terça-feira, dezembro 09, 2003

Perguntas e respostas ( 21-10-2003)

Perguntas e respostas ( 21-10-2003)


1- Longe de mim querer de alguma maneira imiscuir-me na disputa
eleitoral do Benfica. Aliás, parece-me óbvio que o vencedor está
encontrado de antemão, assim comomeparece óbvio que os benfiquistas
desta vez não se deixarão arrastar por uma candidatura do tipo
aventureiropolicial, que tantos danos causou ao clubenumpassado ainda
próximo. O que me interessava era compreender melhor, em relação ao
Benfica como aos outros, o mistério das contas das SAD dos clubes. O F.
C. Porto acaba de anunciar mais um prejuízo de exercício, de cerca de
1,8 milhões de contos, apenas para o 1.º semestre do ano corrente -
umsemestre emque o estádio nunca teve assistências abaixo das 25 mil
pessoas, o clube nunca teve menos de 70 mil sócios e a equipa
teveumacarreira europeia prolongada e brilhante.Ouseja,umperíodo para
lucros e não para prejuízos.O Sporting presumo que apresentará contas
não muito distantes destas ou piores ainda. Quanto ao Benfica, omistério
é ainda maior. Confessando o que se sabia - que o clube também vive no
vermelho quanto aos resultados da exploração corrente-Luís Filipe Vieira
louva-se, contudo, de, neste mandato que agora termina, a direcção do
clube ter «saldado 26 milhões de contos de dívidas», ao mesmotempo que
construíaumestádio cujo custo deve andar próximo dos 30 milhões, e ao
mesmo tempo que se louva também de não vender jogadores já há dois anos.
Compreendo que benfiquistas como Jaime Antunes ou Manuel Alegre se
interroguem de onde veio o dinheiro, como aconteceu omilagre. A esta
pergunta, que deveria interessar todos os sócios votantes na próxima
eleição, Luís Filipe Vieira responde apenas que «o segredo está no
aproveitamento da própria marca». Acredito que a marca Benfica valha
muito; mas valerá 30-35 milhões de contosemtrês anos? Diz o presidente
da SAD que «as contas são auditadas» mas não é por serem auditadas que
omistério se esclarece, que as contas se tornam públicas e que tudo se
torna, como ele diz, «transparente».


2- Luís Filipe Vieira é, entretanto, o responsável pela SAD do futebol -
precisamente a área em que esta direcção cessante tem piores resultados
para apresentar. Repete ele que a sua grande obra de gestão foi evitar a
venda de jogadores, assim começando a construirumaequipa que, já este
ano, poderá disputar o título. Mas, vendo jogar a equipa, vendo os
últimos jogos contra oLa Louvière e o Gil Vicente (onde só um offsidemal
assinalado ao ataque do Gil,mesmoao cair do pano, terá evitado danos
maiores...), perguntamo- nos como será possível a este Benfica ser
levado a sério comocandidato ao título. E, ao analisar a equipa, jogador
por jogador, perguntamo- nosquemé que estaria interessado emir às
compras à Luz. É que, tirando Simão Sabrosa e o jovem guarda-redes
Moreira, não vejo ali ninguém que se destaque de uma confrangedora
mediania, quando não mesmo assumida mediocridade. Esta é a pior equipa
que alguma vez me lembro de ter visto defender as cores do Benfica.Vale
a LFV ter falhado o negócio com o Ricardo, já que o Moreira é muito
melhor jogador do que o protegido de Scolari.


