sexta-feira, maio 13, 2005

Sem categoria (10 Maio 2005)

Nem um nem outro têm, no caso, razões válidas de queixa das arbitragens, mas, mesmo que as tivessem, sobra aquilo que todos vimos e uma vez mais: nem Benfica nem FC Porto mostraram ter categoria para ganhar este campeonato

1- Maisumajornada e mais uma vez a arbitragem utilizada como desculpa para novos tropeções dos candidatos ao título: pelo FC Porto, empate em Moreira de Cónegos, e, excepcionalmente, pelo Benfica, derrotado em Penafiel. Nem um nem outro têm, no caso, razões válidas de queixa, mas, mesmo que as tivessem, sobra aquilo que todos vimos e uma vez mais: nem Benfica nem FC Porto mostraram ter categoria para ganhar este campeonato. OBenfica tem uma equipa com dois, vá lá, três jogadores bons e nada mais. Não é por acaso que, das 18 vitórias no campeonato, doze foram à tangente. Quando não há manobras de Faro, nem expulsões dos adversários, nem erros cirúrgicos dos árbitros, o Benfica fica reduzido a dar o que pode e o que pode é muito pouco. Após Penafiel, o presidente do Benfica queixou-se de o árbitro ser... benfiquista e ter feito vista grossa a três penalties (!), razão da derrota. A crítica, todavia, apenas concede um eventual penalty e, mesmo esse, muito esforçado e nada conclusivo pelas imagens vistas. Em contrapartida, todos viram apenas meia oportunidade de golo construída pelo Benfica em todo o jogo e uma meia hora final verdadeiramente constrangente para quem se afirma candidato natural ao título. Luís Filipe Vieira não se importava de repetir um empate ou vitória por penalty ou penalties duvidosos, como sucedeu contra o Belenenses, na última jornada, e não só. Mas, depois, como se pode falar em justiça e transparência, se o futebol exibido não corresponde minimamente às vitórias registadas e pretendidas? OFC Porto, depois de uma época de «desconstrução científica», tem vivido essencialmente do génio de dois jogadores: Ricardo Quaresma e Vítor Baía — que, para grande desgosto de Scolari, continua, jogo após jogo e ano após ano, a mostrar que não há ninguém que lhe faça sombra em Portugal. De resto, tem alguns outros bons jogadores, que às vezes se esforçam ou estão inspirados e outras não, tem outros que não são maus mas não se esforçam e outros que se esforçam mas, coitados... Como de novo se viu contra o Moreirense, é uma equipa sem rotinas de ataque, incapaz demarcar mais do que um golo por jogo e que, com quatro jogadores de ataque que, todos juntos foram avaliados e pagos pela SAD em qualquer coisa como cinco ou seis milhões de contos, conseguem ser apenas o 10.º ataque da SuperLiga! Depois do Moreirense, Pinto da Costa queixou-se da falta de controlo anti-doping, Reinaldo Te les queixou-se do juiz de linha que expulsou Quaresma, por supostas palavras e que fora o mesmo que no Estoril inventara um penalty inexistente contra o Porto, e José Couceiro, para acabar, queixou-se das «coincidências» de ter ficado sem Fabiano e Quaresma para os jogos seguintes. Mas esqueceram-se todos de dizer que, mais uma vez, o FC Porto sofreu um golo no primeiro remate feito pelo adversário à baliza e que deu meia parte de avanço, antes de começar a pensar em recuperar os danos. E a isso, meus amigos, chama-se falta de atitude competitiva e falta de espírito de vitória. Não merecem.

2- Em contrapartida, mesmo sem grande brilhantismo e com alguma da sorte habitual à mistura (cada vez que a bola é cruzada para a pequena área do Ricardo é ummilagre não acabar dentro da baliza...), o Sporting voltou a dizer ontem à noite que tem os melhores jogadores, o melhor futebol e a melhor atitude competitiva. Creio que vai ser campeão, como sempre aqui vaticinei. Só me pesa aquele decisivo jogo de Alvalade, contra nove jogadores do FC Porto. Um jogo que foi consequência directa do Tordesilhas assinado entre os presidentes do Sporting e do Benfica e que foi consequentemente decidido por João Ferreira (viram como ele ajudou a decidir também, este domingo, a troca de posições, na luta pela despromoção, entre o Gondomar e o Chaves?).

