1- Wimbledon chegou ao fim com a final esperada, a partir do momento em que Federer e Nadal se despediram prematuramente. Foi uma final disputada sob um calor tórrido e, talvez por isso, jogada a um ritmo lento e essencialmente defensivo. Djokovíc esteve quase irreconhecível, cometendo erros não forcados em catadupa, e Murray praticamente limitou-se a tirar partido disso e de uma arbitragem que varias vezes o favoreceu. A este nível de ténis estratosférico, foi uma das mais fracas finais de que me lembro. E para a história ficará que um britânico (não confundir com um inglês) conseguiu suceder a Fred Perry, 77 anos depois.
2- O grande espectáculo televisivo de Wimbledon é agora substituído pelo grande espectáculo televisivo do Tour de France, em 100ª edição. O espectáculo é fabuloso, há um português entre os dez primeiros, mas a mim, pessoalmente, não me diz nada: já sei que o mais provável é os da frente estarem todos drogados. Uns serão descobertos agora, outros só mais para diante. Mas depois da razia de episódios de doping entre os melhores das últimas gerações, sobretudo depois da queda em desgraça de Lance Armstrong, para mim o ciclismo está morto. A sua credibilidade vale zero. De entre todas as suas grandes lendas, só Coppi, Anquetil e Mercx se mantêm ainda em glória. E talvez porque, à época, os controlos anti-doping não eram eficazes. A discussão necessária, e a única capaz de salvar o ciclismo profissional, tarda a ser feita a sério: saber se mais vale fazer etapas em que se consiga subir o Alpe d'Huez só com bife grelhado e Eau d'Évian, ou fingir que se consegue escalá-lo só com isso, como dizia Joaquim Agostinho.
3- Resta assim concentrar-nos no palpitante mundo das transferências futobolisticas, aqui e lá fora. Por cá, sente-se que os grandes desfechos, a nível de Porto e Benfica, ainda estão para acontecer e até à absurda data de 31 de Agosto nada está fechado. O Benfica continua a espera de vender Matic, Cardozo e Garay ou Gaitan, para poder comprar qualquer coisa mais sonante do que uma van de sérvios. Agora, comprou um central argentino com o sacrílego nome de Lisandro Lopez, copiando o nome do outro que fez furor no ataque do FC Porto e joga agora em França. Com um nome desses, um tipo não pode ser central e não pode jogar no Benfica!
Já o FC Porto, confirmando o ditado de que não hã fome que não dê em fartura, vai acumulando doses industriais de médios, não apenas para preencher o que era, de facto, o sector mais fraco da equipe mas sobretudo para tentar que algum deles consiga minimizar os danos resultantes da ausência de Moutinho. No processo, vai batendo recordes de melhores vendas de sempre por parte de clubes mexicanos e até, a fazer fé nos relatos de imprensa, está tentado a abrir de 25 milhões de euros para ir buscar um jovem médio-extremo brasileiro chamado Bernard. Espero ben que não o faça, porque estas loucuras nunca pressagiam nada de bom. Li num jornal que Bernard destinar-se-ia a compensar a «ausência de extremos», ocasionada pela venda de James Rodriguez e as «mais do que prováveis saídas» de Atsu e Iturbe. E pergunto-me: mas porquê «mais do que prováveis saídas»? Atsu quer sair, mas até agora ninguém chegou ao valor aliás modesto, da sua cláusula de rescisão e, que eu saiba, isto não é assim que funciona, não basta a vontade do jogador para logo ser libertado. E o mesmo se diga de Itutbe, que com certeza há-de valer mais do que as raríssimas oportunidades que Vítor Pereira lhe deu para o mostrar. Voltar a emprestá-lo sem ter chegado verdadeiramente a testá-lo parece-me esbanjamento. Entrelanto, e sem que se perceba ao certo porque razão, arrasta-se a decisão de compra de Ghilas, a solução mais à mão e mais promissora para servir como alternativa a Jackson Martinez. Não entendo como, ao mesmo tempo que se paga 10 milhões por um central (num plantel que já tinha seis, quatro dos quais de grande categoria) se protela a compra de uma única alternativa ao lugar fulcral de ponta-de-lança. Como já aqui escrevi, das duas compras no mercado interno que eu gostaria de ver o FC Porto fazer. Mossoró e Ghilas, um já se foi embora baratinho, e o outro corremos o risco de o perder por inércia - como perdemos o Lima para o Benfica. No dia em que parte para o seu estágio holandês, com mais de trinta jogadores à disposição, o primeiro grande teste de Paulo Fonseca é a escolha dos 26 ou 27 com que optará ficar. A sua lista de dispensas começará a levantar o véu sobre as ideias do novo treinador do FC Porto. E eu, que o vejo chegar com esperança, confio que não revele o mesmo desinteresse pelos jovens talentos que o seu antecessor. Em dois anos no FC Porto, e não obstante a quantidade de jovens colocados à sua disposição pela SAD, Vitor Pereira só fez revelar um único talento novo: Mangala. É pouco para um clube que tanto gasta em aquisições de jovens potenciais talentos e que tanto espera vir a ganhar no futuro, com as suas vendas.
No Sporting e avisadamente, o que funciona é a contenção de despesas: tentar despachar jogadores que ganham demais para o orçamento reduzido, tentar adquirir outros por empréstimo, a custo zero ou a tostões. Mas a nova filosofia de parente pobre do futebol português, que é a única que os bancos consentem agora, tem sido acompanhada por uma intensa campanha de marketing, tentando fazer passar por autoridade e inflexibilidade do seu presidente o que não passa de impossibilidade. É assim que tentando adquirir um avançado colombiano desconhecido de todos e a custo zero, o marketing trata logo de fazer constar que ele é o novo Falcão - a custo zero. Ou, quando, depois de muito regatear, Bruno de Carvalho contrata o também avançado Cissè à Académica pela simbólica quantia de 300.000 euros e logo faz saber que lhe impôs uma cláusula de rescisão de 60 milhões. Ou seja, e como Bruno de Carvalho estranhou e criticou que o FC Porto tenha vendido Moutinho abaixo da cláusula de rescisão, pressupõe-se que ele não fará o mesmo e que, portanto, espera que um jogador comprado por 300.000 seja vendido amanha por 60 milhões - mais do que custou Neymar ao Barcelona. Os sócios adoram estas atitudes de «autoridade», «firmeza», «capacidade negocial». Como os sucessivos esforços de Bruno de Carvalho de afastar Bruma do tutor, primeiro, do empresário Pini Zahavi depois, e agora do advogado, mantendo a esperança de um cara-a-cara entre ele e o jogador, que lhe permitiria arrancar-lhe uma assinatura fruto da ingenuidade do guineense. Os sócios adoram isto, adoram ouvir o seu presidente dizer-lhes que já abateu 150 milhões ao passivo, embora não explique, e ninguém lhe pergunte, porque artes mágicas o conseguiu. Adoram a atitude de cortar relações com o FC Porto, mesmo que o pretexto seja fraco e o proveito nulo ou pior. Adoram ouvi-lo dizer que é nas primeiras oito jornadas que o Sporting costuma ser roubado do titulo, o que lhes mantém acesa a chama imensa de uma hipotética candidatura ao titulo e aceso o fogo do rol de queixas com que sempre se consolam das ilusões frustradas. Concedo que seria difícil a qualquer presidente do Sporting, perante o cenário de terror encontrado, ir por outro caminho ou adoptar um discurso de vencido à partida. O marketing ajuda a manter as esperanças e as ilusões, mas, na hora da verdade, o marketing é apenas...marketing. E será então, passado o estado de graça, que Bruno de Carvalho terá de mostrar de que fibra é feito. Adiante veremos.
As Opiniões Desportivas de Miguel Sousa Tavares
Textos de Miguel Sousa Tavares na Abola sobre futebol, que leio atentamente e de quem sou admirador. Este blog não tem nenhuma relação com o autor dos textos. As crónicas terão sempre desfasamento em relação à última em banca, no respeito pelos direitos do jornal onde são colocadas.
domingo, agosto 11, 2013
sábado, agosto 10, 2013
WIMBLEDON E O RESTO (02 JULHO 2013)
1- Já aqui escrevi em tempos que o meu desporto preferido entre todos é o ténis. Para jogar ou para ver, não há desporto algum que se lhe possa comparar. Assistir a um jogo de um torneio ATP é ter a garantia de que em momento algum nos vamos aborrecer - com tempos mortos, tácticas defensivas, manhas dos jogadores, contestação à arbitragem, cobardias dos treinadores, comportamento lastimável do público etc.,etc. - como acontece em tantos jogos de equipa, com o futebol à cabeça, ou em vários outros desportos que resultam profundamente chatos, como a Fórmula 1. O ténís é uma espécie de combate de gladiadores em que o resultado nunca está feito até que alguém vença o último match point — como bem observou o Woody Allen, que fez desse momento o ponto de partida para um filme.
Por estes dias, os amantes do ténis vivem a sua temporada de luxo, que se inicia em finais de Maio, principio de Junho, culminando em Wimbledon. São, por ordem, os torneios de Barcelona, Roma, Monte Carlo e Rolland Garros, todos em terra batida, seguindo-se a mítica relva do All England Tennis Club, vulgo Wimbledon. Há um ano atrás, decidi que por esta altura de 2013, e coincidindo com o meu aniversário, me ia ofertar um presente de anos especial: um lugar na final de Wimbledon. Mexi-me, tentei, falei, procurei, mas não consegui: pode ser que para o ano... Vejo-me, pois, limitado a ir assistindo aos jogos sentado no sofá. O que vale é que o ténis é um jogo altamente televisivo e o court central, ou o court n°1 de Wimbledon, com várias câmaras atentas a todos os pormenores, da relva e das bancadas, é um espectáculo em si mesmo. Este é um publico civilizado e generoso, que tanto venera o vencedor justo como o vencido digno. E por isso é que é possível ver um jogador já sem hipótese alguma de virar os acontecimentos, à beira de perder o terceiro set e com três match points contra, conseguir safar dois deles apenas por uma questão de brio e de vontade de não se despedir do público sem mostrar que lutou até ao último suspiro.
Wimbledon é uma competição verdadeiramente única, não só no ténis como em qualquer outra modalidade. As boas e velhas tradições inglesas de fair play e respeito pelo público que vai ver os jogadores são absolutamente incomparáveis e a chave da atracção imortal deste nome. Isso começa logo na exigência de que todos os jogadores estejam integralmente vestidos de branco, acabando-se com a cacofonia das cores dissonantes e o mau gosto de alguns equipamentos. Está fora de questão, também, que os jogadores se apresentem despenteados à moicano e tatuagens de cima a baixo: aqui tudo é discreto e clean. Nem pensar em reclamar com o árbitro (apenas algumas leves e cerimoniosas discordâncias muito ocasionais) assim como seria absolutamente inadmissível ver os jogadores a discutir um com o outro, a abandonarem o campo sem ser lado a lado, a não se cumprimentarem entre si e o árbitro no final, ou ver o vencido deixar de felicitar o vencedor. Um só exemplo basta para perceber toda a diferença do que significa o fair play: na bancada de serviço não é necessário ordem do árbitro - ela é executada quando o jogador que vai servir está preparado e em posição e quando constata que o adversário também o está. Não há nenhum sinal entre eles, nenhum gesto ou palavra do árbitro e, no entanto, não há memória de um jogador ter servido antes que o outro estivesse preparado para receber, tentando tirar daí vantagem. A sanção para quem não cumprir quaisquer destas regras, muitas delas não escritas, é simples: no ano seguinte, o jogador que não acatou as regras não será convidado a participar.
