1- A alegria incontida de André Villas Boas após o apito final do árbitro do terrível jogo de Viena foi compreendida e partilhada em simultâneo por todos os que vivem com paixão este grande clube azul e branco. Várias coisas coincidiram em Viena: a memória da inesquecível vitória contra o Bayern e também a memória da inesquecível vitória contra o Pena-rol, num estádio de Tóquio igualmente coberto de neve — ambas as coisas nessa fabulosa época de 1987. E, depois, a prova que faltava que este FCP de Villas Boas cumpre as melhores tradições da casa, jogando com a mesma vertigem da vitória em qualquer terreno e em qualquer circunstância — na neve do Pratter, na piscina de Coimbra, no vento da Madeira, em quintais de província e até em relvados normais e condições climatéricas normais. A mim, o que mais impressionou foi essa vontade de vencer aquele jogo, que nem sequer era dramaticamente importante, para, entre outras coisas, mostrar à bancada onde, numa feliz iniciativa, estavam os heróis de 87, que o espírito do Dragão continua vivo, inimitável entre nós, e logo motivo de todas as invejas, calúnias e maledicências. Sim, 23 anos depois, a caravana continua a passar e é motivo de orgulho para a cidade do Porto e para o Portugal que não é o dos Pequeninos.
Aliás, folheio os jornais desportivos do fim-de-semana, e o que vejo? Que o FC Porto tem algumas modalidades semi-amadoras, como o atletismo, o bilhar ou a natação (onde acabou de se consagrar campeão nacional feminino e vice-cam-peão masculino); que não tem outras que, por exemplo, tem o nosso principal rival, como o râguebi ou o futebol de salão (pomposamente chamado futsal); e que tem quatro modalidades profissionais e assumidas como tal: o futebol, o basquete, o andebol e o hóquei em patins. E onde estamos, em cada uma delas? No futebol, em primeiro lugar do campeonato, com oito pontos de avanço sobre o Benfica, nos dezaseis-avos da Liga Europa, como primeiro classificado do grupo e já com uma Supertaça na vitrina; no basquete, em primeiro, com sete vitórias e sete jogos — mais duas que o segundo classificado, o Benfica, igualmente; no andebol, em primeiro , com uma vitória a mais que o segundo, o ABC (e o Benfica em sexto); no hóquei, onde somos campeões há uma década, em primeiro, com nove vitórias e um empate e mais um ponto que o segundo — o Benfica, outra vez.
Ou seja: o sistema, como eles dizem, impôs-se aos túneis da verdade desportiva e extravasou as fronteiras do futebol, para abranger também todas as modalidades em que o FC Porto se envolve. Somos um pesadelo, somos uma praga, somos um fantasma inultrapassável. Somos uma nação!
2- Ontem à noite, contra o Setúbal, o FC Porto teve um jogo que acabou por se complicar, mas, a meu ver, não por culpa própria. Aos 15 minutos, já Elmano Santos tinha perdoado dois vermelhos directos a jogadores do Vitória, por duas autênticas agressões. Passado um pouco, permitiu que o Hulk fosse abalroado à ombrada, não percebi se dentro, se fora da área. Das três faltas, só assinalou uma e nem um amarelo mostrou. Aos 42 minutos, por indicação do auxiliar, marcou um penalty a favor do Porto que, para mim, não existiu. Na segunda parte, marcou falta e amarelo a Fucile por um corte em tackle limpíssimo e banal, e, no minuto seguinte, quando Falcão ia a entrar completamente sozinho na área, em posição frontal e com a bola dominada à sua frente, foi agarrado por Valdomiro e Elmano Santos mostrou-lhe o mesmo amarelo. Pelo meio, assinalou várias faltas a favor do Vitória que só existiram na sua imaginação, ao mesmo tempo que perdoava aos de Setúbal um jogo constantemente agressivo, por vezes a atingir a violência. Enfim, a dois minutos do fim, devolveu a única gentileza feita ao FC Porto, assinalando um penalty a favor do Vitória por uma falta ocorrida fora da área.
Foi Elmano Santos, com a sua atitude deliberada de permissividade total à agressividade do jogo do Vitória, quem acabou por enervar e desarticular a equipa do FC Porto. E é difícil acreditar que tudo aquilo foi inocente: há muito que não via uma arbitragem tão desequilibrada contra uma equipa. Achei realmente o cúmulo da lata que Manuel Fernandes se tenha vindo queixar da arbitragem no final. Ele, que comandou uma equipa que, tirando o penalty oferecido, só fez um remate perigoso à baliza e da autoria do guarda-redes, costa a costa. Ele, que nos seus tempos de avançado, se tornou o maior especialista do campeonato a arrancar penalties simulados aos árbitros. E não reparei que qualquer das coisas o tenha incomodado.
