quinta-feira, fevereiro 17, 2005

O horizonte é vermelho (15 Fevereiro 2005

Só há dois jogadores que o Benfica tem razão de temer para o jogo do Dragão: o McCarthy, que marcou aquele golão na Luz, e o Ricardo Quaresma, que lhes roubou a Supertaça, com outro golaço. Do primeiro já se ocupou o CD da Liga. Do segundo, havendo o mínimo pretexto, alguém se vai ocupar daqui até lá.

1- Miguel Ribeiro Teles compreendeu o que Dias da Cunha não compreendeu: que, na sua ânsia de combater moinhos de vento, o presidente do Sporting acabou a selar um pacto contra o próprio inimigo por ele identificado— o tal de «sistema».

Em todas as 22 jornadas que a SuperLiga deste ano leva disputadas, o Benfica tem apenas uma eventual razão de queixa de um árbitro, e nem sequer se pode falar propriamente de um erro, mas de uma má visualização por parte do fiscal de linha: a célebre jogada contra o FC Porto, no jogo da Luz, em que a bola terá entrado por completo na baliza de Baía. E nada mais: todos os outros lances duvidosos ocorridos em jogos do Benfica, ao longo das restantes 21 jornadas, foram decididos a seu favor.

Quando Dias da Cunha se junta a Filipe Vieira para, entre outras coisas, reclamar da arbitragem, esquece que está a juntar-se ao maior beneficiário das arbitragens, esta época. E esquece-se que Benfica e Boavista — que, sem futebol para tal, são dois dos comandantes da SuperLiga — dominam de facto o «sistema», através do seu controlo a meias da Liga de Clubes e, correspondentemente, da arbitragem. E não apenas da arbitragem: também da disciplina. A ideia da introdução do castigo a jogadores a posteriori, através do vídeo e pela mão do Conselho de Disciplina da Liga, denuncia-se a si própria nos seus propósitos, através de uma simples leitura das estatísticas: dos 25 jogos de suspensão até agora aplicados pelo CD, doze foram-no a jogadores do FC Porto (incluo já a incrível e revoltante promessa de suspensão de Seitaridis por dois jogos, por pretensa agressão); dois contemplaram jogadores do Boavista e nenhum jogadores do Benfica (e, todavia, todos vimos, por exemplo, no jogo entre os dois clubes mandantes da Liga, o Petit a agredir com uma cotovelada o Tiago...). De todos os castigos aplicados, apenas os jogadores do FC Porto foram contemplados com mais de um jogo de suspensão — esticado, no caso mais recente do Mc Carthy, até três jogos, o suficiente para conseguir incluir o jogo contra o Benfica. A pergunta é simples: se quem domina a organização dos jogos, a arbitragem e a disciplina, não constitui o «sistema», o que é, afinal, o tal sistema de que tanto fala o presidente do Sporting?

Miguel Ribeiro Teles percebe infinitamente mais de futebol do que Dias da Cunha. Ele sabe que, para além do absurdo de o sistema ser dominado por quem está de fora e não por quem está dentro, não há sistema que possa transformar em campeão—e de Portugal, da Europa e do Mundo —uma equipa banal ou medíocre. E sabe que o FC Porto dos últimos anos nunca foi banal nem medíocre. Agora, o que a ele lhe deve parecer estranho é que o único dirigente de clube que anda a anunciar aos quatro ventos e desde o início da época que vai ser campeão e que até já tem a festa pensada, depois do último jogo (contra o Boavista, no Bessa...), é precisamente o presidente do Benfica — cuja equipa oscila entre o banal e o medíocre.

O que Miguel Ribeiro Teles percebeu e Dias da Cunha não, é que o pacto com o Benfica visou um adversário que neste momento, e devido à sua auto-implosão, tinha deixado de ser o inimigo a abater. E que, inversamente, levou o Sporting a entregar-se na boca do lobo. E, enquanto Dias da Cunha ficou muito contente porque julga ter neutralizado Pinto da Costa, Filipe Vieira ficou ainda mais contente porque neutralizou ambos e, ainda para mais, viu-se elevado à condição de parceiro moralizador na luta contra o «sistema»—ele, que declarou ser mais importante ganhar a Liga do que ter uma boa equipa de futebol.

