1- Há já uns anitos, escrevi aqui um texto intitulado De pequenino se torce o destino, e em que reclamava uma punição exemplar, podendo ir mesmo até à irradiação, para um jogador do Benfica que tinha visto actuar pela Selecção Nacional de juniores e que cometera um acto de brutalidade como nunca antes nem depois voltei a ver no futebol: com um adversário caído no chão e o jogo a decorrer, ele passara pelo adversário e, sem os árbitros estarem a ver, pisou-o, deliberadamente e com violência, na cabeça. Os árbitros não viram, mas a televisão viu e, por isso mesmo, eu escrevi que aquele jovem, em princípio de carreira profissional, devia ser imediatamente ensinado de que o futebol não era aquilo. Mas não aconteceu nada e esse jovem, chamado Amoreirinha, seguiu a sua carreira, primeiro no Benfica, depois noutros clubes que aceitaram o seu tipo de serviços - porque ele não mudou, nem de estilo, nem de natureza.
Anteontem, revi o dito Amoreirinha e constatei que continua igual a si mesmo. Aos 8 minutos de jogo, qual filho pródigo em dívida, ofereceu o jogo de Setúbal ao seu antigo clube, fazendo-se expulsar graças a uma entrada de uma selvajaria absoluta. Nada a dizer sobre a decisão do árbitro: ele está lá para proteger o futebol e os jogadores de futebol, não os caceteiros e o antijogo. Mas espero, obviamente, que a decisão de Jorge de Sousa faça escola em todos os jogos e para todos os árbitros e, nomeadamente, quanto ao tempo de amostragem dos cartões, acabando-se com o absurdo critério de que os cartões não devem ser usados antes de decorrido um período de graça, que funciona como uma espécie de salvo conduto para os profissionais da cacetada e da intimidação.
Em sete minutos apenas, o Benfica resolveu o jogo de Setúbal, tirando partido de trés erros alheios consecutivos: aos 8, Amoreirinha fez-se expulsar; aos 15, aproveitando a demora do banco do Setúbal em pro- ceder à substituição que se impunha e recompor a sua defesa, Melgarejo percorreu todo um flanco aberto como uma avenida e cruzou para o golo inaugural, beneficiando ainda de o fiscal-de-linha não ter visto o offside tangencial de Melgarejo e, na dúvida, ter deixado seguir. Mais uma vez digo que aceito o critério do árbitro e só espero que faça doutrina para outros jogos (ao contrário do que se viu, por exemplo, em offsides caramente inexistentes assinalados ao ataque do Porto no jogo da véspera contra o Guimarães).
Não saberemos nunca se, sem a colaboração de Amoreirinha, o Benfica não conseguiria repetir o seu tradicional passeio em Setúbal, que já acontece há uma dúzia de anos. Que ele foi determinante para a arrancada, foi (e sabe-se como a arrancada é o mais importante e difícil nestes jogos), mas não é licito estabelecer uma relação de causa a efeito.
2- Contra o Vitória de Guimarães, e apesar de também ter marcado cedo, o FC Porto viveu 66 minutos de incerteza, ao abrigo de um contragolpe de sorte de um adversário, mais do que inofensivo, inexistente. E foi preciso mais um daqueles golos de Hulk, rematando cruzado e rasteiro do lado direito da área para o lado oposto, para enfim resolver o jogo, acordar o público da imensa chatice que estava a ver e trepar no resultado. Não sei se terá sido a última contribuição de Hulk para o alívio geral da equipa e, particularmente, do seu treinador. Sei que, se o tiver sido, vamos sentir desesperadamente a falta da simplicidade genial destas jogadas do brasileiro, que até fazem parecer fácil o que para outros é tão difícil. Raramente todos deveram tanto a um só.
A avaliar pelas informações de A BOLA, esta será a última semana de Hulk no FC Porto. Pode ser até que tudo se tenha já consumado quando este texto vir a luz da manhã desta terça-feira. Sem grande esperança (pois sei quanto a SAD desespera para o vender), quero ainda acreditar que os golos, as arrancadas e as jogadas de génio de seu Givanildo não passarão a ser, desde já, apenas uma recordação dolorosa nos corações portistas... e um motivo de imenso júbilo e alivio nas almas benfiquistas. E espero que, dos candidatos que A BOLA elenca para o seu lugar, a opção não recaia em Lima: é razoavelmente bom jogador, mas não tem sequer lugar no onze titular do FC Porto. E, por mais amigos que sejam os dois clubes e as duas direções, negócios entre ambos em que o FC Porto sai sempre a perder e o Braga a ganhar já tivemos quanto baste. E exactamente por passarmos a vida a oferecer e emprestar de borla aos outros clubes um exército de jogadores que pagámos, que os Hulk, os Falcão, os Quaresma, os Anderson, são vendidos todos os anos.
3- A saída de Hulk só terá uma vantagem operacional: é menos um jogador que o FC Porto e o seu treinador têm de gerir a meias com o Brasil e Mano Menezes. De facto, a notícia de que, depois dos Jogos Olímpicos, depois do particular com a Suécia, Mano Menezes voltou já a convocar Hulk e Danilo (Alex Sandro ficou de fora, desta vez) para dois novos jogos particulares no Brasil, é um abuso sem limites. É preciso pensar se valerá a pena voltar a comprar jogadores brasileiros que tenham potencial para chegar à selecção do seu país, sabendo-se que a CBF não tem qualquer pudor em chamá-los, não apenas para os jogos que a FIFA impõe, o que é lógico, mas para todos os outros jogos particulares em que os jogadores são exibidos mundialmente como se fizessem parte de um circo, enquanto os clubes que lhes pagam o ordenado ficam à espera das sobras, vendo a CBF cobrar fortunas à sua custa (e que muitas vezes, como se viu já, vão parar ao bolso dos seus dirigentes). Até porque a moda está a pegar noutras paragens e ainda recentemente o FC Porto viu Christian Atsu ter de viajar até à China para disputar um jogo particular pelo Gana. Imagine-se a importância do jogo...
4- Dois pormenores a propósito do FC Porto-Guimarães, que, para mim todavia, são importantes. Primeiro, a confirmação de que esta versão do equipamento principal do Porto é a coisa mais feia que se poderia imaginar. Para mim, que lá atrás, na infância, me tornei portista fascinado pelo seu equipamento, mais do que pelo meu lugar de nascimento, isto é quase um crime contra a própria identidade portista. Eu não quero saber de merchandising, aliás indigente: não percebo e não aceito que alguém pegue num equipamento tão bonito e tão feliz, que o mundo inteiro já conhece de cor, e o transforme numa imitação de um mau gosto total, descaracterizado, irreconhecível, que me custa a crer que alguém queira comprar. Com cores tão apelativas como o azul e o branco, qualquer designer competente e qualquer comercial inteligente pouparia o equipamento principal e inovaria sim no alternativo e na criação de toda uma linha de roupa desportiva e casual que os portistas se orgulhariam de usar. Agora, desvirtuar as cores e o desenho fundadores da imagem do clube, apenas para obedecer à imbecil regra de que é preciso mudar todos os anos, nada mais sendo preciso fazer, é de uma incompetência assustadora. Aqui fica o meu repúdio, o meu grito de revolta contra os autores deste atentado à alma portista.
O segundo detalhe é apenas for the record e só porque li um comentário de um benfiquista que teve o supremo desplante de afirmar que o único clube prejudicado na primeira jornada foi o Benfica, porque o árbitro lhes anulou um golo em que o Cardozo elevou o pé à altura da cara do guarda-redes do Braga numa disputa de bola, sem que se saiba se lhe tocou ou não - e, para ele, só haveria jogo perigoso confirmando-se um pontapé do Cardozo na cara do Beto. Pois o pormenor que quero registar é este: vão disputados dois jogos do campeonato e, segundo todas as opiniões, excepto as de benfiquistas, já vão também três penalties favoráveis ao FC Porto que não foram assinalados e dois deles teriam evitado a perda de dois pontos em Barcelos. O último, contra o Guimarães, foi de anedota: um defesa atira-se em voo, com os dois braços estendidos e corta assim um remate do Hulk na direcção da baliza, e o árbitro, ali ao lado, julgou que foi apenas um acidente de percurso...da bola. Anotem.
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