segunda-feira, julho 04, 2011

A FALTA QUE BRUNO E BAÍA FAZEM (03 AGOSTO 2010)

1- Finalmente, tive um primeiro relance sobre o FC Porto 2010/11, de André Villas Boas: vi a última hora do jogo com o Bordéus, em Paris. E o que vi deixou-me naturalmente preocupado: este FC Porto, que acumulou duas derrotas nos dois jogos do Torneio de Paris, ao contrário do que diz o seu treinador, não está minimamente preparado para enfrentar o Benfica, daqui a cinco dias. E muito me espantaria que em cinco dias conseguisse recuperar o atraso para a equipa de Jorge Jesus, que arrancou esta pré-época com a mesma pedalada da anterior e com a vantagem de apenas ter perdido dois elementos: o intermitente Di Maria e o incansável Dr. Ricardo Costa, da Comissão Disciplinar da Liga. Diferentemente da equipa de Jorge Jesus, o FC Porto volta a arrancar com a necessidade de começar muita coisa de novo — agora e sobretudo, a necessidade de se habituar a novo treinador. Como aqui escrevi no final da época passada, era de prever que Pinto da Costa desse ao novo, jovem e iniciado treinador melhores e mais armas do que as que concedeu a Jesualdo Ferreira no ano passado. Porque, sendo a escolha de Villas Boas uma aposta pessoalíssima do presidente portista, o falhanço dele seria visto sobretudo como o falhanço de Pinto da Costa. E, pelo que vi do jogo com o Bordéus, isso parece ter acontecido para já. A equipa está ainda completamente perra, desarticulada e sem ideias assumidas (e não me parece que a aposta na rotação permanente de todos os jogadores ao fim de meia dúzia de jogos de preparação — ao contrário do que Jesus tem feito no Benfica — seja o caminho mais rápido para dar à equipa um fio de jogo). Mas, apesar de não funcionar para já, enquanto conjunto, há ali elementos novos que revelam valor para poderem vir a ser úteis: do pouco que vi, foi o caso de Souza, uma excelente alternativa a um Fernando que passou a época anterior descansado e sonolento, o caso de Castro também, e de Ukra e James Rodriguéz. Não há dúvida de que Villas Boas tem ali mais e melhor matéria prima para fazer melhor do que Jesualdo na época passada (em que ainda teve de enfrentar as lesões prolongadas de Rodriguéz, Varela e Ruben Micael e o castigo de prisão quase perpétua cozinhado para Hulk).

Mas há um problema grave chamado Bruno Alves e que salta à vista de qualquer um. Como se sabe e aqui escrevi a semana passada, a direcção da SAD está desesperada para vender Bruno Alves e também Raul Meireles, talvez igualmente Fucile. Por razões que me escapam, apenas apareceu para Bruno uma proposta do Zenit e ele estará receptivo a aceitá-la: será mais um português a deixar-se iludir pelos dólares russos, sem perceber que vai para um país inóspito, longe de tudo a que está habituado, a fazer deslocações de avião permanentes (só para ir jogar a Vladivostock, no Pacífico, são doze horas de avião!), e que daqui a um ano, fatalmente, estará a suspirar para que alguém o resgate ao campeonato russo. Logicamente que André Villas Boas, confrontado com as notícias diárias que dão conta da iminente venda de Bruno Alves e Raul Meireles, optou por deixar ambos de fora dos jogos de preparação, pois que não faria sentido estar a preparar uma nova equipa para começar a época com jogadores que amanhã podem já não estar ali. E o que tem sido visto e abundantemente comentado deste FC Porto sem Bruno Alves é que toda aquela defesa estremece ao menor sopro. Maicon e Sereno, com muito trabalho, talvez possam vir a ser razoáveis suplentes, mas daí não passarão; e Rolando, que vem de uma época em que regrediu, em lugar de progredir, com várias falhas decisivas, vale metade do habitual sem Bruno Alves ao lado. Ora, vendendo o seu capitão e referência, não apenas defensiva, o FC Porto não irá, por certo, encontrar substituto à altura — a menos que quisesse gastar o mesmo dinheiro que vai ganhar com a venda, o que seria absurdo. E um grande central para futuro precisará de dois, três anos para se afirmar — como sucedeu com o próprio Bruno Alves. Isto quer dizer que, pela primeira vez desde há muitos anos, o FC Porto prepara-se para enfrentar uma época sem nenhum grande central. Foram anos e anos em que esse era um sector sempre bem preenchido entre os azuis e brancos, fosse com dois ou, ao menos, com um grande jogador: Geraldão, Demol, Aloísio, Jorge Andrade, Ricardo Carvalho, Jorge Costa, Pepe, Bruno Alves, enfim, toda uma sequência de grandes centrais que contribuíram decisivamente para duas décadas de domínio inquestionável no futebol português.

Villas Boas poderá, assim, vir a ter mais e melhores soluções que Jesualdo Ferreira, mas com essa imensa e irresolúvel diferença negativa que é não ter um central à altura das aspirações da equipa. E seria milagre que isso não começasse já a pagar um preço no jogo com o Benfica para a Supertaça.

2- Acho que nunca ou quase nunca um tão grande jogador deu tanto a um clube e saiu tão mal tratado dele como Vítor Baía. O acto final do afastamento progressivo de Baía — primeiro, da baliza; depois, do balneário e, finalmente, do clube — viveu-se esta semana, a sós entre ele e Pinto da Costa. Poucos elementos, dos que lá passaram nos últimos vinte anos, foram tão fiéis ao presidente, como o Vítor Baía foi. Não sei, pois, o que terá passado pela cabeça (e pela memória e pela gratidão) de Pinto da Costa, para sacrificar Baía às guerras internas de poder dentro do clube e a personagens incomparavelmente menores — em termos de antiguidade, de lealdade, de dignidade e, sobretudo, de serviço prestado ao clube. Nem sequer é este o padrão de conduta habitual naquela casa: pelo contrário, o reconhecimento do valor dos serviços prestados ao clube foi sempre uma das imagens de marca da gestão de Pinto da Costa. O poder solitário é um mau conselheiro; o poder solitário envelhecido é um péssimo conselheiro.

Acredito, como escreveu Rui Moreira, que um dia Vítor Baía há-de voltar ao clube que é seu e onde foi e é estimado como raríssimos outros. Mas, na hora desta sua saída, que se espera e deseja provisória, só tenho duas palavras para ele: «Obrigado, Vítor!».

3- Já disse que Carlos Queiroz não teria sido a minha escolha para seleccionador. Já disse que achei o seu desempenho na África do Sul medroso e medíocre. Já disse que acho escandaloso, quer o prémio pela prestação, quer a indemnização devida em caso de despedimento. Mas o incidente disciplinar agora suscitado contra ele tem todo o ar de ser um pretexto, coxo e preparado, para se verem livres do homem que escolheram livremente, sem ter de lhe pagar, pelo menos, a totalidade do que contrataram com ele. E sem a coragem de lho dizer na cara.

Sem comentários: