terça-feira, dezembro 11, 2012

PARA QUÊ ESPERAR MAIS? (22 NOVEMBRO 2011)

1- Eu em Natal, no Brasil, num festival literário, e o meu filho em Bolonha, Itália, num semestre de estudo. Veio dele uma primeira mensagem: «Estamos a perder 1-0 com a Académica a 20 minutos do fim e o James continua no banco.» Perguntei: «Estamos a jogar com a reserva?» Respondeu que não, «são os titulares» e, menos de meia hora depois, nova mensagem: «Perdemos 3-0. Que mais será preciso para mandar embora o Vítor Pereira?» Dez minutos a seguir, telefonaram do JN: andavam a fazer uma mini sondagem pelos adeptos portistas para saber que destino preconizavam para Vítor Pereira.

Bem, comigo, enganaram-se, com certeza: há mais de um mês que aqui escrevi que «com Vítor Pereira, o FC Porto não vai a lado nenhum». Foi a seguir ao desastre de S. Petersburgo, contra o Zenit, quando não me restaram mais dúvidas de que ele não fazia a mais pequena ideia do que era dirigir uma equipa como o FC Porto e só por acidente circunstancial é que estava sentado naquele banco. Depois disso, veio o empate caseiro com o APOEL e a impensável derrota em Chipre, apenas para confirmar aquilo que entrava pelos olhos adentro de cada um. E veio novo empate em Olhão, em mais um jogo de uma pobreza franciscana.

A pergunta que me interessa não é a de saber se Vítor Pereira se deve ir embora. Essa é pergunta para fazer aos portistas que ainda alimentaram ilusões, não a mim, que há muito as perdi. A única pergunta que me interessa, de facto, é a do meu filho: que mais será preciso para Pinto da Costa acordar da sua letargia e convencer-se de que não há milagres e que, como aqui escrevi há quinze dias, é preciso pôr termo a esta agonia de uma grande equipa, antes que as coisas se tornem realmente feias? Que mais falta ainda provar? Que mais oportunidades desperdiçadas lhe serão concedidas? Que outras demonstrações de incompetência para a função serão ainda necessárias? O que falta - ser afastado da Liga dos Campeões, ser ultrapassado por Sporting e Benfica, ser eliminado também daquela coisa da Taça da Liga? Para já, saímos da Taça de Portugal ao segundo jogo e à primeira dificuldade encontrada. Ficámos impedidos de defender com um pouco mais de brio e de honra um título que nos pertencia há três anos e gentilmente entrámos para a galeria das grandes memórias da Académica e ajudámos a cimentar a carreira nascente do treinador portista Pedro Emanuel. Já tínhamos também ajudado o APOEL o Feirense e o Olhanense a fazerem história. Tanta generosidade já começa a irritar: não tarda nada, já ninguém respeita esta equipa que por aí anda arrastando o nome e as camisolas do FC Porto.

Como escrevi há um mês, eu acho que o grande problema de Vítor Pereira nem é o que ele vai perder, é o que vai estragar. Se não for rápidamente desmobilizado, ele vai conseguir estragar uma grande equipa, que lhe caiu do céu em herança. Este é o treinador que acha que o Varela (e até o Cristian Rodriguez!) é melhor que o James; o treinador que ainda não percebeu que o Rolando tem de sair rapidamente da equipa porque já são incontáveis os golos causados por erros dele (e foi preciso o Moutinho explicar-lhe que também estava a precisar de estagiar no banco, para ele perceber}; o treinador que desdenhou promessas como o Kelvin e o Christian Atsu e que mantém o Iturbe no congelador; o treinador que achou que um ponta de lança imberbe chegava para disputar a fase de grupos da Champions; o estratega que não acerta uma substituição e que nos momentos de aperto é brifado pelo adjunto, que veio da terceira divisão; o estudioso que descobriu que a passagem rápida da defesa para o ataque não convinha ao «futebol de posse de bola» que queria implementar; o inconsciente que, depois de um jogo em Chipre em que viu a equipa criar apenas uma oportunidade de golo (e de penalty inexistente), conseguiu declarar que tinham jogado «à Porto»; o cego, que vai culpando a equipa pelas sucessivas decepções, recusando-se a encarar o facto de que a equipa é ele que a faz... ou que desfaz.

