quinta-feira, junho 07, 2012

DE 7 DE AGOSTO DE 2010 A 22 DE MAIO DE 2011: 288 DIAS PARA A HISTÓRIA (31 MAIO 2011)

1- Tudo começou a 7 de Agosto do ano passado, na final da Supertaça. Recapitulemos o enredo: de um lado estava o Benfica, coroado (e justamente) campeão e já anunciado bicampeão pela imprensa; do outro, um FC Porto, derrotado no campo e no Conselho de Disciplinada Liga. De um lado, um Benfica que se renovava (saíam Quim, Di Maria e Rodriguez, entravam Roberto, Gaitan e Salvio), e do outro um FC Porto que perdia Bruno Alves e Raul Meireles e recebia Otamendi, João Moutinho e um desconhecido de 19 anos chamado James Rodriguez). De um lado, estava o mestre da táctica, Jorge Jesus, um treinador melhor do que Mourinho, segundo o APV;do outro, um miúdo, com cinco meses de experiência como treinador na Académica, por quem Mourinho, ele próprio, não dava um chavo e a quem Jesus vaticinava uma invencível tremedeira assim que começasse a pressão. As apostas eram de 9 para 1, a favor do Benfica. Mas ganhou o Porto - e ganhou sem espinhas, por 2-0 e depois de uma lição de táctica dada pelo miúdo ao mestre. E essa vitória do FC Porto against all odds foi decisiva, a vários níveis: credenciou Villas Boas e deu confiança a ele, aos jogadores e aos adeptos. Mais do que começar a época a ganhar, foi determinante começá-la mostrando que não se temia, antes se podia tranquilamente enfrentar e vencer o pré-anunciado bicampeão e candidato ao título de campeão europeu.

À 4ª jornada do campeonato, o FCP recebeu e venceu o Braga, o vice-campeão, num jogo empolgante em que precisou de virar duas vezes a desvantagem no marcador — coisa que nunca acontecera com Jesualdo Ferreira. Isso permitiu somar quatro vitórias nos quatro primeiras jogos do campeonato e abrir logo uma vantagem de 9 pontos para o Benfica. À 9ªJ jornada, dia 30 de Outubro, aconteceu o terrível jogo de Coimbra, disputado sobre um lençol de água, em lugar de um relvado, em circunstâncias que árbitro algum deveria ter consentido. Mas, depois de uma luta tremenda, que nada tinha a ver com futebol. Silvesrre Varela arrancou um fantástico pontapé de bicicleta que resolveu o jogo - e foi aí que eu percebi que o Porto ia ser campeão, porque ficou ali à vista toda a fibra, a vontade, a determinação de um campeão. E uma semana depois, aconteceu o 5-0 ao Benfica, no Dragão, que acabou com todas as dúvidas e mostrou, sem disfarce possível, quem era a melhor equipa do campeonato. Não foi uma simples vitória, foi um banho de bola, um jogo para história, uma humilhação que até conseguiu calar durante uns quinze dias o Sílvio Gervan e o Rui Gomes da Silva. Mesmo que nada de mais exaltante viesse a acontecer durante a época, isso já era vingança suficiente contra o túnel, o dr. Costa, a dr. Morgado, a escritora e todos os outros para quem a mediocridade desculpa a inveja.

O quinto momento decisivo da época aconteceu no Inverno de Viena, num tapete de neve, com um hat-trick de Falcão a derrotar o Rapid, destarte confirmando duas coisas: que o FC Porto de André Villas Boas podia ganhar em quaisquer condições e que, além do sucesso interno, era também candidato a sério ao triunfo na Europa. A seguir, houve a lesão de Falcão, que durou dois meses, e o período incaracterístico de Dezembro/Janeiro, onde se ultrapassaram adversários fáceis da Taça de Portugal e um frango de Kieseck afastou irremediavelmente o FC Porto da única competição que não viria a vencer: a Taça da Liga. Mas em cinco dias determinantes, entre 13 e 17 de Fevereiro do novo ano, o FC Porto foi a Braga vencer por 2-0 e a Sevilha vencer por 2-1 - e, com isso, deu um passo decisivo no campeonato e ganhou lugar nos oitavos-de-final da Liga Europa, O sonho incrível de ganhar nas duas frentes começava a germinar...

