quinta-feira, junho 13, 2013

E HOJE, TAMBÉM NÃO É DECISIVO? (26 MARÇO 2013)

1- Quando teve os seus navios alinhados em coluna pronta a executar a sua célebre manobra de ataque em V, frente à Armada espanhola, no Cabo Trafalgar, Lord Nelson transmitiu a todos os navios a sua última ordem: «A Inglaterra espera de cada um que cumpra o seu dever». A bordo dos navios, Nelson tinha um equipagem de marinheiros e fuzileiros de assalto altamente treinados, mas que viviam em condições de uma dureza difícil de acreditar para os dias de hoje, mal alimentados, mal pagos (quando o eram), meses sem ir a casa (os que não morriam), e sofrendo horrores quando feridos e tratados a bordo, num tempo em que não havia anestesias nem antibíóticos e o tratamento mais comum para os ferimentos eram a amputação e as ligaduras. Mas todos sabiam que, se vencessem a Invencível Armada em Trafalgar, como venceram, as Ilhas Britânicas estariam mais uma vez a salvo de um inimigo vindo do mar.

Em, Telavive, frente a um adversário infinitamente mais fraco que a Selecção portuguesa, num jogo que era imperioso ganhar e com uma equipa composta por meninos de ouro, pagos milionariamente e com prémios de presença, de vitória e de qualificação à sua espera, viajando em classe executiva de voos fretados, dispensados de todas as demoras e diligências nos aeroportos e instalando-se em hotéis de luxo rodeados de mordomias, o que lhes disse o seleccionador Paulo Bento? Disse-lhes que o jogo não era decisivo e que estavam desde já dispensados de pensarem no primeiro lugar do grupo, que dá apuramento directo para o Brasil, pois isso causaria um desgaste desnecessário nos seus espíritos tão ocupados com coisas bem mais importantes como o sejam decidir o desenho da próxima tatuagem ou a escolha do último modelo de penteado inspirado no ca- tálogo de arbustos das florestas do Bornéu. Na opinião avisada do seleccionador, a 6º selecção do ranking da FIFA não tinha, de forma alguma, estrita obrigação de regressar com uma vitória frente à 74ª selecção do mesmo ranking. Dito e feito: recebida a mensagem e com um golo caído do céu aos 80 segundos, os meninos de ouro dedicaram-se a passear a sua classe em campo. Em breve estavam a perder por 3-1 e só um milagre imerecido lhes permitiu, no último sopro do jogo, escapar a uma derrota enxovalhante.

A Selecção Nacional de Paulo Bento está transformada na Decepção Nacional. Tal como escreveu o Rui Moreira, não joga nada e, pior ainda, não se percebe o que faz Paulo Bento em troca de beneficiar de um dos mais fantásticos lugares que o país tem para dar, na relação trabalho/remuneração, só talvez ultrapassado pelo lugar de Eduardo Catroga no Conselho de Supervisão da EDP. Não se percebe para que servem coisas como a excursão ao Gabão ou os particulares com Equador e quejandos, onde a Selecção desperdiça prestígio e aliena adeptos. Vai para mais de um ano que os jogos desta Selecção são penosos exercícios de diletantismo, falta de brio e falta de qualidade. Não é uma questão de atitude, mas sim de mentalidade, explica o seleccionador, numa extraordinária confissão do seu fracasso (pois a quem mais, que não ele, compete mudar as mentalidades, pelos vistos, instaladas na equipa?). Mas será lambem uma questão de mentalidade que não se veja no jogo desta equipa nada de treinado e ensaiado, nem sequer livres ou cantos? Que não haja um fio de jogo, nem uma organização defensiva aceitável, nem plano de ataque que vá para além de esperar que o génio de Ronaldo resolva tudo por si só? Será uma questão de mentalidade continuar a apostar em jogadores que já ultrapassaram o seu prazo de validade útil e estão na fase em que já não lhes resta outra montra que não a da Selecção? E que mentalidade se pretende alterar quando é o próprio Paulo Bento que aparece a justificar a vergonhosa exibicão de Telavive com o golo madrugador que «penalizou» a equipe e com a incapacidade de saber «gerir o resultado» (ou seja, a ganhar por l-0, o único objectivo deveria ter sido o de defender essa preciosa vantagem...). Entre tão complexas mentalidades e tão delicadas susceptibilidades, talvez se pudesse explicar à equipa que, se bem que a invasão da pátria não esteja em jogo, ninguém está pronto a compreender e desculpar que a 6ª Selecção da FIFA não esteja presente entre as 32 que vão estar no Brasil. Nem os brasileiros nos perdoarão a nossa ausência: para eles, se Portugal não se conseguir qualificar num grupo tão fácil, é porque não houve vontade de estar no Brasil.