3- Na semana passada, escrevi aqui que esperava um grande jogo Barcelona-Real e que acreditava que Mourinho conseguiria sair de Camp Nou sem ser derrotado. Arrependi-me depois de ter escrito esta última frase, apenas motivada por razões diplomáticas de patriotismo. Arrependido, vou voltar ao que sempre foi a minha convicção e que, aliás, aqui venho exprimindo há anos:
— José Mourinho é um fantástico treinador, mas, se o que conta são os resultados e o futebol à vista, ele não é o melhor treinador do mundo, nem o foi em 2010. O melhor treinador do mundo, actualmente, é Pep Guardiola, que, em três anos, fez do Barcelona a melhor equipa de clube que eu me lembro de alguma vez ter visto jogar e que, logo no ano de estreia, conseguiu ganhar tudo o que havia para ganhar em Espanha, na Europa e no Mundo: oito títulos.
— O Barcelona é muito melhor equipa do que o Real Madrid: já o era e continua a sê-lo. Guardiola introduziu um estilo de jogo único e nunca visto, que parece um prolongamento do jogo da rabia nos treinos e que, não apenas é capaz de esmagar, mas também de humilhar uma equipa como o Real Madrid.
— O Barcelona é um clube com muito mais dignidade e mérito que o Real. É o produto de uma ética, de uma escola de valores (que, obviamente, e só lhe fica bem, não perdoa aos traidores), e de uma escola de futebol, que se traduz nisto: enquanto que no jogo de Camp Nou, o Barcelona alinhou com oito espanhóis, dos quais sete catalães (os que fizeram da Espanha campeã do mundo), e apenas três estrangeiros (se é que Messi, que ali está desde os 14 anos, já lá vai uma década, pode ser considerado estrangeiro...), o Real alinhou apenas com três espanhóis, sendo o resto a tal colecção internacional de galácticos, iniciada há anos atrás e financiada com as jogadas imobiliárias obscuras de Florentino Pérez em Madrid. Ou seja e como aqui escrevi a semana passada: o Barcelona é o FC Porto de Espanha e o Real Madrid é o Benfica. Não deixa de ser uma coincidência feliz e simbólica que ambos, Barcelona e FC Porto, tenham dado cinco aos seus imperiais adversários...
— E, enfim, não há patriotismo que salve esta evidência: Cristiano Ronaldo é um dos melhores futebolistas e um dos melhores atletas da actualidade, mas, para azar seu, ele coincide no tempo com esse tipo chamado Leonel Messi...e não há comparação possível. Este ano, parece que o título de melhor jogador do ano está reservado a Iniesta, que é, de facto, um jogador fabuloso. Nestes últimos cinco anos, será a quarta vez que o trofeu é negado ao argentino, por razões de justiça comparativa ou politicamente correctas. Não importa. Ele tem sido, nestes cinco anos, e para quem gosta de futebol, o melhor jogador, ano após ano. Se durante muito tempo, tentando não ser influenciado pela memória recente, hesitei entre Cruyff e Messi, agora já não vou tendo grandes dúvidas: o pequenino Messi é o melhor jogador de futebol jamais visto, desde que o mundo é mundo e o futebol existe. Não por acaso, o único que eu acho que podia rivalizar com ele, foi excepcional jogador no Barcelona e um seu treinador determinante, de quem Guardiola hoje diz que o futebol do Barça é ainda tributário.
4- Como toda a gente, achei fantástico o frango de Moretto na Luz. E lembrei-me de como, de cada vez que o FC Porto enfrenta uma equipa onde jogam jogadores seus emprestados ou que é treinada por ex-jogadores seus de referência, logo se levantam as vozes dos benfiquistas a lançar um mar de suspeitas prévio, mas que, depois, nunca encontram correspondência factual nos jogos. O que não se diria se Ventura, guarda-redes emprestado pelo FCP ao Portimonense, tivesse aberto o caminho a uma vitória portista com um frango daqueles? Enfim, adiante...
Mas também achei fantástico que o autogolo de Moretto tenha sido atribuído... a Cardozo. Não sei se foi para disfarçar o embaraço, para relançar a campanha já vivida no último campeonato de "faça de Cardozo o melhor marcador da liga", ou ambas as coisas. E achei fantástico que as últimas imagens do jogo da Luz tenham sido do Moretto a cumprimentar e a ser cumprimentado pelos adeptos benfiquistas na primeira fila da bancada. Não havia necessidade.
5- Aconteceu nos dois últimos jogos em Alvalade, contra FC Porto e Lille: erros favoráveis da arbitragem foram decisivos para os resultados alcançados pelo Sporting. Tem acontecido regularmente nos últimos meses, mas tal não justifica nada de anormal nem nenhuma conclusão ou suspeita. O que já não é normal é que, na primeira ocasião em que o Sporting for prejudicado por um erro de arbitragem, eles desatem aos gritos, em comunicados e manifestações, esquecendo tudo o que ficou para trás.
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