terça-feira, junho 28, 2011

OS DIAS DE VERÃO (20 JULHO 2010)

Se tivesse que dizer do que mais gosto nas férias de Verão, talvez dissesse que é da rotina destes dias — a qual, sendo sempre igual de ano para ano, é uma espécie de garante da continuidade das coisas, da certeza de que o essencial está em ordem, mesmo que a vida se desordene tantas vezes.

E da rotina destes dias, o que mais gosto é das primeiras horas da manhã, antes de conseguir ir para a praia.

Começa com o canto das rolas no pinhal e os ruídos da manhã, que vêm de longe, transportados à distância, com uma nitidez que só acontece no Verão. Acordo para a manhã cheia de luz e comum calor ainda suportável e apresso-me para chegar ao mercado do peixe quando a escolha ainda é abundante e os olhos se enchem de bancas azuis, prateadas, vermelhas, brancas e no ar há um cheiro a meloa e coentros. Vou e venho pelo vai-vém, a barca que, por 60 cêntimos, nos atravessa de um lado para o outro do rio, à hora em que os barcos de recreio vão saindo e as últimas traineiras vêm chegando da sua noite de pesca. Mas, antes disso, antes de apanhar o barco e atravessar para o lado de lá da cidade, onde fica o mercado, paro invariavelmente num café junto aos barcos para tomar o pequeno-al-moço e ler os jornais do dia, comprados na tabacaria ao lado. E começo pela sagrada leitura da BOLA, com que as manhãs de Verão sempre começam desde que me lembro de haver Verão.

Por estes dias de Julho, a leitura da BOLA também tem a sua imutável rotina. Agora, que as vedetas dos estádios já acabaram também a sua estação algarvia — invariavelmente passada em Vilamoura e no bar do tal Paulo China, onde esperam ser fotografados pelas revistas do jet seis (o jet set não vai para Vilamoura nem frequenta locais onde possa ser fotografado) — vive-se a longa estação da chamada pré-época. Os três grandes partem durante uns dez dias para algum hotel paradisíaco situado nos Alpes ou nos Pirinéus, onde pagam com o corpo os copos bebidos nas férias e o treinador tenta integrar e dar espírito de corpo a uma pequena multinacional de brasileiros, argentinos, colombianos, senegaleses, polacos e portugueses. Por mais esforços que façam os enviados dos jornais, não há muito para contar nem muito para ler desses dias de pasmaceira: há sempre um novo jogador que «é mesmo reforço», um outro que «mostrou pormenores de qualidade» (ou seja, não mostrou nada) e outro, que passou a época anterior sentado no banco de suplentes e que agora se exibe como «inesperado reforço» — mas que logo voltará ao seu patamar de Peter.

E, depois, claro, há a infindável novela dos craques que vão ser comprados e dos que vão ser vendidos. Os primeiros, acabam sempre por se revelar mais caros do que as fracas bolsas dos clubes portugueses desejariam, e as iminentes aquisições arrastam-se com «arestas por limar» ou na expectativa da chegada do empresário que há-de «desbloquear» as negociações. Os segundos, pelo contrário, afinal não encontram compradores pelo preço que era suposto valerem e, claro, sempre muito aquém das célebres «cláusulas de rescisão», com que os adeptos que os não querem ver vendidos são tranquilizados... antes de se verem iludidos. O Benfica, depois de anos e anos em que não via ninguém interessar-se por qualquer jogador seu, tem agora, e como é sabido, «meia-Europa» atrás do Luisão (um clássico de todas as épocas), e do David Luiz e Fábio Coentrão. E, ora incham de orgulho com tanta cobiça relatada, ora descansam impantes com a «intransigência» da SAD em não os vender por menos do que a cláusula de rescisão — como sucedeu com o Di Maria... O Sporting, depois do surpreendente negócio do João Moutinho, desespera agora para que alguém venha e faça também do Miguel Veloso um «traidor», para que a situação financeira, já em alerta vermelho, não entre em alerta negro. E, entretanto, mantendo a prosápia de grande, vai escorregando para os jornais notícias do seu interesse na compra de sucessivos nomes de peso internacionais que, todavia, por esta e aquela razão, acabam sempre não vindo. Mas o que importa é a notícia do «estatuto», poder dizer que «o Sporting está no mercado», mesmo que, depois, tudo se reduza ao novo sportinguista desde pequenino e novo patrão do meio-campo, Maniche. O FC Porto, cuja SAD nunca resiste a comprar uma dúzia de jogadores mais no início de cada época, desespera também para encontrar comprador para o Bruno Alves e o Raul Meireles, nessa meia-Europa que também suspira por eles há tanto tempo. E, embora neste caso, até já se tenha feito saber aos quatro ventos que as cláusulas de rescisão não interessam para nada, começa a crescer a angústia de que não haja dinheiro para pagar as novas aquisições, sem ter de entrar em saldos ou então a ter de vender os que não estavam nos planos: o Álvaro Pereira, o Falcão ou o Hulk. (Já agora, e não sabendo se ainda vou a tempo, gostaria de exprimir um desejo de portista: que a SAD não compre o tal Walter, que tem alimentado um longo romance nestes dias de férias. E por várias razões: porque não gosto do nome nem da cara dele; porque, tão jovem ainda, já arrasta uma fama de indisciplinado e regateiro nas negociações; e porque, embora eu entenda que um miúdo nascido miserável numa favela brasileira não tenha tido condições para ir à escola, já não entendo que, aos 20 anos de idade, já rico e futebolista — isto é, com um horário de trabalho de três horas por dia — não tenha arranjado tempo para aprender a ler e a escrever. E, no futebol de hoje, um jogador analfabeto é uma menos-valia, em todos os aspectos. Mas este meu desejo já deve estar desajustado: naquela casa há uma adição por compras verdadeiramente fatal).

E assim, entre a paz das férias e angústia do mercado de jogadores, vou vivendo este tempo mágico do Verão. Como todos os portistas, habituei-me, nesta altura do ano, a olhar a medo para os cabeçalhos da BOLA, assim que a compro. Nos últimos anos, em Julho, vários dias se estragaram, quando olhei para a primeira página do jornal e vi que tínhamos perdido o Deco, o Pepe, o Quaresma, o Anderson, o Lucho, o Lisandro, etc. Mas, não sei porquê, nunca leio outro tipo de notícias: «perdemos» o Helton, o Stepanov, o Mariano, o Guarín, o Valeri, o Prediger. Nem sequer o Farias, mesmo dado! Li que André Vilas-Boas tem ao seu dispor 37 jogadores — não contando com aqueles que já nem sequer se apresentam no Dragão para se mostrarem ao novo treinador e que por aí andam, dispersos pelo mundo, a engrossar a folha salarial de uma empresa que se dá ao luxo de ter menos trabalhadores ao seu serviço do que aqueles que estão permanentemente dispensados de serviço. E li que, desses 37, ele só queria ficar com 23. Mas, como começa a instalar-se a ideia de que nem Meireles nem Bruno Alves vão encontrar o tão anunciado comprador ao virar da esquina, os 23 já subiram para 25 — limite máximo. O que quer dizer que, queira ou não queira, Villas-Boas vai acabar com 28 a 30, como sempre sucede com os treinadores que por lá passam. O primeiro trabalho de um treinador do FC Porto é gerir a quantidade; só depois é que tem de gerir a qualidade.

Bem, vou voltar para férias. Espero ter boas notícias do Walter, quando abrir o jornal, hoje de manhã.

BRAVO, ESPANHA! (13 JULHO 2010)

1- Não faço parte daqueles portugueses que vivem a invejar e maldizer a Espanha e a repetir a estafada frase dos maus ventos e maus casamentos. Pelo contrário, até aprendi que Filipe IV foi dos melhores governantes que já tivemos e não invejo a Espanha: admiro-a. Considero a Espanha uma fabulosa pátria de nações, cuja diversidade é a sua força e cuja relação com o poder central não é feita de lamúrias e reivindicações constantes, mas de gestos concretos de vontade e personalidade própria, da comunidade e das regiões. Em Portugal, vive-se a reclamar do poder — subsídios, privilégios, apoios; em Espanha, faz-se e avança-se, sem o poder e, se necessário, contra ele. Nós fizemos as Descobertas através de um monopólio da coroa, em que muitas vezes os capitães, os donatários e os governantes locais eram escolhidos pelo antiquíssimo e sempre actual sistema da «cunha»; os espanhóis descobriram a América com fundos e iniciativa privada, saída dos empresários de Sevilha.
Eu não invejo a Espanha, eu admiro-a. Admiro um país que teve Velásquez, Goya, Dali, Picasso, Miro, Cervantes, Cela, Unamuno, Montalbán, Almodóvar, Penélo-pe Cruz, Joan Manuel Serrat. Que fez e preservou Santiago de Com-postela, Trujillo, Barcelona, Sevilha, o Alhambra, Salamanca, San Sebastian, Córdova. Um país que produz campeões do mundo no golfe, na vela, no basquetebol, no ténis, na equitação, nos ralis, na Fórmula 1 e, agora, no futebol.
Enquanto português e vizinho, não invejo a Espanha: reclamo quando abusam de nós (não por quererem comprar a Vivo, mas quando nos roubam a água, as pescas e nos encostam centrais nucleares junto à fronteira — essa coisas de que os nossos governantes não se atrevem a reclamar). Mas, no resto, só posso admirar um país e um povo que sempre foi «mau aluno» europeu: não acabaram com a sesta nem submeteram o seu calendário ao clima de Bruxelas, não deixaram de fumar mais ou menos onde querem, nem acabaram com as caçadas e as touradas, como querem os Zelotas de europeus, nem deixaram de comer o que gostam, por mais politicamente incorrecto que seja. Por isso, a Espanha tem uma qualidade cada vez mais rara e preciosa: tem personalidade. Los tiene en su sítio. E anteontem, em Joanesburgo, os espanhóis provaram que não é preciso abdicar daquilo que é próprio para conquistar o que se sonha. Mas dá muito trabalho, muito e exaustivo trabalho, conquistar os sonhos.
Como toda a gente já disse, esta equipa de Espanha é o resultado dos dois anos de sucesso da dupla Laporta/Guardiola na construção dessa fabulosa equipa do Barcelona — provavelmente a melhor equipa de futebol de clube jamais vista. E a grande ironia do seu triunfo em África foi que, enquanto que o ex-presidente Laporta, que teve de abandonar o Barcelona FC após o cumprimento do único mandato que os estatutos do clube lhe permitiam fazer (coisa impensável entre nós...), agora se vai dedicar à política, fundando um partido independentista, a facção espanhola do Barcelona queele criou deu um contributo determinante para a vitória da Espanha: sete jogadores do Barça entre os onze titulares habituais (contra dois do Real...) e todos os oito golos da Espanha no Mundial assinados por jogadores que ele contratou para o Barça. Ou seja: sem o Barcelona, sem a cantera futebolística da Catalunha, a Espanha não teria ganho o Mundial. E certamente que Laporta terá estremecido quando viu Puyol agarrado à bandeira de Espanha ou Iniesta agarrado à Rainha Sofia. Mas o que seria também do Barcelona FC sem a Espanha? Jogaria o campeonato da Catalunha, tendo como único opositor o Espanhol de Barcelona? Eis o milagre do futebol: conseguir unir o que a política e a História trazem desunido.