Este ano, Wimbledon tem assistido a uma hecatombe prematura de alguns dos principais favoritos e favoritas à vitória: Nadal caiu na primeira ronda, Federer, o meu preferido, na segunda. Também tivemos a proeza da nossa Michelle Brito, derrotando a 3ª do ranking, Sharapova, mas logo caindo a seguir às mãos da 104ª. Confesso que tinha apostado que ela caía logo a seguir à sua grande vitória, porque, infelizmente, essa tem sido desde sempre a característica dos nossos tenistas, à qual Michelle Brito não escapa: a falta de consistência de jogo, a falta de um espírito de vitória que transforme ocasionais proezas sem seguimento em progressos fortes e consistentes. Quando olhamos para o lado, para Espanha, e constatamos que eles já vão na terceira ou quarta geração de jogadores de topo nos últimos trinta anos, é inevitável perguntarmo-nos por que razão nós nunca tivemos um grande jogador ou jogadora, alguém que tivesse conseguido, nem que fosse uma só semana, ocupar o top-50 do ranking. E se, há trinta anos, a desculpa evidente era a falta de condições, falta de campos,de oportunidades, de treinadores de topo, hoje, e em alguns casos, essa desculpa já não colhe. Michelle Brito, por exemplo, foi levada pelos pais para os Estados Unidos aos 8 anos de idade, com a única finalidade de jogar ténis, aprendendo na mais prestigiada escola do mundo, que é a Academia de Nino Bolletieri, em Miami. Daqui e da Academia de Barcelona, saíram muitos dos actuais jogadores do Top-20 e têm saído muitos mais ao longo dos anos. Já vários portugueses passaram por lá, mas nenhum triunfou. É, certamente, um mistério. Um frustrante mistério.
E assim, enquanto tudo parece encaminhar-se para uma final Murray-Djokovic, resta-me pensar no assunto e ficar sentado a assistir ao mais fantástico espectáculo desportivo do mundo. Como se estivesse lá, sentado ao lado da cabina onde o imortal John McEnroe faz hoje os seus comentários televisivos. E ficar a lembrar-me da mais empolgante final a que já assisti, a de 1980, salvo erro, em que McEnroe, derrotando Bjorn Borg em cinco seis e quatro horas e meia de duelo de cortar a respiração, evitou que o sueco conquistasse a sua sexta vitória consecutiva em Wimbledon, do mesmo passo resgatando um ténis de risco e de ataque, que Borg havia congelado nos courts.
2- Com uma votação norte-coreana, o Sporting entregou-se totalmente ás ideias de Bruno de Carvalho, confirmando o estado de graça de que goza o novo presidente, como ninguém mais antes dele. Segui atentamente a sua entrevista no Dia Seguinte e, entre muita coisa que me pareceu acertada e reveladora de um novo espírito de revolta contra os «abutres do futebol», que é de registar e louvar, também houve coisas que não entendi. Entendi que o Sporting transformou dívida em propriedade do clube, desse modo e por exemplo, transformando-se em parte num clube angolano - o que não deixa de ser um sinal dos tempos, no futebol como no resto. Mesmo assim, não percebi como é que, por artes mágicas, fez desaparecer 150 milhões de euros de deficit, assim como não percebi o que vai fazer com os jogadores cujo vencimento ele julga incomportável, mas que nâo aceitam baixá-lo: vai encostá-los, continuando, como impõem os contratos, a pagar-lhes um ordenado incomportável até ver se eles se fartam e vêm negociar?
Bem, uma coisa, pelo menos, vista de fora, é de louvar: Bruno de Carvalho está a mudar as mentalidades daquela casa, pondo fim a hábitos de ricos em casa arruinada. É um caminho de seriedade e o único que parece viável.
E também me parece que o caminho que ele está a seguir, mais tarde ou mais cedo, será, inevitavelmente , o do FC Porto e Benfica. Por ora, o que tem permitido o tipo de gestão dos dois grandes é a sua capacidade de gerar excepcionais mais valias em jogadores comprados barato e valorizados no clube. Mas quando, como no caso do Benfica, se descobre que estão a pagar uma loucura de l04 ordenados a jogadores profissionais, percebe-se bem que, se houver um ano em que nenhuma grande venda seja levada a cabo, tudo aquilo estremece de alto a baixo. E se no ano seguinte a situação se repetir, todo o edifício pode começar a desmoronar-se. Pode discutir-se se este tipo de gestão envolve demasiados riscos ou se é o único que permite sustentar os dois nossos dois grandes na média/alta roda europeia. Mas quando se chega ao ponto de ter 104 jogadores sob contrato, mais escolas de formação, para conseguir vender um ou dois por ano, a questão já não tem a ver com o tipo de gestão praticada, mas com o tipo de negócios levados a cabo. Sete sérvios de uma só vez?
Por estes dias, os amantes do ténis vivem a sua temporada de luxo, que se inicia em finais de Maio, principio de Junho, culminando em Wimbledon. São, por ordem, os torneios de Barcelona, Roma, Monte Carlo e Rolland Garros, todos em terra batida, seguindo-se a mítica relva do All England Tennis Club, vulgo Wimbledon. Há um ano atrás, decidi que por esta altura de 2013, e coincidindo com o meu aniversário, me ia ofertar um presente de anos especial: um lugar na final de Wimbledon. Mexi-me, tentei, falei, procurei, mas não consegui: pode ser que para o ano... Vejo-me, pois, limitado a ir assistindo aos jogos sentado no sofá. O que vale é que o ténis é um jogo altamente televisivo e o court central, ou o court n°1 de Wimbledon, com várias câmaras atentas a todos os pormenores, da relva e das bancadas, é um espectáculo em si mesmo. Este é um publico civilizado e generoso, que tanto venera o vencedor justo como o vencido digno. E por isso é que é possível ver um jogador já sem hipótese alguma de virar os acontecimentos, à beira de perder o terceiro set e com três match points contra, conseguir safar dois deles apenas por uma questão de brio e de vontade de não se despedir do público sem mostrar que lutou até ao último suspiro.
Wimbledon é uma competição verdadeiramente única, não só no ténis como em qualquer outra modalidade. As boas e velhas tradições inglesas de fair play e respeito pelo público que vai ver os jogadores são absolutamente incomparáveis e a chave da atracção imortal deste nome. Isso começa logo na exigência de que todos os jogadores estejam integralmente vestidos de branco, acabando-se com a cacofonia das cores dissonantes e o mau gosto de alguns equipamentos. Está fora de questão, também, que os jogadores se apresentem despenteados à moicano e tatuagens de cima a baixo: aqui tudo é discreto e clean. Nem pensar em reclamar com o árbitro (apenas algumas leves e cerimoniosas discordâncias muito ocasionais) assim como seria absolutamente inadmissível ver os jogadores a discutir um com o outro, a abandonarem o campo sem ser lado a lado, a não se cumprimentarem entre si e o árbitro no final, ou ver o vencido deixar de felicitar o vencedor. Um só exemplo basta para perceber toda a diferença do que significa o fair play: na bancada de serviço não é necessário ordem do árbitro - ela é executada quando o jogador que vai servir está preparado e em posição e quando constata que o adversário também o está. Não há nenhum sinal entre eles, nenhum gesto ou palavra do árbitro e, no entanto, não há memória de um jogador ter servido antes que o outro estivesse preparado para receber, tentando tirar daí vantagem. A sanção para quem não cumprir quaisquer destas regras, muitas delas não escritas, é simples: no ano seguinte, o jogador que não acatou as regras não será convidado a participar.
Este ano, Wimbledon tem assistido a uma hecatombe prematura de alguns dos principais favoritos e favoritas à vitória: Nadal caiu na primeira ronda, Federer, o meu preferido, na segunda. Também tivemos a proeza da nossa Michelle Brito, derrotando a 3ª do ranking, Sharapova, mas logo caindo a seguir às mãos da 104ª. Confesso que tinha apostado que ela caía logo a seguir à sua grande vitória, porque, infelizmente, essa tem sido desde sempre a característica dos nossos tenistas, à qual Michelle Brito não escapa: a falta de consistência de jogo, a falta de um espírito de vitória que transforme ocasionais proezas sem seguimento em progressos fortes e consistentes. Quando olhamos para o lado, para Espanha, e constatamos que eles já vão na terceira ou quarta geração de jogadores de topo nos últimos trinta anos, é inevitável perguntarmo-nos por que razão nós nunca tivemos um grande jogador ou jogadora, alguém que tivesse conseguido, nem que fosse uma só semana, ocupar o top-50 do ranking. E se, há trinta anos, a desculpa evidente era a falta de condições, falta de campos,de oportunidades, de treinadores de topo, hoje, e em alguns casos, essa desculpa já não colhe. Michelle Brito, por exemplo, foi levada pelos pais para os Estados Unidos aos 8 anos de idade, com a única finalidade de jogar ténis, aprendendo na mais prestigiada escola do mundo, que é a Academia de Nino Bolletieri, em Miami. Daqui e da Academia de Barcelona, saíram muitos dos actuais jogadores do Top-20 e têm saído muitos mais ao longo dos anos. Já vários portugueses passaram por lá, mas nenhum triunfou. É, certamente, um mistério. Um frustrante mistério.
E assim, enquanto tudo parece encaminhar-se para uma final Murray-Djokovic, resta-me pensar no assunto e ficar sentado a assistir ao mais fantástico espectáculo desportivo do mundo. Como se estivesse lá, sentado ao lado da cabina onde o imortal John McEnroe faz hoje os seus comentários televisivos. E ficar a lembrar-me da mais empolgante final a que já assisti, a de 1980, salvo erro, em que McEnroe, derrotando Bjorn Borg em cinco seis e quatro horas e meia de duelo de cortar a respiração, evitou que o sueco conquistasse a sua sexta vitória consecutiva em Wimbledon, do mesmo passo resgatando um ténis de risco e de ataque, que Borg havia congelado nos courts.
2- Com uma votação norte-coreana, o Sporting entregou-se totalmente ás ideias de Bruno de Carvalho, confirmando o estado de graça de que goza o novo presidente, como ninguém mais antes dele. Segui atentamente a sua entrevista no Dia Seguinte e, entre muita coisa que me pareceu acertada e reveladora de um novo espírito de revolta contra os «abutres do futebol», que é de registar e louvar, também houve coisas que não entendi. Entendi que o Sporting transformou dívida em propriedade do clube, desse modo e por exemplo, transformando-se em parte num clube angolano - o que não deixa de ser um sinal dos tempos, no futebol como no resto. Mesmo assim, não percebi como é que, por artes mágicas, fez desaparecer 150 milhões de euros de deficit, assim como não percebi o que vai fazer com os jogadores cujo vencimento ele julga incomportável, mas que nâo aceitam baixá-lo: vai encostá-los, continuando, como impõem os contratos, a pagar-lhes um ordenado incomportável até ver se eles se fartam e vêm negociar?
Bem, uma coisa, pelo menos, vista de fora, é de louvar: Bruno de Carvalho está a mudar as mentalidades daquela casa, pondo fim a hábitos de ricos em casa arruinada. É um caminho de seriedade e o único que parece viável.
E também me parece que o caminho que ele está a seguir, mais tarde ou mais cedo, será, inevitavelmente , o do FC Porto e Benfica. Por ora, o que tem permitido o tipo de gestão dos dois grandes é a sua capacidade de gerar excepcionais mais valias em jogadores comprados barato e valorizados no clube. Mas quando, como no caso do Benfica, se descobre que estão a pagar uma loucura de l04 ordenados a jogadores profissionais, percebe-se bem que, se houver um ano em que nenhuma grande venda seja levada a cabo, tudo aquilo estremece de alto a baixo. E se no ano seguinte a situação se repetir, todo o edifício pode começar a desmoronar-se. Pode discutir-se se este tipo de gestão envolve demasiados riscos ou se é o único que permite sustentar os dois nossos dois grandes na média/alta roda europeia. Mas quando se chega ao ponto de ter 104 jogadores sob contrato, mais escolas de formação, para conseguir vender um ou dois por ano, a questão já não tem a ver com o tipo de gestão praticada, mas com o tipo de negócios levados a cabo. Sete sérvios de uma só vez?
sexta-feira, agosto 09, 2013
COMO A FIFA CONSEGUIU PEGAR FOGO AO BRASIL (25 JUNHO 2013)
1- A FIFA não tem culpa dos males endémicos do Brasil, como a corrupção a todos os níveis, o tráfico de influências, as ineficiências estruturais e, acima de tudo, a profunda desigualdade social. Mas a FIFA tem culpa dos seus pecados originais e nunca emendados: a ganância, a arrogância, a insensibilidade social e politica. A FIFA (e a sua filial europeia, a UEFA) vê o futebol como um negócio de ricos e para ricos, cujo objectivo final é proporcionar aos seus dirigentes uma vida de nababos. Ora, justamente o que fez do Brasil a pátria do futebol foi o futebol de pé descalço, o futebol das praias, das ruas, dos morros. Lula tirou 20 milhões de brasileiros da absoluta pobreza, graças ao plano chamado bolsa família, inspirado no RSI de José Sócrates. Mas apesar disso, do petróleo, do ferro, da devastação da Amazónia, o Brasil não deixou ainda a sua condição de país atrasado e, em muitas zonas, subdesenvolvido. Porque as riquezas são mal distribuídas e porque entre a mata e a mina ou a jazida, muito dela desaparece, sem deixar rasto. Ou, quando o deixa, os criminosos ficam impunes, porque estão bem protegidos. O Brasil, que justamente aspira ao lugar que a sua imensidão e riqueza justificam no plano internacional, tem ainda um longo caminho a percorrer, antes de poder fazer figura de novo-rico. E foi isso que o Brasil se atreveu a fazer, com a organização de três mega-eventos mundiais em quatro anos: a Taça das Confederações, o Mundial de 2014 e os Jogos Olímpicos do Rio, de 2016.
A tentação brasileira de fazer figura de rico em lugar de deixar de fazer figura de pobre, encontrou--se, desgraçadamente, com a voracidade da FIFA de cobrar os seus eventos a custos pornográficos. Se a FIFA não fosse, como é, uma associação de mal-fazer aos países, a primeira exigência que faria aos candidatos à organização dos Mundiais é que os gastos com os jogos não ultrapassassem determinado limite — definido em função do PIB e do rendimento per capita de cada país. Mas o que a FIFA faz é exactamente o inverso; exigir um mínimo de gastos para aceitar uma candidatura — e esse mínimo é astronómico. É por isso que a FIFA, sem vergonha alguma, aprovou o Mundial de 2022 no Catar — um país onde não há a menor tradição futebolística, nem sequer habitantes para ir aos estádios ou onze profissionais para formar uma selecção. Mas que vai pagar uma nota preta para ter o Mundial, incluindo a colocação de ar condicionado no interior dos estádios, para que se possa jogar com temperaturas próximas dos 50º. E, para que o escândalo passasse, já se soube que alguns dos membros da FIFA foram devidamente sensibilizados (e mais não se sabe porque o assunto foi convenientemente chutado para debaixo do tapete).
E eis que, de repente, um povo inteiro que se suponha estar exultante com tanta festa prometida, rebenta nas ruas, proclamando que prefere hospitais e escolas decentes, transportes públicos de qualidade, do que os magníficos estádios novos impostos pela FIFA (como o novo Arena de Manaus, condenado ao abandono logo após o Mundial). Até porque, como qualquer um conseguiria prever, o custo dos estádios já disparou quatro vezes o preço inicial (só a remodelação do Maracanã vai já em seis vezes o orçamento!). Com toda a razão, os brasileiros perguntam como pode gastar tanto dinheiro numa festa um país onde falta dinheiro para o essencial. E perguntam de que lhes servirá os milhões de visitantes anunciados, se o custo disso é uma inflação que voltou a querer disparar e que em alguns casos, como o imobiliário, atinge custos totalmente incomportáveis para o cidadão médio? Antes do Mundial e dos JO, o Brasil era um país atrasado, mas com crescimento acelerado e cada vez mais pobres a acederem à classe média. Agora, é um país quase estagnado e em que muita gente da classe média está a voltar à pobreza, porque não pode sustentar os custos de um Brasil internacional.
Acresce que algumas das regras impostas no caderno de encargos da FIFA foram recebidas como um insulto às tradições e leis do país. Percebo bem do que se queixam; quando Portugal lançou a sua candidatura ao Euro-2004, o governo de então convidou-me para ser porta-voz dela — convite que recusei e que viria a ser aceite por Carlos Cruz. Mas, educadamente, pedi para ver o caderno de encargos, antes de confirmar a minha recusa, perante a insistência. E o que vi, fez com que, além da minha razão inicial para recusar (porque entendia que o Euro-2004, com os seus dez estádios, novos ou remodelados, era um luxo de que o país não precisava e que o futuro se encarregaria de revelar um desperdício, como hoje está à vista), concorresse uma outra razão impeditiva da minha aceitação; as exigências que a UEFA fazia eram uma ofensa às leis e à soberania económica do país. Porque os queridos patrões da UEFA e da FIFA não se limitam a ganhar rios de dinheiro com a venda de bilhetes e de direitos televisivos; eles participam também em todos os negócios conexos aos eventos e em condições tais que pouco sobra para a concorrência local. E quem já viu actuar de perto os exércitos que a UEFA e a FIFA deslocam para os eventos que promovem — os meninos e meninas, os assessores, os chefes intermédios e os figurões — decerto se deu conta das mordomias e do luxo ostensivo de que aquela gente se rodeia. Os clubes podem estar falidos, os países podem ser pobres, mas a UEFA e a FIFA, essas, fazem vida de organizações milionárias. Os brasileiros, aliás, sabem bem o que a casa gasta, pois durante muitos anos o grande chefe desta próspera família foi o brasileiro João Havelange — e está tudo dito.
E é por isso que eu, para usar, adaptada, uma frase imortal de um coronel da ditadura brasileira, quando oiço alguém começar a sugerir um Mundial de Futebol ou uns Jogos Olímpicos em Portugal, apetece-me logo puxar da pistola!
2- Continuando no capítulo dos dinheiros do futebol, tropecei esta semana num interessantíssimo artigo no Público, da autoria de António Samagaio, professor de Economia no ISEG. Era acerca dos Fundos de jogadores, agora tão em moda entre nós, e que têm três características, digamos, opacas: ganham sempre avultadas quantias no co-financiamento da compra de parte dos passes aos clubes, mesmo quando estes perdem dinheiro; são invariavelmente sediados em paraísos fiscais; e não se conhecem os seus donos. Dois dias depois, ainda no Público, o artigo mereceu resposta de Angelino Ferreira, administrador da SAD do FC Porto. Contestando a falta de transparência atribuída aos Fundos, Angelino Ferreira defendia que eles eram a única forma que permitia a clubes como o FC Porto, Benfica ou Sporting, financiarem-se para se poderem manter relativamente competitivos no mercado de jogadores e nas competições internacionais, visto que o crédito bancário fechou portas. E acrescentava que a tentativa, ora em curso por parte da UEFA, de vedar o recurso aos Fundos de jogadores, só iria agravar mais ainda o fosso entre os 15 clubes muito ricos da Europa e aqueles a que poderíamos chamar a classe média/alta. O argumento é pertinente e é verdade também que só os parvos se deixarão convencer pelas proclamações a favor do fair-play desportivo-financeiro, do Sr. Platini. Quisesse ele, deveras, bater-se por alguma igualdade entre a concorrência, e clubes como o Real Madrid, os dois Manchester, o PSG e agora o Mónaco, não se poderiam comportar como piratas no mercado. Não impede que o argumento principal de António Samagaio tenha permanecido e permaneça sem resposta: sem saber quem são os proprietários dos Fundos, como se pode falar em transparência? Basta deitarmo-nos a imaginar quem poderão eles ser...
A tentação brasileira de fazer figura de rico em lugar de deixar de fazer figura de pobre, encontrou--se, desgraçadamente, com a voracidade da FIFA de cobrar os seus eventos a custos pornográficos. Se a FIFA não fosse, como é, uma associação de mal-fazer aos países, a primeira exigência que faria aos candidatos à organização dos Mundiais é que os gastos com os jogos não ultrapassassem determinado limite — definido em função do PIB e do rendimento per capita de cada país. Mas o que a FIFA faz é exactamente o inverso; exigir um mínimo de gastos para aceitar uma candidatura — e esse mínimo é astronómico. É por isso que a FIFA, sem vergonha alguma, aprovou o Mundial de 2022 no Catar — um país onde não há a menor tradição futebolística, nem sequer habitantes para ir aos estádios ou onze profissionais para formar uma selecção. Mas que vai pagar uma nota preta para ter o Mundial, incluindo a colocação de ar condicionado no interior dos estádios, para que se possa jogar com temperaturas próximas dos 50º. E, para que o escândalo passasse, já se soube que alguns dos membros da FIFA foram devidamente sensibilizados (e mais não se sabe porque o assunto foi convenientemente chutado para debaixo do tapete).
E eis que, de repente, um povo inteiro que se suponha estar exultante com tanta festa prometida, rebenta nas ruas, proclamando que prefere hospitais e escolas decentes, transportes públicos de qualidade, do que os magníficos estádios novos impostos pela FIFA (como o novo Arena de Manaus, condenado ao abandono logo após o Mundial). Até porque, como qualquer um conseguiria prever, o custo dos estádios já disparou quatro vezes o preço inicial (só a remodelação do Maracanã vai já em seis vezes o orçamento!). Com toda a razão, os brasileiros perguntam como pode gastar tanto dinheiro numa festa um país onde falta dinheiro para o essencial. E perguntam de que lhes servirá os milhões de visitantes anunciados, se o custo disso é uma inflação que voltou a querer disparar e que em alguns casos, como o imobiliário, atinge custos totalmente incomportáveis para o cidadão médio? Antes do Mundial e dos JO, o Brasil era um país atrasado, mas com crescimento acelerado e cada vez mais pobres a acederem à classe média. Agora, é um país quase estagnado e em que muita gente da classe média está a voltar à pobreza, porque não pode sustentar os custos de um Brasil internacional.
Acresce que algumas das regras impostas no caderno de encargos da FIFA foram recebidas como um insulto às tradições e leis do país. Percebo bem do que se queixam; quando Portugal lançou a sua candidatura ao Euro-2004, o governo de então convidou-me para ser porta-voz dela — convite que recusei e que viria a ser aceite por Carlos Cruz. Mas, educadamente, pedi para ver o caderno de encargos, antes de confirmar a minha recusa, perante a insistência. E o que vi, fez com que, além da minha razão inicial para recusar (porque entendia que o Euro-2004, com os seus dez estádios, novos ou remodelados, era um luxo de que o país não precisava e que o futuro se encarregaria de revelar um desperdício, como hoje está à vista), concorresse uma outra razão impeditiva da minha aceitação; as exigências que a UEFA fazia eram uma ofensa às leis e à soberania económica do país. Porque os queridos patrões da UEFA e da FIFA não se limitam a ganhar rios de dinheiro com a venda de bilhetes e de direitos televisivos; eles participam também em todos os negócios conexos aos eventos e em condições tais que pouco sobra para a concorrência local. E quem já viu actuar de perto os exércitos que a UEFA e a FIFA deslocam para os eventos que promovem — os meninos e meninas, os assessores, os chefes intermédios e os figurões — decerto se deu conta das mordomias e do luxo ostensivo de que aquela gente se rodeia. Os clubes podem estar falidos, os países podem ser pobres, mas a UEFA e a FIFA, essas, fazem vida de organizações milionárias. Os brasileiros, aliás, sabem bem o que a casa gasta, pois durante muitos anos o grande chefe desta próspera família foi o brasileiro João Havelange — e está tudo dito.
E é por isso que eu, para usar, adaptada, uma frase imortal de um coronel da ditadura brasileira, quando oiço alguém começar a sugerir um Mundial de Futebol ou uns Jogos Olímpicos em Portugal, apetece-me logo puxar da pistola!
