terça-feira, junho 14, 2011

UM POUCO MAIS DE CALMA... (01 JUNHO 2010)

1- Vamos devagar: o resultado do primeiro teste da Selecção contra Cabo Verde foi mau e tristonho, mas é mais do que prematuro começar já a tirar conclusões catastrofistas, como alguns fizeram. É verdade que aquilo que talvez mais tenha deprimido as pessoas foi acharem que estavam a ver mais do mesmo, mais daquilo que tão abundantemente vimos durante a fase de qualificação e os jogos particulares sob a direcção de Carlos Queiroz. Isto é, uma equipa com um futebol triste e desinspirado, sem rasgo ofensivo nem desenvoltura no seu jogo, que às vezes mais parece um aglomerado ad-hoc de jogadores do que uma verdadeira equipa, onde cada um sabe o que tem a fazer e fá-lo. Mas para isso mesmo é que servem os jogos de preparação, para isso é que serve este longo estágio de um mês, antes da entrada em cena: esperemos que já hoje, contra os Camarões, se possa ver resultados palpáveis destes dias de trabalho na Covilhã.

Vamos, pois, com calma. Mas com calma deve ir também o seleccionador, que não pode e não deve, ao escutar as primeiras e tímidas criticas, desatar logo a espingardear contra a «desonestidade intelectual» dos críticos. Eu não fiz parte do imenso coro que pediu a Madail a nomeação de Carlos Queiroz: por escolha minha, não seria ele o seleccionador. Mas, uma vez escolhido, é tocar em frente, desejar-lhe toda a sorte do mundo e confiar que estará ao nível da tarefa (o que, para mim, não significa quimeras como ganhar o Mundial ou chegar à final, mas conquistas mais ao nosso alcance: os oitavos-de-final, certamente, os quartos-de-final, desejavelmente). Mas se Queiroz foi escolhido e com o principesco salário anual de 1.350.000 euros (é notável como, em relação aos escandalosos salários do futebol, já não há indignação popular e ninguém se lembra de reclamar para eles cortes ou contenção...), é porque se entendeu que ele é super-qualificado para a função. Se o seleccionador de Portugal, apesar de ganhar menos do que o seu antecessor, o «patriota» luso Scolari, é, mesmo assim, o sétimo seleccionador mais bem pago dos 32 que vão estar no Mundial (ganhando, por exemplo, 60% mais do que Dunga, à frente da selecção do Brasil, ou Maradona, à frente da Argentina, mais do dobro de Domenech, comandando a França, ou cinco vezes mais do que Bob Bradley, à frente dos Estados Unidos), ele não pode, obviamente, indignar-se porque os críticos da exibição contra Cabo Verde, em sua opinião, ignoram como se desenvolve a preparação de uma equipa para o Mundial. Claro que ignoram: se não ignorassem, onde estaria a superioridade técnica de Queiroz que justificasse um vencimento de 110.000 euros por mês, mais prémios? E o que ele não pode também ignorar é que nem um só dos seus 31 colegas do Mundial escaparia às críticas locais, se empatasse a zero, em casa, contra uma selecção tão modesta como a de Cabo Verde.

Portanto, nem os adeptos devem esperar o impossível e o óptimo logo ao virar da esquina, nem o seleccionador se deve colocar num pedestal onde toda a critica seja vista como um acto de desonestidade ou pior ainda.

2- Sempre achei que se devia ponderar a altura em que se disputam Mundiais e Europeus. E que, ponderando, talvez se chegasse à conclusão de que seria melhor fazê-los disputar pouco depois do início da época — lá para Setembro, Outubro — do que no final da época, como acontece. No final da «nossa» época, há muitos jogadores que chegam lesionados ou nem sequer comparecem por isso mesmo; alguns dos melhores chegam desmotivados porque já tiveram, ao longo da época e ao serviço dos seus clubes, êxitos que lhes bastem para um ano só; e quase todos chegam cansados, depois de uma temporada inteira, com 30,40,50 ou mais jogos nas pernas. Poder--se-ia argumentar que essa alteração ainda podia servir para o Europeu, com todas as selecções situadas no mesmo hemisfério norte— logo, na mesma altura competitiva da época —, mas não para um Mundial, reunindo selecções de todos os continentes e ambos os hemisférios. Mas isso, hoje, já não é tão verdade, pois a grande maioria dos jogadores que estão num Mundial, sejam mesmo sul-americanos, africanos ou dos antípodas, jogam em clubes europeus e estão feitos ao calendário europeu.

