terça-feira, outubro 11, 2011

AS TRÉGUAS ESTÃO A CHEGAR AO FIM (25 JANEIRO 2011)

1- Nos últimos dez jogos, o FC Porto só disputou dois fora de casa e ambos para o campeonato: em Paços de Ferreira (vitória por 3-0, justa mas com resultado enganador) e o do último sábado, em Aveiro. Pelo meio, não saiu do conforto do Dragão, para mais recebendo equipas fracas e até de divisões inferiores, em jogos de relativa importância. Desde o fantástico desempenho contra o Rapid, num relvado transformado em ringue de patinagem no gelo, no já distante 2 de Dezembro, é possível dizer que nunca mais a equipa do FC Porto foi posta verdadeiramente à prova. E o que é curioso é que se até aí a equipa tinha revelado solidez e qualidade crescentes, ultrapassando com brilho os adversários internos e externos, foi a partir daí, quando entrou num período de quase dois meses do que se poderia classificar como descanso activo (um luxo que não existe lá fora, onde qualquer competição interna é a doer), que o FC Porto começou a acusar debilidades e a revelar zonas de mediocridade preocupantes.

Em vão se recorrerá aos chavões habituais de que a equipa é «coerente», está «coesa» ou revela «competência» — esse palavreado de que os treinadores tanto gostam e que não quer dizer nada. À vista de todos e das progressivamente despidas bancadas do Dragão, basta retirar do jogo algum dos três elementos de luxo desta equipa, e toda a estrutura abana, de trás para a frente. Vai-se ganhando, mas já só quase à custa do desequilíbrio fundamental que um jogador de excepção como o Hulk consegue meter no jogo e que compensa, por enquanto, um futebol sem velocidade e rasgo, sem tensão nem urgência de vitória, revelando alguns casos de absoluta incompetência e outros de incapacidade de manter um nível exibicional alto mais do que um mês de seguida. De bom, apenas a revelação de James Rodriguez, a confirmação do valor de Otamendi e a melhor época do Helton, desde que lá está. E, vá lá, um Guarín mais esclarecido e útil do que aquilo que se lhe conhecia. A hipótese boa é que este ciclo de mediocridade sobrevivente foi cientificamente planeado para coincidir com um período anormalmente favorável do calendário desportivo, permitindo à equipa recuperar forças para depois reaparecer no pleno das suas qualidades já antes vistas, e justamente quando tal for mais necessário. Estaria assim a aproveitar estas tréguas competitivas e a administrar os lucros amealhados, aqui e na Europa, por um começo de época ao seu melhor nível. Segue-se o jogo antecipado para o campeonato, contra o Nacional, amanhã no Dragão (que, dado o recente desaire, já saiu da categoria de jogo fácil) e a deslocação a Barcelos, para a Taça da Liga, já sem grandes motivações. E ponto final nas tréguas competitivas: no mês que se segue, a iniciar em 2 de Fevereiro, poderá vir logo o jogo do Dragão com o Benfica (caso este ultrapasse nos quartos-de-final o Rio Ave, dia 26), para a meia-final da Taça de Portugal; depois, recepção ao Rio Ave e deslocação a Braga, para a Liga; a seguir, os dois jogos com o Sevilha, e, finalmente, no espaço de 4 dias, uma descida a Olhão, para o campeonato, e outra (provável) à Luz, para decidir a presença no Jamor.

Tal como eu vejo as coisas, quer isto dizer que, neste momento, o desfecho próximo e feliz desta equipa está nas mãos do departamento médico: quanto mais tempo demorarem a devolver o Falcão e o Álvaro Pereira maiores são as hipóteses de o FC Porto não passar incólume pelo conturbado mês de Fevereiro. Porque uma coisa é seguramente certa: não é com o Walter ou o Emídio Rafael que vamos caçar águias e dançar sevilhanas.

