segunda-feira, junho 04, 2012

NÃO HAVIA NECESSIDADE (10 MAIO 2011)

1- Foi uma semana estranha, pois que aqui estou a escrever sobre dois desaires do FC Porto: a derrota em Villarreal e o empate/derrota caseiro com o Paços de Ferreira. Foram dois desaires que nada comprometeram, nem a passagem à final da Liga Europa, nem a possibilidade de terminar invicto o campeonato. Mas estragaram algumas estatísticas: a de chegar ao fim da Liga Europa com nove jogos disputados fora e nove vitórias; a de terminar o campeonato só com vitórias no Dragão; e a de igualar o melhor campeonato de sempre, do Benfica de Jimmy Hagan. Isso doeu um pouco e, sobretudo, pela sensação que ficou de que não havia necessidade: quer em Villarreal, quer no Dragão, o FC Porto desperdiçou duas vitórias completamente adquiridas.

Villas Boas e a equipa foram muito elogiados por terem sobrevivido à fase massacrante de seis jogos terríveis em dezoito dias, sem fazer poupanças e ganhando sempre — enquanto que Jorge Jesus, por exemplo, adoptou estratégia diferente e com resultados péssimos. E, subitamente, Villas Boas mudou de filosofia: correu bem em Setúbal, correu mal a seguir. Mas eu não sou contra as poupanças, quando se está em final de época, os jogadores principais já levam 50 jogos em cima e a equipa ainda luta por títulos em várias frentes. Mas acho que as poupanças devem ser feitas rotativamente, dois ou três jogadores de cada vez e não meia equipa de uma só vez ou todo um sector ao mesmo tempo. Em minha opinião, foi isso que aconteceu em Villarreal e no Dragão e o resultado foi vermos fugir-nos vitórias que já pareciam garantidas. Ambos os jogos deram para confirmar os pontos vulneráveis desta magnífica equipa (que também os tem): Rolando continua a sua mais fraca época desde que chegou ao Dragão, falhando demais em lances decisivos e mostrando como era fácil jogar bem ao lado de Bruno Alves. João Moutinho regressou, em ambas as ocasiões, ao tipo de exibição que eu critiquei — foi absolutamente inexistente e inócuo, quer num, quer noutro jogo. Ruben Micael confirmou que não tem andamento para titular: pensa e executa devagar, falha quatro passes em cada cinco. Com ele e Moutinho no meio-campo, como contra o Paços, o jogo tem de ser directo da defesa para o ataque, porque o meio-campo só joga para trás e para os lados, e isso tornou-se cristalino quando entrou o Belluschi, o melhor médio da equipa, e se começou a ver passos de rasgo, a abrir caminhos na frente. O Fernando (bem, eu sou dos que não se rendem aos talentos dele) foi simplesmente um desastre em Villarreal. Ocupa uma posição de luxo no xadrez da equipa e ainda desfruta de um estatuto de luxo: está dispensado de construir jogo, só se lhe pede que o destrua. E ele fá-lo da forma mais primária, corta de qualquer maneira e para onde está virado, rarissimamente conseguindo um corte que deixe a bola com a equipa. Mas em Villarreal foi pior ainda: não cortou um lance e ainda comprometeu em dois ou três daqueles cortes e passes cegos. Também vimos o Walter falhar um golo de criancinha, no último minuto do jogo do Dragão, e continuamos à espera que ele emagreça para ficar um novo Falcão, porque, por enquanto, é apenas igual... a um Walter. E, depois, enfim, tivemos ainda o caso humano do Mariano Gonzalez, que Villas Boas fez entrar em jogo no Dragão, antes de ter a vitória confirmada e não podendo ignorar que, quando ele entra, passamos a jogar com um a menos, de tal maneira é impressionante o dom que tem para estragar toda e qualquer jogada que lhe passe ao alcance. É um excelente rapaz e um bom profissional, mas espero bem que esta tenha sido a última vez que tivemos de pagar a factura de lhe dar minutos de jogo.

Em contrapartida, confirmou-se que Helton está a fazer uma época notável e, para muitos, inimaginável. Que Otamendi é um central a sério. Que o trio-maravilha Álvaro Pereira-Falcao-Hulk são a alma desta equipa e res ponsáveis por 80% do seu êxito: a saída de qualquer um deles será paga duramente. Confirmou-se ainda que James é já um talento confirmado e deveria ser titular do flanco esquerdo do ataque, por direito próprio, e que Guarín é a maior descoberta desta época e um elemento hoje indispensável no miolo. E, já agora, Souza é muito melhor e mais sólido que Fernando; Fucile ou Sapunaru dão ambos garantias no lado direito da defesa, mesmo Sereno só lhe falta aprender a cruzar melhor para ser também uma revelação a lateral, e Beto pode ocupar a baliza à vontade, que fica bem entregue.