3- Depois da derrota em Vila do Conde, com o Rio Ave, Petit queixou-se de que os adversários estariam «motivados» por fora — leia-se, pagos para ganhar ou empatar com o Benfica. A declaração só me surpreendeu pelo que ela contém de hipocrisia: toda a vida existiram prémios desses e até já houve uma época em que eles eram transparentemente públicos. Neste final de campeonato, seguramente que todos os candidatos ao título os estão a oferecer. Mas isso não é grave, grave seria haver prémios para perder jogos e não para ganhá-los. Lembrei-me disto depois de ver a atitude do Moreirense contra o FC Porto. Sabendo que só a vitória lhes interessava para não desceram de divisão, o que fizeram eles, depois de o FC Porto chegar ao empate? Continuaram a defender com todos, como se o empate fosse precioso, tiraram um jogador ofensivo e substituíram-no por um defensivo e assanharam-se a defender com unhas e dentes mesmo depois de o FC Porto ficar reduzido a 10. No final, entrevistado pela Sport TV, o jogador Nei declarou que o empate não era «de forma alguma uma desilusão» e que «se tivermos de descer, paciência! ». É assim a vida!

4- Também no Liverpool-Chelsea, a equipa de Mourinho consentiu umgolo no primeiro remate do adversário, passou meia parte a dormir e, quando quis ir atrás do prejuízo, faltou-lhe o tempo, faltou-lhe a sorte (que o Milan teve contra o PSV e que o Sporting teve em toda a eliminatória contra o AZ) e acabou por morrer com as mesmas armas com que costuma matar, às mãos de uma equipa que, em termos europeus, é perfeitamente banal. Foi um mau jogo de futebol, como já o havia sido em Londres e como é inevitável que aconteça quando se enfrentam duas equipas que, primeiro que tudo, jogam para não perder. E foi uma desilusão para o país inteiro, que agora venera Mourinho como nunca antes, quando ele era treinador do FC Porto. Para mim, foi uma desilusão particular — não a derrota, que adivinhei, mas a reacção de Mourinho à derrota. Também ele se atirou ao árbitro, por causa do «golo fantasma», que, todavia, pareceu mesmo golo. Mas esqueceu-se de dizer que o desfecho correcto daquela jogada era penalty e expulsão do guarda-redes do Chelsea—o que, muito possivelmente, acabaria por ser pior. Mas o que mais me impressionou foi a resposta que Mourinho deu a um jornalista inglês, no final do encontro. Primeiro, pelo inglês primário, quer de vocabulário quer de pronúncia, que eu não suspeitava que fosse o de um homem tão perfeccionista e que se iniciou no futebol exactamente como tradutor de inglês. Depois, pela resposta em si à pergunta se ainda se considerava «especial». Resposta textual: «Claro que sou especial. Não há dúvida alguma sobre isso. Você acha que tem hipóteses de ter o mesmo sucesso no seu trabalho que eu tive no meu, em três anos? Não tem hipótese nenhuma!» Já há tempos, fiquei siderado com uma afirmação dele em Israel, quando disse que um dia seria seleccionador nacional», mas quando eu quiser, não quando eles quiserem!». José Mourinho deveria parar um pouco para pensar. Não há nada mais inebriante do que o sucesso. Mas o sucesso rápido, ao contrário do que ele parece pensar, é mais fácil do que o sucesso continuado. Mais fácil de adquirir e mais fácil de perder.

5- Esta terça-feira, os promotores do «manifesto»—Dias da Cunha e Filipe Vieira — reúnem-se com quem quiser fazer de «compagnon de route» dos auto designados «moralizadores» do futebol português. Parece que vão discutir as arbitragens — «aquilo que os divide»—agora que as sequelas extrajudiciais e premeditadas do «Apito Dourado» lhes afastaram do caminho o concorrente que os unia: o FC Porto. Adorava ser mosca para lá estar. Deve ser uma conversa surreal: ambos desconfiam que o outro anda a influenciar as arbitragens, ambos desconfiam que o outro lhe quer roubar o título por debaixo da mesa, ambos acusam os árbitros semana sim, semana sim, mas, como começaram esta cruzada contra o «inimigo comum», que agora seria ridículo acusarem, acusam-se um ao outro por meias-palavras e insinuações que depois juram veementemente em nada pretender atingir as nobres intenções e a grande cumplicidade que os une. E isto tudo antes do decisivo Benfica-Sporting, onde é garantido que, no final, um deles, pelo menos, se irá queixar da arbitragem. De que falarão, então?

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