessem por si mesmas. Assim, fica difícil mandar as culpas para cima de um seleccionador que, ao contrário de Scolari, junta uma equipa que reune o consenso geral e espera sempre que eles joguem ao menos qualquer coisa de semelhante àquilo que estamos habituados a vê-los jogar pelos seus clubes. A única crítica que eu consigo fazer a Queiroz é a de ele não ter, quando tal seria recomendável, a coragem de prescindir de alguns imprescindíveis que chegam ali e só desiludem: se Ronaldo ou Deco não estão em forma ou manifestamente estão a atrapalhar a fluidez do jogo, pois que os tire ou os deixe de fora! Será que o mundo acabava?

Enfim, os milagres sempre existem e todos confiamos que amanhã em Guimarães, contra Malta, não haja nenhuma brincadeira do tipo-Albânia. Pelo contrário, seria bem bom que a Selecção fizesse um jogo cheio, capaz de reacordar um país que já estava semi-descrente e ganhar aí o ânimo suficiente para ultrapassar o play-off que se seguirá e assinar a folha de presenças na África do Sul. Não basta apregoar ao mundo que somos óptimos: é preciso demonstrá-lo, de quando em vez.


2- A lesão de Cristiano Ronaldo ao serviço da Selecção portuguesa tem todos os ingredientes para deixar os responsáveis do Real Madrid à beira de um ataque de raiva. É que ele já veio lesionado, não tendo disputado o último jogo pela sua equipa, devido à lesão. E os 27 minutos que esteve em campo contra a Hungria pioraram a sua situação: agora vai estar parado um mês, pelo menos, falhando seis jogos do Real, entre os quais os dois importantes confrontos com o Milan para a Liga dos Campeões. E Ronaldo custou ao Real 96 milhões de euros e ganha milhão e meio por mês... Mesmo com o seguro de que os madrilenos dispõem e accionaram e com a modesta ajuda do seguro da FPF, esta é a situação clássica que os clubes tanto temem, quando «emprestam» os seus «activos», como agora se diz, às Selecções. Situação parecida viveu Cristian Rodriguéz, ao serviço do Uruguai, esta semana. Sem jogar pelo F.C.Porto há um mês, ausente dos últimos quatro jogos do clube, mesmo assim foi convocado por Oscár Tabarez. A diferença é que não chegou a entrar em campo contra a Bolívia e tudo o indica que também ficará de fora no decisivo confronto em Montevideo contra a Argentina de Diego Maradona. Mas acaba por fazer uma viagem intercontinental inútil e por interromper o tratamento no departamento médico do F.C.Porto, com manifesto prejuízo para o clube que, neste caso, nem sequer pode accionar seguro algum.

Com o que os clubes investem hoje em jogadores e com a fortuna que lhes pagam, um dia este problema irá ter de ser encarado a sério e a bem ou a mal. Sobretudo, porque cada vez são mais as competições inventadas pelas Federações e os jogos particulares onde exibem as «suas» vedetas mundiais. As Federações usam e exibem e os clubes pagam. Em nome de um «dever patriótico» que, aliás, cada vez é mais difícil de justificar, quando se olha para a composição «nacional» de algumas Selecções - Portugal incluído.


3- E, falando ainda de Selecções: sintomático do panorama do nosso futebol foi a constituição da equipa portuguesa que defrontou a Hungria: dois jogadores do F.C.Porto, um do Sporting (e naturalizado português) e nenhum do Benfica (acabaria por entrar, já com o jogo decidido, Nuno Gomes, cuja reforma da Selecção só foi adiada devido à reforma de Pauleta e ao total deserto de pontas-de-lança, que levou até à invenção de Liedson como português). Mas o Benfica, que há uns anos atrás Vale e Azevedo jurava que teria rapidamente «a espinha dorsal da Selecção», o Benfica que, em pleno Estádio da Luz, não tinha um único jogador no onze inicial da camisola das quinas, tinha, no mesmo dia e à distância de um continente, dois titulares a jogar pela Selecção do Brasil e outros dois pela Selecção da Argentina... O clube mais portugês da Selecção acaba por ser assim o... Chelsea, de Londres, que forneceu três jogadores titulares contra a Hungria: Ricardo Carvalho, Bosingwa e Deco.

