quinta-feira, junho 16, 2005

Transferências (15 Junho 2005)

Por alguma razão Mourinho fez do McCarthy a sua única exigência para ser campeão europeu, por alguma razão Sir Alex Ferguson disse que nunca tinha visto um golo como o que ele marcou ao Manchester no Dragão, por alguma razão a Comissão Disciplinar da Liga gastou uma época inteira assanhada contra ele, colocando-o de fora em catorze jogos.

A época de caça,também conhecida como «defeso », vai animada, como sempre. Os três grandes vão mexendo as suas peças no tabuleiro de xadrez em que grande parte da futura época se decide. Conforme a capacidade financeira e o talento de prospecção e negociação, eles optam por se reforçar, por se renovar, ou por conservar ou mesmo enfraquecer os respectivos plantéis. Os clubes de media dimensão ou pequenos esperam pelas grandes decisões dos três tubarões para depois irem às «sobras». Frequentemente, porém, são eles que fazem os melhores negócios do «defeso», comprando barato e despercebidamente jogadores que para o ano já estarão a ser cobiçados pelos «grandes», a preços quatro ou cinco vezes superiores. Mas, como de costume, as atenções estão todas viradas para os três do topo. E aí, este ano, as atitudes são diferentes: há quem se contenha, quem espere para atacar e quem não espere para começar já gastar «à grande». Respectivamente, Sporting, Benfica e FC Porto.

No Sporting e pela segunda ou terceira época consecutiva, a ordem é de conter despesas, sair a ganhar do saldo entre compras e vendas e reduzir a massa salarial fixa. Pedro Barbosa e Rui Jorge foram sumariamente dispensados; Sá Pinto ganhou um ano de sobrevivência, em contrapartida de descer substancialmente o seu vencimento; Douala e Enakarhire, duas proveitosas contratações da última época, parecem de malas aviadas para esse estranho Dínamo de Moscovo, entreposto e salvação dos clubes portugueses. E a manutenção do decisivo Liedson, sem o qual nada salvará o Sporting na próxima época, está pendente de o Corinthians, outro dos novos-ricos planetários, aceitar o preço de 9 milhões que a SAD pede por ele. Só Ricardo, mal estimado pelos adeptos e com vontade de sair, não parece encontrar as tais fabulosas propostas que nos juram existirem em permanência para ele. De facto, a imprensa desportiva passa a vida a escrever que o Ricardo tem muito mercado... em Inglaterra, devido ao Portugal- Inglaterra para o Euro, em que defendeu um de seis penalties e converteu outro. Mas, não obstante o próprio Ricardo insistir com a SAD para ser vendido, a verdade é que não aparece ninguém a chegar-se à frente. E realmente, eu não vejo muito bem os ingleses a contratarem um guarda- redes só porque ele marca penalties, mas, em contrapartida, é um permanente calafrio no jogo aéreo... que é justamente o futebol- tipo inglês.
Portanto, no Sporting, a notícia são as saídas e não as entradas. Estas, a menos que Liedson seja vendido, não passam de meras intenções, que logo esbarram na falta de poder financeiro negocial dos leões — como no caso da hipotética compra do promissor central da Académica, José Castro. Vale ao Sporting ter como ponto de partida uma excelente equipe, a partir da qual, e mesmo com as saídas, dispõe de uma base sólida para a época que aí vem.