2- Anunciada como a primeira final de um Mundial entre duas monarquias, a final de Joanesburgo foi uma real chatice. Um jogo de «mata-talentos», como escreveu o Vítor Serpa, com 41 faltas, pancadaria sem fim, marcações cerradas, terror do risco, do génio, do imprevisto. Uma péssima propaganda planetária a este jogo outro-ra maravilhoso. Há anos que venho escrevendo que um dia os treinadores ainda hão-de conseguir matar o futebol, de tal forma se deixaram reduzir à escravidão dos resultados para satisfazer os figurões que lhes pagam e não o povo que vai aos estádios. Este Mundial mostrou-nos que já faltou mais.
Quem se lembra das duas gerações fabulosas da Holanda — a de 74, com Cruyff e Neeskens, e a de 78, com Van Basten e Rijkaard —, só podia desejar a derrota desta Holanda. Chegou à final por caminhos simplificados, o que mais acrescentava à sua responsabilidade de mostrar que merecia aquele momento e aquela taça. Mas o que se viu foi uma equipa formada por um bom guarda-redes, um grande médio ofensivo e um grande avançado, acompanhados por oito caceteiros, jogadores de bola quadrada. Mostrou não ter nenhum plano de jogo, que não fosse o de destruir por todos os meios o jogo do adversário. Sem fazer um grande jogo, que nunca fez, a Espanha jogou o suficiente para merecer a vitória e evitar derrota maior do futebol.

3- Porque foi um Mundial muito mal jogado, talvez o pior de sempre. Todas as grandes vedetas se apagaram e não creio que por acaso. Para além de repetir a minha tese de que os Mundiaissão jogados na pior altura, em final de época e quando os grandes jogadores estão sobrecarregados, acho também um disparate uma competição com 32 selecções, disputando 64 jogos e arrastando-se por um mês inteiro de compe-tição, mais três semanas de preparação e jogos particulares. Não já justificação alguma a não ser a ganância financeira da FIFA, bem exemplificada fisicamente na figura de «padrinho» do sr. Blatter e a sua écharpe branca. O cansaço das vedetas mais as tácticas dos treinadores desaguaram num Mundial insuportavelmente soporífero. E que, pela primeira vez, não ficará para a história para ser lembrado como o Mundial desta ou daquela selecção, deste ou daquele grande jogador. Bem avisado andou o Cristiano Ronaldo, que logo tratou de comprar um filho para poder regressar às bocas do mundo, por outra via — já que, por via futebolística, foi o que se viu.

4- 0 melhor marcador do Mundial foi a Jabulani. Vários jogadores marcaram cinco golos, mas a Jabulani, sozinha, marcou uns dez ou doze. Mais uma vez, os interesses comerciais da FIFA (e agora também os da Liga de Clubes) fizeram-na optar por uma bola que destrói o futebol, tal como o conhecemos — porque, como explicaram os engenheiros da NASA, a mais de 73 kms/hora ganha trajectórias imprevisíveis e absurdas, e a mais de 20 metros de distância da baliza levanta voo. A FIFA dizia que com esta esfera louca iríamos assistir a muito mais golos — mas foi o Mundial com menos golos de sempre. Dizia que os grandes especialistas em livres e remates de meia-distância iriam caprichar — mas nenhum deles conseguiu marcar um só golo. Dizia que os guarda-redes se iriam adaptar rapidamente — mas o que vimos foi que mesmo os guarda-redes mais seguros não se atreviam a agarrar a Jabulani, tratando de a sacudir de qualquer maneira, como a um insecto infeccioso. Tal como as vuvuzelas, a Jabulani veio para dar cabo do futebol, dos seus tempos, da sua elegância, dos seus sons próprios, da participação dos adeptos, das grandes defesas dos guarda-redes. É verdade que marca bastantes golos, mas menos dos que impede, e os que marca são infinitamente mais feios do que aqueles que entrariam se esta danação da Adidas cumprisse minimamente as regras de geometria que fizeram do futebol um jogo de virtuosos.
Não consigo perceber que conspiração é esta para matar um jogo tão bonito.

quarta-feira, junho 22, 2011

UM MAU NEGÓCIO E UMA MÁ DESPEDIDA (06 JULHO 2010)

1- Muitos sportinguistas estão em estado de revolta contra o seu presidente por ter vendido João Moutinho ao FC Porto. Alguns portistas também estão em estado de euforia, pelas razões inversas. Quero confortar os primeiros e acalmar o entusiasmo dos segundos: quem fez um bom negócio foi o Sporting, não o FC Porto.

Primeiro, já se tinha percebido que o ciclo de Moutinho tinha acabado no Sporting, por razões próprias e outras do clube. Ano após ano dado como transferência iminente para um dos tubarões da Europa, João Moutinho (e o Sporting) viram o sonho ir-se esfumando, Verão após Verão, até chegarmos ao momento actual, em que, no horizonte, não havia uma só proposta de compra por um dos «valores seguros» do Sporting. A isso, somou-se a sua não convocação, sem surpresa, para o Mundial, e finalmente a notícia da sua destituição do cargo de capitão de equipa. Sem o conseguir vender, o Sporting preparava-se para, contrariadamente, ter Moutinho, também ele contrariado e desmotivado, para a nova época. Se alguém tem aparecido a dar 11 milhões por Moutinho, não tenho uma dúvida de que marchava logo.

Pois, apareceu FC Porto — que, não só bancou 11 milhões, mais 25% numa futura transferência, como perdoou 2,5 milhões que o Sporting ainda devia de Postiga, e, mais que tudo acrescentou-lhe o passe de Nuno André Coelho. Quanto valerá o passe de Nuno André Coelho? Eu não sei, mas sei isto: o João Moutinho está em regressão há dois ou três anos: é um jogador regular, acertadinho, mas sem rasgo e, até ver, de progressão falhada; quanto a Nuno André Coelho, para mim, é a grande promessa para vir a ser o melhor central português do futuro. Eu não trocaria um pelo outro: o FC Porto trocou e ainda lhe acrescentou 13,5 milhões. Ou seja, por mais que se desvalorize o passe actual de Nuno André Coelho, a verdade é que, contas feitas, Pinto da Costa bateu a cláusula de rescisão de João Moutinho: 22,5 milhões. O Sporting livrou-se de um problema sem solução à vista e ainda conseguiu facturar o que já não podia esperar, nem nos melhores sonhos. E querem a demissão de Bettencourt por causa disto? Bem, há gente ingrata...

Às vezes, há negócios (e só falo dos recentes) feitos pelo FC Porto que eu não consigo entender, que não como súbitos ataques de generosidade. João Moutinho é um deles, mas há mais. Quaresma foi vendido ao Inter ao preço de saldo de 16 milhões, como então aqui escrevi. E, para disfarçar aborla, aceitámos que eles nos mandassem o Pele, valorizado para o efeito em 6 milhões: pois há três anos que o Pele é um encargo e um problema sem solução. Oferecemos, absolutamente de borla, o Alan e o Luis Aguiar ao Braga: o segundo foi logo vendido, com o Braga a empochar tudo, e o primeiro está em vias de o ser também. Em troca, comprámos-lhes (não foi dado...) o Orlando Sá, que chegou magoado e só fez meia-época, na qual marcou um golo na Taça da Liga, e agora vai ser emprestado ao Marítimo, com os salários apagar no Porto. Compramos miúdos prometedores em todo o lado — Colômbia, Argentina, Alcochete — mas os nossos, os Candeias, Helder Barbosas, Ukras, etc, são todos dispensados, emprestados, oferecidos. Somos um clube infinitamente generoso: basta ver o que aí há de treinadores à espera, para fecharem os planteis, dos reforços que hão-de vir das cedências do FC Porto — as quais, depois, até acabam por contribuir directamente para nos roubar pontos no campeonato, como sucedeu este ano. Não sei, sinceramente, se haveria até campeonato sem a nossa generosidade...


2- Lá acertei na minha previsão de que Portugal não passaria dos oitavos, no Mundial da África do Sul. Não foi preciso grande ciência nem dotes de adivinho. Primeiro que tudo, porque nunca fui adepto de Carlos Queiroz e aqui, expressamente, furei a quase unanimidade nacional, quando ele foi escolhido. Depois, porque, tendo visto a Selecção de Queiroz nas fases de qualificação e de preparação, nunca consegui descortinar ali motivos para tanto entusiasmo com a nossa prestação africana.

Queiroz pode continuar ou não para o Europeu e até adiante, que já todos sabemos o que esperar. Qualificar-nos para a fase final, para ele, é dever cumprido e satisfação quanto baste. Foi isso que se tornou cristalinamente claro na África do Sul: Queiroz nunca quis levar Portugal à glória, nunca quis correr esse risco e sujeitar-se a não passar a fase de grupos. O que ele quis verdadeiramente, o seu objectivo primeiro, foi uma prestação que lhe salvasse a cabeça: conseguir os mínimos exigíveis, chegar aos oitavos e poder dizer a seguir que tinha caído perante a campeã da Europa. Melhor ainda se, de caminho, não perdesse com o Brasil (mesmo um Brasil tão triste) e com a Costa do Marfim (mesmo desfalcada de Drogba), e se a derrota es perada com a Espanha fosse apenas tangencial, como foi. Se todos saímos frustrados da África do Sul, Carlos Queiroz saiu aliviado. Tanto mais que pode dizer que, em matéria de esperanças defraudadas, está em excelentes companhias.

Dos muitos erros que Queiroz cometeu contra a Espanha, e antes contra o Brasil, e que já todos escalpelizaram — deixar Ronaldo sozinho na frente, inventar o Ricardo Costa a defesa-direito e o Pepe a trinco, insistir no Simão, desistir do Deco e do Hugo Almeida —, o pior de todos, para mim, foi a subserviência que ele mostrou, estratégica e pessoalmente, em relação à vedeta da companhia. Já se sabia dessa sua tendência para não se conseguir impor aos grandes jogadores (e por isso falhou no Real Madrid), mas, desta vez, exagerou. Para começar, é injustificável que tenha dado a Ronaldo a braçadeira de capitão, quando tinha na equipa verdadeiros líderes, como Ricardo Carvalho ou Bruno Alves. Depois, é inconcebível que se faça capitão de equipa quem já tinha demonstrado suficientemente que não joga para a equipa, mas para si, para as meninas da bancada e para os seus patrocinadores. É claro que, no Real ou no Manchester, a ganhar um milhão de euros por mês, ele não se pode permitir essas leviandades, nem os treinadores e os adeptos lho consentiriam. Na Selecção, porém, ele acha-se um rei e senhor: só ele é que pode marcar todos os livres (depois de posar devidamente de pernas abertas para os fotógrafos) , pode não passar a bola a ninguém e chutar à baliza a qualquer distância e em qualquer circunstância (e até se pode dar ao luxo de não ter estudado devidamente o comportamento da Jabulani para perceber que, chutada de longe e com força, ela levanta voo e sai sempre por alto). Um treinador que tivesse a coragem dos grandes momentos, teria tirado o Ronaldo ao intervalo do jogo com a Espanha: talvez tivéssemos perdido na mesma (era o mais certo), mas teria mostrado que tinha autoridade para o lugar que ocupa e teria evitado as cenas finais da vedeta zangada. Ao contrário do Francisco José Viegas, eu não entendo que o Ronaldo deva ser poupado e que criticá-lo seja sinal de inveja. Eu não invejo os milhões do Ronaldo, nem a suposta vida de constantes conquistas amorosas que o marketing lhe atribui, nem, seguramente, a roupa ou os adereços do Cristiano Ronaldo. Tenho é muito respeito por jogadores como o Eduardo (de quem esperava pouco...), o Ricardo Carvalho, o Bruno Alves, o Meireles, o Fábio Coentrão, que, esses sim, deram em campo o melhor que tinham e nunca se imaginaram superiores à equipa. Mas o Cristiano Ronaldo, o que lhe deve a Selecção portuguesa, nos últimos quatro anos?


