1- O homem do jogo foi Vítor Pereira. Antes, durante e depois do jogo, ele esteve sempre por cima e fez com que o derby fosse disputado ao ritmo por si escolhido.
Antes do jogo, porque, não deixando de elogiar Jorge Jesus e o futebol jogado pelo Benfica (uma raridade nas relações entre ambos os clubes), respondeu à letra às provocãçõezinhas do treinador benfiquista («somos a única equipe que está em todas as competições»), lembrando que na Champions, que é a mais importante, já não estão. E podia ter acrescentado que é fácil continuar na Taça quando se joga em casa com equipas da terceira divisão, mas é bem mais difícil quando se joga a eliminatória, a uma só mão, no terreno do Nacional e do Braga, num jogo em que foi necessário fazer poupanças forçadas. Também lembrou que uma coisa é o favoritismo habitualmente atribuído ao Benfica nestes jogos, outra é o desfecho, habitualmente favorável ao FC Porto. E, sobretudo, em nenhum momento Vítor Pereira lamentou a ausência de um jogador fundamental como James Rodriguez, agravada ainda pelas ausências de Atsu e Iturbe — em contraste com Jorge Jesus, que, com aquele desvelo pela verdade desportiva que já o levara a elogiar o «jogo de igual para igual» com o Barcelona (como se fosse igual jogar contra o Barcelona A ou a reserva), tambem declarara catedraticamente que para o FC Porlo era exactamente o mesmo jogar com o James ou sem ele (como se viu na época passada...).
Durante o jogo, Vítor Pereira deu uma banhada táctica em Jorge Jesus. Susteve no meio-campo a cavalgada frenética do ataque benfiquista, mostrando que ali estava um adversário bem mais difícil do que o habitual. E, sem James nem Atsu para abrirem jogo para Jackson Martinez, com dois ocasionais extremos absolutamente inofensivos (Varela e Defour), apostou nas diagonais em aberturas rápidas pelo centro da defesa do Benfica — que só não produziram resultados mortais porque houve um juiz-de-linha que se encarregou do papel de quinto defesa benfiquista. Eu, que me gabo de perceber logo de entrada como vai correr um jogo ao FC Porto, a partir da atitude dos jogadores logo de início, aos 5 minutos já tinha concluído que, em condições normais, aquele jogo não ia ser perdido e, muito provavelmente, iria ser ganho. De facto, só aos 76 minutos, quando uma distracção na defesa em linha permitiu a Cardozo isolar-se perante Helton, é que o Benfica esteve perto de po- der ganhar o jogo. De resto, apenas reagiu bem a uma entrada de dragão, que rapidamente espalhou o temor e a ansiedade pelas bancadas da Luz. Colocando-se na frente por duas vezes e, logo no início do jogo, o FC Porto mostrou ao que vinha e condicionou a confiança benfiquista até final. Seguríssimo atrás (com excepção da retribuição de Helton ao frango de Artur), com Alex Sandro e Mangala imperiais, muilo bem acompanhados por Danilo e Fernando, a defesa portista apenas se mostrou vulnerável nessa jogada de Cardozo e no extraordinário golo de Matic, que é daqueles que não dá para prever nem para evitar. De resto, e não obstante uma noite pouco inspirada de Moutinho e Lucho, o FC Porto ganhou sempre a batalha de meio-campo, apesar de fustigado com faltas inexistentes de cada vez que um benfiquista era desarmado, e a que Jorge Jesus preferiu chamar «faltas técnicas». Onde as coisas falharam, como era de prever, foi no ataque pelos flancos. E eu,de facto, só não dou à performance de Vítor Pereira a nota máxima, porque continuo a não entender a sua fixação em Varela. Com toda a franqueza, pergunto-me se ele não terá um vídeo em que reveja os jogos e em que se dê ao trabalho de ir notando as vezes, em cada jogo, em que Varela tem um bom passe a rasgar, um bom centro, uma finta bem sucedida, um remate perigoso, um sprint ganho a um defesa, uma ajuda decisiva atrás ou, vá lá, em que não perca de imediato a bola para um adversário. Anteontem na Luz, isso sucedeu zero vezes — o que está dentro da média. E, se Defour, visivelmente, não é extremo nem grande jogador, no banco estavam Kelvin e Sebá, que tem, pelo menos, a vantagem de serem jovens, com mais talento à vista e muito mais vontade de mostrar serviço. E pena esta obsessão de Vítor Pereira, porque muitas vezes, como anteontem, a equipe está, de facto, a jogar com dez. E assim é mais difícil.