SER SPORTINGUISTA É FREUDIANO (08 OUTUBRO 2009)

1- Os sportingistas passaram quinze dias a discutir o árbitro do jogo com o Porto, indiferentes ao facto de já ninguém os escutar. Começaram por discutir a nomeação, depois qualquer coisa de não muito explícito sobre a arbitragem do próprio jogo e, finalmente, as consequências disciplinares das ofensas que lhe dirigiram. Veio entretanto um jogo europeu, contra o Hertha de Berlim, cuja exibição foi tão entusiasmante que eu adormeci a ver o jogo ao fim de quinze minutos e no dia seguinte li nos jornais que Paulo Bento tinha dito mal da própria equipa, os jogadores também, e o público assobiara-os convictamente. Também e segundo rezam as crónicas, a escassa vitória de 1-0 ficou a dever-se, em boa medida, ao facto de o árbitro ter feito vista grossa a um penalty favorável aos alemães - mas sobre isso e como de costume, já os sportinguistas não se pronunciaram. E veio a seguir o empate caseiro com o Belenenses e uma exibição a que resisti dez minutos sem adormecer. Mas é garantido que, à mais pequena oportunidade ou pretexto, lá estarão eles outra vez a discutir uma arbitragem. Ser sportinguista, hoje em dia, é qualquer coisa que tem laivos de distúrbio freudiano.

O habitual segundo classificado do futebol português vive num limbo onde não alcança nem o esplendor das vitórias portistas nem o descalabro das derrotas benfiquistas; não tem o espírito de conquista do F.C.Porto nem a arrogância de prima-dona do Benfica, que sempre se anuncia como o próximo campeão. Sem dinheiro nem massa associativa para outros atrevimentos e sem o aventureirismo suicidário de outros, o Sporting tem preferido, prudentemente, viver do que vai tendo (sobretudo da sua tão louvada escola de jogadores) do que lançar-se em operações desesperadas de tudo-ou-nada. O resultado tem sido o de que não conquista nada, mas também não perde tudo. Tudo visto e ponderado, o saldo não tem sido negativo e uma coisa há que convém não esquecer: um título ganho pelo Sporting, com meios financeiros substancialmente inferiores aos dos seus dois rivais, teria muito mais valor do que um título arrecadado por estes. Mas para quem já foi «grande» do futebol português (no século passado), para quem a tradição dos bons velhos tempos tinha reservado uma quota de 25% dos campeonatos e só enfrentava a concorrência do rival da Luz, compreende-﷓se que não seja fácil habituar-se a este estatuto de eterno-vencido-jamais-esmagado.

Em minha opinião, o Sporting enfrenta um futuro negro: a prazo não muito distante poderá mesmo vir a extinguir-se como clube de referência no futebol português - tal qual como o PSD poderá vir a extinguir-se como partido de governo. Ambos estão perante problema idêntico: a falta de sustentabilidade. O PSD desprovido de base ideológica, o Sporting de base clubística.

Aceitar esta realidade, esta morte lenta, não é fácil. É mais do que compreensível que os sportinguistas - se bem que compreendendo as dificuldades financeiras e o próprio esvaziamento da mistica clubística (basta olhar para as bancadas de Alvalade ou lembrar o que dizia Soares Franco) - não se habituem facilmente à ideia de terem ficado irremediavelmente para trás na corrida ao futuro. E daí esta obsessão com as arbitragens, este delírio de calimeros, que mais não é do que um reflexo freudiano de fugir à realidade e encontrar um factor alheio, um inímigo externo, que os impede de serem quem eram. O delírio foi levado tão longe que se transformou numa cultura do clube, numa condição natural de um sportinguista. O sportinguista começa a contestar o árbitro antes mesmo de o jogo começar, começa a assobiá-lo aos dois minutos de jogo e, se não triunfa, já se sabe que o culpado único é o homem do apito. Quando fala de futebol, o sportinguista diz sempre «o Sporting, o clube mais perseguido pelas arbitragens…» e já nem se preocupa em justificar porquê ou sequer em convencer quem quer que seja dessa verdade adquirida. Para ele, é doutrina assente que, se o Sporting não é campeão, digamos a cada três anos, é porque os árbitros não deixam. E esta «verdade» não é discutível. Não importa que lhes lembrem as tantas outras vezes em que o Sporting é beneficiado, que lhes lembrem que muitos dos árbitros que tanto contestam até são conhecidos por serem sportinguistas (pelo contrário, ainda desconfiam mais), ou que lhes lembrem o pífio desempenho internacional dos leões, que têm apenas para apresentar uma obscura Taça das Taças, conquistada há 40 anos atrás, graças a um canto directo de um senhor chamado Morais. Nem sequer interessa, claro, olhar para exibições como as que fizeram contra o Hertha e o Belenenses - e que são bem frequentes - e perguntar-lhes se acham que a culpa de não reinarem como leões será mesmo e só dos árbitros. Eles já não vão mudar. E, quando manifestamente já nem a arbitragem serve como desculpa então surge a revolta interna - contra jogadores, treinador, dirigentes e até um presidente acabado de tomar posse a quem exigem, seja lá como for, o milagre instantâneo de inventar uma equipa de campeões sem dinheiro nem sócios nas bancadas.