A actual programação do Europeu e do Mundial tem como consequência, e pelas razões que atrás enumerei, que muito raramente vemos jogos ao nível dos melhores jogos de clubes que vemos na Europa, ao longo da época. Esses factores alteram a lógica previsível das coisas e, por isso mesmo, muitas vezes não são as selecções com melhores jogadores e melhores equipas no papel que se vão destacar mais, mas sim aquelas que conseguem contornar melhor esses factores de perturbação e que têm treinadores mais inteligentes para lidar com isso.

3- Catorze membros da claque benfiquista mais conhecida foram condenados a penas de prisão efectiva pelo Tribunal Criminal de Lisboa, e por um rol de crimes de violência muito sérios. Eu, por exemplo, não sabia e fiquei a saber por uma fotografia do Correio da Manhã, que aquela claque tinha incendiado por completo um autocarro do FC Porto. E fiquei a saber que, apesar do comunicado da Direcção do Benfica, demarcando-se dos condenados, ficou provado em tribunal que era na célebre «casinha» cedida pela Direcção à claque, no Estádio da Luz, que eles guardavam o material com o qual levavam a cabo as suas actividades, seguramente não reveladoras da tal postura de despor-tivismo sempre apregoada por aquelas bandas.

Também na semana passada, ficámos a saber que a PJ identificou indivíduos de várias partes do País, que passaram a época que terminou a ameaçar de morte árbitros e seus familiares. E que todos são adeptos do Benfica.

E escrevo isto, não porque eu ache que o Benfica, ou qualquer clube, seja responsável pela violência e clima de intimidação e terror nos estádios, levado a cabo por alguns elementos de algumas claques. É claro que há clubes que fazem mais para o evitar do que outros, alguns são mais complacentes do que outros. Mas, em rigor, não se pode dizer que sejam as direcções a consentir ou instigar o comportamento das claques. No que todos serão responsáveis é em terem consentido um esquema instalado em que parece que, sem claques organizadas, não há animação nos estádios nem apoio às equipas. E, então, fecha-se os olhos a muitas coisas, em troca desse apoio.

Mas escrevo isto para que se anote bem a diferença de tratamento que a imprensa dedica à claque do Benfica e à do FC Porto. O Benfica foi jogar ao Porto e o autocarro foi apedrejado? Foi, sim senhor. Mas (A Bola até foi excepção) esqueceram-se de referir que o do FC Porto também foi apedrejado no Porto e, seguramente, não por portistas, e que já antes o havia sido a caminho de um jogo da Taça no Estoril, ao passar debaixo de um viaduto da A-5 (o mesmo acontecendo ao carro particular onde viajava o presidente do FC Porto, atingido à pedrada, com o pára-brisas estilhaçado, em plena auto-estrada, fruto de uma emboscada devidamente planeada). Fizeram um charivari com os «violentos incidentes» protagonizados pela claque do FC Porto, no Algarve, aquando da final da Taça da Liga — mas esqueceram-se de dizer que tais incidentes (que até o presidente do Benfica desvalorizou) consistiram apenas em que, quando os autocarros pararam e encostaram na portagem da A-2, após 6oo quilómetros fechados lá dentro, alguns elementos da claque resolveram sair e foram corridos àbastonada de volta aos autocarros. Há vinte anos que nos vendem a «verdade» do clima de intimidação que se viverá em todos os Porto-Benfica lá em cima, e lá vem a recordação de Jorge de Brito a entrar no estádio das Antas, escondido no banco de trás deum carro e do cheiro a lixívia que haveria na cabine do Benfica. Pois bem: digam-me lá quando foram os últimos e «graves incidentes» ocorridos no Porto e com a comitiva ou dirigentes do Benfica — seja no estádio, no túnel ou no hotel? E fizeram um escândalo porque, cumprindo uma tradição anual, os deputados do FC Porto jantaram no Parlamento com a Direcção do clube. Disseram que o Parlamento estava a «branquear crimes», mas os únicos crimes, julgados pelos únicos tribunais habilitados para tal, e que levaram gente à prisão, por causa de very-lights, fogo posto, violência organizada, etc, por acaso só sucederam com adeptos do Benfica. Um pouco mais de pudor não lhes faria mal algum.

E, já agora, podiam lembrar-se que o mesmo José Mourinho, que hoje veneram, é aquele que levou o FC Porto à conquista de um campeonato, uma Taça de Portugal e uma Champions, no ano em que, segundo eles, o FC Porto só ganhou porque um árbitro foi tomar um «cafezinho» a casa de Pinto da Costa, antes de um jogo a feijões. É uma chatice quando a realidade não bate certo com a «verdade»...

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