quarta-feira, agosto 24, 2011

HÁ TRAUMAS DIFÍCEIS DE ULTRAPASSAR (16 NOVEMBRO 2010)

1- Mais de oito dias depois, ainda continuo nas nuvens com o 5-0. É que foram muitas coisas juntas, muitos motivos de alegria e também de desforra. Ora, anotem: l) vencemos o nosso principal rival na luta pelo título; 2) alargámos a distância para uns já quase irrecuperáveis 10 pontos de avanço, que, na prática, são 11; 3) conquistámos um resultado para a História, que já não se usa hoje em dia e, menos ainda, num clássico nacional; 4) foi a terceira vitória contundente e consecutiva sobre o Benfica, nos últimos seis meses e nos últimos três encontros — uma espécie de tira-teimas sobre quem é a melhor equipa portuguesa da actualidade; 5) para além do resultado esmagador, foi um banho de bola em todos os capítulos (tudo o que o Benfica conseguiu no jogo foi um remate perigoso quando já havia 4-0); 6) foi um arraso para as vedetas do Benfica, de quem se diz que o planeta inteiro anda atrás: o Fábio Coentrão (grande jogador) e o David Luís (grande exagero); 7) com outra exibição demolidora do Hulk, foi mais uma demonstração prática das razões que estiveram por trás da emboscada no túnel da Luz e do jeito que isso deu ao Benfica no campeonato passado; 8) foi uma exemplar lição táctica do rookie André Villas Boas ao catedrático Jorge Jesus — o «novo Mourinho», segundo alguns clarividentes benfiquistas; 9) foi (mais uma!) demonstração do que é, realmente, a verdade desportiva: enquanto eles se gastaram, como habitualmente, em mensagens para o árbitro, queixinhas ao ministro, temores sobre a sua segurança e até ameaças de falta de comparência ao jogo (que jeito que lhes teria dado!), nós esperámos por eles, calmamente e em silêncio, e, na hora e meia da verdade, ali, no único campo da verdade desportiva, até os comemos! Ah, grande Porto, ainda não recuperei de tanta felicidade!

2- E, se nós ainda não recuperámos de tanta felicidade, eles, coitados, tão cedo não recuperam de tanta frustração, tamanha humilhação. Passaram a semana toda em auto-recriminações, tentando reduzir tudo a uma má opção táctica do treinador ou então, como escreveu o notável Malheiro, a tentar explicar o desastre por uns quinze minutos felizes do Porto, mais «uma expulsão forçada e um penalty inexistente ».

Sábado de manhã, cem adeptos de uma claque «não oficial» do Benfica invadiram o treino no Seixal e foram pedir explicações aos jogadores e ao treinador. Relatou 'A Bola' que se «viveram momentos de grande tensão», com «agressões verbais» e alguns jogadores muito impressionados (que é como quem diz...). Já no relato do próprio Jorge Jesus, tudo não passou de «uma conversa breve, de cinco minutos, com alguns benfiquistas educados, ordeiros e com sentido de responsabilidade». Fiquemos por esta última versão e antes assim: só faltava ao Benfica ter de se preocupar com os seus próprios adeptos...

Valeu que no domingo, oito dias depois da sova levada no antro dos dragões (como escreveu o director do Record), o Benfica teve ocasião de se redimir num jogo caseiro contra o último da classificação e onde tudo lhe saiu bem. O jogo valeu para pacificar os espíritos e calar as especulações de tantos benfiquistas, escutadas em surdina ao longo da semana, acerca da curiosa expedição a Angola entre dois jogos do campeonato. E serviu para outra coisa que até a um portista empedernido comoveu: o golo e as lágrimas de Nuno Gomes. Afinal, os jogadores também choram, não são só os adeptos.

3- Já o FC Porto, ainda nas nuvens, meteu folga contra o Portimonense. Percebe-se, aceita-se, tem de se viver com isso de vez em quando, embora não seja bonito de ver. Mas era escusada tanta displicência, tanta negligência, que às vezes sai cara. Até ao último minuto, mergulhados num torpor indolente e medíocre, os portistas estiveram à mercê de um golpe de sorte do adversário. Não aconteceu nem esteve próximo de acontecer, mas não havia necessidade de jogar tão pouco e tão mal. E havia 40.000 portistas nas bancadas, numa noite de chuva e frio e antes de um dia de trabalho...

4- Como se esperava (o próprio Ministério Público pediu em julgamento a sua absolvição), Nuno Cardoso, ex-presidente da CMP foi absolvido do pretenso crime dos «terrenos das Antas» — que serviu ao seu sucessor, Rui Rio, de pretexto para uma campanha anti-FC Porto, muito aplaudida pela inteligentsia lisboeta e que dura até hoje. Sempre achei extraordinário como é que a interpretação de um inspector das Finanças, determinando que a CMP tinha avaliado em mais 2,5 milhões de euros que o seu valor real terrenos permutados entre o FCP e a CMP, tivesse dado origem a tanta especulação e tanta maledicência, só terminadas com a sentença que agora julgou a acusação «absurda» e concluiu que a CMP tinha «defendido o interesse público». Isto, enquanto que para a construção do novo Estádio da Luz e do Alvalade XXI, a câmara de Lisboa não permutou terrenos com o Benfica e o Sporting: deu-lhes sim, terrenos, bombas de gasolina, direitos de construção excepcional e dinheiro, muito dinheiro. Tudo dado. Mas disso, ninguém se ocupou, ninguém suspeitou de crime ou escândalo algum.

5- Vítor Pereira fez o seu anunciado balanço das arbitragens entre a 6ª e a 10ª jornadas. Tudo azul. Ou melhor, tudo vermelho, tudo pacífico: como o Benfica não teve quaisquer razões de queixa (antes pelo contrário, vide jogo com o Paços de Ferreira), não houve problema algum, está tudo óptimo. Mas, pelo menos e como fez notar André Villas Boas, é inconcebível que Vítor Pereira ache que o Académica-FC Porto foi um jogo sem história e com condições para ser disputado. Se o FC Porto tem perdido um jogo que era de absoluta lotaria (mas que acabou por ganhar muito bem), o jogo com o Benfica ter-se-ia disputado em condições psicológicas bem diferentes. Hoje, depois dos 5-0 e da banhada ao Benfica, é difícil imaginar que uma derrota aleatória na piscina de Coimbra tivesse feito alguma diferença. Mas a verdade é que podia tê-lo feito, podia ter sido um turningpoint no campeonato e através de um jogo que nunca se deveria ter disputado. Achar isso normal é preocupante.

6- Soube por uma entrevista do próprio, que o FC Porto rescindiu o contrato com Candeias. Não se limitou a emprestá-lo ao Portimonense: libertou-o, de graça, sem ver nele valor algum para o manter. Como aqui escrevi diversas vezes, tenho a opinião contrária: acho que o jovem Candeias é um valor seguro nas mãos de um clube e de um treinador que o saiba reconhecer e promover — coisa que Jesualdo Ferreira não quis fazer. Agora, ele diz sonhar com o Benfica e, sobretudo, em mostrar aos responsáveis do FC Porto que se enganaram a seu respeito. É mais um de uma série impressionante de miúdos que o FC Porto tem desaproveitado e que têm em comum três coisas: serem da cantera do clube, serem portugueses e serem sempre menos valorizados do que qualquer jovem sul-americano desembarcado em Pedras Rubras. Os próximos espero que não sejam o Ukra e o Castro.

7- 0 derby do Minho, pese às queixas absurdas do presidente do SC Braga, foi, sobretudo um muito mau jogo, disputado por duas más equipas praticamente sem um único bom jogador. Não adianta queixar-se do árbitro, quando se vê que o Luis Aguiar, por exemplo, dispondo de dois livres no final do jogo, daqueles em que a única coisa que importa é levantar a bola para a confusão da área, não foi sequer capaz de a elevar acima dos rins do defesa mais próximo.

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