domingo, outubro 14, 2007

UM POUCO MAIS DE AZUL...( 09 Outubro 2007)

O FC Porto vai com mais cinco pontos do que ia no ano passado por esta altura e já ganhou três jogos que perdeu em 2006. Isso é um facto incontornável e louvável. Mas também é facto que joga muito pior futebol, muito menos seguro, muito menos denominador, do que jogava na última época.


Que dizer deste surpreendente FC Porto, que joga um futebol incapaz de entusiasmar o adepto mais fácil e, todavia, segue, imperial, com sete vitórias em sete jogos do campeonato e bem lançado na Liga dos Campeões? Alguns jornalistas, daquela escola dos que estão sempre prontos para fazer rapapés aos treinadores e dirigentes, andam para aí a lançar piadas contra os «adeptos críticos» a quem os factos e as vitórias desmentirão todos os dias, e o próprio presidente Pinto da Costa lança indirectas, supostamente irónicas e sábias, aos «críticos», na revista do clube. E, todavia…

Todavia eu mantenho a substância das minhas críticas: a onda de aquisições (doze!) para a nova temporada foi um desastre. À excepção de Leandro Lima e Stepanov, que, com trabalho e oportunidades, ainda podem justificar o investimento, todos os outros não têm, à vista desarmada, qualquer valor que chegue para jogar no FC Porto e justificar os cerca de 15 milhões de euros gastos em compras, durante o mês de Julho. Pelo que, estes surpreendentes resultados vêm sendo obtidos com a mesma equipa que no ano passado foi campeã com um ponto de avanço sobre o Sporting — só que desfalcada «apenas» do Pepe, do Anderson e de outros, como o Ibson, o Alan ou o Vierinha. Só um milagre fará com que esta curta manta dê para as necessidades da época que, como se sabe, são as mesmas de sempre: ser campeão e chegar, pelo menos, à primeira eliminatória da Liga dos Campeões.

Contrariando a minha oposição de princípio à política de compras por atacado que é uma imagem de marca desta direcção, penso que o FC Porto, se quiser lutar a sério pelos seus objectivos habituais, tem de ir às compras em Janeiro. Mas, depois de ter visto o Sporting-Guimarães deste sábado, o que eu faria, para já, até teria custo zero: ir buscar dois jogadores que já são nossos. Um, é o Alan, que nunca deveria ter saído, porque é francamente melhor que, por exemplo, o Tarik ou o Mariano González; o outro é o jovem Rabiola, comprado ao Vitória de Guimarães e lá deixado por empréstimo, com o FC Porto a pagar a totalidade dos seus salários (porque não propusemos ao Manchester uma operação destas, mas ao contrário, em relação ao Anderson?). Jesualdo é que sabe porque escolheu quem escolheu e porque desprezou quem desprezou. Mas, face à fraqueza pungente dos reforços adquiridos, faz impressão ver tantos jogadores do FC Porto, francamente melhores, a brilhar noutros clubes, como o Vitória de Guimarães, o Setúbal, o Leixões ou a Académica. E nós a pagar os ordenados para os ver jogar pelos outros e a pagar os ordenados dos «reforços» para os ver jogar na bancada…

Por isso, quando os tais jornalistas de que acima falei, escrevem, muito diligentes, que Jesualdo calou os críticos que o acusavam de jogar sempre com a mesma equipa e nunca apostar nos reforços, eles «esquecem-se» do resto da história: é que os críticos não sabiam, ao contrário de Jesualdo, que os reforços eram tão fraquinhos. Faltava vê-los jogar. E, agora que os vimos, é óbvio que a única pergunta pertinente é esta: porque razão Jesualdo os quis ou deixou que lhos impingissem?

Essa é uma questão. A outra questão é a qualidade do futebol praticado e à vista de todos. O FC Porto vai com mais cinco pontos do que ia no ano passado por esta altura e já ganhou três jogos que perdeu em 2006. Isso é um facto incontornável e louvável. Mas também é facto que joga muito pior futebol, muito menos seguro, muito menos denominador, do que jogava na última época. No ano passado, por esta altura, estava eu aqui a elogiar, sem reticências, o futebol azul-e-branco; este ano, tirando o jogo de Braga, logo na primeira jornada, não vi motivos para qualquer entusiasmo. Eu sei que os campeões se fazem também ganhando jogos mal jogados; mas, independentemente dessas sete vitórias que aí estão, não acredito que se possa ser campeão sem nunca jogar francamente bem — apenas com atitude competitiva e cultura de vitória, que essas, felizmente, continuam a ser a imagem de marca das sucessivas equipes do FC Porto.