P.S: Vou responder a José Diogo Quintela apenas por razões de honra. Eu escrevi aqui que ele vive a repetir uma mentira na esperança de que ela se torne verdade; ele respondeu todo um texto a chamar-me mentiroso: faz uma diferença e exige uma resposta adequada. Mas espero bem que esta seja a última vez que tenho de lhe responder, pois não tenho o menor gosto em alimentar polémicas públicas com quem não reconheço nível para tal. Como humorista, JDQ vive do talento de Ricardo Araújo Pereira e nada mais; como anunciante, integra aquela patética, indigente e caríssima campanha da MEO, onde os Gatos aparecem a fazer figura de espermatozóides do espaço, repetindo até à náusea gagues sem sombra de piada ou de imaginação; parece que ultimamente também se lançou como escritor, juntando umas insípidas crónicas publicadas numa revista numa coisa a que chamou livro. Talvez com o tempo aprenda que ser escritor requer infinitamente mais trabalho, mais talento e mais seriedade do que, simplesmente, anunciar-se como tal — hoje, qualquer artista de cabaret o faz.

Tenho assim a ideia de que JDQ é alguém que precisa de se alavancar no caminho desbravado por outrem para alcançar os seus 15 minutos de fama. E tenho a noção de que, quando ele chama o meu nome para título garrafal da sua crónica e me promete tareia sem fim, atrai muito mais leitores do que aqueles que habitualmente consegue com as suas deslavadas e totalmente desinteressantes crónicas dos outros dias. Mas não consta da minha lista de boas acções o favor de ajudar a promover o JDQ.

Adiante. Aos factos e em resumo. JDQ anda para aí há um ano a tentar fazer piadas e produzir insinuações baratas — das quais extrai conclusões desonestas e deliberadamente mentirosas — sobre o cafezinho que o ex-árbitro Augusto Duarte foi tomar a casa de Pinto da Costa, na véspera de apitar um Beira-Mar-FC Porto para o campeonato de 2004, jogo que ele classifica como decisivo. Ora, não é preciso ser tão inteligente quanto o próprio JDQ para perceber que o que ele quer dizer entrelinhas é: a)- que o árbitro não foi apenas ao cafezinho, mas também ao envelope; b)- que foi graças a isso que o FCP não perdeu o dramático jogo do dia seguinte, contra o Beira -Mar; c)- e graças a esse precioso empate que ganhou o campeonato; e d)- que foi com jogadas destas que o FCP conquistou também a sua hegemonia dos últimos 25 anos no futebol português.

A isto, eu respondi e respondo: a) a tese do envelope foi literalmente estilhaçada pelo tribunal de Aveiro, quando a única prova de tal — o testemunho da também escritora Carolina Salgado —, apesar de longamente preparado pelo MP, se revelou, como seria de esperar, uma total anedota; b)- ninguém, a começar pelos ex-árbitros que integravam o júri de apreciação de O Jogo, encontrou no desempenho do árbitro quaisquer motivos para poder dizer que ele tinha favorecido o FCP, antes pelo contrário; c) - o jogo era tão decisivo, ou tão pouco, que o FCP se deu ao luxo de dispensar vários titulares e sair de lá, tranquilamente, com dois pontos perdidos; d)- dá-se o caso de, nesse ano de 2004, o FCP ter o campeonato praticamente ganho desde o final da primeira volta e estar apenas preocupado com a Champions, que viria a ganhar daí a semanas, depois de, no ano anterior, ter ganho também campeonato e Taça UEFA. Era, à vista de todos, menos de fanáticos como JDQ, de longe a melhor equipe portuguesa e uma das melhores da Europa, base da Selecção Nacional que seria a seguir vice-campeã europeia, acrescentada de jogadores estrangeiros como Deco, Alenitchev, Carlos Alberto ou McCarthy, e treinada por um tal José Mourinho. Qual é o raciocínio de Quintela? Que, sem o cafezinho, o Porto teria perdido em Aveiro, enquanto o Sporting teria ganho no Bessa (não ganhou, mas por culpa do árbitro, diz ele — claro, como sempre); a seguir, o Porto perdia também em Vila do Conde e mais algures, enquanto o Sporting continuava a ganhar sempre, até ser campeão. E assim se fariam os campeões, pudesse ele. Como não pode, limita-se ao que julga poder: falsificar a história e beneficiar do silêncio e do esquecimento geral, para fazer passar a mentira como verdade.

O que está em discussão é apenas isto. O resto, as coisas onde ele vê mentiras tenebrosas da minha parte, são apenas pormenores igualmente ridículos: saber se o Beira-Mar-Porto acabou num empate a 0-0 ou a 1-1, se aconteceu antes da meia-final da Champions ou antes da final ou se os ex-árbitros de O Jogo eram três ou quatro, não muda rigorosamente em nada o essencial. E o essencial, repito, é que o JDQ vive a alimentar uma mentira, assente em falsas acusações que o tribunal desfez e em opiniões próprias que quem quer que tenha um mínimo de memória sabe que não passam de delírios e desonestidade intelectual.

Para terminar e, mais uma vez, como já sucedeu em relação ao RAP, queria dizer que há duas coisas que me fazem confusão. A primeira, é porque razão escrevem estes tipos num jornal sobre futebol, quando, manifestamente, eles não só não entendem nada de futebol, como nem sequer estão interessados em falar disso: o que lhes interessa do futebol é apenas a intriga, a insinuação, a calúnia, o despeito e a inveja — o futebol de tasca.. E a segunda coisa que me faz confusão é o tempo que estes Gatos dedicam a pesquisar e arquivar tudo o que eu (ou o Rui Moreira) escrevemos, para depois sucumbirem a orgasmos sucessivos de cada vez que acham que nos apanharam em contradição. Francamente, não me imagino a desperdiçar uma hora que seja dos meus preciosos dias a pesquisar as obras completas do JDQ...

ESTA NOITE, A VERDADE (29 JUNHO 2010)

1- Logo à noite se saberá se Queiroz fez bem ou mal em ter entrado em campo contra o Brasil para jogar indisfarçadamente para o empate. Ao renunciar a tentar vencer o Brasil e o grupo, Queiroz sabia que as probabilidades de apanhar a Espanha, em vez do Chile, eram muitas. E não se tratava apenas de escolher o Chile em vez da Espanha, escolher a campeã da Europa em vez da equipa macia e acessível que se viu ontem ser tranquilamente passada pelo Brasil. Bastava a Queiroz ter olhado para o esquema do Mundial para perceber que, ficando em segundo lugar, ia parar à metade mais difícil do organigrama. Do que não tenho dúvidas é que ele escolheu deliberadamente, como já o havia feito no jogo inaugural, jogar pelo seguro, correndo um mínimo de riscos no imediato. Por isso, optou por desmontar a equipa que tão bem havia funcionado contra a Coreia do Norte, optou por jogar com seis defesas (embora dois disfarçados de médios); optou por jogar sem ponta-de-lança de raiz, deixando Cristiano Ronaldo isolado em território comanche uma hora a fio, com isso prescindindo também de o ter como lançador do futebol ofensivo da equipe. Parece-me que Queiroz estudou mal e temeu demais este Brasil de Dunga — que é uma equipa que parece cansada, jogando a passo, longe, pelo menos por enquanto, da fantasia que seria de esperar. E que, sem Robinho, Kaká e Elano, estava ao alcance do Portugal que jogou contra a Coreia. Mas, como disse, logo à noite se verá o resultado da sua opção: ao optar por não correr riscos contra o Brasil, ele vai ter o risco por inteiro contra a Espanha. Depois de ter evitado a hora da verdade contra a Costa do Marfim e contra o Brasil, não há agora fuga possível contra a Espanha. Oxalá a inspiração dos jogadores dê a isto uma continuação feliz.

2- Foi em 2008 que Manches-ter United e Chelsea se encontraram em Moscovo, na final da liga dos Campeões. Tudo começou com um grande golo de cabeça de Cristiano Ronaldo, mas o Chelsea empatou e o jogo seguiu para prolongamento epenalties. E, quando Ronaldo falhou o dele, o Chelsea ficou perante a oportunidade pela qual Roman Abramovich espetou já próximo de mil milhões no Chelsea: ser campeão europeu. Bastava-lhe converter um penalty, e Avram Grant iria conseguir o que Mourinho não conseguiu no Chelsea. Quando, porém, vi que o penalty decisivo estava a cargo de Anelka, saltei na cadeira (eu odeio o Manchester United), ao realizar o tremendo erro que Grant ia cometer. Porque Nicolas Anelka, para mim, é o símbolo do mercenário no futebol: é um jogador que só joga quando lhe apetece, só corre quando está para aí virado, que já passou por variadíssimos clubes, dos melhores do mundo, pago milionariamente, e sempre se achou superior a todos os clubes onde está. Nesse fim de tarde, em Moscovo, ele avançou para bola displicentemente, chutou displicentemente, permitindo uma defesa fácil a Van ser Sar, e virou as costas, indiferente, sem sequer esboçar um gesto de contrariedade. E o Manchester ganhou o desempate nos penalties e a Cham-pions, como estarão lembrados.
Não percebo, pois, que um seleccionador da França assuma o risco de levar Anelka a um Mundial. O risco de levar a um Mundial um jogador que não vive a camisola e que está em campo por desfastio e por dinheiro, nada mais. Domenech correu esse risco e o resultado foi ser insultado na cabina por Anelka, e ainda ter de levar com um levantamento dos jogadores em solidariedade com o companheiro, expulso da Selecção como só podia ser, e acabar, o próprio Domenech, a ler o comunicado da revolta dos jogadores! A FIFA — que, como disse Khadafi e com alguma razão, tem qualquer coisa de organização mafiosa — quer agora que o governo francês não se meta no assunto da vergonha pública que foi a representação francesa neste Mundial. Parece que a FIFA acha que o poder político não deve interferir nos poderes das Federações Nacionais nem no futebol — excepto quando é a própria FIFA a reclamar a intervenção do poder político ou até a fazer negociatas obscuras com ele quando isso lhe convém. Mas é uma pretensão condenada ao fracasso; casos como o de Anelka, numa selecção francesa cujo onze principal chegou a jogar apenas com dois franceses de origem, não podem escapar a um debate político que já está lançado. E, mesmo que esse debate não tenha de resvalar para as posições xenófobas da FN de Le Pen, nem os franceses, nem qualquer outro povo, confrontado com a prestação a vários níveis vergonhosa da sua selecção, poderá deixar de meditar se vale a pena mandar a um Mundial uma Selecção formada por grandes jogadores mas que não sentem o orgulho e a responsabilidade de representar o seu país e estão lá, sobretudo, para se mostrarem e sacarem contratos. Eu, no lugar do director desportivo da selecção francesa, em vez de me demitir e ir embora, tinha esperado pela eliminação da equipa e tinha-os despedido a todos, ali mesmo. Dizia-lhes, logo no fim do jogo: Estão dispensados e despedidos. Acabou-se o hotel pago e não há avião reservado a vossa espera. Voltem para casa como quiserem. De qualquer modo, Laurent Blanc vai ter que recomeçar tudo a partir do nada. E ainda bem que a França foi para casa. E a Itália. E a Inglaterra. Um futebolzeco, cheio de vedetas, cheio de nada.