2- Perdendo em Atenas, o Benfica não comprometeu por aí além as suas hipóteses de passar à fase seguinte da Liga Europa, num grupo mais do que acessível. O que perdeu, e uma vez mais, foi a possibilidade de arrecadar pontos fáceis para o ranking dos clubes portugueses na UEFA. Se olharmos a relação entre os pontos ganhos na UEFA e as participações havidas, o Benfica é de longe o maior beneficiário… do esforço alheio. Se alguém quiser contar com os pontos ganhos pelo Benfica para chegar a uma qualificação europeia, bem pode esperar sentado. Em contrapartida, não fossem os pontos conquistados nos últimos anos por Sporting, Braga e, sobretudo, F.C.Porto (olha quem!) e o Benfica teria ficado algumas vezes, em matéria de participação europeia, pelos Troféus Amizade ou Guadiana.


3- Já o F.C.Porto, o único clube com estatuto europeu do nosso futebol, não perdeu a oportunidade de somar três pontos no confronto com o Atlético de Madrid. Não venceu com brilhantismo, mas com todo o mérito e com a segurança e a naturalidade de quem, de facto, já está habituado aos altos palcos do futebol europeu. Uma vitória que começou numa notável tranquilidade defensiva, face a um ataque que mete respeito (Aguero, Forlán, o «Bota de ouro» europeu, Simão, Maxi Rodriguéz) e que se consumou graças aos dois únicos jogadores que, do meio-campo para a frente, podiam fazer a diferença: Hulk e Falcao. Os mesmos, aliás, que viriam a resolver, no domingo, o jogo em Olhão. Eles, mais os dois centrais de luxo ao dispor de Jesualdo - que defendem com classe, aguentam as fífias do Helton sem estremecerem de susto e ainda vão lá à frente marcar golos - conseguiram fazer disfarçar as baixas de Cristián Rodriguez e Silvestre Varela. E a verdade é que, sem eles, o F.C.Porto foi capaz de levar de vencida o Olhanense, o Atlético de Madrid e o Sporting, que deixou já a cinco pontos de distância. Também é verdade que continua a três pontos do Benfica e a quatro do Braga, mas não só a sorte do Braga não vai durar para sempre, como a infindável série de jogos fáceis do Benfica em breve terá fim também.

O QUE SE SOFRE DE LONGE! (29 SETEMBRO 2009)

1- As últimas semanas foram um calvário para um portista de todos os dias, como eu. Ausente onde nem sequer a televisão portuguesa chega, falhei sucessivamente o F.C.Porto-Leixões, Chelsea-F.C.Porto, Braga-F.C.Porto e F.C.Porto-Sporting. Quatro jogos, de que a única coisa que soube foi o resultado final. No mais, limitei-me a tentar adivinhar, a antecipar o onze e a forma como a equipa se portaria e a desejar a notícia de uma vitória no final. O saldo acabou em duas vitórias e duas derrotas e, como sempre e absurdamente me acontece, invadiu-me o remorso de ter estado ausente, acreditando que, se aqui estivesse, não teríamos perdido dois jogos.

O black-out total só foi rompido uma vez, no jogo de Stamford Bridge, em que consegui aceder a um site inglês que ia relatando o jogo em tempo praticamente real, mas sem direito a quaisquer imagens. Mais valia que não o tivesse conseguido: é que bastou-me ver a equipa que Jesualdo Ferreira tinha escolhido para iniciar o jogo, para ficar logo mal-disposto.