3- Uma resposta a Luís Nazaré: Agradeço-lhe a sua carta aberta, aqui
publicada sexta- feira passada. Agradeço-lhe o tom civilizado, calmo e
lúcido, hoje em dia tão raro, quando se discute futebol. Acredito que
também possa não ser fácil ser benfiquista no Porto mas, apesar de tudo,
o facto é que os há bem mais que portistasemLisboa e, pelo menos no seu
caso, tem a sorte de, embora portuense, habitar na cidade do seu clube,
enquanto eu só episodicamente habito no Porto, o que significa que, para
ver futebol ao vivo, tenho de me deslocar 600 quilómetros. Nãopretendo
de forma alguma passar- me por vítima e sei demasiadamente bem que o
hooliganismo, o facciosismo sem limites e a cobardia das multidões são
iguaisem toda a parte e em todos os clubes: não há adepto sério que não
tenha por vezes vergonha dos seus. Mas a verdade é que, tirando as
Antas, tudo o resto me está vedado: jáme tentaram agredir na Luz, em
Alvalade, noRestelo, emSetúbal e até no Estádio Nacional,numafinal da
Taça entre F. C. Porto e V. Guimarães. Acredito que, se fosse
benfiquista e igualmente conhecido em termos públicos, também não me
seria aconselhável frequentar oEstádio das Antas. As coisas são como são
e olhe que lamento sinceramente não poder já nem digo ver o meuclube
jogaremAlvalade ou na Luz, mas não poder conhecer, como tanto desejava,
os novos estádios do Sporting e, sobretudo, o do Benfica, que, pelas
fotografias e filmes, me parece deslumbrante. É óbvio que não duvido por
um momento(nemprecisava demedar a palavra dehonra) quando garante que
nunca põe a sua condição de benfiquista à frente da de português, quando
se trata de torcer pela vitória de equipas portuguesas contra
estrangeiras. E não me furto à sua pergunta: de que lado estava eu no La
Louvière-Benfica? Acredite que a resposta é fácil e por várias razões:
estava do lado do Benfica, claro. Primeiro, por uma razão familiar: só
consegui que o meu filho mais novo saísse portista, embora lisboeta (é a
nova geração, para quem o Porto exerce um efeito de atracção semelhante
ao do Benfica dos anos 60). Já quanto ao mais velho, infelizmente, saiu
benfiquista e doentio. Acontece: já o meu pai, que era sportinguista, a
primeira vez que me levou ao futebol foi a Alvalade, para ver oPorto ser
esmagado pelo Sporting.Eeu, que nem sequer sabia ou ligava ao facto de
ter nascido no Porto e lá ter metade das minhas raízes familiares, dei
comigo, enquanto o Sporting marcava golos sem parar (foram seis!), a
sentir-me irresistivelmente atraído pelas cores das camisolas azuis e
brancas e pela tristeza daqueles rapazes, esmagados e humilhados. E saí
de lá para 18 anos de jejum e sofrimento,emque omeuportismo nunca
enfraqueceu. Essa, pois, é a primeira razão: quando não envolve disputa
com o Porto torço sempre pelo Benfica, porque o amor de pai é mais
forte, assim como é forte a amizade que meliga amuitos dos meus maiores
amigos que, na sua grande maioria, são também benfiquistas. Depois,
gosto por princípio que os clubes portugueses ganhem contra os
estrangeiros, a menos que de todonão o justifiquem.Também, comoqualquer pessoa inteligente, prefiro que ganhem porque hoje isso significa ganhar
pontos UEFA, que a todos beneficiam. E, finalmente, acho que para haver
igualdade competitiva no campeonato é preciso que todos os grandes ou
nenhum deles estejam simultaneamente envolvidos nas competições
europeias. De outromodo, como tem acontecido nos últimos anos, enquanto
o Porto e o Boavista, nos períodos mais críticos do campeonato, disputam
dois jogos por semana, envolvendo deslocações, mais stress emais lesões,
o Benfica e o Sporting descansam na pasmaceira de umjogo semanal
intramuros. Aceite asminhas saudações portuenses.



4- Umrecado para oDaniel Reis. Caro Daniel: os teus especialistas, as
tuas gravações vídeo e os teus arquivos selectivos nãomeinteressam
rigorosamente nada. A única coisa que interessava era que respondesses à
pergunta incómoda que te fiz, em lugar de fingir que não a percebeste:
como pode alguém que numa coluna de opinião se identifica como
sportinguista assumido ter depois a isenção e a distância para, agora já
como jornalista, escrever sobre o Sporting ou os seus rivais directos?
Pode alguém que seja militante partidário assumido e colunista
partidário assumido ser simultaneamente jornalista político, acreditado
como isento e independente? E, se não, porque não é exigível para o
jornalismo desportivo o que é exigível para o jornalismo político? Será
o jornalismo desportivoumgénero menor do jornalismo, com um código de
conduta particular e regras deontológicas de excepção? Se é para
desconversar outra vez não vale a pena responderes. Já basta o outro.

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