3- Não consigo perceber como é que, tendo chegado à terceira jornada da fase de grupos, os comentadores das televisões e, em especial da Sport TV, não tinham feito o trabalho de casa mais básico e não conseguiam dizer, face aos resultados de dois jogos que iam decorrendo simultaneamente, quais as equipas que se apuravam e, pior ainda, que revelassem ignorância sobre os próprios critérios de desempate. Ao minuto 6 dos descontos de um jogo, ainda Carlos Manuel e o relator da Sport TV discutiam entre si quais as equipas que passariam com aquele resultado e o da outra partida!
De Carlos Manuel, aliás, notável jogador no seu tempo, retive alguns comentários feitos durante o Argentina-Grécia e o Argentina-México, que mostram a profundidade do seu pensamento, como comentador: «[Na fase de grupos] todos os jogos são importantes. Não é o primeiro, nem o segundo, nem o terceiro: são todos»; « Uma equipa tanto pode apurar-se ganhando o primeiro jogo, como perdendo ou...ou...empatando»; «É de esperar um golo da Argentina. O que não dizer que a Grécia não possa marcar: o futebol é isto»; «É importante dizer que um Mundial tem a muito a ver com a qualidade dos jogadores»; «Muito por culpa do seu líder [Maradona], os jogadores da Argentina têm qualidade»; «A velocidade do pensamento dele é notável, sabendo de antemão que ia meter a bola ali [sobre um petardo de Tevez ao canto da baliza do México]»; «Continuo a dizer que nós nunca podemos dizer que uma substituição é mal feita. Ela pode é não correr bem».

4- Quando tudo isto acabar, quando o Mundial fechar as portas, vamos voltar ao ram-ram habitual. Vamos saber se o Benfica conseguiu vender um Di Maria apaga-díssimo no Mundial, não, claro, pelos 40 milhões da cláusula de rescisão, como prometeu L.F. Viera, mas por 20, que já não seria nada mau. E se, em contrapartida, não acaba sem o Fábio Coentrão, vendido muito mais cedo e mais barato do que desejavam, face à fantástica campanha que vem fazendo na África do Sul. Vamos ver se o Sporting descobre mais oportunidades para contratar alguns sportinguistas desde pequeninos que por aí têm andado tresmalhados, como o Maniche. E vamos ver se o FC Porto, que agora parece ter desviado as atenções da Argentina para o Rio Grande do Sul, consegue, mais uma vez, juntar dez aquisições, sem conseguir vender um só dos jogadores que não lhe interessa manter (caramba, nem há quem dê um milhão de euros pelo Farias? Porque não tentam o Sporting?).
Mas antes de regressarmos à conversa habitual, lá vamos enchendo a barriga com este festim de futebol do Mundial, agora a chegar à hora da verdade — onde se faz a separação entre os verdadeiros candidatos e os que são só prosápia.

5- Vale a pena reter as palavras de Nuno Espírito Santo, guarda-redes que acaba de deixar o FC Porto: «O FC Porto é muito mais do que um grande clube, é uma escola de valores, como a lealdade, fidelidade, dignidade, honestidade e dedicação, que faz de todos os que passamos por esta casa melhores pessoas. Sinto-me honrado e orgulhoso por pertencer à bela história do FC Porto. Sou e serei Porto». Muitos outros ex-portistas — em especial os vindos do Benfica ou Sporting — disseram o mesmo quando por lá passaram. E é por causa deste espírito e desta atitude que nós ganhamos tantas vezes, enquanto os outros só ganham na inveja, na calúnia e na maledicência.

terça-feira, junho 21, 2011

SETE RAZÕES DE ESPERANÇA (22 JUNHO 2010)

1- A bola de saída voltou a ser nossa, mas, desta vez, saímos a jogar para a frente e não para trás ou para os lados. Isso foi o bastante, para mim, para perceber que vínhamos com outro espírito e uma atitude de conquista. Com menos medo de ganhar do que medo de perder. E assim durante o jogo inteiro, mesmo na meia-hora final, quando o resultado e a passagem aos oitavos já estavam decididos, e a equipa optou por continuar a jogar ao ataque, correndo os riscos necessários.

2- Ao contrário das previsões de Carlos Queiroz, manifestadas logo após o jogo contra a Costa do Marfim, a Coreia do Norte não ergueu nenhum muro à nossa frente. Pelo contrário: jogaram no campo todo, desde o primeiro ao último minuto e, quando ainda havia 0 - 0, chegaram a assustar-nos por duas ou três vezes — a pior das quais quando Eduardo defendeu um remate para a frente, permitindo uma recarga fácil que, por sorte, saiu alta. Paradoxalmente, foi a ausência de medo do seleccionador coreano que nos abriu, de par em par, as portas do Paraíso. Porque, se no ataque a Coreia ainda assusta às vezes, na defesa aquilo é manteiga, à espera de uma faca.

3- Tiago e Raul Meireles — eles abriram-nos o jogo. Sobretudo Meireles, o homem imprescindível desta Selecção, o verdadeiro MVP de Portugal. Mas também Fábio Coentrão — grande jogo, grande jogador! — e Hugo Almeida, bem melhor que Liedson. Estes, e os centrais, sem falhas, compensaram os que, na minha opinião, estiveram bastantes furos abaixo: Miguel e Simão, como de costume, e Pedro Mendes.

4- O Ronaldo da segunda parte foi aquele pelo qual uma nação inteira há muito esperava, jogando para a equipa e não para a secção de efeitos especiais da televisão (embora, curiosamente, tenha acabado, finalmente, por marcar um golo que vai correr mundo nos blogues de efeitos especiais).

5- Sabia-se que o mais difícil era chegar ao 2-0: a partir daí, a Coreia fundia-se, por mais que tenham jurado morrer em campo pelo Querido Líder. E assim foi e num ápice: 2-0, 3-0, 4-0, em sete minutos de auto-estrada de prego a fundo. Depois, vieram mais dois e mais outros tantos poderiam ter vindo, quando Cristiano Ronaldo abriu o livro. Tenho pena dos coreanos que não desertarem antes do final do Mundial: será que acabam o ano vivos?

6- É verdade que a Coreia jogou contra nós de uma forma aberta que tudo facilitou e não fez o mesmo contra o Brasil. Mas, para quem viu também o Brasil-Costa do Marfim, onde o resultado foi bem melhor do que a exibição, não é de todo absurdo pensar que podemos vencer esta triste selecção de Dunga, da qual parece desertada, europeizada, toda a antiga fantasia em movimento. Sim, podemos perfeitamente ganhar ao Brasil e terminar em primeiro no grupo. O problema é que a nossa Selecção ninguém sabe como vai jogar a seguir. Um bom jogo não prenuncia necessariamente outro bom e vice-versa, como vimos ontem e felizmente. Fisicamente, estamos bem melhor à vista do que os brasileiros e isso também vai contar.

7- Bem, e last but not least, ganhámos ânimo, reganhámos orgulho e conquistámos um precioso suplemento de alma e de vontade. Sendo como somos, é de prever que a nação já vai toda embandeirar em arco. Não há razão para tanto, há apenas uma nova razão de esperança. Estamos nos oitavos e, afinal, até somos capazes de marcar golos.

segunda-feira, junho 20, 2011

POR FAVOR, CALEM AS VUVUZELAS! (15 JUNHO 2010)

1- Corra melhor ou pior, este Mundial irá passar à história, antes de mais, por uma razão literalmente de fundo: o ruído do exército de varejeiras que nos entra pela casa, pelos ouvidos, pela vida adentro, de cada vez que seguimos um jogo na televisão. Nem os comentários do Carlos Manuel na Sport TV conseguem irritar mais do que essa praga das vuvuzelas, inventada por quem não gosta de futebol para ser usada por quem nada percebe de futebol e não está lá para ver o jogo.
De todos os lados, o consenso está estabelecido: não há ninguém que suporte aquilo. Nem jogadores, nem técnicos, nem árbitros, nem repórteres de campo, nem comentadores de televisão, nem espectadores. Porque não se proíbem, então? Porque o sr. Blatter tem medo de ofender os sul-africanos e, com eles, o voto dos africanos, indispensável à sua manutenção no poder dessa máquina de fabricar e ostentar dinheiro que se chama FIFA. A única esperança que resta é que os próprios sul-africanos já começam a interrogar-se se o insuportável ruído das vuvuzelas não acabou, afinal, por ser desfavorável à prestação inaugural da sua selecção — impedida pela manada de elefantes loucos de fazer escutar os seus cânticos e gritos de apoio. A vuvuzela, como me explicaram lá na África do Sul em Agosto passado, é a grande esperança dos bafana-bafana para conseguirem perturbar o futebol das outras equipas. E lá que perturbam, perturbam; disso não há a mais pequena dúvida e só por isso, e se lá estivesse para defender o futebol, o sr. Blatter trataria de as proibir. Mas, não se atrevendo ele a esse gesto politicamente incorrecto, resta então a esperança de que os próprios sul-africanos comecem a duvidar das suas vantagens. Enquanto tal não acontecer, estamos condenados ou ao inferno, ou a assistir a um Mundial em silêncio. Ao que isto chegou!

2- Devemos perguntar-nos para que serve tão extensa comitiva da FPF na África do Sul, tantos dirigentes, adidos de imprensa, etc, quando a gestão do caso Nani foi má de mais, incompreensível de mais. Tão má e tão incompreensível, que logo nasceu o rumor (que ainda se mantém e já quase como verdade estabelecida), que não houve lesão nenhuma impeditiva da prestação do jogador, mas sim um caso de doping abafado desta maneira. Rumor ainda mais alimentado pelas declarações do próprio jogador, no regresso a casa, quando declarou que numa semana estaria bom. Quem e porquê deixou que este boato, atingindo o nome profissional de Nani, alastrasse desta forma? E porquê que não houve jornalistas capazes de fazerem as perguntas que se impunham: porque não vem o médico da Selecção explicar a lesão? Que lesão foi, ao certo? Onde fez Nani os exames que determinaram ô seu afastamento? Porque não os fez antes de seguir para a África do Sul? O que disseram, exactamente, os exames? Foi mandada cópia ao Manchester United? E o que disseram os ingleses? Quanto tempo de recuperação era previsível? Que tipo de tratamento podia ser feito? Como é que o Drogba parte o cúbito, é operado e, se calhar, já joga logo à tarde, e o Nani faz uma luxação no ombro e é declarado irrecuperável para todo o Mundial?
Ainda estão a tempo, senhores responsáveis da Federação: querem dar-nos uma explicação que acabe de vez com as dúvidas, as especulações e os boatos ofensivos, ou regressámos ao espírito de Saltillo?

3- Logo à tarde, não tem que enganar: só a vitorianos interessa. E, para vencer, acabou-se o palavreado de circunstância e as brilhantes explicações técnico-tácticas: é preciso que Queiroz não tenha medo de ganhar, de lutar pela vitória e que saiba transmitir essa atitude aos jogadores.
Acredito firmemente na vitória e um bom prenúncio éque vamos jogar com o equipamento branco — bem mais bonito e bem mais nacio -naláo que o eterno, feio e intragável equipamento à Benfica.

4- A BOLA fez um inquérito onde me perguntaram qual a selecção que eu via como favorita. Respondi a Argentina, mas depois constatei que a generalidade dos respon-dentes enumeravam duas, três e até quatro selecções. Assim, como dizem os brasileiros, fica mais fácil acertar...