2- Continuando no capítulo dos dinheiros do futebol, tropecei esta semana num interessantíssimo artigo no Público, da autoria de António Samagaio, professor de Economia no ISEG. Era acerca dos Fundos de jogadores, agora tão em moda entre nós, e que têm três características, digamos, opacas: ganham sempre avultadas quantias no co-financiamento da compra de parte dos passes aos clubes, mesmo quando estes perdem dinheiro; são invariavelmente sediados em paraísos fiscais; e não se conhecem os seus donos. Dois dias depois, ainda no Público, o artigo mereceu resposta de Angelino Ferreira, administrador da SAD do FC Porto. Contestando a falta de transparência atribuída aos Fundos, Angelino Ferreira defendia que eles eram a única forma que permitia a clubes como o FC Porto, Benfica ou Sporting, financiarem-se para se poderem manter relativamente competitivos no mercado de jogadores e nas competições internacionais, visto que o crédito bancário fechou portas. E acrescentava que a tentativa, ora em curso por parte da UEFA, de vedar o recurso aos Fundos de jogadores, só iria agravar mais ainda o fosso entre os 15 clubes muito ricos da Europa e aqueles a que poderíamos chamar a classe média/alta. O argumento é pertinente e é verdade também que só os parvos se deixarão convencer pelas proclamações a favor do fair-play desportivo-financeiro, do Sr. Platini. Quisesse ele, deveras, bater-se por alguma igualdade entre a concorrência, e clubes como o Real Madrid, os dois Manchester, o PSG e agora o Mónaco, não se poderiam comportar como piratas no mercado. Não impede que o argumento principal de António Samagaio tenha permanecido e permaneça sem resposta: sem saber quem são os proprietários dos Fundos, como se pode falar em transparência? Basta deitarmo-nos a imaginar quem poderão eles ser...
quinta-feira, agosto 08, 2013
OS MENINOS DE OURO (18 JUNHO 2013)
O chamado defeso é a parte da época futebolística que eu mais temo e desprezo. Temo, porque, invariavelmente, me traz sempre noticia da venda de algum ou alguns dos melhores jogadores do meu clube (enquanto os outros ninguém cobiça e é sempre uma dor de cabeça vermo-nos livres deles). E desprezo esta parte da época porque, entre tantos negócios de compra e de venda que se cruzam, vem sempre ao de cima o particular brio profissional e amor à camisola de tantos daqueles que passamos o ano a aplaudir como ídolos nossos. Afinal, este é um mundo desprovido de valores como lealdade, dedicação, respeito pelo clube. Há excepções, notáveis, mas a regra é esta. Por mais que a história se repita, em todos os clubes e em todos os defesos, não há maneira de os adeptos meterem na cabeça que os únicos para quem esses valores têm significado são eles próprios.
Fixemo-nos no exemplo nos chamados clubes grandes - que são os que têm mais adeptos, fazem mais negócios de arromba e onde a feira de vaidades e ambições encontra melhores oportunidades para se exibir. Quando, em proveniência de um clube menor, são contratados por um grande, os jogadores vêm entusiasmados: se são portugueses, logo declaram que são adeptos daquele clube desde pequeninos; se são estrangeiros, juram que há muito tinham o sonho de jogar ali. Assinam por 4 ou 5 anos, posam com a camisola, prometem que vão ser campeões e, depois de uma visita guiada à sala de troféus do novo patrão, garantem que estão muito bem informados sobre o clube, o futebol local e o pais ou cidade de acolhimento. Mas, quando se trata de emigrantes em pais alheio, jamais os ouvimos falar depois sobre o pais ou a cidade onde estão: nenhum jogador do Real ou do Atlético de Madrid alguma vez disse que tinha visitado o Prado; nenhum jogador estrangeiro do Chelsea, do Arsenal,do Tottenham, é suspeito de se ter sido visto na National Gallery ou num teatro de Old Vic; nenhum jogador, dos que agora correm para o Mónaco, sabe coisa alguma de Monte Carlo, a não ser que é um paraíso fiscal e tem um Grande Prémio de Fórmula 1. Nunca os vimos com um livro sobre a história do pais onde estão (mas também nunca vimos um jogador de futebol com um livro, uma revista ou um jornal, nada mais que os inevitáveis headphones, que acham o cúmulo do in).
Mas retomemos o percurso dos jogadores acabados de chegar a um dos nossos grandes. Passado um a dois anos de militância clubistica, das duas uma: ou ele se revelou uma boa aquisição ou se revelou um fiasco. No primeiro caso, é certo e sabido que o clube vai ter de lhe renegociar o contrato ou ele passa a jogar desmotivado, porque, afinal, o que lhe parecera óptimo para cinco anos, ao fim de um ou dois já lhe parece pouco. Mas se ele se revelou mesmo excepcional, então já não aceita a renegociação: pressionado pelo empresário, acossado pelos tubarões europeus, ele já só quer é sair, e o clube, admitindo que não o quer também vender, só pode escolher entre esperar que alguém chegue ao montante de indemnização acordado, ou vendê-lo abaixo disso, para se livrar do que se tornou um problema. Se, porém, sucedeu o contrário, que foi o jogador revelar-se um flop, os empresários desaparecem do horizonte e as únicas propostas por ele que podem surgir são a titulo de empréstimo. Mas, como eles nunca aceitam baixar o salário em troca de poderem jogar regularmente noutro lado, o clube seu proprietário só tem como solução aceitar pagar-lhe parte do salário para que ele jogue por outro e assim diminua a folha salarial.
E depois há os casos intermédios, de jogadores que nem são um flop nem uma maravilha. É o caso de Nani, por exemplo: depois de quase dois anos sem mostrar valor nem no Manchester nem na Selecção, tornou-se um problema sem solução fácil - tanto mais que acha que está a «um outro nível» acima do dos clubes portugueses. Vários outros jogadores portugueses que tinham aqui uma óptima situação mas preferiram emigrar, sem se adaptarem, acabaram assim. Como Ricardo Quaresma: começam a descer a rampa devagarinho - Rússia, Turquia, clube inglês ou espanhol do meio da tabela - e, quando olham para o lado, não percebem bem o que lhes aconteceu, para já não lhes reconhecerem o mesmo valor. Outro caso é o de Fernando. o polvo portista. Não percebe que o seu valor é potenciado por pertencer a um clube com uma atitude competitiva especial e estar integrado numa escola de jogo que potencia as suas características. Sonha chegar à selecção do Brasil - o que é um sonho legítimo - mas como pode chegar lá um jogador com inegáveis características de lutador e destruidor de jogo, mas igualmente inegáveis lacunas técnicas (finta, passe e remate), que no Brasil são incompreensíveis? Diz agora o seu empresário que Fernando «tem o direito» de aspirar a mais altos voos. De facto, tem esse direito - embora eu, pessoalmente, o considere uma utopia e ache que em lado nenhum ele gozará do estatuto que tem no FC Porto. O problema, porém, não é dos direitos do Fernando, é dos deveres a que se obrigou quando assinou um contrato com o FC Porto. A noção de que não há direitos sem deveres correspondentes é coisa que não entra ali.
No mundo destes meninos de ouro parece que não existem outras regras nem outras realidades que não o meio em que se movem e os interesses que os mobilizam. Os contratos de trabalho são muito bons, mas só na hora de os assinar e enquanto não lhes acenarem com nada de melhor; os salários são fabulosos, mas desde que o empresário não lhes faça a cabeça com uma proposta irresistível; os países são muito acolhedores, desde que não lhes cobrem impostos nem contribuições para a Segurança Social ou que isso fique a cargo do clube; o futebol local é óptimo, o que não os impede, se as coisas correrem bem, de sucumbirem ao legítimo desejo de aspirarem a mais altos voos; as cidades onde vão morar são excelentes, desde que o clube lhes arranje uma vivenda ao pé do centro de treinos, porque o horário de trabalho de duas ou três horas por dia é muito cansativo; e a realidade que os envolve, os pobres e desempregados que gastam o dinheiro que não têm para irem ao estádio aplaudi-los, não é coisa que os incomode, visto que estão tão de passagem.
Alex Ferguson, um personagem de que nunca gostei, dizia, sobre David Beckham, uma coisa que percebo perfeitamente: que não era capaz de treinar um jogador que mudava de penteado todas as semanas. Ele via isso como demonstração de uma frivolidade que impediria Beckham de se concentrar a sério no seu trabalho. Não sei se terá sido isso que fez com que, a partir de certa altura, o menino bonito do futebol inglês tivesse deixado de evoluir como jogador. Mas Beckham limitou-se a antecipar uma coisa que Ferguson não viu, na altura: que vinha aí o tempo em que, além, de salários milionários, os grandes jogadores, os jogadores-vedeta, iriam ganhar tanto ou mais com a sua imagem e os direitos dela do que com a sua arte de dar pontapés numa bola (é o caso de Ronaldo e Messi, já de si, os dois jogadores mais bem pagos do planeta). E talvez merecesse um estudo sociológico aprofundado perceber como é que estas vedetas que se vestem como salteadores da feira de Carcavelos, que mudam de penteado todas as semanas (e cada um mais horrível do que o outro), que se barram de tatuagens como as torradas de manteiga, e que ganham fortunas inimagináveis arruinando os clubes, são os únicos ídolos incontestados dos tempos de hoje.
Fixemo-nos no exemplo nos chamados clubes grandes - que são os que têm mais adeptos, fazem mais negócios de arromba e onde a feira de vaidades e ambições encontra melhores oportunidades para se exibir. Quando, em proveniência de um clube menor, são contratados por um grande, os jogadores vêm entusiasmados: se são portugueses, logo declaram que são adeptos daquele clube desde pequeninos; se são estrangeiros, juram que há muito tinham o sonho de jogar ali. Assinam por 4 ou 5 anos, posam com a camisola, prometem que vão ser campeões e, depois de uma visita guiada à sala de troféus do novo patrão, garantem que estão muito bem informados sobre o clube, o futebol local e o pais ou cidade de acolhimento. Mas, quando se trata de emigrantes em pais alheio, jamais os ouvimos falar depois sobre o pais ou a cidade onde estão: nenhum jogador do Real ou do Atlético de Madrid alguma vez disse que tinha visitado o Prado; nenhum jogador estrangeiro do Chelsea, do Arsenal,do Tottenham, é suspeito de se ter sido visto na National Gallery ou num teatro de Old Vic; nenhum jogador, dos que agora correm para o Mónaco, sabe coisa alguma de Monte Carlo, a não ser que é um paraíso fiscal e tem um Grande Prémio de Fórmula 1. Nunca os vimos com um livro sobre a história do pais onde estão (mas também nunca vimos um jogador de futebol com um livro, uma revista ou um jornal, nada mais que os inevitáveis headphones, que acham o cúmulo do in).
Mas retomemos o percurso dos jogadores acabados de chegar a um dos nossos grandes. Passado um a dois anos de militância clubistica, das duas uma: ou ele se revelou uma boa aquisição ou se revelou um fiasco. No primeiro caso, é certo e sabido que o clube vai ter de lhe renegociar o contrato ou ele passa a jogar desmotivado, porque, afinal, o que lhe parecera óptimo para cinco anos, ao fim de um ou dois já lhe parece pouco. Mas se ele se revelou mesmo excepcional, então já não aceita a renegociação: pressionado pelo empresário, acossado pelos tubarões europeus, ele já só quer é sair, e o clube, admitindo que não o quer também vender, só pode escolher entre esperar que alguém chegue ao montante de indemnização acordado, ou vendê-lo abaixo disso, para se livrar do que se tornou um problema. Se, porém, sucedeu o contrário, que foi o jogador revelar-se um flop, os empresários desaparecem do horizonte e as únicas propostas por ele que podem surgir são a titulo de empréstimo. Mas, como eles nunca aceitam baixar o salário em troca de poderem jogar regularmente noutro lado, o clube seu proprietário só tem como solução aceitar pagar-lhe parte do salário para que ele jogue por outro e assim diminua a folha salarial.
E depois há os casos intermédios, de jogadores que nem são um flop nem uma maravilha. É o caso de Nani, por exemplo: depois de quase dois anos sem mostrar valor nem no Manchester nem na Selecção, tornou-se um problema sem solução fácil - tanto mais que acha que está a «um outro nível» acima do dos clubes portugueses. Vários outros jogadores portugueses que tinham aqui uma óptima situação mas preferiram emigrar, sem se adaptarem, acabaram assim. Como Ricardo Quaresma: começam a descer a rampa devagarinho - Rússia, Turquia, clube inglês ou espanhol do meio da tabela - e, quando olham para o lado, não percebem bem o que lhes aconteceu, para já não lhes reconhecerem o mesmo valor. Outro caso é o de Fernando. o polvo portista. Não percebe que o seu valor é potenciado por pertencer a um clube com uma atitude competitiva especial e estar integrado numa escola de jogo que potencia as suas características. Sonha chegar à selecção do Brasil - o que é um sonho legítimo - mas como pode chegar lá um jogador com inegáveis características de lutador e destruidor de jogo, mas igualmente inegáveis lacunas técnicas (finta, passe e remate), que no Brasil são incompreensíveis? Diz agora o seu empresário que Fernando «tem o direito» de aspirar a mais altos voos. De facto, tem esse direito - embora eu, pessoalmente, o considere uma utopia e ache que em lado nenhum ele gozará do estatuto que tem no FC Porto. O problema, porém, não é dos direitos do Fernando, é dos deveres a que se obrigou quando assinou um contrato com o FC Porto. A noção de que não há direitos sem deveres correspondentes é coisa que não entra ali.
No mundo destes meninos de ouro parece que não existem outras regras nem outras realidades que não o meio em que se movem e os interesses que os mobilizam. Os contratos de trabalho são muito bons, mas só na hora de os assinar e enquanto não lhes acenarem com nada de melhor; os salários são fabulosos, mas desde que o empresário não lhes faça a cabeça com uma proposta irresistível; os países são muito acolhedores, desde que não lhes cobrem impostos nem contribuições para a Segurança Social ou que isso fique a cargo do clube; o futebol local é óptimo, o que não os impede, se as coisas correrem bem, de sucumbirem ao legítimo desejo de aspirarem a mais altos voos; as cidades onde vão morar são excelentes, desde que o clube lhes arranje uma vivenda ao pé do centro de treinos, porque o horário de trabalho de duas ou três horas por dia é muito cansativo; e a realidade que os envolve, os pobres e desempregados que gastam o dinheiro que não têm para irem ao estádio aplaudi-los, não é coisa que os incomode, visto que estão tão de passagem.
Alex Ferguson, um personagem de que nunca gostei, dizia, sobre David Beckham, uma coisa que percebo perfeitamente: que não era capaz de treinar um jogador que mudava de penteado todas as semanas. Ele via isso como demonstração de uma frivolidade que impediria Beckham de se concentrar a sério no seu trabalho. Não sei se terá sido isso que fez com que, a partir de certa altura, o menino bonito do futebol inglês tivesse deixado de evoluir como jogador. Mas Beckham limitou-se a antecipar uma coisa que Ferguson não viu, na altura: que vinha aí o tempo em que, além, de salários milionários, os grandes jogadores, os jogadores-vedeta, iriam ganhar tanto ou mais com a sua imagem e os direitos dela do que com a sua arte de dar pontapés numa bola (é o caso de Ronaldo e Messi, já de si, os dois jogadores mais bem pagos do planeta). E talvez merecesse um estudo sociológico aprofundado perceber como é que estas vedetas que se vestem como salteadores da feira de Carcavelos, que mudam de penteado todas as semanas (e cada um mais horrível do que o outro), que se barram de tatuagens como as torradas de manteiga, e que ganham fortunas inimagináveis arruinando os clubes, são os únicos ídolos incontestados dos tempos de hoje.
quarta-feira, agosto 07, 2013
ESCOLHAS (11 JUNHO 2013)
1- Finalmente terminou a novela Jorge Jesus, que manteve em suspenso a escolha de treinador, quer por parte do Benfica, quer do FC Porto. Entre a contestação interna e as dúvidas de muitos benfiquistas e o terror de ver Jesus emigrar para o Porto, Luís Filipe Vieira escolheu a continuidade. E, a meu ver, fez bem. Não apenas porque Jesus tem provado ser bom treinador, como ainda porque a alternativa de o deixar sair envolvia mais riscos. O que não quer dizer que a sua continuidade não envolva riscos. Sobretudo o risco imenso de voltar a perder o campeonato para o FC Porto. Alias, o medo de nova derrota frente ao FC Porto é tamanho que, no contrato com prémios por objectivos assinado entre ambas as partes, Jorge Jesus tem reservado um prémio por ganhar o campeonato nacional que é igual ao prémio de ser campeão europeu e o dobro do que receberá se vencer a Liga Europa. Um milhão de euros: eis quanto valerá a Jesus a proeza de vencer os portistas no campeonato.
Tal como aqui previ, mal Vieira anunciou a continuidade de Jesus, Pinto da Costa avançou logo com a alternativa: Paulo Fonseca. A escolha de um jovem treinador que ainda está a terminar a sua formação e que vai apenas para a terceira época num clube profissional e segunda na primeira Liga, seria uma escolha de alto risco, não se tratasse do FC Porto. É que, apesar da excelente época feita em Paços de Ferreira, que lhe valeu o justo título de treinador revelação do ano, convém não esquecer que o homem que terá por mandato renovar o título de campeão nacional e chegar aos quartos de final da Champions ainda há três anos atrás trabalhava nos escalões amadores. Mas já vimos este cenário num passado recente, com Villas Boaas e Vítor Pereira, e a mensagem de Pinto da Costa não podia ser mais clara: independentemente de mais ou menos experiência e mais ou menos talento, qualquer um corre sérios riscos de ser campeão no FC Porto. Porque o clube, o seu presidente, a sua estrutura, a sua cultura de vitória entranhada, fazem só por si o grosso do trabalho.
E assim sendo, aquilo que se pede a um treinador do FC Porto, hoje em dia, é que não complique o que esta facilitado à partida, que não tenha medo de tentar vencer sempre, que ponha a equipa a jogar à campeão e que não desperdice, antes valorize, os jovens talentos em que o clube tanto aposta, para mais tarde vender com lucros impressionantes. Em minha opinião, Vítor Pereira venceu, não complicou muito, mas falhou nos outros itens: encostou vários talentos a que não deu oportunidades; instalou um futebol de contenção em slow motion que afastou adeptos do estádio; e por vezes - como em Málaga - teve medo de vencer.
Quanto a Paulo Fonseca, a quem dou as boas-vindas. espero que ele vá aprendendo depressa, porque necessariamente começará por ter de aprender: treinar o Paços não é bem o mesmo que treinar o FC Porto...
2- Depois de perder James e Moutinho, os próximos que se perfilam na linha de saída são Atsu, Iturbe, Mangala e Fernando: quatro casos diferentes.
Atsu é um talento já comprovado e que Vítor Pereira desdenhou. Em minha opinião, mesmo com o contrato a terminar para o ano, o FC Porto não o deve deixar sair, antes tentar convencê-lo a renovar, com a ajuda do novo treinador. Iturbe nunca teve verdadeiras ocasiões para provar o que vale e, por isso mesmo, deve ser chamado para fazer a pré-época a permitir ao novo treinador avaliá-lo a sério e tentar perceber porque razão tanta gente lhe augura um futuro brilhante. Mangala foi, para mim, a revelação da época portista, a única consentida ou imposta a Vítor Pereira (e não sei se, sem a lesão de Maicon, teria sido diferente). Vai valer uma fortuna e não há pressa alguma em vendê-lo, apesar de estarem de regresso dois centrais emprestados (Sereno e Rolando) e de já ter sido contratado mais um central, Reyes - (aliás num estranho negocio noticiado pela Bola, em que o FC Porto terá pago sete milhões pelo jogador e 2,1 milhões de «comissões». Comissão na compra, e logo de 30%? Será possível?). Enfim, quanto a Fernando, confesso que já perdi a paciência para a sua rábula anual de declarar que se quer ir embora, como se estivesse numa prisão, e não a trabalhar ao abrigo de um contraio luxuoso, assinado de livre vontade. Eu cá dizia-lhe que aparecesse com uma proposta minimamente séria e deixava o ir. Talvez aprenda com o exemplo de Rolando que há mais coisas entre a realidade e os sonhos do que o excesso de ambição faz crer.
Ah, e depois de termos passado mais de meia época com um relva do em péssimas condições e depois de o ter conseguido recuperar, lá foi ele outra vez à vida graças ao concerto dos Muse - o tipo de coisa de que Pinto da Costa era opositor dantes. Oxalá tenhamos de volta, e para abrir a época, um relvado ao nível da equipa que também esperamos vir a ter!
3- Uma coisa de que eu gosto no FC Porto é que nunca somos nós a abrir as guerras e não nos desgastamos nem nos expomos ao ridículo com a produção de comunicados tão cara aos dois grandes clubes da Segunda Circular. Num momento em que os clubes têm tantos interesses comuns a defender, o corte de relações decretado pelo Sporting em relação ao FC Porto parece uma coisa do século passado, e, embora constitua um truque por demais sabido para juntar forças internas contra o inimigo inventado ad hoc e desviar as atenções de coisas bem mais graves, não deixa de ser uma bravata ridícula. Como ridículo foi o comunicado que acompanhou o gesto - tomado ainda mais falhado pela resposta que lhe deu o FC Porto: o silêncio total. A melhor resposta possível.
O mais absurdo ainda é que tal invocada falta de educação do FC Porto (aliás, de um só dirigente seu), começou sim pelo Sporting e pelo seu presidente. Foi Bruno de Carvalho quem começou por lançar suspeitas de falta de seriedade do FC Porto na venda de Moutinho, sem para tal dispor de informação e de fundamento serio. Prosseguiu depois, face a resposta óbvia de Pinto da Costa, com a piada sobre a fruta, muito saudada pelos benfiquistas — que, tendo visto a justiça a sério, e não a desportiva, recusar todos os cabazes de frutas que lhes foram apresentados contra o FC Porto, continuam a argumentar como se nada tivesse acontecido. E muito contentes fica também ver o Sporting, com tantos contenciosos em mão e no horizonte, juntar-se-lhes no elogio da justiça privada ou da concepção privada do que seja a justiça. Pelo que, e sem pôr as mãos no fogo por Adelino Caldeira, se o que ele fez é aquilo que veio relatado - deixar o presidente do Sporting de mão estendida - parece-me mais do que legítimo. Ou será que é má educação responder à má educação?
Em pano de fundo deste episódio a que a história não atribuirá grande Importância, sobram contudo duas coisas escondidas pelo incidente de Tavira. Uma, é que parece que o desfecho daquela final da Taça de Andebol foi ditado por uma dessas arbitragens que, se tem sido ao contrario, teria dado origem, no mínimo, a um comunicado indignado com origem em Alvalade. A outra é que, na situação de aperto total em que está o Sporting, já tinha havido alguns indícios de que Bruno de Carvalho estará a congeminar uma aproximação estratégica ao Benfica, que verá como útil neste momento. E isso pressupõe, primeiro, um enfrentamento com o FC Porto, espécie de prova da verdade das suas intenções sérias de se aproximar do grande clube da águia. Se assim for, recomendo aos meus amigos sportinguistas (com quem não faço tenções de cortar relações algumas), que se acautelem. O abraço benfiquista dado no passado recente a clubes como o Estoril, o Belenenses, a Académica, o Vitória de Guimarães, o Braga ou o Olhanense, não lhes deixou, propriamente, grandes e gratas recordações.
Tal como aqui previ, mal Vieira anunciou a continuidade de Jesus, Pinto da Costa avançou logo com a alternativa: Paulo Fonseca. A escolha de um jovem treinador que ainda está a terminar a sua formação e que vai apenas para a terceira época num clube profissional e segunda na primeira Liga, seria uma escolha de alto risco, não se tratasse do FC Porto. É que, apesar da excelente época feita em Paços de Ferreira, que lhe valeu o justo título de treinador revelação do ano, convém não esquecer que o homem que terá por mandato renovar o título de campeão nacional e chegar aos quartos de final da Champions ainda há três anos atrás trabalhava nos escalões amadores. Mas já vimos este cenário num passado recente, com Villas Boaas e Vítor Pereira, e a mensagem de Pinto da Costa não podia ser mais clara: independentemente de mais ou menos experiência e mais ou menos talento, qualquer um corre sérios riscos de ser campeão no FC Porto. Porque o clube, o seu presidente, a sua estrutura, a sua cultura de vitória entranhada, fazem só por si o grosso do trabalho.
