sexta-feira, novembro 16, 2007

O HOMEM RESOLVE (06 NOVEMBRO 2007)

1- Fabuloso Liedson: entre Fátima e Alvalade, entre quarta-feira e domingo, ele sozinho fez esquecer a anunciada crise do Sporting. Em ambos os jogos, o Sporting foi inferior, enquanto equipa, ao seu adversário e podia muito bem ter perdido ambos, não fosse essa serpente venenosa à solta, que tanto saca golos monumentais em remates inesperados, como se introduz na mais pacífica das jogadas alheias para semear o pânico e acabar por sacar um penalty ou um golo de onde, aparentemente, não haveria perigo algum. Já o disse antes e repito-o: Liedson e Quaresma são os únicos grandes jogadores que restam na Liga portuguesa, para além do caso especial de Rui Costa.

Para ser também um dos grandes pontas-de-lança de referência do futebol europeu, só falta a Liedson impor-se exactamente nos jogos europeus, o que até aqui não tem conseguido. Amanhã à noite, contra a Roma, o Sporting bem precisa que o seu talento à solta esteja em campo contra os italianos, porque apenas uma vitória manterá os verdes na luta pela qualificação e poderá significar o fim da tal crise.

2- O FC Porto, recebendo o Marselha, está em melhor posição: um empate, até mesmo uma derrota, não significa logo o fim de todas as esperanças. Mas uma vitória projectará a equipa para o primeiro lugar do grupo e com a qualificação praticamente garantida. Lucho Gonzalez vai fazer muita falta, pois que com ele sucede o contrário de Liedson: muitas vezes apagado nos despiques internos, às vezes mesmo totalmente ausente do jogo, ele emerge, como se tivesse estado a hibernar, nos grandes jogos europeus. Em Marselha, dos 28 jogadores que passaram pelo jogo, foi ele quem mais correu: quatorze quilómetros. E não correu à toa, correu sim ao seu melhor nível, com aqueles passes que rasgam uma defesa inteira e subitamente abrem clareiras junto à área adversária.

Ao FC Porto falta o que o Sporting tem em grande estilo: um ponta-de-lança a sério. Pese à sensacional época do «goleador» Lisandro, e por mais que o próprio se reinvindique como tal, ele não é um ponta-de-lança de criação natural. Está nessas funções porque nenhum dos muitos outros — Adriano, Postiga, Farias, Édgar, Rui Pedro, Bruno Morais, mais uma série deles emprestados — conseguiu até à data destacar-se de uma mediania não aceitável num campeão nacional. O campeonato está, aliás, cheio de pontas-de-lança bem melhores do que qualquer um da colecção ao dispor do campeão nacional. Enfim, o eterno mistério das compras de Verão…

Entretanto, esta surpreendente equipa-fixa de Jesualdo Ferreira, que tantas vezes tem ganho esta época sem jogar bem, voltou agora a ceder um empate jogando bem — como já havia sucedido em Marselha. No deslize caseiro contra o Belenenses, que interrompeu aquela impressionante série de vitórias no campeonato, não encontrei razão alguma para criticar a exibição da equipa. Do princípio ao fim do jogo, o FC Porto lutou infatigavelmente pela vitória, face a um Belenenses que se fechou e defendeu muito bem, mas que pouco atacou com perigo, sobretudo na segunda parte. Houve também «casos do jogo», mas não foi por aí que o FC Porto viu fugir-lhe a vitória. O primeiro golo dos portistas, e único que valeu, é claramente offside; mas nem o segundo nem o terceiro, ambos anulados, o são. Mas todos resultam de jogadas muito rápidas e com decisões às vezes ao centímetro e que não são humanamente cobráveis à arbitragem. Entendo que, nestes casos, não é legítimo queixas da arbitragem, mas, quanto muito, apenas da pouca sorte. E o resumo do jogo, tal como o vi, é esse: o Belenenses teve mérito no empate que sacou, mas, com um pouco de sorte, o FC Porto teria ganho e também com justiça. Não há crise. Até porque…

3- …Porque o Benfica, por exemplo, que segue no segundo lugar, demonstra, jogo após jogo, que só por acaso ou por sorte ocupa tal posição: há várias equipas classificadas abaixo bem melhores do que o Benfica. Não têm é a sorte de vencer todos os jogos à tangente e nos últimos instantes ou não têm também o seu Bruno Paixão para, citando o relato de A BOLA, «empurrar os pacenses para a sua área de forma habilidosa e digna de compêndio», terminando por transformar um empate em vitória e assegurar aos encarnados a tão desejada recuperação de dois pontos para o FC Porto. Este Bruno Paixão, aliás, é sempre mais do mesmo, já não surpreende ninguém. A bem dizer, só surpreendeu mesmo quando, logo no início da sua carreira no topo, assinou aquela inesquecível arbitragem no Campomaiorense-FC Porto. Logo aí, quem manda na arbitragem, percebeu que só tinha uma de duas soluções: ou acabar com a carreira dele imediatamente ou fazer à portuguesa, deixando-o tranquilamente em paz para ir progredindo por antiguidade, independentemente do mérito e da credibilidade. Escolhido o segundo caminho, muito «Apito Dourado» e muita «Corrupção» depois, ele aí está, impune a tudo, caminhando tranquilamente até à reforma. Que se há-de fazer, se vivemos a época da «transparência» e da «regeneração»?

4- Tal como havia previsto, os jogadores do Braga, depois de muito se esforçarem, acabaram por mandar o seu treinador para o desemprego. Tanta displicência em campo, tanta falta de humildade e de atitude, só podiam conduzir a maus resultados. E já se sabe que, quando os resultados são maus, paga o treinador, quer tenha culpa, quer não — porque o presidente é irresponsável por natureza e os jogadores estão defendidos por contratos de trabalho que não os obrigam a correr nem a esforçar-se. Completamente à toa, o presidente António Salvador despede treinadores como quem muda de camisa, põe espiões a vigiar os hábitos nocturnos dos jogadores, muda os horários dos treinos e os dias de folga. Enfim, trata os jogadores como meninos mal comportados, ao mesmo tempo que, contraditoriamente, responsabiliza o treinador. E, no fim, ainda tem talento para se dedicar àquela estafada rábula do «segurem-me senão eu saio!», tão típica dos presidentes que se acham insubstituíveis.

Que um tipo queira ser jogador de futebol, eu percebo muito bem. Também percebo que queira ser treinador — todos quereríamos sê-lo de vez em quando. Mas um dia ainda me explicarão esse fascínio por ser dirigente do futebol — e logo do futebol português. Porque há-de alguém, excepto pontualmente e com espírito de missão e de sacrifício ditados por paixão clubística, querer dirigir clubes arruinados, aturar os caprichos de jogadores que se acham vedetas aos 18 anos, de «empresários»que não dão tréguas e adeptos que passam as horas de trabalho da semana plantados à porta dos centros de treino ou dos estádios a insultar tudo e todos, quando as coisas correm mal? A única explicação que vejo para esta estranha atracção pelo poder é o desejo de dar nas vistas e se transformarem em «figuras públicas» de audiência nacional. Deve ser isso que explica também a quantidade de novos-ricos emergentes que, mal chegam a presidentes de clube e vêem os holofotes e os microfones estendidos para eles, se tomam por gente importante e invejável. Mas que vocação!

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