Há dias, por acaso, passei pela RTP-Memória e revi um célebre Milan-FC Porto, para a Liga dos Campeões, em 1987, onde Jardel fez a sua aparição retumbante na primeira linha da equipa, marcando dois golos que fizeram o FC Porto sair de San Siro com a vitória por 3-2. Era treinador António Oliveira (um dia explicarei porque entendo que ele foi um dos melhores treinadores que passaram pelo clube), e, só para se ter uma ideia da diferença de talentos entre essa equipa de então e a de hoje, atente-se no quadro de jogadores que Oliveira tinha à sua disposição, apenas no meio-campo e no ataque. No meio-campo, ele jogou com Sérgio Conceição, Barroso, Paulinho Santos e Zahovic; no ataque fez alinhar Edmilson e Artur. Depois, com aquela fantástica capacidade que ele tinha para fazer as substituições certas no momento certo, fez entrar Jardel, Rui Barros e Drulovic. E ainda deixou de fora, por lesão, Domingos! E o Milan, onde pontificavam jogadores como Maldini, Pannuci, Ambrozini, Marco Simone, Raizinger, Davids, George Weah, Desailly, Albertini, Boban e Roberto Baggio, levou uma lição de bola do Porto! Mas, a verdade é que, da actual equipa do Porto, apenas Ricardo Quaresma teria lugar naquele onze de Oliveira. E vale a pena recordar o comentário final de António Oliveira: «Como viram, ao contrário do que gosta de dizer a imprensa portuguesa, não foi preciso a ajuda do árbitro para ganharmos ao Milan, em San Siro». Já lá vão vinte anos desta lengalenga…

É por causa da memória destas coisas que o público do FC Porto é o mais exigente e o melhor público de futebol em Portugal — uma coisa tem que ver com a outra. Quem não está habituado ou se desabituou das grandes jornadas europeias, das grandes equipas e do grande talento, quer é ganhar de qualquer maneira — como sucede em Alvalade frequentemente, e na Luz, bastantes vezes. No Dragão é diferente: no Dragão queremos as vitórias, mas queremos também o grande futebol. Por isso, é que a ganhar por 1-0 a um inofensivo Boavista e mesmo na véspera de um jogo europeu decisivo na Turquia, o público do Dragão é capaz de assobiar a equipa, porque não está satisfeito com o espectáculo. No FC Porto é fácil ser treinador, por um lado, mas é difícil, por outro. É fácil, porque naquele clube tudo está pensado e organizado para triunfar e a cabina tresanda a ambição de vitória. Mas é difícil, porque ali não é possível pedir tempo aos adeptos nem viver com a desculpa de que são os árbitros que não nos deixam ganhar. E, para além das vitórias, nós queremos espectáculo, golos, futebol.

É por isso, podem crer, senhores jornalistas compreensivos e senhor presidente avesso a críticas, que eu tenho a certeza de que, apesar das sete vitórias e do alívio de Istambul, ninguém se sente ainda tranquilo nem satisfeito e a maior parte de nós continua a pensar, por exemplo, que não ter forçado a vitória contra o Liverpool foi uma oportunidade perdida (até porque o segundo lugar no grupo significa quase sempre a eliminação nos dezasseis avos-finais, às mãos de um «tubarão»).

E é por isso que o FC Porto tem de ir ou banco dos emprestados ou às compras, em Dezembro. Porque os golpes de génio do Quaresma ou os ocasionais flashes europeus do Lucho não vão chegar para as encomendas todas. Precisamos de mais um central de categoria, de dois médios criativos de ataque, de um extremo-direito e de um verdadeiro ponta-de-lança. É muita coisa. Pois é: foi uma pena ter desprezado o que nos dava jeito e ter ido buscar o que não precisávamos.

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