No Benfica, espera-se. A situação financeira e negocial é idêntica à do Sporting, isto é, não há dinheiro para consumar nada em matéria de aquisições fortes e sonantes. Mas tem um capital de esperança e de expectativa, composto pelo entusiasmo do título e da participação garantida na Liga dos Campeões, de que o Sporting não dispõe. Luís Filipe Vieira espera que o negócio do novo cartão ou os putativos negócios que José Veiga consiga fazer com esses igualmente misteriosos fundos de investimento multinacionais se concretizem em dinheiro fresco ou em jogadores a custo zero ou próximo disso. Por ora, limitaram-se a comprar o central Anderson, já anunciado em Janeiro, e o aveirense Beto. Depois de ter visto uns quantos vídeos, Ronald Koeman deve ter chegado à conclusão de que não poderia contar com outra época em que os golos só apa......... definiu a sua prioridade número um: um ponta-de-lança capaz de marcar golos, coisa que não é manifestamente, o caso de Nuno Gomes. Se eu mandasse no Benfica, ia buscar o Liedson ou o McCarthy, que Sporting e Porto estão obstinados a mandarem embora. No caso do McCarthy até haveria o desafio adicional de ver como ele, de camisola do Benfica, deixaria imediatamente de ser perseguido pelos árbitros e pelos disciplinadores da Liga. Entretanto, e enquanto espera para ver se o dinheiro aparece ou não, Vieira vai-se louvando de conseguir manter a «espinha dorsal » da equipe, para o que conta, de resto e como para tudo o resto, com a habitual caixa de ressonância da imprensa, também ela esforçando-se para nos fazer crer que aquele plantel tem muitos interessados por esse mundo fora. Olhem, eu, como portista, o que mais desejo é que o Benfica mantenha todos os seus jogadores actuais e o Sporting o José Peseiro a treinador. E isto não é maldade: é sentido prático.

Pois, lá no FC Porto, e tal como no ano passado, a regra parece ser a de vender tudo o que dá dinheiro e comprar tudo o que mexe. Já vão em quatro vendas e oito aquisições, a somar aí a uns quinze «regressos » de empréstimos. O habitual: um plantel de uns quarenta jogadores para começar a época e pôr logo a cabeça em água ao novo treinador.

Se, quanto às vendas, incluindo as da época passada, eu tenho estado sempre em acordo (excepto quanto à venda do Carlos Alberto, que tanto jeito teria dado para o final do campeonato...), já quanto às compras, não consigo conformar-me com a enxurrada de brasileiros, a leva de jogadores de terceiro plano que não se entende para que servem ou as tentativas, sempre falhadas, de transformar jogadores medíocres do Benfica embons jogadores no FC Porto. Dez Leo Limas não valem um Carlos Alberto, assim como dez Sokotas não valem um McCarthy — cuja venda parece iminente e é insistentemente «pedida » pela imprensa desportiva de Lisboa (como já antes pedia a do Jardel, ano após ano...). Por alguma razão Mourinho fez do McCarthy a sua única exigência para ser campeão europeu, por alguma razão Sir Alex Ferguson disse que nunca tinha visto um golo como o que ele marcou ao Manchester noDragão, por alguma razão a Comissão Disciplinar da Liga gastou uma época inteira assanhada contra ele, colocando-o de fora em catorze jogos. A saída do McCarthy deixará o ataque do FC Porto (que este ano foi o 8º do campeonato!) sem ninguém capaz de marcar golos de forma regular. É um tiro no pé, incompreensível da parte de quem, ao contrário dos rivais, não tem necessidade imperiosa de realizar dinheiro. E que, aliás, e para fingir que compensa depois, irá gastar o dinheiro da venda do McCarthy em três ou quatro inúteis só para fazer número e acrescentar as despesas fixas. Enfim, provavelmente, quando isto vir a luz do dia, já é inútil, mas, pelo menos, que haja alguém a ter avisado.


PS: O jovem Amoreirinha protagonizou, há dois anos e no Torneio de Toulon, a mais selvática, feia e inexplicável agressão a um adversário que eu alguma vez vi num campo de futebol. Na altura, impressionado com o que tinha visto, escrevi aqui que ele não poderia de forma alguma passar impune -visto que o árbitro do jogo nada havia visto. Mas, neste nosso futebol que é capaz de expulsar e suspender por quatro jogos o McCarthy porque ele se tentou libertar com o braço e o cotovelo de um adversário sentado em cima da sua cabeça, o Amoreirinha beneficiou de absoluta impunidade: continuou a representar o seu clube e a Selecção de sub-20, como se nada fosse. Agora, na meia-final de Toulon, ele reincidiu, atingindo um adversário a soco e deixando a equipe de Portugal reduzida a dez durantemais demeio jogo. Mas obviamente que a culpa não é dele: a culpa só pode ser de quem, tendo por obrigação formá-lo como jogador, permite que ele continue assim e a representar Portugal.

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