5- Como bem sabemos, uma mentira repetidamente dita transforma-se em verdade. Há anos que o José Diogo Quintela anda a repetir que um árbitro foi tomar um cafezinho a casa de Pinto da Costa, na véspera de apitar um jogo decisivo do FC Porto, em 2004. Tirando o facto de não ter sido assim que a coisa ficou provada em tribunal, o mais importante é que esse jogo (um Beira-Mar-FC Porto) não era decisivo, pois que o Porto já tinha o campeonato no bolso — tanto que se dispensou de apresentar vários titulares, que ficaram a descansar para a- eminente final da Cham-pions, em Geselkirchem, que teve lugar daí a dias. O jogo terminou empatado, salvo erro 1-1, e, segundo o trio de analistas de arbitragem do Jogo, o árbitro do cafezinho cometeu, de facto, dois erros, um para cada lado e ambos com possível influência no resultado. Só que, azar, o primeiro erro foi contra o FC Porto — e o primeiro erro é sempre mais importante. Ah, e o treinador, que precisava que dessem cafezinhos aos árbitros para vencer um Beira-Mar, chamava-se José Mourinho e logo, logo, iria ser campeão europeu...
Eu, no lugar do José Diogo Quintela preocupava-me antes (porque é mesmo de andar preocupado) com o espectáculo lastimável de ver o Sporting andar há um mês a anunciar iminentes reforços que nunca se confirmam e fabulosas vendas de jogadores que ninguém quer comprar. Preocupava-me com as contas apresentadas pela SAD leonina e com o facto de ela não ser capaz de apresentar, em mais de três semanas, uma simples garantia bancária de três ou quatro milhões para comprar o tal de Petrovic. Ou de andar a formar grandes promessas em Alcochete que se vê à rasca para colocar a rodar noutros clubes porque quer que sejam eles a pagar os ordenados. Ou de cada vez ter menos adeptos no estádio e mais passivo nas contas, ou de ter terminado o campeonato a 27 pontos do Benfica, etc... e tal. Enfim, não vou bater no ceguinho, só não consigo é entender o descaramento de continuar a insistir naquilo que todos os tribunais deram como não provado e continuar a tentar que o povo acredite que tudo o que o FC Porto ganhou nos últimos anos (enquanto o Sporting celebrava segundos lugares como grandes conquistas) foi com cafezinhos ou as férias do Calheiros no Brasil, já depois de reformado. Se neste país houvesse uma cultura de responsabilidade, se cada um fosse responsabilizado pelo que diz e faz, não se continuaria a insistir em mentiras desmascaradas pela justiça. Pelo contrário, o que se perguntaria é quem responde pelos milhões de euros de dinheiro dos contribuintes gastos pelo dream team do Ministério Público numa operação de perseguição ao FC Porto, desenterrando processos arquivados, acusando com falta de provas, arregimentando testemunhos que toda a gente via que eram falsos e pessoalmente motivados. Quem responde por isso?

6- E, recordando as palavras do Hulk sobre os incidentes do túnel da Luz («Acredito que foi uma situação armada, combinada») — graças à qual ele perdeu, além do mais, toda a esperança de poder estar no Mundial) —, quero saudar aqui o tardio desaparecimento do dr. Ricardo Costa do CD da Liga e do futebol português. Espero bem que seja definitivo, pois que, há muitos anos a seguir o futebol, não me lembro de prestação tão negra como a sua, no dirigismo desportivo. Claro que vai deixar saudades em muita gente, mas por razões que ele muito bem sabe e que eu, no lugar dele, dispensaria.

7- A Naide Gomes tem razão: o título feminino de atletismo conquistado pelo FC Porto, graças a uma armada de atletas do Leste, contratadas para tal, prejudica o atletismo nacional, falseia o desportivismo e não honra o clube. Qual é o orgulho, o sentido, de ser campeão assim, numa modalidade amadora? Só para ter mais uma taça na vitrina?

sexta-feira, junho 17, 2011

MAGALIESBURG (08 JUNHO 2010)

1- Por estranho que pareça, nem o Público nem o Diário de Noticias de ontem referiam o nome do local de estágio onde a Selecção Nacional tinha acabado de chegar na véspera: Magaliesburg. Mas daqui até dia 25, pelo menos, o nome vai-nos entrar nos ouvidos dezenas de vezes ao dia, porque é lá que estarão concentradas também todas as nossas esperanças.

E, antes de mais, um esclarecimento pessoal: num daqueles inquéritos sumaríssimos de que os jornais gostam, o Expresso perguntou-me há dias quem achava eu que iria ser a grande decepção na África do Sul. Respondi com duas palavras apenas: «a própria». Parece-me a mim que a resposta, para qualquer pessoa, só poderia querer dizer a própria selecção sul africana, a anfitriã. E, tendo ainda por cima, a resposta sido dada por escrito, por mail, não consigo entender como é que a minha resposta que apareceu publicada tenha sido «Portugal». Dizem-me tristes experiências anteriores que, anos a fio, eu irei ter de penar por esta coisa que não disse - sobretudo se, como é expectável e desejável, nós não venhamos a ser, obviamente, a grande decepção deste Mundial. Infelizmente, a mentira faz sempre um caminho mais longo e durável do que a verdade que se pretende repor. Ainda hoje, passados quatro anos, eu enfrento um ódio sem fim nos blogues da net por uma suposta frase sobre os professores que nunca disse ou escrevi e a qual já desmenti uma dezena de vezes, em vários lados. Para que conste, então, e apenas para aqueles que se preocupam com esse "pormenor" de distinguir a mentira da verdade: eu não penso isso e não disse isso, sobre a nossa Selecção.

2- Em matéria de expectativas, alias, confesso que não consigo ter nenhumas firmes. Dizia há dias o David Borges que a nossa Selecção é capaz de ganhar a qualquer outra. Bem, eu não direi tanto; acho que só uma vez em dez poderíamos ganhar ao Brasil, à Argentina, à Espanha. Mas é verdade que, num dia de inspiração, podemos ganhar quase a qualquer uma e, uma vez em dez, como disse, também àquelas três.

O problema está em que também acho que, num dia de desispiração, poderemos perder quase com qualquer uma. Aquilo que me causa mais apreensão no nosso jogo é que ele nunca é previsível, nunca sabemos se a Selecção está em dia sim ou em dia não. Falta-lhe uma continuidade exibicional e nao só de jogo para jogo, mas também ao longo de um mesmo jogo. Nunca sabemos se o Cristiano Ronaldo vai soltar o génio ou andar por ali, semi perdido: se o Deco vai abrir linhas de passe que são como riscos do Niemayer (como fez contra a Costa do Marfim), ou se vai parecer um jogador banal, que até os cantos executa mal (como fez contra Cabo Verde). Todos sabemos o que vale a Selecção, jogador por jogador, e ali não há maus Jogadores. O trabalho de Carlos Queiroz, a responsabilidade que é só sua, é justamente pegar neles todos e fazer uma equipa e dar a essa equipa uma identidade e uma continuidade de jogo, que tantas vezes se duvida que exista. Quando a bola começar a rolar a sério, no dia 15, já poderemos tirar uma primeira conclusão e saber se a Covilhã e Magaliesburg foi ou não tempo perdido.

3- A boa e terrível noticia é a lesão de Drogba. Se o «novo produto» de que fala o seu médico, não conseguir o improvável milagre de o pôr apto para nos enfrentar dia 15, pode-se dizer que os deuses começaram connosco este Mundial. E não vale a pena soltar aquelas frases de circunstância de que um jogador não faz a diferença e que, mesmo sem ele, a Costa do Marfim continua a ser uma equipa ameaçadora. Não é verdade e até fica mal disfarça-lo: o Drogba faz muito mais falta à Costa do Marfim do que o Ronaldo nos faz a nós. Basta pensar que foram os golos do Drogba que qualificaram os marfinenses, enquanto que nós nos classificámos sem um único golo da nossa maior estrela.

Entretanto, a lesão do melhor marcador do campeonato inglês, a juntar a várias e recentes outras de jogadores já seleccionados para o Mundial (a ultima foi o Pirlo), confirma a ideia que aqui deixei a semana passada: que esta altura, o prolongamento da época, é má para realizar os Mundiais e Europeus. Não apenas pelas lesões, mas pelo cansaço que vai ser evidente em tantas vedetas de que tanto se espera.

4- E por falar em vedetas e em Cristiano Ronaldo, a sua visita às crianças com cancro do IPO, a maneira como as tratou, como falou com elas, foi um momento lindo - dele e da Selecção. Com tanta operação de marketing que a sua equipa de imagem faz à roda dele, tantas dezenas de supostas ou reais namoradas que lhe atribuem ciclicamente, as Paris Hilton e essa treta toda, a imagem do Ronaldo, em minha opinião, não sai favorecida, mas antes pelo contrário: parece a de alguém que, fora dos relvados, só se preocupa com festas, loiras, Ferraris e íates. Mas a sua simples visita ao IPO e a forma como se comportou devolveram-no à condição humana e mostraram outro lado, bem melhor, de um rapaz predestinado e privilegiado. Nem ele sabe o quanto saiu a ganhar com isso!

Ao invés, a inacreditável viagem de promoção publicitária do autocarro da Selecção entre o hotel e o Aeroporto de Lisboa foi um daqueles fretes que não se imaginariam possíveis naquela que, para todos os efeitos, é uma representação nacional. Se querem que a gente sinta a Selecção como um bocado da Pátria, não a ponham a fazer fretes comerciais a favor da Galp ou do Continente! O dinheiro não é tudo, Dr. Madail!

5- Confesso que também não tenho opinião formada (e quem poderá tê-la?) sobre a aposta de altíssimo risco que Pinto da Costa assumiu para novo treinador do Porto. Não é a juventude dele, propriamente, que me preocupa, é antes a falta de experiência de campo e de comando de homens. Em contrapartida, só pode, e já o provou, ter experiência e conhecimento abundante da observação dos adversários e do uso da estatística - dois instrumentos hoje fundamentais na preparação dos jogos. Quanto à idade, não acho que seja necessariamente um factor negativo: o que não faltam por ai é treinadores com 60 anos que não há maneira de aprenderam nada...

A juventude de Villas Boas encaixa até bem na necessidade por todos os portistas sentida de mudar de ciclo. Como já aqui o escrevi (mas os nossos adversários recusam-se a entender), foi isso, e não a ingratidão ou um "castigo", que levou ao final do ciclo Jesualdo Ferreira, um ano antes do previsto. Mas, como também escreveu aqui Vítor Serpa, e eu subscrevo, esta é, de facto, a aposta mais pessoal e mais arriscada de Pinto da Costa. Se ela falhar, a responsabilidade, não primeira, mas sim única, será dele e não de Villas Boas. E isso dá-me esperança que Pinto da Costa, fazendo, como convém aos tempos e à situação financeira do clube, poucas mas criteriosas aquisições, lhe dê, realmente, uma equipa ganhadora. Jogadores, a começar pelo meio-campo ofensivo,que entrem de caras na equipa, em lugar de virem fazer número, ganhar experiência ou rodar noutras paragens. Enfim, que ele dê a Villas Boas armas iguais para se bater com o Benfica, que este ano não tivemos.

Ah, e há mais um factor de optimismo: é que, não sabendo embora o que vale Villas Boas, constatei que o Ricardo Araújo Pereira lhe dedicou uma crónica inteira, cujo objectivo principal era garantir-nos que ele não é o novo Mourinho – isso, como se sabe e garantiram vários benfiquistas, é o Jorge Jesus (a propósito: alguém, por acaso, acreditou naquela noticia de que Pinto da Costa terá tentado contratar Jesus, em Maio passado? Eu cá fartei-me de rir...). Pois bem: se o RAP se dá ao trabalho de dedicar uma crónica inteira ao novo treinador do FC Porto, esquecendo por uma vez a reminiscência das minhas obras completas e as do Rui Moreira, é porque eles estão preocupados com a nossa escolha. E isso é óptimo sinal.

terça-feira, junho 14, 2011

UM POUCO MAIS DE CALMA... (01 JUNHO 2010)

1- Vamos devagar: o resultado do primeiro teste da Selecção contra Cabo Verde foi mau e tristonho, mas é mais do que prematuro começar já a tirar conclusões catastrofistas, como alguns fizeram. É verdade que aquilo que talvez mais tenha deprimido as pessoas foi acharem que estavam a ver mais do mesmo, mais daquilo que tão abundantemente vimos durante a fase de qualificação e os jogos particulares sob a direcção de Carlos Queiroz. Isto é, uma equipa com um futebol triste e desinspirado, sem rasgo ofensivo nem desenvoltura no seu jogo, que às vezes mais parece um aglomerado ad-hoc de jogadores do que uma verdadeira equipa, onde cada um sabe o que tem a fazer e fá-lo. Mas para isso mesmo é que servem os jogos de preparação, para isso é que serve este longo estágio de um mês, antes da entrada em cena: esperemos que já hoje, contra os Camarões, se possa ver resultados palpáveis destes dias de trabalho na Covilhã.