Em 10 de Março, em Moscovo, foi o oitavo momento decisivo da época, quando o FC Porto conseguiu manter em branco o temível ataque do CSKA e vencer por 1-0, abrindo caminho para quartos- finais da LE - que, nova vitória por 2-1 no Dragão confirmaria. Novo mês - Abril - mais dois momentos empolgantes: o histórico triunfo na Luz, por 2-1, depois de mais um banho de bola ao principal rival, antecedendo o banho de água e a súbita escuridão no estádio, destinados a tentar ofuscar a celebração de um título alcançado em pleno palco do adversário, e, três dias decorridos, mais um festival de futebol no triunfo por 5-1 contra o Spartak de Moscovo, logo aí reservando lugar nas meias-finais da Liga Europa. E, numa tremenda sequencia de jogos a cada três dias, com viagens pelo meio,seguiram-se, quase sem tempo para respirar, mais quatro vitórias de rajada: 3-2 em Portimão, onde Villas Boas experimentou pela primeira vez fazer descansar meia equipa titular; 5-2 em Moscovo, onde o FC Porto passou a registar quatro vitórias em quatro jogos europeus; 3-2 sobre o Sporting, noDragão, um resultado que sugere falsas dificuldades para quem não viu o jogo; e a épica vitória sobre o Ben-fica, de novo na Luz e agora por 3-1, conquistando, contra todas as previsões, um lugar no Jamor e assinalando a quarta e última humilhação do putativo campeão europeu numa só época.

O 10º dia marcante desta inesquecível temporada aconteceu logo uma semana depois da vitória para a Taça, na Luz, quando, numa segunda parte arrebatadora, o FC Porto transformou uma desvantagem de 0-1 ao intervalo num clamoroso 5-1 sobre o Villarreal, com um poker de Falcão e mais uma exibição para mais tarde recordar. E, enfim, vieram os acabamentos de Maio e da época toda, numa semana triunfante: dia 15, no Funchal, vitória tranquila por 2-0 sobre o Marítimo, encerrando um campeonato para a história, com 27 vitórias, 3 empates e 0 derrotas; dia 18, em Dublin, vitória sobre o Braga e conquista da Liga Europa, com Falcão a bater o recorde de golos europeus numa temporada, destronando Jurgen Klinsmann, com 17 golos; e, dia 22, para acabar em beleza, vitória na final da Taça de Portugal, com goleada de 6-2 sobre o Guimarães, apesar de dois dias de festejos e apenas um de descanso, face a uma equipa que se tinha estado a preparar, em estágio, uma semana a fio, para encontrar o segredo de conseguir derrotar um invencível adversário.

Como escreveu Lorca, « Tardará mucho tiempo em náscer, si és que násce...» uma equipa portuguesa capaz de tamanha façanha de que jamais houve registo, com excepção do poker que o FC Porto de Ivic também conseguiu nos idos de oitenta. Mas então não demos um 5-0 ao Benfica, não os vencemos e humilhámos quatro vezes, não fomos celebrar o título em pleno Estádio da Luz e não lhes roubámos, directamente, quatro títulos que eles também disputavam. Não batemos todos e tantos recordes como esta época e nào tivemos de enfrentar um massacre de 58 jogos oficiais, vencendo na chuva, na lama, na neve, de Olhão a Moscovo, de Sevilha a Istambul. Esta época e esta equipa entraram para sempre para a história do FC Porto e para a história do futebol português. Foram melhores que o Benfica de Coluna e Eusébio em 63, melhores que o FC Porto de Madjer e Futre em 87, melhores que o FC Porto de Mourinho em 2003 e 2004. Não podem nem devem ser esquecidos e, tal como prometi, vou continuar a escrever sobre eles no meu próximo texto, onde irei analisar, um por um, todos os protagonistas desta inesquecível temporada de 2010/11.

PS - A única equipa melhor que o FC Porto que vi jogar este ano foi o Barcelona. Podem vir com as lamentações da ordem — os árbitros, a UEFA, o sistema, etc, enfim tudo aquilo que um portista já conhece de cor — mas o que fica é aquilo que todos vemos: este Barcelona de Guardiola é provavelmente a melhor equipa que alguma vez existiu, e Lionel Messi, como não me canso de escrever há anos, é o melhor jogador de futebol de todos os tempos.

Nada mais justo que Barcelona e FC Porto se encontrem agora no Mónaco, em 26 de Agosto.

Sem comentários: