quarta-feira, janeiro 09, 2013

OS SOFRIMENTOS DE JESUS (06 DEZEMBRO 2011)

1- Ainda não será desta vez que Jorge Jesus porá as mãos em cima da Taça de Portugal. Longe daqui, não assisti à tragédia do Funchal, contra o Marítimo Subsidiado F. C. , mas já tive ocasião de ouvir dois indignados benfiquistas, queixando-se amargamente das opções do seu treinador, que terá sacrificado a Taça às cautelas que entendeu tomar para defrontar o perigoso Otelul Galati, no Estádio da Luz, amanhã à noite. Mas é das tais coisas: se tivesse corrido bem, Jesus teria demonstrado a sua mestria na gestão da equipa; correndo mal, mostrou antes a sua deficiente avaliação de dificuldades. Devo confessar, que um frémito de alegria percorreu todos corações portislas, ao tomarem conhecimento da eliminação do Benfica - tão grande, pelo menos, como o que percorreu os corações benfiquistas ao saberem da hecatombe portista, há quinze dias atrás, frente à Académica. Não apenas porque assim nos sentimos desforrados, mas também porque assim mantemos a nossa vantagem de dois títulos a mais do que o Benfica, conquistada na temporada inesquecível de 2010/11. Para nos alcançar este ano, o Benfica terá agora de vencer o campeonato e a Taça da Liga; para nos ultrapassar, terá também de vencer a Liga dos Campeões. Podemos dormir descansados.

À hora a que escrevo, ainda o Sporting não se começou a desembaraçar desse pequeno obstáculo chamado Belenenses. Uma vez isso feito, os leões terão aberta uma auto estrada até ao Jamor e à conquista da Taça. Basta-lhes depois ultrapassarem o Marítimo (em casa, outra vez) e, beneficiando do sorteio e do afastamento precoce dos mais directos rivais, têm à vista essa coisa ultimamente tão rara, que é um título.

2- No youtube circula um vídeo do último Benfica--Sporting, que é, de facto, eloquente de alguns dos males de que padece o nosso futebol. Estava-se à beira do fim e o Benfica, reduzido a dez, resistia como podia às investidas do Sporting, em busca do empate. E então que Jorge Jesus abandona a sua área reservada (e que não pode ultrapassar) e corre como um louco ao longo da linha lateral, esbracejando e gritando para Artur para que ele se atire para o chão. E eis que o guarda-redes do Benfica, sem nada que o pudesse justificar, se atira para o chão, com... uma lesão muscular súbita! Lá vem o árbitro parar o jogo, fazer entrar a assistência médica e assim conceder ao Benfica uns minutos preciosos de descanso, ao mesmo tempo que quebra o ritmo atacante do Sporting. A cena oscila entre o hilariante e o indigno, deixando para cada um as considerações éticas visto que as disciplinares, certamente não se colocam. Como já não se colocaram na época passada, quando o mesmo Jorge Jesus, no final de um jogo, em pleno relvado e nas barbas do árbitro, deu uma estalada a um jogador adversário e levou 11 dias de suspensão (contados exactamente para terminarem na véspera do Benfica-Porto), enquanto que o agredido levou mês e meio.

3- Não tenho uma dúvida de que todos os que escrevem sobre futebol têm um clube da sua simpatia, o que obviamente lhes retira isenção. Todos, sem excepção. Mas isso não é grave, desde que quem escreve esteja à partida identificado como apoiante de determinado clube e seja apenas comentador. Grave é quando veste as vestes diáfanas do jornalista isento e sem clube, sem outro interesse que não servir a verdade dos factos. A propósito da gaiola inaugurada entre nós no Estádio da I.uz, vi alguns jornalistas desses - que melhor serviriam a verdade com um emblema do SLB bem à vista - defender que a gaiola é uma coisa perfeitamente normal, aceitável e civilizada e que o Benfica se limitou a copiar o que se faz lá fora (onde?) e a antecipar o que aí vem, por todo o lado. E são estes mesmos jornalistas que depois gostam de escrever textos «moralizadores», lastimando que a gente pacífica e respeitável já não possa ir ao futebol, tranquilamente, com a família ou acompanhantes. Como? Pagar 60 euros para ir ver um jogo enjaulado como animal feroz dentro de uma gaiola dita de segurança, onde, ao menor sinal de pânico, todos poderão ser esmagados contra as grades? Será isto que propõem como remédio normal e civilizado contra o vandalismo? Olhem, comigo não contem para frequentar as vossas gaiolas. Até teria vergonha que me vissem lá dentro.

4- Preocupante, é o mínimo que se pode dizer sobre a notícia, não desmentida, de que as modalidades mal- chamadas de amadoras do FC Porto estão com salários em atraso. Preocupante porque todas elas são campeãs nacionais em título e porque isto mostra bem até que ponto os clubes de topo, e não só, vivem acima das suas possibilidades e com a corda no pescoço, agora que o crédito bancário está bem mais difícil. E preocupante ain- da porque, supostamente, a SAD do FC Porto vai em cinco anos consecutivos de lucros e de prémios distribuídos pelos seus administradores e, apesar de uma dívida acumulada de 57 milhões, está ainda bem melhor do que as SAD dos seus directos rivais (104 milhões o Sporting, 109 milhões o Benfica). Na sua edição deste domingo, perguntava o jornal Público se as SAD do futebol fariam sentido, com uma cotação de bolsa ao nível da do BCP. Bom, é preciso dizer que as SAD, enquanto empresas, nunca fizeram sentido, porque nunca pretenderam fazê-lo. Só mesmo um papalvo é que poderia imaginar que, ao subscrever acções de uma SAD, se tornava um accionista de um negócio em tudo semelhante ao de qualquer outra sociedade anónima. As SAD nada mais foram do que uma oportunidade para as direcções dos clubes encaixarem um dinheiro caído do céu, graças à subscrição inicial do capital, vendida a devotos do clube. Mas nunca se preocuparam com a cotação das acções em bolsa e nunca, como é óbvio, fizeram tenções de pagar um euro que fosse a título de dividendos. Se alguém caiu na esparrela de que este era um bom investimento de poupanças, é digno de dó. Mas seria de esperar, isso sim, que as SAD tivessem um mínimo de gestão profissional e prudencial e não viessem a servir, como serviram, para subtrair todo o património dos clubes, afectando-o a si próprias e à cobertura dos prejuízos crónicos da sua gestão suicidária. Um dia alguém rebenta: só temos de adivinhar quem é o elo mais fraco.

5- Surpreenda-me, Vítor Pereira: logo à noite, contra o Zenit, não ponha o Maicon a defesa direito; deixe o Rolando no banco e ponha o Mangala e o Otamendi no centro da defesa; não deixe o Hulk sozinho no centro do ataque; e pense três vezes antes de fazer substituições: uma, para ter a certeza de que são necessárias, outra sabendo bem o que quer alterar, e outra escolhendo quem o possa fazer. Deixe-se de jogar à roleta e à lotaria, leve um plano de jogo bem definido e explicado aos jogadores e que contemple apenas as adaptações necessárias em função de circunstâncias diversas do previsto. E, por favor, trate de ganhar o jogo e colocar-nos nos oitavos-finais da Champions. A equipa está repousada (graças à Académica) e vai estar bom tempo e casa cheia. Temos tudo por nós.

6- E o meu Corinthians, o FC Porto do Brasil, lá se sagrou campeão, batendo ao sprint um valoroso Vasco. Foi um campeonato emocionante, que chegou a ter sete equipas em lula pelo título e que, finalmente, deu a Liedson aquilo que sete anos de Sporting não lhe conseguiram dar: as faixas de campeão. Aliás, justamente oferecidas à memória do grande doutor Sócrates, um homem do Timão, que explicou que se pode ser um grande jogador de futebol e, ao mesmo tempo, um grande cidadão, que não se preocupa apenas com dinheiro e contratos, automóveis de espantar, penteados e tatuagens. Como disse Lula — outro adepto ferrenho do Timão - Sócrates levou para os relvados a consciência cívica de um povo que resistia à ditadura dos generais brasileiros e precisava de símbolos para essa luta. Infelizmente, o futebol não conhece muitos exemplos destes. A regra são as tatuagens e os penteados, os automóveis e os contratos.

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