quarta-feira, junho 22, 2011

UM MAU NEGÓCIO E UMA MÁ DESPEDIDA (06 JULHO 2010)

1- Muitos sportinguistas estão em estado de revolta contra o seu presidente por ter vendido João Moutinho ao FC Porto. Alguns portistas também estão em estado de euforia, pelas razões inversas. Quero confortar os primeiros e acalmar o entusiasmo dos segundos: quem fez um bom negócio foi o Sporting, não o FC Porto.

Primeiro, já se tinha percebido que o ciclo de Moutinho tinha acabado no Sporting, por razões próprias e outras do clube. Ano após ano dado como transferência iminente para um dos tubarões da Europa, João Moutinho (e o Sporting) viram o sonho ir-se esfumando, Verão após Verão, até chegarmos ao momento actual, em que, no horizonte, não havia uma só proposta de compra por um dos «valores seguros» do Sporting. A isso, somou-se a sua não convocação, sem surpresa, para o Mundial, e finalmente a notícia da sua destituição do cargo de capitão de equipa. Sem o conseguir vender, o Sporting preparava-se para, contrariadamente, ter Moutinho, também ele contrariado e desmotivado, para a nova época. Se alguém tem aparecido a dar 11 milhões por Moutinho, não tenho uma dúvida de que marchava logo.

Pois, apareceu FC Porto — que, não só bancou 11 milhões, mais 25% numa futura transferência, como perdoou 2,5 milhões que o Sporting ainda devia de Postiga, e, mais que tudo acrescentou-lhe o passe de Nuno André Coelho. Quanto valerá o passe de Nuno André Coelho? Eu não sei, mas sei isto: o João Moutinho está em regressão há dois ou três anos: é um jogador regular, acertadinho, mas sem rasgo e, até ver, de progressão falhada; quanto a Nuno André Coelho, para mim, é a grande promessa para vir a ser o melhor central português do futuro. Eu não trocaria um pelo outro: o FC Porto trocou e ainda lhe acrescentou 13,5 milhões. Ou seja, por mais que se desvalorize o passe actual de Nuno André Coelho, a verdade é que, contas feitas, Pinto da Costa bateu a cláusula de rescisão de João Moutinho: 22,5 milhões. O Sporting livrou-se de um problema sem solução à vista e ainda conseguiu facturar o que já não podia esperar, nem nos melhores sonhos. E querem a demissão de Bettencourt por causa disto? Bem, há gente ingrata...

Às vezes, há negócios (e só falo dos recentes) feitos pelo FC Porto que eu não consigo entender, que não como súbitos ataques de generosidade. João Moutinho é um deles, mas há mais. Quaresma foi vendido ao Inter ao preço de saldo de 16 milhões, como então aqui escrevi. E, para disfarçar aborla, aceitámos que eles nos mandassem o Pele, valorizado para o efeito em 6 milhões: pois há três anos que o Pele é um encargo e um problema sem solução. Oferecemos, absolutamente de borla, o Alan e o Luis Aguiar ao Braga: o segundo foi logo vendido, com o Braga a empochar tudo, e o primeiro está em vias de o ser também. Em troca, comprámos-lhes (não foi dado...) o Orlando Sá, que chegou magoado e só fez meia-época, na qual marcou um golo na Taça da Liga, e agora vai ser emprestado ao Marítimo, com os salários apagar no Porto. Compramos miúdos prometedores em todo o lado — Colômbia, Argentina, Alcochete — mas os nossos, os Candeias, Helder Barbosas, Ukras, etc, são todos dispensados, emprestados, oferecidos. Somos um clube infinitamente generoso: basta ver o que aí há de treinadores à espera, para fecharem os planteis, dos reforços que hão-de vir das cedências do FC Porto — as quais, depois, até acabam por contribuir directamente para nos roubar pontos no campeonato, como sucedeu este ano. Não sei, sinceramente, se haveria até campeonato sem a nossa generosidade...


2- Lá acertei na minha previsão de que Portugal não passaria dos oitavos, no Mundial da África do Sul. Não foi preciso grande ciência nem dotes de adivinho. Primeiro que tudo, porque nunca fui adepto de Carlos Queiroz e aqui, expressamente, furei a quase unanimidade nacional, quando ele foi escolhido. Depois, porque, tendo visto a Selecção de Queiroz nas fases de qualificação e de preparação, nunca consegui descortinar ali motivos para tanto entusiasmo com a nossa prestação africana.