Uma vez mais (e já aqui escrevi tantas vezes sobre isso!), Jesualdo Ferreira não fugiu ao comportamento típico do treinador português no momento de enfrentar um desafio europeu que surge como maior do que a aparente capacidade da equipa: mudar tudo o que é habitual e está treinado e rotinado, para reforçar a defesa e o meio-campo e enfraquecer o ataque, na esperança que do céu caia um empatezinho a zero. E, todavia, ele já adquiriu suficiente experiência internacional à frente dos dragões para que lhe seja exigível um comportamento menos provinciano e menos medroso. Aliás, na véspera, Jesualdo Ferreira, ao comentar o triste histórico dos jogos do F.C.Porto em Inglaterra para as competições europeias (13 jogos, 2 empates e 11 derrotas), tinha dito que algum dia o F.C.Porto acabaria por ganhar um jogo, quando tivesse attitude para isso, e prometendo que, pelo seu lado, nada iria mudar na forma habitual de jogar da equipa, apesar de ir ter pela frente a que ele considerava a melhor equipa inglesa do momento.

Afinal, tudo aconteceu ao contrário. Pelo que li nas crónicas subsequentes e nos próprios comentários do site inglês, o Chelsea que o F.C.Porto enfrentou está longe de estar em forma e, desfalcado de Drogba, mostrou-se um adversário perfeitamente ao alcance, pelo menos de um empate - assim houvesse coragem para o enfrentar olhos nos olhos. Logo aí, Jesualdo mostrou que tinha o adversário mal estudado e que os seus temores tinham mais que ver com o passado do que com o presente.

Depois (meu Deus!), o homem que tinha prometido nada mudar na equipa, fez só isto: num dos flancos de ataque tirou a boa surpresa desta época, Silvestre Varela, para entregar o lugar ao seu fiasco de estimação - Mariano González - assim preferindo um peso-morto a um desequilibrador nato. E, para rematar em beleza (numa equipa cuja grande dificuldade tem sido conseguir marcar golos), tira o ponta-de-lança Falcao, preferindo, à boa maneira dos treinadores portugueses, «reforçar o meio-campo», com o trapalhão do Guarín (que, desde que chegou ao F.C.Porto apenas fez um jogo conseguido, contra uma equipa dos distritais, para a Taça). Ou seja, Jesualdo tratou, logo à partida, de mostrar que estava borrado de medo do Chelsea e, como era inevitável, transmitiu esse medo à equipa, que jogou todo o primeiro tempo entricheirada atrás dos escudos, como uma corte romana enfrentando um exército de bárbaros muito superior. E, claro, aconteceu o que sempre acontece quando se joga para o zero-zero, com medo do adversário: num golpe fortuito, o Chelsea chegou ao golo e só então é que Jesualdo, perdido por cem, perdido por mil, desfez os erros cometidos de entrada e soltou os cavalos para que o F.C.Porto corresse atrás do prejuízo e da sorte. Mas está escrito, está escrito desde há muito, que a sorte só ajuda os audazes, não os medrosos. O F.C.Porto perdeu em Londres porque o seu treinador teve medo de tentar ganhar. Esta história já é antiga e já começa a fartar.

Não que seja justo exigir que o F.C.Porto vá jogar fora com os colossos ingleses, com um orçamento infinitamente mais elástico, e se bata sempre de igual para igual. Mas é justo exigir que o seu treinador não se coloque à partida numa atitude de submissão e temor, auto-diminuindo a capacidade da equipa para conseguir uma proeza. E, como já vi esta história escrita várias vezes, pergunto: digam-me quando é que esta fabulosa estratégia lusa de tirar avançados e reforçar o meio-campo, em jogos de dificuldade maior, deu resultados? Quando?

A seguir - ao que li e ao que me contaram - tanto em Braga, como depois contra o Sporting, o F.C.Porto acusou sobremaneira o cansaço do onze mais utilizado, perdendo o primeiro jogo e ganhando periclitantemente o segundo. E aí chegamos a um outro problema, que já vem da época passada e que aparentemente se repete este ano, apesar de mais onze reforços comprados no mercado de Verão, toda uma equipa: Jesualdo não dispõe de suplentes, não apenas ao nível dos titulares habituais, mas ao nível exigível para suplentes de uma equipa que disputa a Champions e o penta-campeonato. Com tantos e tantos jogadores de categoria por aí emprestados ou dispensados de borla, olha-se para o banco do F.C.Porto e suspira-se de impotência. E amanhã, num jogo que é absolutamente necessário vencer contra o Atlético de Madrid, e com as baixas de Fernando, Varela e Rodriguéz, adivinhem quem é que Jesualdo Ferreita tem para os substituir? Guarín, Mariano e Farías. Um trio que mete medo!