Mas vá lá que houve uma excepção: ao decidir viajar até Baku, mesmo impedido de jogar, o capitão Cristiano Ronaldo mostrou a Paulo Bento como é que se mudam as mentalidades. E devo dizer até que as suas habituais fracas exibições na Selecção (que não foi o caso em Israel), me começam a parecer mais justificáveis, à luz do dilema que ele deve viver em campo: jogar sozinho ou jogar para uma equipa que ele sente que não sabe jogar?

2- Desejo ardentemente que a nova direcção do Sporting se aguente por muitos e bons anos. Porque assim estaremos livres de tão depressa voltar a viver o ridículo espectáculo mediático das eleições no Sporting, que a comunicação social tratou como se de eleições presidenciais se tratasse. Vi o debate entre os candidatos na SIC, que permitiu perceber que nenhum deles tinha qualquer acordo com os bancos ou qual quer investidor disponível para injectar dinheiro no Sporting (e não se percebe a troco de quê o fariam ou farão). Também deu para ver que entre a candidatura patética de Carlos Severino, um Bruno de Carvalho que, em várias coisas, faz de facto lembrar Vale e Azevedo, e a candidatura de José Couceiro, a deste último, sem trazer também qualquer solução, me pareceu a única capaz de, pelo menos, não piorar as coisas. Na hora da vitória, vi os sócios apoiantes de Bruno de Carvalho celebrarem como se a conquista do campeonato da Liga estivesse já ali, ao virar da esquina. Dá-me ideia que ainda não realizaram que o campeonato é outro e, nesse, a vitória é tudo menos certa. O grande projecto de que falavam todos os candidatos sem o ousarem dizer, resume-se a uma única palavra: sobreviver.

3- Ao ver Higuaín e Messi (Real Madrid e Barcelona) abraçados em três ocasiões do Argentina-Venezuela - no golo de Messi e nos dois de Higuaín, assistido por ele - ao ver os jogadores do Real e do Barça irmanados no apoio e respeito a Del Bosque, percebe-se como Mourinho andou mal ao acusar de batota a eleição que consagrou Del Bosque como o melhor treinador do ano para a FIFA. Em primeiro lugar, porque não se fazem acusações dessas refugiado em fontes que preferem manter o sigilo - e a única que não o fez, Pandev, foi desmascarado como aldrabão. Em segundo lugar, porque não se entende como é que Mourinho pode justificar a sua ausência na cerimónia com o facto de ter sabido que tinha havido votações adulteradas, quando as votações, de quem em quem, só são divulgadas após a cerimónia. Em terceiro lugar, porque, mesmo que tal tivesse acontecido, teriam sido necessários 40 votos adulterados para lhe roubar a vitória, e não «dois ou três», como ele disse. Em quarto lugar, porque sendo a escolha do melhor treinador do ano necessariamente subjectiva, sempre há alguns critérios objectivos que, neste caso, abonavam a favor de Del Bosque: Mourinho foi campeão de Espanha com o Real (coisa que Del Bosque já tinha sido várias vezes), e este foi campeão da Europa com a Espanha, depois de ter sido campeão do mundo: não é comparável. E, em quinto lugar e finalmente, porque sendo Mourinho indiscutivelmente um dos melhores ou, se quiserem, o melhor treinador do mundo, só lhe ficava bem saber ganhar e saber perder e saber respeitar os adversários e os concorrentes com maior naturalidade e fair play. Como é que um homem tão inteligente e tão talentoso naquilo que faz, se desperdiça assim em guerras inúteis que só o desprestigiam e causam mal estar à sua roda?

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