Vamos, pois, com calma. Mas com calma deve ir também o seleccionador, que não pode e não deve, ao escutar as primeiras e tímidas criticas, desatar logo a espingardear contra a «desonestidade intelectual» dos críticos. Eu não fiz parte do imenso coro que pediu a Madail a nomeação de Carlos Queiroz: por escolha minha, não seria ele o seleccionador. Mas, uma vez escolhido, é tocar em frente, desejar-lhe toda a sorte do mundo e confiar que estará ao nível da tarefa (o que, para mim, não significa quimeras como ganhar o Mundial ou chegar à final, mas conquistas mais ao nosso alcance: os oitavos-de-final, certamente, os quartos-de-final, desejavelmente). Mas se Queiroz foi escolhido e com o principesco salário anual de 1.350.000 euros (é notável como, em relação aos escandalosos salários do futebol, já não há indignação popular e ninguém se lembra de reclamar para eles cortes ou contenção...), é porque se entendeu que ele é super-qualificado para a função. Se o seleccionador de Portugal, apesar de ganhar menos do que o seu antecessor, o «patriota» luso Scolari, é, mesmo assim, o sétimo seleccionador mais bem pago dos 32 que vão estar no Mundial (ganhando, por exemplo, 60% mais do que Dunga, à frente da selecção do Brasil, ou Maradona, à frente da Argentina, mais do dobro de Domenech, comandando a França, ou cinco vezes mais do que Bob Bradley, à frente dos Estados Unidos), ele não pode, obviamente, indignar-se porque os críticos da exibição contra Cabo Verde, em sua opinião, ignoram como se desenvolve a preparação de uma equipa para o Mundial. Claro que ignoram: se não ignorassem, onde estaria a superioridade técnica de Queiroz que justificasse um vencimento de 110.000 euros por mês, mais prémios? E o que ele não pode também ignorar é que nem um só dos seus 31 colegas do Mundial escaparia às críticas locais, se empatasse a zero, em casa, contra uma selecção tão modesta como a de Cabo Verde.

Portanto, nem os adeptos devem esperar o impossível e o óptimo logo ao virar da esquina, nem o seleccionador se deve colocar num pedestal onde toda a critica seja vista como um acto de desonestidade ou pior ainda.

2- Sempre achei que se devia ponderar a altura em que se disputam Mundiais e Europeus. E que, ponderando, talvez se chegasse à conclusão de que seria melhor fazê-los disputar pouco depois do início da época — lá para Setembro, Outubro — do que no final da época, como acontece. No final da «nossa» época, há muitos jogadores que chegam lesionados ou nem sequer comparecem por isso mesmo; alguns dos melhores chegam desmotivados porque já tiveram, ao longo da época e ao serviço dos seus clubes, êxitos que lhes bastem para um ano só; e quase todos chegam cansados, depois de uma temporada inteira, com 30,40,50 ou mais jogos nas pernas. Poder--se-ia argumentar que essa alteração ainda podia servir para o Europeu, com todas as selecções situadas no mesmo hemisfério norte— logo, na mesma altura competitiva da época —, mas não para um Mundial, reunindo selecções de todos os continentes e ambos os hemisférios. Mas isso, hoje, já não é tão verdade, pois a grande maioria dos jogadores que estão num Mundial, sejam mesmo sul-americanos, africanos ou dos antípodas, jogam em clubes europeus e estão feitos ao calendário europeu.

A actual programação do Europeu e do Mundial tem como consequência, e pelas razões que atrás enumerei, que muito raramente vemos jogos ao nível dos melhores jogos de clubes que vemos na Europa, ao longo da época. Esses factores alteram a lógica previsível das coisas e, por isso mesmo, muitas vezes não são as selecções com melhores jogadores e melhores equipas no papel que se vão destacar mais, mas sim aquelas que conseguem contornar melhor esses factores de perturbação e que têm treinadores mais inteligentes para lidar com isso.

3- Catorze membros da claque benfiquista mais conhecida foram condenados a penas de prisão efectiva pelo Tribunal Criminal de Lisboa, e por um rol de crimes de violência muito sérios. Eu, por exemplo, não sabia e fiquei a saber por uma fotografia do Correio da Manhã, que aquela claque tinha incendiado por completo um autocarro do FC Porto. E fiquei a saber que, apesar do comunicado da Direcção do Benfica, demarcando-se dos condenados, ficou provado em tribunal que era na célebre «casinha» cedida pela Direcção à claque, no Estádio da Luz, que eles guardavam o material com o qual levavam a cabo as suas actividades, seguramente não reveladoras da tal postura de despor-tivismo sempre apregoada por aquelas bandas.

Também na semana passada, ficámos a saber que a PJ identificou indivíduos de várias partes do País, que passaram a época que terminou a ameaçar de morte árbitros e seus familiares. E que todos são adeptos do Benfica.

E escrevo isto, não porque eu ache que o Benfica, ou qualquer clube, seja responsável pela violência e clima de intimidação e terror nos estádios, levado a cabo por alguns elementos de algumas claques. É claro que há clubes que fazem mais para o evitar do que outros, alguns são mais complacentes do que outros. Mas, em rigor, não se pode dizer que sejam as direcções a consentir ou instigar o comportamento das claques. No que todos serão responsáveis é em terem consentido um esquema instalado em que parece que, sem claques organizadas, não há animação nos estádios nem apoio às equipas. E, então, fecha-se os olhos a muitas coisas, em troca desse apoio.

Mas escrevo isto para que se anote bem a diferença de tratamento que a imprensa dedica à claque do Benfica e à do FC Porto. O Benfica foi jogar ao Porto e o autocarro foi apedrejado? Foi, sim senhor. Mas (A Bola até foi excepção) esqueceram-se de referir que o do FC Porto também foi apedrejado no Porto e, seguramente, não por portistas, e que já antes o havia sido a caminho de um jogo da Taça no Estoril, ao passar debaixo de um viaduto da A-5 (o mesmo acontecendo ao carro particular onde viajava o presidente do FC Porto, atingido à pedrada, com o pára-brisas estilhaçado, em plena auto-estrada, fruto de uma emboscada devidamente planeada). Fizeram um charivari com os «violentos incidentes» protagonizados pela claque do FC Porto, no Algarve, aquando da final da Taça da Liga — mas esqueceram-se de dizer que tais incidentes (que até o presidente do Benfica desvalorizou) consistiram apenas em que, quando os autocarros pararam e encostaram na portagem da A-2, após 6oo quilómetros fechados lá dentro, alguns elementos da claque resolveram sair e foram corridos àbastonada de volta aos autocarros. Há vinte anos que nos vendem a «verdade» do clima de intimidação que se viverá em todos os Porto-Benfica lá em cima, e lá vem a recordação de Jorge de Brito a entrar no estádio das Antas, escondido no banco de trás deum carro e do cheiro a lixívia que haveria na cabine do Benfica. Pois bem: digam-me lá quando foram os últimos e «graves incidentes» ocorridos no Porto e com a comitiva ou dirigentes do Benfica — seja no estádio, no túnel ou no hotel? E fizeram um escândalo porque, cumprindo uma tradição anual, os deputados do FC Porto jantaram no Parlamento com a Direcção do clube. Disseram que o Parlamento estava a «branquear crimes», mas os únicos crimes, julgados pelos únicos tribunais habilitados para tal, e que levaram gente à prisão, por causa de very-lights, fogo posto, violência organizada, etc, por acaso só sucederam com adeptos do Benfica. Um pouco mais de pudor não lhes faria mal algum.

E, já agora, podiam lembrar-se que o mesmo José Mourinho, que hoje veneram, é aquele que levou o FC Porto à conquista de um campeonato, uma Taça de Portugal e uma Champions, no ano em que, segundo eles, o FC Porto só ganhou porque um árbitro foi tomar um «cafezinho» a casa de Pinto da Costa, antes de um jogo a feijões. É uma chatice quando a realidade não bate certo com a «verdade»...

segunda-feira, junho 13, 2011

A MINHA ESCOLHA (25 MAIO 2010)

1- Vai demorada a discussão sobre quem será o próximo treinador do F.C.Porto. Com Pinto da Costa de férias, ninguém mais está autorizado, ou é fonte autorizada, para desvendar a ponta do véu. E pode ser até que, quando este texto sair, já haja treinador no Dragão. Ao certo, porém, a única coisa que parece possível de ter como certo é que Jesualdo Ferreira não continua — ou continuará, mas noutras funções. E, pelo que tenho ouvido aos portistas com quem falo do assunto, a saída de Jesualdo está longe de ser consensual, muito embora seja comum a sensação de que ele cumpriu o seu ciclo. Isso, e não o facto de ter perdido este campeonato, é que determinarão o final de uma ligação de quatro anos — ao contrário do que muitos concluem apressadamente. Dos nomes mais falados, Paulo Bento é o que menos convence. André Villas Boas tem defensores, que o vêem como uma possível reencarnação de José Mourinho. Laszlo Boloni não diz nada a ninguém e Co Adriaanse só pode ser uma ideia de mau gosto.

Como aqui salientei ao longo destes anos, Jesualdo revelou muitos méritos, uma grande capacidade de encaixe dos desvarios da própria SAD do clube e, o que não é despiciendo, foi sempre um senhor, dentro e fora do campo. O que mais critico e critiquei nele foi o seu imenso conservadorismo nas escolhas do seu lote de jogadores. Pior ainda, quando essas escolhas envolviam jogadores a que eu, pessoalmente, não vejo qualquer utilidade, actual ou futura — casos de Helton, Mariano, Guarín, Valeri. Em contrapartida, para quem está fora do lote restrito dos eleitos, parece só restar uma eterna travessia do deserto ou o empréstimo a outras cores. Foi assim que jovens como Beto, Nuno André Coelho, Hélder Barbosa, Sérgio Oliveira, Rabiola ou Candeias não dispuseram de oportunidades sérias de evoluir e integrar o grupo de 18 convocados habituais. E, quanto a jovens vindos dos juniores ou do célebre «Projecto 611», zero absoluto. Bem podem bater à porta ou até tentar arrombá-la: com Jesualdo Ferreira só entra quem já está dentro.

E agora que tudo pode ser baralhado e voltado a dar, agora que vem aí a inefável «saison argentina» e a inescapável venda de alguns dos melhores activos para sustentar o exército dos que ninguém quer, vou dedicar-me a classificar a época acabada de fazer por cada um dos que integraram o plantel de 2009/10, terminando o campeonato em 3.º lugar. E com notas de zero a dez. Ora, aí vai:

HELTON (2) - Julgo e espero que tenha assinado a sua definitiva desconvocatória como titular no último jogo da época, a final da Taça, onde mostrou exuberantemente tudo o que torna insustentável o seu posto de n.º 1 — insegurança, nervosismo e desconcentração entre os postes, total incompetência no jogo aéreo e uma irritante espécie de desleixo, mais parecendo às vezes que está a brincar.

NUNO (2) - Em todas as competições, só fez cinco jogos e apenas se deu por ele em duas ocasiões: quando foi porta-voz da revolta dos jogadores para com a Comissão Disciplinar da Liga e quando Jesualdo lhe deu a baliza da final da Taça da Liga e ele começou por responder com um monumental frango ao primeiro e inofensivo remate do Benfica e depois ainda colaborou em mais dois golos.