2- Mantenho-me fiel à minha tese; quando uma equipa, prejudicada por um ou dois erros de arbitragem, não mostrou, todavia, futebol para merecer ganhar, desculpar-se com o árbitro é o caminho fácil para esconder responsabilidades próprias. Mas, quando uma equipa jogou o suficiente para merecer ganhar e foi prejudicada decisivamente pela arbitragem, tem razão para se queixar. Dois erros de arbitragem evidentes, por todos reconhecidos e decisivos para o resultado final, foram determinantes para evitar que o FC Porto prosseguisse a sua busca de vários recordes neste campeonato. O problema é que isto tem sido sistemático, nestes últimos jogos: foi assim em Setúbal, foi assim nos dois jogos do Estádio da Luz. Mas como se trata do FC Porto e, mesmo assim, seguimos em trente, tudo está bem, quanto à verdade desportiva. Fosse, porém, com o Benfica ou o Sporting, e eu queria ver o banzé que por aí iria!

3- A triste equipa de arbitragem chefiada por Cosme Machado conseguiu estragar em parte uma festa muito merecida. O título de andebol (tri-campeões) e o de futebol júnior — para não variar, conquistado no terreno do Benfica - acrescentam-se a uma época de esplendor. E ainda lutamos, na ponta final, pelos títulos no basquetebol e no hóquei. Uma época de campeões, um clube de campeões!

4- Leonor Pinhão acertou no diagnóstico: Porto e Braga são os finalistas da Liga Europa. E com todo o mérito, após duas brilhantes campanhas europeias e após terem passado nove meses a mostrar que são as duas melhores equipas portuguesas da actualidade, cada uma no seu estilo. Na véspera do jogo da segunda mão, o Benfica ainda tentou duas manobras desesperadas, em abono da verdade desportiva: a invenção, soprada à Marca, do suposto jantar de Pinto da Costa com os árbitros do jogo com o Villarreal da primeira mão, e o estranho caso da fotografia introduzida ao intervalo na cabina do árbitro do Braga-Leiria. Queriam desestabilizar os adversários, mas só conseguiram cobrir-se de ridículo, de tal maneira ficou à vista a mão escondida que atirou as pedras.

No caso da fotografia de Braga, o que mais me chocou foi que se tenha conseguido passar para segundo plano um facto escandaloso: uma agressão de káraté, inacreditável de violência, sobre o Hélder Barbosa, aos 3 minutos, que foi perdoada por esse absoluto incompetente que é Bruno Paixão, que só se mantém no futebol por ser anti-portista e alinhar por cores mais influentes nos meios que decidem. De repente, a agressão deixou de importar e o que passou a importar foi a introdução da fotografia da agressão na cabina do árbitro. A coisa foi vista como uma forma de «pressão» tão grave, que até em Coimbra ressuscitou esse inesquecível Ricardo Costa, a quem a verdade desportiva tanto deve, com mais uma das suas luminosas teses jurídicas - no caso, defendendo nada menos do que a despromoção do SC Braga! Mas esta gente não se enxerga mesmo? Julgarão que somos todos parvos? Julgarão que merece alguma credibilidade a quem quer que seja um Conselho de Disciplina que consegue dar trinta dias de suspensão a um agredido e onze ao agressor, como fizeram com Jorge Jesus, esperando o tempo necessário para lhe aplicar o castigo quando tal era indiferente e terminá-lo na véspera de já não o ser?

Enfim, vai à final quem o mereceu. E, vendo o comportamento dos adeptos do Benfica em Braga, a somar aos seus recentes desempenhos nas recepções ao FC Porto, na Luz, é caso para dizer que ainda bem que não vai haver um Porto-Benfica, em Dublin: seria uma vergonha para o País!

5- E, agora que as últimas ilusões benfiquistas morreram por razões à vista, não é altura de pisar em cima das vencidas, apenas varrer as suas calúnias e, sem embargo, reconhecer que o Benfica, pelo menos, se bateu por melhores resultados e que foi e é ainda o adversário directo do FC Porto em tudo: futebol, andebol, basquetebol, hóquei. É verdade que, no futebol, foi vencido e até humilhado em todas as frentes, mas também uma época como esta do FC Porto não é repetível.

Não me cabe analisar os erros próprios do Benfica, que conduziram a tantas desilusões, num só ano. Apenas constato que o excesso de soberba, a incapacidade de reconhecer méritos alheios e as incansáveis tentativas dos seus advogados e papagaios de tudo reduzirem à falta de verdade desportiva, tiveram o castigo que mereciam. Sinto-me vingado de tanta inveja, tanta calúnia e tanta falta de seriedade, ao imaginar o que irá agora na cabeça desses que vocês sabem quem são. E, por todos, dou-me por satisfeitíssimo ao ler esta frase do José Manuel Delgado, sobre o futebol do Benfica: «Finalmente ficou à vista de todos que o rei ia nu». Eu não diria melhor.


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