Vale ao F.C.Porto que o Atlético de Madrid atravessa um péssimo momento, de resultados e exibições, e que conseguiu até a proeza de empatar a zero, em casa, contra o Apoel de Chipre - os tais que, em tempos idos, encaixaram 16-0 do Sporting, em Alvalade. Mesmo assim, e desfalcado daqueles três, com Raul Meireles a arrastar-se, segundo rezam as crónicas (e que mal reforçado que foi o meio-campo, que tanto precisava de bons reforços, ainda mais depois da saída de Lucho!), o grande problema amanhã vai ser o habitual: construir jogadas para golo. Mas tenhamos fé, porque a vontade de vencer e o espírito de conquista, esses, felizmente, nunca morrem por ali.

E é bom estar de volta e poder seguir intimamente o meu F.C.Porto. Mas não só: também estou muito curioso de ver, porque ainda não vi, o novo Benfica, que dizem transfigurado, uma máquina de futebol e golos, apontada a uma vitória certa entre muros. E também a surpresa deste início de campeonato (todos os anos há uma, que rapidamente se esfuma…): o Sportingt de Braga. Quero ver com os meus olhos se as tais seis vitórias a abrir são fruto do mérito, da sorte, das circunstâncias ou de tudo um pouco. Este ano chego atrasado, mas espero bem que ainda muito a tempo de ver o melhor da época. E isso inclui a qualificação da Selecção para a África do Sul.

NÃO HOUVE CRÓNICA (22 SETEMBRO 2009)

Não houve crónica.

NÃO HOUVE CRÓNICA (15 SETEMBRO 2009)

Não houve crónica.

quarta-feira, setembro 30, 2009

ERROS VELHOS, MÁ FORTUNA (08 SETEMBRO 2009)

1- Ainda não foi desta que ficou esclarecido se estaremos ou não no Mundial do ano que vem, na África do Sul. Temos que continuar a fazer contas, esperar mais um jogo pelo menos, ter fé na aritmética e nos milagres. Enfim, o nosso fado habitual.

Mas, desta vez, ninguém pode dizer que não nos batemos pela vitória e contra o destino até ao último minuto e até ao último fôlego. Os 25 minutos finais, quer da primeira, quer da segunda parte, foram jogados ao nível exigível a quem quer estar num Mundial. A Dinamarca pode agradecer a todos os deuses ter conseguido uma vitória e um empate nos dois jogos contra Portugal, em que foi claramente dominada de ambas as vezes. Quando se remata 35 vezes à baliza, acertando catorze e apenas se marca um golo, enquanto que o adversário remata treze vezes e acerta uma que logo dá em golo, é legítimo queixar-se da sorte. Não a tivemos, de facto. Nem em Lisboa nem em Copenhaga. E que somos melhor equipa que a Dinamarca, não me parece terem ficado dúvidas a ninguém.

O problema é que os verdadeiros vencedores não podem estar dependentes da sorte ou das decisões dos árbitros. Podemos queixar-nos do penalty que Busacca não viu ou do azar das oportunidades perdidas. Podemos queixar-nos uma, duas vezes. Três já é demais: parece o Sporting. Os verdadeiros vencedores jogam contra a sorte e contra os árbitros, jogam o suficiente para se colocarem ao abrigo de factores aleatórios. E, quer em Lisboa, quer em Copenhaga, jogámos o suficiente para ficarmos fora do alcance dos factores aleatórios. Jogámos, sim: mas jogámos, como sempre, um futebol estéril.

Se ficarmos fora do Mundial não é porque não tenhamos equipa para lá estar. É porque a cultura do remate para golo não existe no nosso futebol. Somos óptimos a fintar, a simular, a fazer tabelinhas, a fazer circular a bola, a arrancar toques e números circenses que entusiasmam a plateia. Mas rematar à baliza para marcar golo, e não apenas por rematar, isso não sabemos fazer. Na hora de matar a jogada e o jogo, somos absolutamente indigentes, incompetentes. Eu, se fosse seleccionador, preocupava-me muito pouco com tácticas e estratégias e losangos e linhas de passe e tudo o resto: gastava quatro quintos de cada treino a ensaiar remates à baliza até os jogadores suplicarem misericórdia, mas aprenderem de olhos fechados a dimensão da baliza, a sua localização na hora do remate, a posição do corpo ao chutar, etc. - noções básicas e essenciais do jogo que qualquer profissional devia saber. A coisa mais banal de ver num jogo de futebol em Portugal é ser aceite com toda a normalidade (a começar pelos próprios jogadores) que 80 por cento dos remates à baliza não acertem no alvo - como se ele não tivesse 9,15 de comprimento por 2,30 de altura.

