1- Um fim-de-semana sem futebol a sério é como ir à praia sem sol, comer num bom restaurante e depois não poder acender um charuto, ser sacudido e enjoado no Alfa Pendular e nem ao menos poder fumar um cigarrito durante as duas horas e quarenta minutos que dura a viagem Lisboa-Porto. Este fim-de-semana, para agravar as coisas, ao mesmo tempo que descobri que o Chaves-FC Porto não era transmitido pela televisão, descobri também que não tinha um simples rádio em casa. E assim fiquei duas horas sem saber de nada, até que a internet me trouxe, a seco, a feliz notícia: por uma vez, a segunda linha azul-e -branca tinha cumprido os mínimos e lá havia ultrapassado o Chaves na Taça de Portugal. Depois, li nos jornais que nem toda a segunda linha do FC Porto tinha estado à altura das responsabilidades que aquela lindíssima camisola exige. Consta, nomeadamente, que João Paulo e Lino se encarregaram de adensar o mistério das suas contratações e que Mariano Gonzalez voltou a arrastar o seu imenso talento pelo campo, com aquele seu jeito de quem tem um conflito sem solução com a bola. Melhor fez o Stepanov, que se mantém prudentemente «tocado», e o Farías, que arranjou maneira de se magoar num treino antes do jogo, de modo a não estragar a sua média de cerca de uma hora de jogo por cada seis meses e em troca de alguns 75.000 euros mensais.
2- Estes «reforços» portistas do Verão de 2007 fazem-me lembrar, pelo exemplo contrário, o mais extraordinário profissional estrangeiro que alguma vez vi jogar de azul-e-branco. Chamava-se Teófilo Cubillas, peruano comprado a preço de saldo ao Basileia, da Suíça, algures aí por meados dos anos 70 do século passado, e que era um príncipe e um profissional de eleição, dentro e fora do campo. Um número dez completo: defendia, organizava, atacava; fintava, passava, desmarcava, rematava e marcava. A ele devo o mais bonito golo que vi marcar ao vivo, num estádio: foi na Tapadinha, para o campeonato, quando ele arrancou com a bola a meio campo, deu três toques nela e fez duas simulações, até acabar cara-a-cara com o guarda-redes e com cinco adversários fintados e caídos no relvado. Então, quando se esperava que ele fuzilasse a baliza do Atlético, Cubillas marcou como se estivesse a cobrar um penalty em grande estilo: uma finta de corpo e guarda-redes caído para um lado e a bola a entrar suavemente pelo outro. Lembro-me que se fez um imenso silêncio no velho campo da Tapadinha e os primeiros a reagir foram os próprios jogadores do Atlético, que começaram a bater-lhe palmas. Em Alvalade vi-o marcar outro golo fantástico: sempre a direito, fintou três jogadores do Sporting e, no fim, o guarda-redes; mas, entretanto, estava na linha do fundo e sem ângulo para visar a baliza nem companheiro desmarcado a quem passar a bola; então, lançou-se no percurso inverso, desatando a fintar outra vez os mesmos até chegar à marca de penalty, voltar a virar-se para a baliza e daí fuzilar então as redes sportinguistas.
Recordo este último golo ainda por duas outras razões. A primeira é que, apesar do golo, que colocou o FC Porto a ganhar por 1-0 em Alvalade, o resultado final acabou em 5-1 a favor do Sporting! E a segunda razão é que esse jogo assinalou a minha primeira e única incursão no jornalismo desportivo, enquanto repórter. Jovem estagiário num jornal diário, eu tinha sido mandado substituir um colega da secção desportiva que tinha tido um impedimento de última hora. Radiante por ter oportunidade de ver o meu FC Porto à borla, parece que não estive à altura das circunstâncias: o meu relato do jogo foi julgado de tal maneira distorcido, digamos, que fui para sempre dispensado de fazer «ganchos» daqueles — com a minha inteira concordância, aliás.
Mas, voltando ao Cubillas, ele não era apenas o homem dos grandes golos e a estrela da equipa portista naqueles anos. Ele era ainda um profissional exemplar, correctíssimo e cavalheiro dentro do campo, simpático e simples fora dele, tão dedicado ao clube que lhe pagava que, em dois anos e meio com a camisola do FC Porto, não falhou um único jogo, fosse por castigo ou por lesão.
3- E já que não há actualidade suficiente com que me ocupar e prosseguindo nesta linha de revivalismo portista, lembrei-me de pensar quem foram os melhores estrangeiros que vi jogar pelo FC Porto. E depois de muito pensar, eis a minha lista:
1 – Madjer
2 – Cubillas
3 – Jardel
4 – Aloísio
5 – Kostadinov
6 – Drulovic
7 – Branco
8 – Geraldão
9 – Derlei
10 – Anderson
Qual seria, então, o onze ideal de sempre de estrangeiros que actuaram pelo FC Porto? Aí vai a minha escolha:
— Na baliza, o Mlynarzick — aliás, não me lembro de mais nenhum bom, apenas da série de desastres retumbantes, quando se tratou de preencher o lugar do Baía, saído para o Barcelona. Na defesa, tivemos quatro grandes centrais: o Geraldão, o Aloísio, o Demol e, recentemente, o Pepe; um grande defesa-esquerdo, que foi o Branco; e nenhum defesa-direito — terei, pois, de escolher uma defesa só com três elementos. No meio-campo está a dificuldade maior: dois grandes «trincos», o Doriva e o Emerson; dois bons médios-direitos, o Duda e o Ademir; e vários excelentes médios-esquerdos, «números dez»: o Cubillas, o Deco, o Anderson, o Carlos Alberto. Enfim, no ataque, para além do «rei» Mário, que reina sem rival no lugar fulcral, tivemos dois génios à direita, o Madjer e o Kostadinov, e dois grandes jogadores à esquerda, o Drulovic e o Derlei. Cozinhando tudo isto, com as necessárias alterações, eis a equipa de sonho escalada com os imortais que vieram de fora para honrar a camisola azul e branca:
Que tal, portistas? Até fazíamos mais um estádio para os ver jogar juntos!
4- Entretanto, é preciso descer do sonho à realidade. E a realidade é que esta noite, no Dragão, o FC Porto não pode deixar escapar a possibilidade de ouro, não apenas de seguir para os oitavos-de-final da Champions, mas também de segurar o primeiro lugar e dar já meio passo… para os «quartos». Para isso, é necessário não jogar para o empate, mas sempre para a vitória. Até porque, deixando arrastar o empate ao longo do jogo, à medida que este for caminhando para o final, os jogadores vão começar a enervar-se, sabendo que o Besiktas precisa da vitória e que a derrota significa para o FC Porto até a possibilidade de nem à UEFA ir.
A equipa não tem nada que saber: Bosingwa, Pedro Emanuel, Bruno Alves e Fucile; Paulo Assunção, Raul Meireles e Lucho; Quaresma, Lisandro e Tarik. A única coisa diferente de Jesualdo Ferreira que eu faria era dar a baliza ao Nuno e não ao Helton.
E vamos lá então transformar este sonho em realidade!
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