Queiroz pode continuar ou não para o Europeu e até adiante, que já todos sabemos o que esperar. Qualificar-nos para a fase final, para ele, é dever cumprido e satisfação quanto baste. Foi isso que se tornou cristalinamente claro na África do Sul: Queiroz nunca quis levar Portugal à glória, nunca quis correr esse risco e sujeitar-se a não passar a fase de grupos. O que ele quis verdadeiramente, o seu objectivo primeiro, foi uma prestação que lhe salvasse a cabeça: conseguir os mínimos exigíveis, chegar aos oitavos e poder dizer a seguir que tinha caído perante a campeã da Europa. Melhor ainda se, de caminho, não perdesse com o Brasil (mesmo um Brasil tão triste) e com a Costa do Marfim (mesmo desfalcada de Drogba), e se a derrota es perada com a Espanha fosse apenas tangencial, como foi. Se todos saímos frustrados da África do Sul, Carlos Queiroz saiu aliviado. Tanto mais que pode dizer que, em matéria de esperanças defraudadas, está em excelentes companhias.

Dos muitos erros que Queiroz cometeu contra a Espanha, e antes contra o Brasil, e que já todos escalpelizaram — deixar Ronaldo sozinho na frente, inventar o Ricardo Costa a defesa-direito e o Pepe a trinco, insistir no Simão, desistir do Deco e do Hugo Almeida —, o pior de todos, para mim, foi a subserviência que ele mostrou, estratégica e pessoalmente, em relação à vedeta da companhia. Já se sabia dessa sua tendência para não se conseguir impor aos grandes jogadores (e por isso falhou no Real Madrid), mas, desta vez, exagerou. Para começar, é injustificável que tenha dado a Ronaldo a braçadeira de capitão, quando tinha na equipa verdadeiros líderes, como Ricardo Carvalho ou Bruno Alves. Depois, é inconcebível que se faça capitão de equipa quem já tinha demonstrado suficientemente que não joga para a equipa, mas para si, para as meninas da bancada e para os seus patrocinadores. É claro que, no Real ou no Manchester, a ganhar um milhão de euros por mês, ele não se pode permitir essas leviandades, nem os treinadores e os adeptos lho consentiriam. Na Selecção, porém, ele acha-se um rei e senhor: só ele é que pode marcar todos os livres (depois de posar devidamente de pernas abertas para os fotógrafos) , pode não passar a bola a ninguém e chutar à baliza a qualquer distância e em qualquer circunstância (e até se pode dar ao luxo de não ter estudado devidamente o comportamento da Jabulani para perceber que, chutada de longe e com força, ela levanta voo e sai sempre por alto). Um treinador que tivesse a coragem dos grandes momentos, teria tirado o Ronaldo ao intervalo do jogo com a Espanha: talvez tivéssemos perdido na mesma (era o mais certo), mas teria mostrado que tinha autoridade para o lugar que ocupa e teria evitado as cenas finais da vedeta zangada. Ao contrário do Francisco José Viegas, eu não entendo que o Ronaldo deva ser poupado e que criticá-lo seja sinal de inveja. Eu não invejo os milhões do Ronaldo, nem a suposta vida de constantes conquistas amorosas que o marketing lhe atribui, nem, seguramente, a roupa ou os adereços do Cristiano Ronaldo. Tenho é muito respeito por jogadores como o Eduardo (de quem esperava pouco...), o Ricardo Carvalho, o Bruno Alves, o Meireles, o Fábio Coentrão, que, esses sim, deram em campo o melhor que tinham e nunca se imaginaram superiores à equipa. Mas o Cristiano Ronaldo, o que lhe deve a Selecção portuguesa, nos últimos quatro anos?


P.S: Vou responder a José Diogo Quintela apenas por razões de honra. Eu escrevi aqui que ele vive a repetir uma mentira na esperança de que ela se torne verdade; ele respondeu todo um texto a chamar-me mentiroso: faz uma diferença e exige uma resposta adequada. Mas espero bem que esta seja a última vez que tenho de lhe responder, pois não tenho o menor gosto em alimentar polémicas públicas com quem não reconheço nível para tal. Como humorista, JDQ vive do talento de Ricardo Araújo Pereira e nada mais; como anunciante, integra aquela patética, indigente e caríssima campanha da MEO, onde os Gatos aparecem a fazer figura de espermatozóides do espaço, repetindo até à náusea gagues sem sombra de piada ou de imaginação; parece que ultimamente também se lançou como escritor, juntando umas insípidas crónicas publicadas numa revista numa coisa a que chamou livro. Talvez com o tempo aprenda que ser escritor requer infinitamente mais trabalho, mais talento e mais seriedade do que, simplesmente, anunciar-se como tal — hoje, qualquer artista de cabaret o faz.