E, depois de oito meses a ouvir falar até à náusea do golo de Maicon em off-side (esquecendo os erros que favoreceram o Benfica nesse jogo, como o livre inexistente que lhe deu o segundo golo), Vítor Pereira esteve muitíssimo bem, no final do derby de domingo, optando por não calar a sua revolta com o que todos viram. Porque isto de os benfiquistas declararem que a arbitragem foi boa e passa-se adiante, como se a opinião deles fizesse doutrina, é chão que já deu uvas. Houve quatro off-sides mal tirados ao ataque portista três dos quais, começando logo pelo primeiro minuto de jogo, evitaram situações de jogador isolado frente ao guarda-redes. Se isto são erros «sem influência no resultado», estamos conversados... Como disse o treinador portista, não vale a pena passar a semana a treinar jogadas de ruptura no ataque se depois um juiz-de-linha, provavelmente tolhido pelo medo e pela responsabilidade, opta sistematicamente pela opção mais fácil.
Mas foi sobretudo na análise ao trabalho disciplinar do árbitro que Vítor Pereira esteve à altura daquilo que se exige a um treinador do FC Porto. Em relação a Matic, toda a gente viu o mesmo que João Ferreira e toda gente que conhece as regras do futebol sabe que aquilo é amarelo, sem desculpa: se João Ferreira o não mostrou, seguido de vermelho, foi apenas porque não quis. Em relação a Maxi Pereira, a história foi a habitual: algumas faltas maldosas no primeiro tempo, uma entrada ao corpo de Defour quando este ia para a área em boa posição, aos 58 minutos (sem falta assinalada nem amarelo), seguida, dois minutos depois, por uma cotovelada em Mangala, junto à lateral, numa das suas entradas características (e de novo sem falta nem cartão). E, finalmente, aquela entrada de kick-boxing sobre João Moutinho que, em qualquer lugar do mundo onde o futebol é apreciado, terminava com a sua imediata expulsão para os balneários. Mas finalmente alguém disse alto e bom som aquilo que eu próprio já aqui havia escrito: a impunidade de que goza Maxi Pereira é um escândalo na liga portuguesa, onde não há nenhum jogador que se lhe compare na falta de respeito pelos adversários e pela sua integridade física, pelo jogo e pelos espectadores e pelos próprios árbitros, com quem goza de alto, seguro da sua impunidade. É inacreditável que, como disse Vítor Pereira, Maxi Pereira possa continuar a terminar todos os jogos em campo, como se nada de escandaloso se passasse com as suas actuações. Noutros tempos, as suas recorrentes cotoveladas na cara dos adversários e nas barbas dos juízes-de linha, seriam mais difíceis de escamotear. Mas isso era no tempo dos sumaríssimos, que passaram de moda assim que o seu único alvo o FC Porto deixou de ter jogadores cotoveleiros, genuínos ou inventados. Hoje, Maxi Pereira distribui cotoveladas à vontade, toma balanço no ar e desfere pontapés no peito dos adversários, nem sequer se preocupando em saber onde está a bola, para disfarçar, e passa os jogos todos a distribuir pancada para, como explicou Abel Xavier n'A BOLA TV, «ganhar espaço e respeito». Neste caso, a táctica é eficaz: não creio que tenha o respeito dos adversários e dos que gostam de futebol, mas tem o respeitinho dos árbitros portugueses. E o silêncio cúmplice da crítica. Até quando, é a pergunta que se começa a tornar impossível de não ser escutada.
Sem comentários:
Enviar um comentário