BETO (7) - Não fosse a lesão de Helton e ainda estaria à espera que Jesualdo lhe desse uma oportunidade... para mostrar que é infinitamente melhor e transmite incomparavelmente mais segurança à defesa do que Helton. Vá lá, que ainda foi a tempo de uma justíssima convocatória para o Mundial. O céu pode esperar, a baliza do F.C.Porto já não.

SAPUNARU (4) - Estava a prometer uma época melhor, quando atravessou o túnel da Luz e Ricardo Costa o devolveu à Roménia.

FUCILE (5) - Pior do que no ano passado, mas ainda um valor seguro, com intermitências. O pior, claro, foi o desastre do Estádio Emirates, onde conseguiu oferecer quatro golos num só jogo. Acabaria por ser um dos raríssimos a quem Jesualdo pôs de castigo por causa de uma má exibição.

MIGUEL LOPES (5) - Agarrou a oportunidade e provou bem. Bom a defender, mas pior a atacar do que Fucile.

ÁLVARO PEREIRA (8) - Ele e o também recém-chegado Falcao foram as revelações da época. Esteve em praticamente todos os jogos e foi o jogador mais utilizado do plantel (46 jogos). Sempre com uma pedalada, um pulmão e um coração imensos. Foi o segundo jogador da equipe com mais assistências para golo e o melhor do campeonato, na sua posição.

BRUNO ALVES (7) - Dois terços da época em grande estilo, com alguns golos e exibições notáveis. Depois, no último terço e como vem sendo habitual, o pai encarregou-se de o destabilizar e isso foi bem patente na final da Taça. Tem de resolver, de uma vez por todas, se quer sair ou ficar e, querendo sair, se tem quem pague o que o clube tem o direito de exigir.

ROLANDO (4) - Uma época claramente abaixo da anterior, às vezes mesmo desastrosa. Como se dá pouco por ele, muitas vezes escapam à vista os seus erros graves de marcação. Mas eles estão lá e resta saber como se desenvencilhará sem Bruno ao lado.

NUNO ANDRÉ COELHO (5) - Ando há um ano a escrever que ele tem tudo para ser o central do futuro no F.C.Porto. Pode ser que me engane, mas sem oportunidades nenhumas, nunca o saberemos.

MAICON (4) - Jesualdo preferiu apostar nele (utilizou-o mais do dobro das vezes do que Nuno André Coelho), mas não demonstrou porquê a preferência.

FERNANDO (3) - Mais ainda do que Rolando, fez uma época gritantemente pior do que a anterior. Desapareceram os seus cortes científicos, no limite — substituídos por constantes faltas, muitas da quais em zonas proibidas. E não melhorou nada o seu pior defeito — a falta de qualidade do passe e a incapacidade de sair a jogar para a frente, empurrando o jogo.

TOMÁS COSTA (4) - Tem boa vontade, mas isso não chega.

VALERI (0) - Um erro de casting. Parece que ainda ponderam mais uma época de empréstimo...

BELLUSCHI (4) - Tem bons pés e boa leitura de jogo. Mas também falta de força, de combatividade e excesso de tiques de vedeta — para o que lhe faltam bastantes mais e melhores provas.

FREDDY GUARÍN (3) - É, a par de Mariano, um dos queridos da critica (decerto benfiquista...). Lá porque tem um remate forte e marcou uns golos no final da época, não passou a disfarçar o indisfarçável: má qualidade de passe, ausência total de visão de jogo, dificuldades técnicas patentes e tacticamente perdido no jogo, seja qual for a posição que lhe distribuam.

PREDIGER (0) - O nome não prenunciava nada de bom e ele encarregou-se de o confirmar. Tem mais cinco anos de contrato (quem terá sido a luminária que o contratou?). É por estas e muitas outras que todos os anos é preciso vender os melhores.

RÚBEN MICAEL (4) - Muito desejado (por mim, inclusive), entrou na equipa como um furacão e foi perdendo gás aos poucos, até se lesionar. É um mistério saber como regressará.

RAUL MEIRELES (5) - Foi outro que assinou uma época bem mais fraca do que a anterior. A sair, esta é a altura certa. Mas este sector — o dos médios criativos, ofensivos — é onde a equipa já está mais débil.

CRISTIÁN RODRÍQUEZ (3) - Uma época para esquecer, entre lesões, cansaço e baixas de forma. Longe ainda de provar a valia da sua contratação e aquele que dizem ser um dos mais elevados salários da equipa.

MARIANO GONZÁLEZ (3) - Bem, já sabem o que eu penso... Foi, apesar de tudo, melhor do que no ano passado, beneficiou do castigo de Hulk e depois também teve o azar de uma lesão grave (a terceira lesão grave de um jogador nos treinos, esta época!).

HULK (6) - Também não atingiu o brilho do ano passado nem corrigiu os seus maiores defeitos. Apesar de tudo, e desmentindo as palavras de Luís Filipe Viera, que sugeriu que ele não fazia falta à equipa, quando regressou, o F.C. Porto venceu todos os nove jogos disputados até final da época. E, mesmo com três meses de castigo, ainda foi o jogador azul-e-branco com mais assistências para golo e o quarto do campeonato. Para o ano, fica só um apelo: deixem jogar o Hulk!

SILVESTRE VARELA (8) - Começou logo por se transformar numa das revelações da equipa, até se lesionar e falhar meia dúzia de jogos. Voltou e de novo em grande forma, sucumbindo a nova lesão no aquecimento para o jogo com o Benfica da final da Taça da Liga. Terá perdido um lugar no Mundial e fez tremenda falta à equipa.

FALCAO (8) - Foi a grande revelação do ano e o melhor marcador do campeonato, embora roubado do respectivo título. Um grande jogador de área, completo, inteligente. E um senhor dentro do campo.

FARÍAS (4) - O inútil mais útil do plantel.

ORLANDO SÁ (3) - Mais um a quem as lesões roubaram a época. No pouco que sobrou, pouco aproveitou para mostrar dotes à altura do lugar.

SÉRGIO OLIVEIRA, YERO, ADDY, ALEX, DIAS - Alguém os viu?


2- Grande, grandíssimo, José Mourinho. Esta vitória em Madrid, sim, foi Mourinho no seu melhor: tudo estudado, tudo previsto, em nenhum momento deu a sensação de que o Inter deixaria fugir a oportunidade por que esperava há 46 anos. É verdade que a inspiração de Milito resolveu o assunto, mas mesmo isso Mourinho parecia ter previsto. E o «triplete» em Itália fez dele, certamente, uma lenda eterna para lá dos Alpes.

sábado, junho 11, 2011

UMA TARDE MAL PASSADA (18 MAIO 2010)

1- Não vale a pena reabrir a discussão sobre o local da final da Taça, mas, já que tanto se quer manter o Jamor como palco tradicional e mais digno para a final, o mínimo exigível é que o relvado esteja em condições para um bom jogo — o que não foi o caso desta final, jogada num tapete ondulado.

No final do jogo e muito mal disposto (só podia...), Jesualdo Ferreira queixou-se da imprensa desportiva, que não deu ao jogo a importância que ele tinha. É verdade que não, mas também não sei de que estaria ele à espera: como é que uma final sem clubes de Lisboa, entre o Porto e o Chaves, poderia interessar à imprensa desportiva da capital, ainda a viver em plenos festejos do título do Benfica? É óbvio que a excursão a Timor do presidente do Benfica tinha muito mais importância do que o encerramento da época no Jamor — sem Benfica. Convém recordar a Jesualdo que, na véspera do F.C. Porto conquistar em Geselkirchen o segundo título europeu da sua história, a primeira página da nossa imprensa desportiva era a notícia de que o Benfica (então em 4º lugar), iria mudar de treinador no ano seguinte!

O problema, porém, é que, depois de assistir à exibição da equipe do F.C. Porto no Jamor, é caso para dizer que Jesualdo deveria ter começado por lamentar e se indignar com os seus jogadores pela falta de respeito que eles mostraram para com a final, com o adversário e com o público. Vi adeptos portistas regressados do Jamor envergonhados como se tivessem sido vencidos e sem vontade alguma para comemorar a 15.ª Taça de Portugal levada para casa. De facto, a equipa parece ter feito questão de se despedir da época e dos adeptos com uma demonstração de sobranceria, indiferença e falta de profissionalismo que, não sendo costume nela, mais me chocou. Começou tudo em Helton, esforçando-se por oferecer três golos apenas na primeira parte, o primeiro deles numa daquelas atitudes de displicência que o caracterizam e que tanto irritam os adeptos (espero que, se Jesualdo continuar, tenha finalmente percebido que não há mais lugar para o Helton na baliza). Depois, foi Hulk, esbanjando três golos também nos primeiros 45 minutos, acompanhado em mais uma ocasião por Falcao. E um jogo que podia ter acabado com 5-0 ao intervalo, acabou num 2-1 tangencial, depois de Bruno Alves resolver também despedir-se do jogo, da época e talvez do clube, oferecendo um golo e fazendo-se expulsar, minutos antes de ter de subir à tribuna para, enquanto capitão da equipa, receber a Taça das mãos do Presidente da República. Foi lastimável. Mau de mais para ser ultrapassado com a vitória. E é pena, porque agora o futebol de clubes vai de férias e, como é sabido, as últimas imagens são as que mais ficam.

2- Seguramente que terá sido com as melhores intenções, mas, realmente, não deu para entender o que terá levado a direcção do Benfica a emitir um comunicado desejando que a final da Taça não tivesse incidentes fora das quatro linhas. Que tinham eles a ver com isso — será que já ocuparam o Ministério da Administração Interna e a gente não sabe? Não vi comunicados do Sporting, do Belenenses, do Paços de Ferreira...

3- E, por falar em direcção do Benfica: a gente respeitável que lá está deveria olhar de frente e tomar uma atitude em relação à BenficaTV. Tão longamente esperado, planeado e anunciado, certamente que o que se quis com o canal não é aquilo que existe: uma tribuna de incitamento ao insulto, ao ódio, à violência, mesmo. Não vale a pena andar a fazer comunicados ou discursos de boas maneiras quando depois se sustenta uma coisa daquelas. A BenficaTV (onde eu próprio já fui insultado em termos demasiadamente ordinários para serem reproduzidos) não honra o Benfica nem deixa bem a sua direcção. Espero e desejo que não apareçam um PortoTV ou um SportingTV para responderem na mesma moeda, porque então é que o clima ficará irrespirável. Isto é como as claques desordeiras: não há boas nem más, são todas um cancro no futebol. A diferença é que, enquanto que as claques são dificilmente controláveis pelos clubes (muitas vezes são até elas que mandam neles), já um canal de televisão depende inteiramente da direcção do clube. Não há desculpas.

4- Se em Lisboa, Rui Costa pôde entregar ao Papa uma camisola com o símbolo do clube (num gesto, em minha opinião, de um ridículo e de uma presunção patéticos), já no Porto, o F.C. Porto não pôde sequer pendurar um pendão, aliás discreto e bonito, de saudação ao Papa e ao lado de outros. Rui Rio não deixou, naquele seu estilo nordestino de governar. Nem mesmo a visita do Papa o comoveu e convenceu a abrir tréguas na sua paranóica guerra contra o clube maior da cidade. Coitado, a verdade é esta: o F.C. Porto é conhecido no mundo inteiro e, graças a ele, também a cidade do Porto; e Rio, é conhecido onde?

5- Sete defesas centrais entre os 24 para a África do Sul, não são centrais a mais: é uma invasão, um delírio, um ataque de cagaço que não augura nada de bom. Eu sei que dois deles são escalados para servirem de trincos, mas, quando os centrais servem para trincos, isso diz muito sobre as ideias do treinador. E é justamente no meio-campo criativo e ofensivo que a Selecção de Queiroz tem o seu ponto fraco. Nada a dizer dos guarda-redes (Beto foi uma surpresa inteiramente merecida), dos defesas ou dos avançados — são tudo escolhas óbvias e consensuais. Mas o meio-campo que há-de construir jogo para ganhar é o problema principal desta equipa: são muito poucos e não são particularmente bons.