E assim sendo, aquilo que se pede a um treinador do FC Porto, hoje em dia, é que não complique o que esta facilitado à partida, que não tenha medo de tentar vencer sempre, que ponha a equipa a jogar à campeão e que não desperdice, antes valorize, os jovens talentos em que o clube tanto aposta, para mais tarde vender com lucros impressionantes. Em minha opinião, Vítor Pereira venceu, não complicou muito, mas falhou nos outros itens: encostou vários talentos a que não deu oportunidades; instalou um futebol de contenção em slow motion que afastou adeptos do estádio; e por vezes - como em Málaga - teve medo de vencer.
Quanto a Paulo Fonseca, a quem dou as boas-vindas. espero que ele vá aprendendo depressa, porque necessariamente começará por ter de aprender: treinar o Paços não é bem o mesmo que treinar o FC Porto...
2- Depois de perder James e Moutinho, os próximos que se perfilam na linha de saída são Atsu, Iturbe, Mangala e Fernando: quatro casos diferentes.
Atsu é um talento já comprovado e que Vítor Pereira desdenhou. Em minha opinião, mesmo com o contrato a terminar para o ano, o FC Porto não o deve deixar sair, antes tentar convencê-lo a renovar, com a ajuda do novo treinador. Iturbe nunca teve verdadeiras ocasiões para provar o que vale e, por isso mesmo, deve ser chamado para fazer a pré-época a permitir ao novo treinador avaliá-lo a sério e tentar perceber porque razão tanta gente lhe augura um futuro brilhante. Mangala foi, para mim, a revelação da época portista, a única consentida ou imposta a Vítor Pereira (e não sei se, sem a lesão de Maicon, teria sido diferente). Vai valer uma fortuna e não há pressa alguma em vendê-lo, apesar de estarem de regresso dois centrais emprestados (Sereno e Rolando) e de já ter sido contratado mais um central, Reyes - (aliás num estranho negocio noticiado pela Bola, em que o FC Porto terá pago sete milhões pelo jogador e 2,1 milhões de «comissões». Comissão na compra, e logo de 30%? Será possível?). Enfim, quanto a Fernando, confesso que já perdi a paciência para a sua rábula anual de declarar que se quer ir embora, como se estivesse numa prisão, e não a trabalhar ao abrigo de um contraio luxuoso, assinado de livre vontade. Eu cá dizia-lhe que aparecesse com uma proposta minimamente séria e deixava o ir. Talvez aprenda com o exemplo de Rolando que há mais coisas entre a realidade e os sonhos do que o excesso de ambição faz crer.
Ah, e depois de termos passado mais de meia época com um relva do em péssimas condições e depois de o ter conseguido recuperar, lá foi ele outra vez à vida graças ao concerto dos Muse - o tipo de coisa de que Pinto da Costa era opositor dantes. Oxalá tenhamos de volta, e para abrir a época, um relvado ao nível da equipa que também esperamos vir a ter!
3- Uma coisa de que eu gosto no FC Porto é que nunca somos nós a abrir as guerras e não nos desgastamos nem nos expomos ao ridículo com a produção de comunicados tão cara aos dois grandes clubes da Segunda Circular. Num momento em que os clubes têm tantos interesses comuns a defender, o corte de relações decretado pelo Sporting em relação ao FC Porto parece uma coisa do século passado, e, embora constitua um truque por demais sabido para juntar forças internas contra o inimigo inventado ad hoc e desviar as atenções de coisas bem mais graves, não deixa de ser uma bravata ridícula. Como ridículo foi o comunicado que acompanhou o gesto - tomado ainda mais falhado pela resposta que lhe deu o FC Porto: o silêncio total. A melhor resposta possível.
O mais absurdo ainda é que tal invocada falta de educação do FC Porto (aliás, de um só dirigente seu), começou sim pelo Sporting e pelo seu presidente. Foi Bruno de Carvalho quem começou por lançar suspeitas de falta de seriedade do FC Porto na venda de Moutinho, sem para tal dispor de informação e de fundamento serio. Prosseguiu depois, face a resposta óbvia de Pinto da Costa, com a piada sobre a fruta, muito saudada pelos benfiquistas — que, tendo visto a justiça a sério, e não a desportiva, recusar todos os cabazes de frutas que lhes foram apresentados contra o FC Porto, continuam a argumentar como se nada tivesse acontecido. E muito contentes fica também ver o Sporting, com tantos contenciosos em mão e no horizonte, juntar-se-lhes no elogio da justiça privada ou da concepção privada do que seja a justiça. Pelo que, e sem pôr as mãos no fogo por Adelino Caldeira, se o que ele fez é aquilo que veio relatado - deixar o presidente do Sporting de mão estendida - parece-me mais do que legítimo. Ou será que é má educação responder à má educação?
Em pano de fundo deste episódio a que a história não atribuirá grande Importância, sobram contudo duas coisas escondidas pelo incidente de Tavira. Uma, é que parece que o desfecho daquela final da Taça de Andebol foi ditado por uma dessas arbitragens que, se tem sido ao contrario, teria dado origem, no mínimo, a um comunicado indignado com origem em Alvalade. A outra é que, na situação de aperto total em que está o Sporting, já tinha havido alguns indícios de que Bruno de Carvalho estará a congeminar uma aproximação estratégica ao Benfica, que verá como útil neste momento. E isso pressupõe, primeiro, um enfrentamento com o FC Porto, espécie de prova da verdade das suas intenções sérias de se aproximar do grande clube da águia. Se assim for, recomendo aos meus amigos sportinguistas (com quem não faço tenções de cortar relações algumas), que se acautelem. O abraço benfiquista dado no passado recente a clubes como o Estoril, o Belenenses, a Académica, o Vitória de Guimarães, o Braga ou o Olhanense, não lhes deixou, propriamente, grandes e gratas recordações.
terça-feira, agosto 06, 2013
O VAIVÉM (04 JUNHO 2013)
1- Há duas semanas, escrevi aqui sobre o «fim-de-semana perfeito» em que o FC Porto ganhou os títulos nacionais de futebol, andebol e hóquei cm patins, todos em disputa directa contra o seu maior rival dos últimos 50 anos: o Benfica. Pois este foi o fim-de-semana horríbílis: perdemos a Taça de Portugal de andebol para o Sporting, no prolongamento e, ao que parece, após erro decisivo da arbitragem; perdemos o Nacional de juvenis em futebol, no último minuto, para o Benfica; e perdemos a Liga dos Campeões em hóquei em patins, também no prolongamento e com o golo de ouro, para o Benfica, em pleno pavilhão do Dragão. Afinal, a maldição da morte na praia não acontece só aos outros e ainda bem: se fosse sempre o mesmo a ganhar tudo,isto não teria graça alguma.
Da todas as derrotas do fim de semana a que mais doeu foi a do hóquei. Primeiro, porque há mais de 20 anos que não ganhamos o título europeu, de tal maneira, que eu já tinha interiorizado que esta era uma competição onde as equipes portuguesas, com FC Porto à cabeça, entravam sempre e, no final, ganhavam os espanhóis. Segundo, porque o jogo e o título decidiam-se em nossa casa, o que era uma vantagem clara. Terceiro, porque a final, desta vez, não era contra espanhóis, mas contra o Benfica, a quem, há quinze dias, havíamos goleado tranquilamente. E quarto, porque, depois da cena que o Benfica fez na véspera, na noite anterior e na manhã do próprio jogo, dizendo que não havia condições para disputar a final no Dragâo e ameaçando não comparecer (como já havia feito na final do vólei, contra o Sp. Espinho), o que eles mereciam era serem novamente sovados no rinque. Mas, não: ganharam e parabéns. Por uma vez, conseguiram passar do estatuto de campeões dos comunicados, dos conflitos, da instigação ao ódio e à arruaça, à condição de campeões em campo. Mas, mesmo perdendo, o FC Porto foi campeão numa coisa que o Benfica já provou vezes de mais ser incapaz de o ser: no comportamento exemplar do publico, no desportivismo a aceitar a derrota e na bofetada de luva branca com que respondeu aos comunicados provocadores do Benfica. Afinal, o que eles tinham apenas era medo de perder.
Uma semana depois do degradante espectáculo de anti-desportivismo e arrogância mal-educada que o Benfica deu na final da Taça contra o V. Guimarães, à vista de um país inteiro, o mínimo expectável era que, na ocasião imediatamente seguinte, se coibisse de repetir a fórmula. Tanto mais que é uma fórmula de insucesso: o Benfica só voltará à grandeza que já teve no dia em que perceber que não é mais nem menos que os outros e que não lhe assiste nenhum estatuto de grande senhor do desporto português, a quem tudo é consentido e perdoado. Celebrem o título do hóquei e meditem na lição que deu o público portista.
2- À hora a que escrevo, no dia de ontem, não são ainda conhecidos os treinadores de Benfica e FC Porto para a época que vem. A situação é absolutamente excepcional e a coincidência é tudo menos ocasional. Diga a imprensa o que disser, o impasse existe apenas porque ambos os presidentes estão dependentes e paralisados pela decisão que o outro tomar: no dia em que um deles se decidir, o outro decide-se logo a seguir. E, diga a imprensa o que disser, a mim ninguém me convence que a única coisa que os trava é um nome: Jorge Jesus.
Por mais que escrevam que nem Jesus nem Vítor Pereira se decidiram ainda a aceitar as propostas de renovação recebidas, a verdade parece-me oposta: nem Vieira nem Pinto da Costa se decidiram ainda a apresentar verdadeiras propostas de renovação. Pinto da Costa está à espera que Viera anuncie o desenlace com Jesus. E Vieira está à espera que Pinto da Costa anuncie um treinador para, só então, decidir o que faz com Jesus. Porque, acima de tudo, o que ele mais teme é que Jesus acabe no FC Porto e que, como é tradicional, aí conquiste o que não conseguiu conquistar no Benfica. Seria a humilhação extrema, e o medo é tão real (conhecendo Pinto da Costa), que o presidente do Benfica está paralisado entre a vontade maioritária da Direcção e dos benfiquistas de dizer adeus a Jorge Jesus e o terror de o ver no Dragão, a fazer aquilo que Vítor Pereira não faz: encher o estádio e potenciar os valores adormecidos e desperdiçados do catálogo azul-e-branco.
Para desempatar este divertidíssimo jogo do gato e do rato, eu, enquanto portista, acho que é Pinto da Costa que pode e deve fazê-lo. Dispensa Vítor Pereira e vai buscar melhor; depois, das duas uma: ou Jesus sai do Benfica e o Benfica vai para pior, ou Jesus permanece no Benfica e com outro e melhor treinador o FC Porto ganhará na mesma. Porque a fórmula de sucesso no FC Porto é esta: 40% das vitórias devem-se a organização e ao presidente; 30% à equipa; 20% aos treinadores; 10% ao público. Mudando o treinador, pouco muda. E se mudar para melhor, mais crescem ainda as hipóteses de sucesso.
3- Depois de ter criticado Bruno de Carvalho pelo que reputo ser a sua irrazoável posição no caso da venda de João Moutinho ao Mónaco que me parece fruto de uma tendência para falar grosso e imponderadamente, talvez corro expediente para afirmar uma autoridade que vai ser difícil de manter em tempos de extrema dificuldade — devo agora elogiá-lo pela entrevista que aqui deu, na semana passada. À medida que vai conhecendo as dossiers do futebol do Sporting, Bruno de Carvalho não consegue deixar de ficar escandalizado com muitas coisas que a mim também me escarnializam e de que aqui venho dando conta, ao longos dos anos. Há demasiada gente a chular os clubes e demasiadamente: comissões escabrosas dos agentes nos negócios de venda, mas também nos de compra e nas renovações de contratos; fundos obscuros a intermediarem os negócios e a partilharem fatias dos jogadores, ora vendendo-as, ora comprando-as; preços de venda anunciados que nunca correspondem (e às vezes nem de perto) aquilo que os clubes efectivamente encaixam; empresários com quem se continua a negociar mesmo depois de terem enfiado vários barretes aos clubes; clubes amigos dos empresários que não pagam o preço a que se obrigaram numa compra até terem vendido esse mesmo jogador a um terceiro clube; e por aí fora, num mundo submerso de negociatas, que, pelos vistos, não preocupa nenhum Conselho Fiscal nem nenhuma CMVM - apesar de os clube serem SAD, com acções cotadas em bolsa, e as quais, apesar de jamais terem remunerado com um euro que fosse os accionistas, são perdulárias a distribuir lucros, quando os há, entre os administradores.
Numa palavra, e como muito bem diz Bruno de Carvalho: um estranho negócio em que os grandes clubes estão arruinados, esmagados por uma dívida absurda, mas toda a gente que gravita a sua volta está rica à conta do clube.
4- Oxalá eu esteja redondamente enganado, mas as minhas esperanças na vitória de Portugal contra a Rússia e no subsequente apuramento para o Mundial do Brasil são mesmo escassas. E não é tanto porque não confie no seleccionador ou nas escolhas dele: é porque não vejo esta Selecção com capacidade de chegar ao Mundial. E, seguramente, das mais fracas Selecções que me lembro de ter visto nos últimos trinta anos. Porém, o futebol é sempre imprevisto e os factores de sucesso de uma Selecção ainda o são mais.
Veja-se o caso do Brasil, que foi buscar Scolari, depois de anos de sucessivos insucessos pela Europa e arredores. Sob o seu comando, o Brasil ainda não conseguiu ganhar um jogo de preparação, mas ninguém se atreve a prognosticar que não consiga ganhar o Mundial, empurrado por todo um povo de 200 milhões de adoradores e a vontade da FIFA.
Da todas as derrotas do fim de semana a que mais doeu foi a do hóquei. Primeiro, porque há mais de 20 anos que não ganhamos o título europeu, de tal maneira, que eu já tinha interiorizado que esta era uma competição onde as equipes portuguesas, com FC Porto à cabeça, entravam sempre e, no final, ganhavam os espanhóis. Segundo, porque o jogo e o título decidiam-se em nossa casa, o que era uma vantagem clara. Terceiro, porque a final, desta vez, não era contra espanhóis, mas contra o Benfica, a quem, há quinze dias, havíamos goleado tranquilamente. E quarto, porque, depois da cena que o Benfica fez na véspera, na noite anterior e na manhã do próprio jogo, dizendo que não havia condições para disputar a final no Dragâo e ameaçando não comparecer (como já havia feito na final do vólei, contra o Sp. Espinho), o que eles mereciam era serem novamente sovados no rinque. Mas, não: ganharam e parabéns. Por uma vez, conseguiram passar do estatuto de campeões dos comunicados, dos conflitos, da instigação ao ódio e à arruaça, à condição de campeões em campo. Mas, mesmo perdendo, o FC Porto foi campeão numa coisa que o Benfica já provou vezes de mais ser incapaz de o ser: no comportamento exemplar do publico, no desportivismo a aceitar a derrota e na bofetada de luva branca com que respondeu aos comunicados provocadores do Benfica. Afinal, o que eles tinham apenas era medo de perder.
Uma semana depois do degradante espectáculo de anti-desportivismo e arrogância mal-educada que o Benfica deu na final da Taça contra o V. Guimarães, à vista de um país inteiro, o mínimo expectável era que, na ocasião imediatamente seguinte, se coibisse de repetir a fórmula. Tanto mais que é uma fórmula de insucesso: o Benfica só voltará à grandeza que já teve no dia em que perceber que não é mais nem menos que os outros e que não lhe assiste nenhum estatuto de grande senhor do desporto português, a quem tudo é consentido e perdoado. Celebrem o título do hóquei e meditem na lição que deu o público portista.
2- À hora a que escrevo, no dia de ontem, não são ainda conhecidos os treinadores de Benfica e FC Porto para a época que vem. A situação é absolutamente excepcional e a coincidência é tudo menos ocasional. Diga a imprensa o que disser, o impasse existe apenas porque ambos os presidentes estão dependentes e paralisados pela decisão que o outro tomar: no dia em que um deles se decidir, o outro decide-se logo a seguir. E, diga a imprensa o que disser, a mim ninguém me convence que a única coisa que os trava é um nome: Jorge Jesus.
Por mais que escrevam que nem Jesus nem Vítor Pereira se decidiram ainda a aceitar as propostas de renovação recebidas, a verdade parece-me oposta: nem Vieira nem Pinto da Costa se decidiram ainda a apresentar verdadeiras propostas de renovação. Pinto da Costa está à espera que Viera anuncie o desenlace com Jesus. E Vieira está à espera que Pinto da Costa anuncie um treinador para, só então, decidir o que faz com Jesus. Porque, acima de tudo, o que ele mais teme é que Jesus acabe no FC Porto e que, como é tradicional, aí conquiste o que não conseguiu conquistar no Benfica. Seria a humilhação extrema, e o medo é tão real (conhecendo Pinto da Costa), que o presidente do Benfica está paralisado entre a vontade maioritária da Direcção e dos benfiquistas de dizer adeus a Jorge Jesus e o terror de o ver no Dragão, a fazer aquilo que Vítor Pereira não faz: encher o estádio e potenciar os valores adormecidos e desperdiçados do catálogo azul-e-branco.
Para desempatar este divertidíssimo jogo do gato e do rato, eu, enquanto portista, acho que é Pinto da Costa que pode e deve fazê-lo. Dispensa Vítor Pereira e vai buscar melhor; depois, das duas uma: ou Jesus sai do Benfica e o Benfica vai para pior, ou Jesus permanece no Benfica e com outro e melhor treinador o FC Porto ganhará na mesma. Porque a fórmula de sucesso no FC Porto é esta: 40% das vitórias devem-se a organização e ao presidente; 30% à equipa; 20% aos treinadores; 10% ao público. Mudando o treinador, pouco muda. E se mudar para melhor, mais crescem ainda as hipóteses de sucesso.
3- Depois de ter criticado Bruno de Carvalho pelo que reputo ser a sua irrazoável posição no caso da venda de João Moutinho ao Mónaco que me parece fruto de uma tendência para falar grosso e imponderadamente, talvez corro expediente para afirmar uma autoridade que vai ser difícil de manter em tempos de extrema dificuldade — devo agora elogiá-lo pela entrevista que aqui deu, na semana passada. À medida que vai conhecendo as dossiers do futebol do Sporting, Bruno de Carvalho não consegue deixar de ficar escandalizado com muitas coisas que a mim também me escarnializam e de que aqui venho dando conta, ao longos dos anos. Há demasiada gente a chular os clubes e demasiadamente: comissões escabrosas dos agentes nos negócios de venda, mas também nos de compra e nas renovações de contratos; fundos obscuros a intermediarem os negócios e a partilharem fatias dos jogadores, ora vendendo-as, ora comprando-as; preços de venda anunciados que nunca correspondem (e às vezes nem de perto) aquilo que os clubes efectivamente encaixam; empresários com quem se continua a negociar mesmo depois de terem enfiado vários barretes aos clubes; clubes amigos dos empresários que não pagam o preço a que se obrigaram numa compra até terem vendido esse mesmo jogador a um terceiro clube; e por aí fora, num mundo submerso de negociatas, que, pelos vistos, não preocupa nenhum Conselho Fiscal nem nenhuma CMVM - apesar de os clube serem SAD, com acções cotadas em bolsa, e as quais, apesar de jamais terem remunerado com um euro que fosse os accionistas, são perdulárias a distribuir lucros, quando os há, entre os administradores.
Numa palavra, e como muito bem diz Bruno de Carvalho: um estranho negócio em que os grandes clubes estão arruinados, esmagados por uma dívida absurda, mas toda a gente que gravita a sua volta está rica à conta do clube.
4- Oxalá eu esteja redondamente enganado, mas as minhas esperanças na vitória de Portugal contra a Rússia e no subsequente apuramento para o Mundial do Brasil são mesmo escassas. E não é tanto porque não confie no seleccionador ou nas escolhas dele: é porque não vejo esta Selecção com capacidade de chegar ao Mundial. E, seguramente, das mais fracas Selecções que me lembro de ter visto nos últimos trinta anos. Porém, o futebol é sempre imprevisto e os factores de sucesso de uma Selecção ainda o são mais.
Veja-se o caso do Brasil, que foi buscar Scolari, depois de anos de sucessivos insucessos pela Europa e arredores. Sob o seu comando, o Brasil ainda não conseguiu ganhar um jogo de preparação, mas ninguém se atreve a prognosticar que não consiga ganhar o Mundial, empurrado por todo um povo de 200 milhões de adoradores e a vontade da FIFA.
segunda-feira, agosto 05, 2013
DESPEDIDAS (28 MAIO 2013)
1- DE JAMES E MOUTINHO: sucumbiram ao perfume do dinheiro do novo-novo-rico do futebol europeu, o Mónaco, o último recém-chegado ao campeonato do fair-play financeiro do Sr. Platini. Mas, como para fazer uma grande equipa não basta um livro de cheques de um desses pouco recomendáveis milionários russos, Moutinho e James vão andar para trás, desportivamente. Mais lamentável ainda no caso de James, um fora-de-série e o meu jogador preferido no actual plantel portista. Mas, ao menos, desta vez, reconheço que o negócio era irresistível para o FC Porto. O problema é como sempre, o destino que vai ser dado aos 70 milhões. O FC Porto é o campeão europeu de vendas: na última década, facturou 500 milhões em vendas, mais do que qualquer outro clube da Europa. Não tendo esse dinheiro servido para pagar ou amortizar substancialmente o passivo, torna-se difícil de entender porque é preciso vender os melhores, ano após ano. De qualquer modo, com as suas saídas, abrem-se duas vagas de preenchimento urgente e complicado. O FC Porto já foi comprando alguns jovens, mas não parece que venha daí a solução. Se fosse eu a escolher, no mercado interno, apostava em dois jogadores: Mossoró e Ghilas. Nenhum deles fará esquecer, de forma alguma, quer James, quer Moutinho. Mas com 70 milhões no bolso, dá para comprar não apenas os excepcionais, mas também os muito úteis.
DE VÍTOR PEREIRA (?): pareceu-me evidente que Pinto da Costa, na entrevista à RTP, não disfarçou a vontade de abrir um ciclo pós-Vítor Pereira. Independentemente do desempenho do técnico que o FC Porto inventou e lançou em altos voos, julgo que o presidente portista sente o mesmo que eu: Vítor Pereira, conservador até à medula, é um notável desperdiçador de jovens talentos. Só para que ninguém beliscasse o estatuto do seu inamovível Varela, ele desperdiçou o talento de James em metade da época passada, até ao momento em que precisou dele para ganhar o campeonato; e desaproveitou, sem lhes dar qualquer hipótese séria, Djalma, Candeias, Iturbe e Kelvin — a quem apenas confiou a missão impossível, e milagrosamente cumprida, de lhe ganhar o campeonato, jogando 15 minutos contra o Braga e outros tantos contra o Benfica. O caso mais chocante, porém, foi o de Atsu, um verdadeiro diamante em estado bruto, para cuja lapidação não teve nem visão, nem talento, nem paciência. (Julgo, contudo, que o FC Porto, mesmo a um ano do fim do contrato, não o deve deixar sair por menos que os 10 milhões da cláusula de rescisão. E pode ser que com um novo treinador, que perceba o que tem entre mãos, Atsu reveja a decisão de não renovar). Apesar da campanha montada na imprensa, com a colaboração forçada dos próprios jogadores , para a continuação de Vítor Pereira, eu espero que Pinto da Costa, como sempre, saiba resolver o assunto elegantemente, privilegiando os interesses do clube, acima de tudo.