Este sábado, vendo o FC Porto jogar em Aveiro, na companhia de três apaixonados portistas, constatei que estava longe de ser o único apreensivo com o que vamos vendo. A vitória, de facto, nunca esteve em dúvida, conforme toda a imprensa salientou (enfim, não li o Jornal do Benfica...): o Beira-Mar não criou nada que remotamente se pudesse assemelhar a uma ocasião de golo e o Helton não teve de fazer uma só defesa; em contrapartida, o James, o Cristian Rodriguez e o Varela desperdiçaram quatro oportunidades para outro desfecho que não o de magra vitória por 1-0, de penalty; e o penalty, como qualquer pessoa que algum dia jogou futebol, ou percebe um mínimo do assunto, viu, foi mesmo real e não inventado, excepto para os fanáticos adversários habituais. Mas se a vitória foi incontestável, o diagnóstico unânime desta pequena assembleia de quatro portistas também o foi: não jogámos nada. Mais uma vez — sim, mais uma vez. Houve o caso gritante do Varela, que, não se percebeu porquê, André Villas Boas seviciou durante 75 minutos, obrigando-o a jogar um jogo que manifestamente não queria disputar; houve a incompreensível aposta em Rafael, em vez de Fucile, no lado esquerdo da defesa, que apenas serviu para tentar trazer alguma emoção ao jogo, proporcionando ao Beira-Mar uma série de livres, aproveitando as sucessivas faltas cometidas por ele para conseguir enviar a bola para a área azul; houve a recorrente lentidão do Rolando, a pensar, a correr, a cortar e a passar, mostrando como a presença tutelar do Bruno Alves encobria tanta coisa; e houve, do meu ponto de vista, o também habitual génio escondido do João Moutinho, com o qual e sem o qual nada de essencial acontece. E houve, sobretudo, mais uma meia hora inicial desperdiçada em coisa alguma, como se não houvesse pressa em ganhar os jogos; uma grande posse de bola com sucessivos passes transviados e sem uma ideia estratégica; cantos e mais cantos invariavelmente cobrados a meia altura para a defesa próxima afastar sem problemas; e, com excepção de Hulk, uma ausência de vontade, já não digo de nos dar ópera, mas de mostrar que ali está o líder merecido deste campeonato, um conjunto de jogadores «unidos para vencer/ ansiosos por fazer/ deste Porto campeão».

Volto à tese optimista: é apenas um mal passageiro, uma gestão estratégica da temporada, feita de ciclos, de avanços e recuos, até à vitória final. Sinceramente, é o que eu acredito. Mas está na hora de mudar de ciclo e nada melhor do que o departamento médico estar consciente disso.

2- A pequena assembleia de portistas, confrontada a seguir com o dilema entre ver o jogo do Benfica ou fazer as honras a um empadão de perdizes, caçadas nas terras baixas do Guadiana, optou por este, após vinte minutos de visionamento do jogo dos rivais. Não porque desta vez, devo confessá-lo, o futebol do Benfica me tenha causado um sono irresistível, mas justamente pelo contrário, e não só: deu-nos a fome e uma indisfarçável apreensão ao constatar o contraste entre a nossa pasmaceira habitual e inicial e a cavalgada com que os encarnados se atiraram logo ao jogo deles, em vagas sucessivas de desvairados atacantes e com tal fúria que eu desafio os descodificadores tácticos do futebol a dizerem-me que raio de esquema de jogo é aquele: será o 4x2x3x1, o 4x1x3x2 ou o todos prá frente até que a bola entre? Verdade, verdadinha, é que eles estão a jogar bem mais do que nós. O que nos safa é que tudo isto é passageiro e estratégico. Logo, logo, regressa a normalidade. Mas, mesmo assim, se o departamento médico...(ao menos a tempo do provável joguinho de dia 2...).

3- Talvez Jorge Jesus tenha dado um murro ao Luís Alberto, do Nacional, e talvez este tenha devolvido o murro. Ou talvez tudo não tenha passado de uns «empurrões». De certeza que não é importante, são coisas que acontecem a quente, depois dos jogos. Não vale a pena arranjar mais um folhetim, com ameaças de suspensões que vão de quinze dias a dois anos! Já bastou o túnel do ano passado e a imbecilidade de uma justiça desportiva — que, à semelhança de toda a justiça deste pais, é adjectiva e formalista em lugar de ser substantiva e lógica — para perceber que o que mais interessa é que jogadores e treinadores, salvo situações verdadeiramente graves e inultrapassáveis, estejam no seu lugar, no terreno de jogo e os juizes desportivos que vão dar uma volta ao bilhar grande.

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