O Benfica tem um jogador na Selecção; o Sporting tem dois, um dos quais naturalizado recentemente e de propósito para a ocasião; o F.C.Porto tem quatro — e podia ter cinco, se Varela não se tem lesionado, e talvez seis, se o mesmo não tivesse sucedido a Ruben Micael. E, a esses quatro, há a juntar outros cinco, que jogam lá fora, idos directamente do F.C. Porto. É um orgulho para as nossas cores.

E agora vem aí a penosa travessia deste mês de estágio da Selecção, com as insípidas notícias sobre o bacalhau e a vitela com grelos, o treino da manhã e o treino da tarde, os «directos» do hotel e as declarações dos jogadores — que só variam entre a expectativa das meias-finais, da final ou mesmo do título. E uma enxurrada daquele insuportável hino que Carlos Queiroz (porquê ele?) resolveu escolher como hino da Selecção. Português.... cantado em inglês. I´ve got a feeling de que este mês vai ser um aborrecimento sem fim. Oxalá, ao menos, o estágio seja de bom proveito.

6- Fantástico o embate entre Mourinho e Van Gaal: ambos com um passado comum e simultâneo no Barcelona, chegam à final de sábado da Champions trazendo no bolso a Taça e o campeonato da Alemanha e da Itália. Tenho pena que a dureza excessiva do castigo da UEFA a Ribéry o impeça de disputar o jogo mais importante do ano, onde todos os grandes jogadores das equipas finalistas deveriam estar sempre. E espero que não seja um jogo muito táctico, porque seria um desperdício. Eu sei que, como dizem, as finais são para ganhar e não para jogar bonito, mas, se o grande futebol não aparece nas finais com as grandes equipas, aparece quando? Eu acho o Bayern melhor equipa que o Inter, mas o Inter tem o «factor Mourinho» e isso conta e de que maneira!

quinta-feira, junho 09, 2011

QUANDO OS VENCIDOS SÃO VENCEDORES? (11 MAIO 2010)

1- O grande vencedor do fim-de-semana desportivo foi Frederico Gil, o primeiro português a chegar à final do Estoril Open e de uma prova do ATP, onde esteve a um pequeníssimo suplemento de alma da vitória. É verdade que o fim-de-semana teve outros vencedores — o Sporting de Espinho ganhou o campeonato nacional de voleibol ao Benfica, o F.C. Porto praticamente garantiu o título no andebol (a juntar ao de hóquei em patins), e o Belenenses ganhou a Taça de Futsal ao Benfica e está em posição privilegiada para fazer a «dobradinha». Portimonense e Beira-Mar regressaram à I Liga (vocês viram o quintal de aldeia onde a Oliveirense se propunha jogar na I Liga, se tem derrotado o Portimonense? Uff...!). Até o Sporting, como bem lembrou José Eduardo Bettencourt, parece que ganhou qualquer coisa no ping-pong, na natação e no xadrez. E Radomel Falcao, na sua primeira época em Portugal, ganhou a «Bola de Prata», título atribuído ao melhor marcador do campeonato. Mas o grande vencedor foi, de facto, Frederico Gil.

O ténis é um jogo de momentos: raramente um jogador consegue, ao longo da partida, manter-se sempre por cima nos níveis de concentração, motivação e jogo. A alternância de momentos entre os jogadores é a regra, e isso, mais o facto de não consentir tácticas defensivas, é o que faz do ténis, na minha opinião, o mais bonito e emocionante de todos os desportos. Frequentemente, para além do deslumbramento com a qualidade técnica dos jogadores de topo, o que torna um jogo de ténis um espectáculo arrebatador é esse lado de combate singular entre dois gladiadores. Quem, como eu, teve a sorte de ver a inesquecível final de Wimbledon entre Bjorn Borg e John McEnroe, nunca mais a esquecerá, enquanto viver. Anteontem, na final desse torneio que Portugal deve à capacidade de iniciativa de João Lagos, Frederico Gil soube agarrar o seu momento, quando ele passou — com alma, com coragem, com um surpreendente nível de desempenho, face ao 36.º jogador do ranking ATP e detentor em título do torneio. E por pouco, por muito pouco, conseguia a vitória, quando o momento virou a favor do adversário e ele, fazendo das tripas coração, quase conseguia contrariar um destino traçado.

Pena que, para um jogo tão emocionante e tão bem jogado, algum público presente não tenha estado à altura. Eu sei que grande parte daquele público dos camarotes está ali para ver e ser visto e raramente para ver ténis. Assim como a Moda Lisboa ou o Portugal Fashion, o Estoril Open tornou-se um destino obrigatório do jet set e do «jet seis» — gente que acha que o melhor do ténis é o almoço na «tenda VIP» e as fotografias para as revistas sociais. Mas, apesar de tudo, talvez a organização devesse distribuir-lhes à entrada um manual de bom comportamento, onde se explicasse, por exemplo, que é muito foleiro falar ao telemóvel durante o jogo, e que o ténis é um dos últimos redutos do desportivismo — onde é impensável aplaudir ou vaiar o adversário do nosso favorito, quando ele falha uma bola de serviço. As instruções de Jorge Jesus para assobiar sempre os adversários a fim de os desconcentrar destinavam-se a um jogo de futebol do Benfica no Estádio da Luz, e não a um jogo de ténis no Jamor. A ver se para o ano percebem a diferença...

2- O outro grande vencedor individual do fim-de-semana foi o colombiano Radomel Falcao. À entrada para o último jogo, domingo passado, o seu adversário nessa disputa mano-a-mano, Óscar Cardozo, levava quatro golos a menos do que Falcao, embora só um contasse oficialmente: os outros três, golos limpinhos e bonitos, foram gamados ao portista por árbitros e fiscais-de-linha com excesso de zelo. Mesmo assim, Cardozo precisava de dois golos e a verdade é que só marcou um (embora indevidamente se tenha auto-atribuído dois, logo secundado por colaborantes observadores e coberto pelas imagens não explicitas da Sport TV). Terminaram assim empatados com 25 golos cada, mas como Falcão tinha menos jogos disputados (um deles por oportuna cortesia de Pedro Henriques, mesmo antes do F.C.Porto-Benfica), foi ele que, segundo as regras aplicáveis, venceu a Bola de Prata.

E venceu com todo o mérito e toda a justiça. Não só porque, de facto, marcou mais três golos dos que lhe validaram, como também porque dispôs apenas, para engrossar o número, de quatro penalties, dos quais converteu três, enquanto que o seu desafiante dispôs de onze e converteu oito: e marcar de penalty é bem mais fácil. E, depois, enfim, porque, apesar do valor de Cardozo, que não se discute, Falcao é muito melhor jogador e ponta-de-lança que o canhão paraguaio, e não dispôs, atrás de si, de um meio-campo ofensivo com a qualidade do que serviu Cardozo toda a época. Mas, como bem notou o próprio Falcão, «há coisas estranhas no futebol português». Pois há.

3- Ora veja, a propósito do Benfica-Rio Ave, tanta coisa estranha e que a imprensa achou por bem silenciar, para não levantar ondas, neste momento de festa nacional:

a) - Como já é de tradição, o Benfica teve a casualidade de enfrentar um adversário num jogo decisivo quando um dos jogadores deste já estava comprado pelo Benfica para a época seguinte: Fábio Faria, «uma referência da linha defensiva do Rio Ave, ao longo de toda a época», como se escreveu em A Bola. É a velha questão dos «nossos» jogadores ao serviço dos outros, jogando contra «nós». O Olhanense, por exemplo, recheado de jogadores do F.C.Porto, foi ao Dragão e roubou-nos dois pontos: mas, contra o Benfica, um dos «nossos» ao serviço do Olhanense, falhou um golo feito e outro ofereceu um golo: olha, se tem sido ao contrário? Neste caso, porém, ninguém se lembraria de duvidar, por antecipação, da lealdade do jogador do Rio Ave ao clube que ainda lhe paga. Ninguém? Não: ele próprio duvidou e disse que achava melhor não jogar. Confrontado com esta reveladora declaração, Carlos Brito achou mais prudente fazer-lhe a vontade. A «transparência» é isto.

b) - O Rio Ave também tem um jogador chamado Wires, de que eu nunca tinha ouvido falar e que teve uma entrada surpreendente no jogo. Aos 14 segundos (!), com tempo e espaço para aliviar uma bola, resolveu ficar a engonhar, até a perder e «ver-se obrigado» a cometer falta à entrada da área contra a sua equipa; três minutos depois, repete o estranho embaraço e a jogada acaba no primeiro golo do Benfica; mais seis minutos e é expulso — mas, dessa vez, sem culpa própria, apenas proporcionando o pretexto. Mas que jogo para recordar!

c) - Feliz e aliviado, Jorge Sousa avançou para Cardozo e mostrou-lhe o amarelo, quando ele despiu a camisola para celebrar o segundo golo. Assim, pensou ele, salvavam-se as aparências: os amarelos aos de Vila do Conde por dá cá aquela palha, em contraste com a sublime passividade perante as entradas de Luisão, Ramires, Airton. Isto claro, sem falar do glorioso cartão vermelho directo que ele sacou para o tal Wires, por uma entrada simultânea e mútua de pé em riste com o Airton, estavam decorridos cinco minutos de joguinho — que logo ficou resolvido. Eu sei o que chamo àquilo, mas cada um chame-lhe o que quiser... Consta, aliás, que Jorge Jesus costuma dividir os treinos em duas partes: numa, a equipa principal treina contra onze; na outra metade, treina só contra dez. Porque, enquanto que por esse mundo fora e em obediência a regras muito antigas, o futebol costuma ser jogado onze contra onze, já o Benfica, um terço das vezes, como notou Domingos, joga onze contra dez.

d) -Dois pequenos «pormenores» no primeiro golo do Benfica: para começar, é antecedido de um remate de Saviola em off-side, que Carlos defende para a frente, permitindo a recarga para golo; depois, o remate para a baliza é um auto-golo de Gaspar, que, quando levanta a perna para afastar a bola, leva um pontapé de Cardozo por baixo, que a faz mudar de direcção. Não só não foi golo de Cardozo, como nem sequer foi golo que se valide. Não posso jurar pela segunda situação (as imagens da TV não são completamente conclusivas), mas o off-side é flagrante. Os campeões também precisam de sorte, não é o que dizem? E de silêncio.

4- Para azar do Benfica e de Ricardo Costa, desde que o Hulk voltou a jogar, o F.C.Porto soma nove jogos, nove vitórias. E isso dá que pensar, sobre os efeitos do túnel e outras coisas mais. Durante muito tempo, achei, todavia, que, com túnel ou sem túnel, o Benfica merecia ganhar este campeonato, porque era a equipa que melhor jogava, mais atacava e tinha «melhor nota artística», como disse Jorge Jesus. Mas a verdade é que um campeonato não são 15, nem 20, nem 25 jornadas: são 30 e o saldo final deve-se fazer às 30. E, no último terço do campeonato, desapareceu aquele Benfica que jogava mais e melhor (até o Rio Ave, com dez, lhe deu uma lição de bola) e ficou apenas uma profusão de penalties a favor e de adversários expulsos. E, então, assalta-me a dúvida: o que teria feito o F.C.Porto, se tem disposto de 11 penalties a favor, um terço dos jogos em superioridade numérica, fiscais-de-linha atentos a off-sides inexistentes e o Hulk em jogo durante os decisivos três meses em que a prepotência de Ricardo Costa o retirou de cena?