2- Há vários anos que venho aqui insurgindo-me contra o CD da Liga e a sua reiterada actuação indisfarçadamente clubista. Este é um órgão, supostamente de justiça, cujas decisões são sistematicamente desautorizadas por outro órgão superior, o Conselho de Justiça, sem que esse facto leve os seus membros, como seria normal, a reverem o seu critério e a terem algum pudor e algum resquício de isenção. Este é o órgão que, no ano passado, numa decisão contra o Deco, chegou ao ponto de escrever que ele era «iníquo e indigno» — e hoje o Deco é universalmente tido como um dos melhores jogadores do Mundo, continuando, mesmo sendo apenas português naturalizado e a viver no estrangeiro, a dar o seu contributo voluntário à Selecção de Portugal. Ao contrário, quem se atreveria a apresentar o CD da Liga como órgão representativo do que de melhor há na justiça portuguesa? Só por anedota. Há muitos anos que o Conselho Superior da Magistratura vem pedindo aos juízes de carreira que se afastem do futebol, onde a sua actuação só tem servido para desprestigiar a magistratura. Eles fazem orelhas moucas mas, apesar de tudo, seria de esperar que não esticassem a corda até ao ponto de se mostrarem autores de uma paródia de justiça que, antes de mais, os enxovalha a si próprios. Esta sentença sobre o McCarthy ultrapassou todos os limites aceitáveis. Primeiro, a esperteza saloia, feita à vista de todos, de protelar a decisão durante quatorze dias, o suficiente para ela poder abranger o Porto-Benfica. Depois, a violação de um princípio universal da justiça penal — seja criminal, fiscal ou desportiva — que qualquer aluno de um 1.º ano de uma Faculdade de Direito conheçe e que estabelece que nenhuma pena poderá ser agravada se apenas o condenado recorreu dela. Conscientes de que o histórico da sua actuação mostra exuberantemente uma justiça selectiva dirigida contra o FC Porto, e desejosos de evitarem que o clube continue a apelar para o Conselho de Justiça que, uma a uma, vai desautorizando e desmascarando o sentido das sentenças do CD, os tristes membros deste órgão resolveram agora inventar um sistema que iniba o clube, no futuro, de recorrer das suas decisões. «Se recorres, agravamos-te préviamente a pena» — eis a mensagem passada por eles. Acontecesse isto com o Benfica, o Sporting ou o Boavista, e o que não iria por aí de escândalo e gritaria!

3- Nesta triste versão do FC Porto pós-Mourinho, só há dois jogadores que o Benfica tem razão de temer para o jogo do Dragão: o Mc Carthy, que marcou aquele golão na Luz, e o Ricardo Quaresma, que lhes roubou a Supertaça, com outro golaço. Do primeiro já se ocupou o CD da Liga. Do segundo, havendo o mínimo pretexto, alguém se vai ocupar daqui até lá: ou o árbitro do Restelo, no próximo sábado, ou o CD, posteriormente.

4- E esta triste versão do FC Porto pós-Mourinho também não merece o 1.º lugar que ocupa, de parceria com mais três (como vêem, a clubite não me cega...). Este domingo, bastaram-me os dois primeiros minutos de jogo contra o Guimarães (gastos com a bola a circular entre os centrais, os laterais e os trincos, jogando para trás, sem pressas, sem ideias e a medo), para confirmar que estamos perante o pior FC Porto desde há muito tempo. E, para além dos erros de «casting » com os treinadores, a grande razão do insucesso é que a equipe, pura e simplesmente, não presta. Dos quatorze jogadores(!) comprados esta época, apenas um —o Ricardo Quaresma—tem valor para a equipa. Todos os outros não caberiam em nenhuma equipe até ao 8.º lugar da SuperLiga. O Fabiano, o Diego, o Postiga, o Leo Lima, o Leandro, o Cláudio P., o Raul Meireles, etc. etc., são tudo jogadores para esquecer, sendo que não podem ser despedidos e o seu destino natural é transformarem-se num encargo sem retorno para o clube nos próximos três ou quatro anos. Os ditos «empresários», que sempre voltearam à roda do F C Porto, sobretudo quando lhes cheira a dinheiro fresco, devem ter-se fartado de facturar este ano. Mas o clube está tramado: gastou uma fortuna a renovar a equipa e falhou em toda a linha. E, de cada vez que tentou emendar a mão, foi pior a asneira. Dá que pensar que o F C Porto não se tenha lembrado de ir buscar o Nuno Assis ou o Jorginho, que estavam ali à espera de quem lhes deitasse a mão, e que se tenha lembrado de deitar fora o Carlos Alberto e o Rossato e de emprestar o Hugo Almeida ao Boavista, para se atestar de brasileiros sem categoria nem espírito de combatividade. Se os nossos adversários tivessem congeminado a maneira de liquidar a grande equipa que o F C Porto tinha, não teriam conseguido melhor.

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