Tenho assim a ideia de que JDQ é alguém que precisa de se alavancar no caminho desbravado por outrem para alcançar os seus 15 minutos de fama. E tenho a noção de que, quando ele chama o meu nome para título garrafal da sua crónica e me promete tareia sem fim, atrai muito mais leitores do que aqueles que habitualmente consegue com as suas deslavadas e totalmente desinteressantes crónicas dos outros dias. Mas não consta da minha lista de boas acções o favor de ajudar a promover o JDQ.

Adiante. Aos factos e em resumo. JDQ anda para aí há um ano a tentar fazer piadas e produzir insinuações baratas — das quais extrai conclusões desonestas e deliberadamente mentirosas — sobre o cafezinho que o ex-árbitro Augusto Duarte foi tomar a casa de Pinto da Costa, na véspera de apitar um Beira-Mar-FC Porto para o campeonato de 2004, jogo que ele classifica como decisivo. Ora, não é preciso ser tão inteligente quanto o próprio JDQ para perceber que o que ele quer dizer entrelinhas é: a)- que o árbitro não foi apenas ao cafezinho, mas também ao envelope; b)- que foi graças a isso que o FCP não perdeu o dramático jogo do dia seguinte, contra o Beira -Mar; c)- e graças a esse precioso empate que ganhou o campeonato; e d)- que foi com jogadas destas que o FCP conquistou também a sua hegemonia dos últimos 25 anos no futebol português.

A isto, eu respondi e respondo: a) a tese do envelope foi literalmente estilhaçada pelo tribunal de Aveiro, quando a única prova de tal — o testemunho da também escritora Carolina Salgado —, apesar de longamente preparado pelo MP, se revelou, como seria de esperar, uma total anedota; b)- ninguém, a começar pelos ex-árbitros que integravam o júri de apreciação de O Jogo, encontrou no desempenho do árbitro quaisquer motivos para poder dizer que ele tinha favorecido o FCP, antes pelo contrário; c) - o jogo era tão decisivo, ou tão pouco, que o FCP se deu ao luxo de dispensar vários titulares e sair de lá, tranquilamente, com dois pontos perdidos; d)- dá-se o caso de, nesse ano de 2004, o FCP ter o campeonato praticamente ganho desde o final da primeira volta e estar apenas preocupado com a Champions, que viria a ganhar daí a semanas, depois de, no ano anterior, ter ganho também campeonato e Taça UEFA. Era, à vista de todos, menos de fanáticos como JDQ, de longe a melhor equipe portuguesa e uma das melhores da Europa, base da Selecção Nacional que seria a seguir vice-campeã europeia, acrescentada de jogadores estrangeiros como Deco, Alenitchev, Carlos Alberto ou McCarthy, e treinada por um tal José Mourinho. Qual é o raciocínio de Quintela? Que, sem o cafezinho, o Porto teria perdido em Aveiro, enquanto o Sporting teria ganho no Bessa (não ganhou, mas por culpa do árbitro, diz ele — claro, como sempre); a seguir, o Porto perdia também em Vila do Conde e mais algures, enquanto o Sporting continuava a ganhar sempre, até ser campeão. E assim se fariam os campeões, pudesse ele. Como não pode, limita-se ao que julga poder: falsificar a história e beneficiar do silêncio e do esquecimento geral, para fazer passar a mentira como verdade.

O que está em discussão é apenas isto. O resto, as coisas onde ele vê mentiras tenebrosas da minha parte, são apenas pormenores igualmente ridículos: saber se o Beira-Mar-Porto acabou num empate a 0-0 ou a 1-1, se aconteceu antes da meia-final da Champions ou antes da final ou se os ex-árbitros de O Jogo eram três ou quatro, não muda rigorosamente em nada o essencial. E o essencial, repito, é que o JDQ vive a alimentar uma mentira, assente em falsas acusações que o tribunal desfez e em opiniões próprias que quem quer que tenha um mínimo de memória sabe que não passam de delírios e desonestidade intelectual.

Para terminar e, mais uma vez, como já sucedeu em relação ao RAP, queria dizer que há duas coisas que me fazem confusão. A primeira, é porque razão escrevem estes tipos num jornal sobre futebol, quando, manifestamente, eles não só não entendem nada de futebol, como nem sequer estão interessados em falar disso: o que lhes interessa do futebol é apenas a intriga, a insinuação, a calúnia, o despeito e a inveja — o futebol de tasca.. E a segunda coisa que me faz confusão é o tempo que estes Gatos dedicam a pesquisar e arquivar tudo o que eu (ou o Rui Moreira) escrevemos, para depois sucumbirem a orgasmos sucessivos de cada vez que acham que nos apanharam em contradição. Francamente, não me imagino a desperdiçar uma hora que seja dos meus preciosos dias a pesquisar as obras completas do JDQ...

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