DE JORGE JESUS (?): Escrevi aqui há três semanas, que, apesar das declarações firmes de Luís Filipe Vieira, nada estava decidido quanto à continuação do técnico benfiquista. O final da época do Benfica e de Jesus, culminando naquela tão feia prestação no Jamor (em vários aspectos, que agora seria de mau gosto enumerar), teve qualquer coisa de tragédia grega. E foi de uma grande injustiça para Jorge Jesus. Mas não está escrito em lado algum que o futebol tenha de ser justo. E o Guimarães aliás, bem mereceu a alegria de um titulo nacional.
DE JOSE MOURINHO: também o final da Taça do Rei, culminando com a sua expulsão e o seu comportamento no banco, foi um final penoso para a passagem de Mourinho pelo Real Madrid. Perdeu muito mais do que ganhou e com a agravante de raramente ter sabido perder. Por uma vez, aconteceu-lhe o impensável de fazer o pleno das críticas; sai de mal com o clube, os adeptos, a imprensa e os próprios jogadores. No seu regresso ao lugar onde foi feliz espera-o tudo menos condescendência. Nunca é tarde para meditar.
DE ALEX FERGUSON:Outro técnico que se despede, mas este da profissão. Não mergulho no mar de homenagens a Sir Alex. Vi-o sempre como uma personagem arrogante, incapaz de reconhecer mérito aos que não pertencem ao clube de milionários do Manchester United, e sem pinga de desportivismo. É fácil ser treinador de sucesso quando se tem dinheiro para comprar tudo o que os pobrezinhos têm de bom. Para grande gáudio dos benfiquistas, Sir Alex declarou um dia que o FC Porto ganhava tanto que só podia comprar os títulos no supermercado. Mas não desdenhava abastecer-se de jogadores no supermercado portista, aproveitando as mais-valias criadas pelo FC Porto e que, nas mãos dele, nunca jogavam o mesmo — como Anderson.
DE DAVID BECKHAM: também se despediu do futebol, ficando para a verdadeira história como um jogador que era jeitoso apenas a cobrar cantos e livres e a promover lingerie masculina.
2- A guerra que o Sporting abriu ao FC Porto a propósito dos valores da venda de João Montinho ao Mónaco, podia ter, à partida, razão de ser; mas, avaliada com alguma calma, nada subsiste de válido.
Podia ter razão de ser, porque, vendendo dois jogadores em pacote e por um preço unitário, a tentacão de baixar o preço declarado por Moutinho para assim ter de pagar menos ao Sporting, era, de facto, muito forte: não sei o que faria o Sporting, em idêntica posição. Todavia, a verdade é que, há três anos, quando se queria desfazer a todo o custo do que chamou «uma maçã podre», o Sporting pôs Moutinho no mercado e não conseguiu melhor do que os 11 milhões que o FC Porto pagou em dinheiro, mais o passe de Nuno André Coelho, um jogador estragado em Alvalade. Se Moutinho hoje valeu 25 milhões, não é porque já valesse isso então, mas porque a camisola e a escola do FC Porto o valorizou para mais do dobro. Nunca o Sporting conseguiu ou conseguiria vendê-lo próximo desses valores e devia era agradecer a quem o fez por si, reservando-lhe uma fatia de 3,5 milhões a titulo de «enriquecimento sem causa», como se diz no Código Civil. O argumento de que Moutinho foi vendido abaixo da cláusula de rescisão, não vale nada; as cláusulas de rescisão só servem para proteger os clubes que não querem vender e, em Portugal, todos querem. Raros são os jogadores negociados de livre vontade que saem pelo preço da cláusula: também James saiu abaixo e Hulk, por exemplo, que tinha uma cláusula de 100 milhões, saiu por 40. A diferença declarada entre os preços de venda de Moutinho e James parece-me bem razoável e até simpática para o Sporting: Moutinho é um grande jogador, um chefe de orquestra, mas não pertence à espécie dos jogadores que decidem jogos e que são os mais disputados. James é um fora-de-série, bastante mais novo e com uma margem de progressão indiscutivelmente maior.
Penso que nem o sportinguista mais feroz defenderia que o preço certo seria o mesmo para ambos: 35 milhões. Deste modo, estamos a falar de quê: de 30 milhões por Moutinho e 40 por James, em vez dos 25/45 declarados? OK, seja: isso daria mais 1,250 milhões para o Sporting. Vale a pena abrir uma guerra e questionar publicamente a seriedade de outro clube por 1,2 milhões de euros? E quando essa guerra tem como único fundamento querer ganhar mais uns euros à custa do mérito alheio? Bruno de Carvalho só sairia com razão disto, se fosse capaz de proclamar «eu conseguia vender o João Moutinho por mais de 25 milhões!». Mas, se assim fosse, porque não se apresentou ao FC Porto com uma proposta superior para a venda de Moutinho? A ver vamos se daqui até ao final do defeso ele consegue vender algum jogador pelos mesmos 3,5 milhões de comissão de mais valias que o FC Porto agora lhe pagou. E, tendo pago no total 14,5 milhões, mais o passe de Nuno André Coelho, avaliado então em 2,5 milhões, se a memória me não falha, o FC Porto equivaleu o mais alto valor alguma vez pago por um jogador do Sporting: os 17 milhões pelos quais Ronaldo foi vendido ao Manchester United. Não chega? Façam melhor.
DE VÍTOR PEREIRA (?): pareceu-me evidente que Pinto da Costa, na entrevista à RTP, não disfarçou a vontade de abrir um ciclo pós-Vítor Pereira. Independentemente do desempenho do técnico que o FC Porto inventou e lançou em altos voos, julgo que o presidente portista sente o mesmo que eu: Vítor Pereira, conservador até à medula, é um notável desperdiçador de jovens talentos. Só para que ninguém beliscasse o estatuto do seu inamovível Varela, ele desperdiçou o talento de James em metade da época passada, até ao momento em que precisou dele para ganhar o campeonato; e desaproveitou, sem lhes dar qualquer hipótese séria, Djalma, Candeias, Iturbe e Kelvin — a quem apenas confiou a missão impossível, e milagrosamente cumprida, de lhe ganhar o campeonato, jogando 15 minutos contra o Braga e outros tantos contra o Benfica. O caso mais chocante, porém, foi o de Atsu, um verdadeiro diamante em estado bruto, para cuja lapidação não teve nem visão, nem talento, nem paciência. (Julgo, contudo, que o FC Porto, mesmo a um ano do fim do contrato, não o deve deixar sair por menos que os 10 milhões da cláusula de rescisão. E pode ser que com um novo treinador, que perceba o que tem entre mãos, Atsu reveja a decisão de não renovar). Apesar da campanha montada na imprensa, com a colaboração forçada dos próprios jogadores , para a continuação de Vítor Pereira, eu espero que Pinto da Costa, como sempre, saiba resolver o assunto elegantemente, privilegiando os interesses do clube, acima de tudo.
DE JORGE JESUS (?): Escrevi aqui há três semanas, que, apesar das declarações firmes de Luís Filipe Vieira, nada estava decidido quanto à continuação do técnico benfiquista. O final da época do Benfica e de Jesus, culminando naquela tão feia prestação no Jamor (em vários aspectos, que agora seria de mau gosto enumerar), teve qualquer coisa de tragédia grega. E foi de uma grande injustiça para Jorge Jesus. Mas não está escrito em lado algum que o futebol tenha de ser justo. E o Guimarães aliás, bem mereceu a alegria de um titulo nacional.
DE JOSE MOURINHO: também o final da Taça do Rei, culminando com a sua expulsão e o seu comportamento no banco, foi um final penoso para a passagem de Mourinho pelo Real Madrid. Perdeu muito mais do que ganhou e com a agravante de raramente ter sabido perder. Por uma vez, aconteceu-lhe o impensável de fazer o pleno das críticas; sai de mal com o clube, os adeptos, a imprensa e os próprios jogadores. No seu regresso ao lugar onde foi feliz espera-o tudo menos condescendência. Nunca é tarde para meditar.
DE ALEX FERGUSON:Outro técnico que se despede, mas este da profissão. Não mergulho no mar de homenagens a Sir Alex. Vi-o sempre como uma personagem arrogante, incapaz de reconhecer mérito aos que não pertencem ao clube de milionários do Manchester United, e sem pinga de desportivismo. É fácil ser treinador de sucesso quando se tem dinheiro para comprar tudo o que os pobrezinhos têm de bom. Para grande gáudio dos benfiquistas, Sir Alex declarou um dia que o FC Porto ganhava tanto que só podia comprar os títulos no supermercado. Mas não desdenhava abastecer-se de jogadores no supermercado portista, aproveitando as mais-valias criadas pelo FC Porto e que, nas mãos dele, nunca jogavam o mesmo — como Anderson.
DE DAVID BECKHAM: também se despediu do futebol, ficando para a verdadeira história como um jogador que era jeitoso apenas a cobrar cantos e livres e a promover lingerie masculina.
2- A guerra que o Sporting abriu ao FC Porto a propósito dos valores da venda de João Montinho ao Mónaco, podia ter, à partida, razão de ser; mas, avaliada com alguma calma, nada subsiste de válido.
Podia ter razão de ser, porque, vendendo dois jogadores em pacote e por um preço unitário, a tentacão de baixar o preço declarado por Moutinho para assim ter de pagar menos ao Sporting, era, de facto, muito forte: não sei o que faria o Sporting, em idêntica posição. Todavia, a verdade é que, há três anos, quando se queria desfazer a todo o custo do que chamou «uma maçã podre», o Sporting pôs Moutinho no mercado e não conseguiu melhor do que os 11 milhões que o FC Porto pagou em dinheiro, mais o passe de Nuno André Coelho, um jogador estragado em Alvalade. Se Moutinho hoje valeu 25 milhões, não é porque já valesse isso então, mas porque a camisola e a escola do FC Porto o valorizou para mais do dobro. Nunca o Sporting conseguiu ou conseguiria vendê-lo próximo desses valores e devia era agradecer a quem o fez por si, reservando-lhe uma fatia de 3,5 milhões a titulo de «enriquecimento sem causa», como se diz no Código Civil. O argumento de que Moutinho foi vendido abaixo da cláusula de rescisão, não vale nada; as cláusulas de rescisão só servem para proteger os clubes que não querem vender e, em Portugal, todos querem. Raros são os jogadores negociados de livre vontade que saem pelo preço da cláusula: também James saiu abaixo e Hulk, por exemplo, que tinha uma cláusula de 100 milhões, saiu por 40. A diferença declarada entre os preços de venda de Moutinho e James parece-me bem razoável e até simpática para o Sporting: Moutinho é um grande jogador, um chefe de orquestra, mas não pertence à espécie dos jogadores que decidem jogos e que são os mais disputados. James é um fora-de-série, bastante mais novo e com uma margem de progressão indiscutivelmente maior.
Penso que nem o sportinguista mais feroz defenderia que o preço certo seria o mesmo para ambos: 35 milhões. Deste modo, estamos a falar de quê: de 30 milhões por Moutinho e 40 por James, em vez dos 25/45 declarados? OK, seja: isso daria mais 1,250 milhões para o Sporting. Vale a pena abrir uma guerra e questionar publicamente a seriedade de outro clube por 1,2 milhões de euros? E quando essa guerra tem como único fundamento querer ganhar mais uns euros à custa do mérito alheio? Bruno de Carvalho só sairia com razão disto, se fosse capaz de proclamar «eu conseguia vender o João Moutinho por mais de 25 milhões!». Mas, se assim fosse, porque não se apresentou ao FC Porto com uma proposta superior para a venda de Moutinho? A ver vamos se daqui até ao final do defeso ele consegue vender algum jogador pelos mesmos 3,5 milhões de comissão de mais valias que o FC Porto agora lhe pagou. E, tendo pago no total 14,5 milhões, mais o passe de Nuno André Coelho, avaliado então em 2,5 milhões, se a memória me não falha, o FC Porto equivaleu o mais alto valor alguma vez pago por um jogador do Sporting: os 17 milhões pelos quais Ronaldo foi vendido ao Manchester United. Não chega? Façam melhor.