Enfim, não adianta dizer mais nada. Repito que a culpa não é sequer de Vítor Pereira: ele faz o que pode e sabe. O problema é que isso, obviamente, não chega, nem chegará nunca. A culpa também não é de Pinto da Costa, que também fez o que pôde nas circunstãncias que teve de enfrentar. A culpa é apenas e só do Dragão de Ouro André Villas Boas e da sua deserção - que eu, ao que parece sozinho, não perdoei nem perdoo. Mas, a partir daqui, a continuidade de Vítor Pereira até ao desastre total e absoluto é apenas decisão do presidente. «Quem sabe, faz a hora, não espera acontecer», como escreveu o Gerardo Vandrei e cantava a Simone, em pleno período de nevoeiro da ditadura militar brasileira.

2- No Brasil, justamente, a presidente Dilma Rousse honrou uma das suas promessas eleitorais e fez aprovar e instalar a Comissão da Verdade e Reconciliação, para trazer a lume grande parte da história, ainda escondida, dos crimes da ditadura militar, instaurada em 1964 e terminada com Tancredo Neves e As Directas Já! Há, pelo menos, 500 mortos sem sepultura, 500 famílias de antigos resistentes à ditadura que não sabem sequer como é que os seus filhos ou pais, ou filhas ou mães e mulheres, morreram e quando e às mãos de quem. E claro, que os militares não gostaram nada da ideia: dizem que ofende a honra militar. Como se não tivessem sido eles próprios quem ofendeu a honra militar, derrubando um governo legítimo e instalando uma ditadura sanguinária e criminosa!

Pois, no Brasil, segui mais de perto esta ponta final do Brasileirão. Depois de um disputadíssimo campeonato que, até seis jornadas do fim, tinha cinco candidatos em disputa pelo título — o meu Corinthians, mais um quarteto caríoca formado pelos renascidos Vasco e Botafogo, vindos da segunda divisão, o Fla, campeão há dois anos, e o Flu, campeão em título - agora, a três jornadas do fim, tem aparentemente a luta resumida a dois: o Corinthians e o Vasco da Gama, o clube português do Rio (o de São Paulo é a Portuguesa dos Desportos, que, depois de longa travessia do deserto, acaba de assegurar o regresso ao escalão principal, na sequência de uma brilhante conquista do título da 2' Divisão). Arredados do título estão o Flamengo (onde Ronaldinho Gaúcho, mais preocupado com as memoráveis farras na sua vivenda da Barra da Tijuca do que com o trabalho diário, é vaiado pelos adeptos), o Fluminense e o Botafogo. A esses três juntam-se, na luta pelo chamado G-5 (os lugares que dão acesso à Taça Intercontinental), o surpreendente Figueirense e, vindo lá de baixo, o São Paulo (onde um regressado Luís Fabiano, autor de quatro golos nos úllimos dois jogos, nem parece o mesmo que em 2004 era suplente do FC Porto) e o Internacional, de Porto Alegre. Vi o jogo de sábado passado, no São Januário, entre o Vasco e o Avaí: um, lutando pela renovação de um título que conquistou pela última vez em 97, o outro, lutando para sair do último lugar da classificação e reduzido a dez jogadores desde o minuto 20. Mesmo assim, o Vasco só chegou ao golo após uma hora de jogo - um grande golo do veterano Felipe, um número dez cruzado com onze, que forma a coluna mais ofensiva, juntamente com Éder Luís, Fágner e Diego Sousa (assistidos por um Juninho Pernambucano, que nós conhecemos). E só chegou ao golo então, porque na baliza do Avaí estreava-se um guarda-redes que, antes disso, evitou uns cinco golos e foi o melhor em campo. Sabem quem? Pois, o tão controverso Moretto, ex-Benfica. de regresso ao futebol brasileiro após nove anos de transumância. Outro benfiquista a dar nas vistas nesta jornada foi Felipe Menezes, autor de um hat trick na vitória do Ceará na sua difícil deslocação ao outro extremo do Brasil, o Rio Grande do Sul, para defrontar o Grémio (décimo golo de Felipe Menezes no campeonato). E vi também o muito esperado jogo de Florianópolis, entre o sensacional Figueirense e o aristocrático Fluminense: com o Deco em grande forma e o centro-avante Fred inspiradíssimo, o Flu destroçou o Figueirense, cimentou o 3.° lugar e, teoricamente, ainda está na luta pela revalidação do título que ostenta. E muito mais haveria para contar sobre este empolgante campeonato brasileíro, se Vítor Pereira não me tivesse estragado o fim de semana futebolíslico.

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