Também acho injusto crucificar Carlos Queiroz. Se os jogadores não acertam por sistema na baliza ou, quando acertam, é inofensivo, a culpa não é dele, pois o mal vem muito lá de trás e tem raízes e explicações mais complexas. E o resto é a falta de baraka que ele tem - sobretudo se pensarmos no seu antecessor, Scolari, que é o tipo com mais sorte ao jogo que eu alguma vez vi. Desta vez e quanto muito, podemos questionar porque razão o seleccionador, depois de ter jogado a cartada oportunista do Liedson, resolveu não o meter de início: eternamente ficaremos a pensar que com o Liedson no lugar do Simão, não teríamos desperdiçado aqueles dois golos fáceis que o Simão desperdiçou na primeira parte. Será que foi uma afirmação de autoridade cientifica, pelo facto de todos os jornalistas que acompanham a Selecção terem apostado que o Liedson jogava de início? Se foi, pagámos caro a vaidade. O António Oliveira tinha o hábito de fazer isso: mudava a linha de cada vez que a imprensa descobria os seus planos para o onze inicial. Foi assim que ele entrou para o Guinness, nunca repetindo o mesmo onze inicial do F.C.Porto em todas as quinze jornadas da primeira volta de um campeonato. Só que o Oliveira tinha um toque de génio que Queiroz não tem e que vi em raros treinadores: ele conseguia, de facto, transformar a equipa a partir do banco. E não esperava nem 70, nem 60, nem 45 minutos para o fazer: punha o onze errado de entrada só para não satisfazer os jornalistas, mas logo depois corrigia, assim que via que aquilo não estava a funcionar. «Quem sabe, faz a hora, não espera acontecer».

Enfim, venha a vitória em Budapeste e as que faltam, venha o encosto da Suécia em Copenhaga, venha o milagre de que precisamos. Se não é que este país cai mesmo na depressão!


2- O dr. Ricardo Costa, presidente do Conselho de Disciplina da Liga, escreveu dois extensos artigos no «Público» onde procurou demonstrar a lógica e a justiça da sua actuação e do órgão que dirige no chamado processo «Apito Dourado». Duas páginas inteiras de jornal é muito, é mais do que suficiente para, ou se demonstrar que se tem razão, ou para se fingir que tem. No primeiro caso, isso depende de se ter mesmo razão; no segundo, depende do talento literário. No caso do dr. Ricardo Costa, foi uma oportunidade perdida: porque não tem razão nem nunca teve e porque não tem talento literário algum.

O seu extensíssimo arrazoado, em estilo burocrático/narrativo, é um texto inextrincável para qualquer ser pensante, juristas incluídos. Duvido que alguém tenha conseguido lê-lo até ao fim e entender do que se tratava sem se perder algures. Eu esforcei-me e consegui ler até ao fim, mas já não consegui entender o que ele dizia, a páginas tantas.

Em substância, percebi que o dr. Ricardo Costa visava, obviamente, explicar o embaraço de ter condenado na justiça desportiva réus que a justiça comum declarou inocentes. E julga ultrapassar essa dificuldade explicando que ambas as jurisdições são independentes entre si. Sem dúvida que sim. Resta que ele - que confessa que todo o seu material de prova lhe foi fornecido pelo Ministério Público, em fase de averiguações - julgou e condenou, clubes e pessoas, com base em factos que os tribunais julgaram não provados. E com base num testemunho que o tribunal acusou de perjúrio. Bem pode até passar a assinar uma coluna semanal no «Público» que jamais ultrapassará isto: os factos em que ele se apoiou para condenar não existiram. O resto é conversa fiada.


3- O Jornal «I» perguntou a alguns ex-craques do futebol quem terá sido o melhor jogador de sempre: Pelé ou Maradona. As opiniões dividiram-se entre ambos, com excepção de Eusébio, que votou em Alfredo Di Stéfano. Entro na escolha para dar a minha opinião de «futebolista de bancada»: para mim, o melhor jogador que alguma vez vi jogar não foi nem Pelé, nem Maradona, nem Di Stéfano, nem o próprio Eusébio, que bem merece estar na short list. O melhor jogador que vi, o mais inteligente, o mais completo, o mais genial, foi um senhor chamado Johan Cruyff, que apareceu para o mundo numa célebre vitória do Ajax de Amesterdão no Estádio da Luz e que explodiu para a História no FC Barcelona.