sexta-feira, janeiro 11, 2013

OS SUSPEITOS DO COSTUME (20 DEZEMBRO 2011)

1- Com o empate cedido em Coimbra, o Sporting vê chegar o Natal a seis pontos de distância dos seus rivais, confirmando a sua alergia a esta época festiva. Claro que, em comparação com épocas anteriores, este Natal do Sporting é completamenle diferente, fruto de um trabalho notável de Domingos Paciência, o treinador portista que conseguiu transformar um grupo de jogadores vindos de todos os lados e que jamais se tinham encontrado numa equipa com ideias próprias e assimiladas por todos eles. Porém, será no dia 8 de Janeiro, quando encerrar a primeira volta recebendo em Alvalade o campeão nacional, que o Sporting de Domingos Paciência dirá se é ou não para contar com ele já este ano como candidato ao título. E nada menos que uma vitória poderá confirmar essa candidatura: o empate será comprometedor e a derrota praticamente encerrará a questão e deixará a questão do título entregue aos suspeitos do costume: Benfica e FC Porto.

Em Coimbra, num bom jogo de futebol, o Sporting poderia ter chegado à vitória se Van Wolswinkel (que alguns sportinguistas já comparam a Van Basten) estivesse de pontaria afinada. A última meia hora do Sporting foi de candidato, mas o empate pareceu-me justo pois também a Académica dispôs de várias oportunidades que poderiam ter colocado o resultado num 2-0, provavelmente irrecuperável.

2- Bastante diferente foi a tarefa do FC Porto frente ao Marítimo - que deu uma lição de futebol defensivo, mas apenas isso. Por ironia das coisas, também o Maritimo se poderia ter colocado em vantagem, na única e flagrante oportunidade de que dispôs em todo o jogo, um minuto antes de o FC Porto conseguir, enfim, chegar ao golo. Num minuto tudo pode mudar num jogo e o FC Porto bem mereceu essa felicidade ao minuto 79, pois consta que bateu vários recordes do campeonato: 67% de posse de bola, 65 ataques, 34 remates e 16 cantos! Este tipo de jogos, em que só uma equipa ataca, enquanto que a outra apenas defende e confia ao seu guarda- redes uma exibição de luxo, são profundamente irritantes e estão a tornar-se regra em todos os jogos dos grandes contra os outros. É certo que o Marítimo pode usar a desculpa de ter jogado 50 minutos com um a menos, mas tenho para mim que a superioridade numérica em jogos destes e quando essa superioridade favorece a equipa que quer construir o resultado e ainda o não conseguiu, acaba por se revelar quase sempre uma armadilha. Foi o que sucedeu neste jogo: se, com onze, o Marítimo mantinha só um homem na frente, com dez passou a não ter nenhum e a defender com todos dentro da área a maior parte do tempo. Se bem que Pinto da Costa tenha aberto uma surpreendente excepção para vir dizer que desta vez Vítor Pereira acertou nas substituições (!), a verdade é que me parece que, face à lesão de James e com um a mais, Vítor Pereira deveria ter feito entrar logo dois avançados e não apenas o Kleber, prescindindo do Fernando e de jogar com dois médios defensivos. Como habitualmente, a crítica desportiva apressou-se a resgatar o Cristian Rodriguez ape- nas porque a bola lhe foi parar aos pés para o remate do primeiro golo - assim como poderia ter ido parar aos pés de qualquer um dos oito jogadores com que o FC Porto atacava dentro da área do Marítimo. Eu compreendo que, vendo que o FC Porto tem, para a ala esquerda, o James, o Iturbe, o Varela, o Djalma e ainda vem o Christian Atsu, haja o maior interesse em convencer Vítor Pereira que a melhor escolha para o lugar... é o Cristian Rodriguez.

3- Duarte Gomes, o árbitro do FC Porto-Marítimo, não podia evitar reagir de alguma maneira às criticas de Pinto da Costa, que veio lembrar os últimos penalties polémicos que este árbitro assinalou ou deixou por assinalar. A prestação de Duarte Gomes não prejudicou o FC Porto apenas nesse lance, mas ele foi, de facto, o mais incompreensível e poderia ter tido consequências determinantes para o campeonato. Fez bem Duarte Gomes em reconhecer o seu erro, embora tenha ficado por explicar como é que o mesmo árbitro que conseguiu ver três penalties de bola na mão a favor do Benfica em apenas vinte minutos do jogo contra o Vitória de Guimarães, não conseguiu ver, ali a dois passos, um penalty tão flagrante cometido sobre o Belluschi. Mais estranho que isso só a cerimónia com que os dois comentadores da TVI evitaram tomar uma posição firme sobre o lance e nunca mais se referiram a ele, como se tivesse sido um fait-divers durante o jogo.

Mas Pinto da Costa veio também dizer uma coisa que nunca havia sido dita e que merece reflexão, em vez das habituais ironias dos moralistas de serviço. Que a profissionalização dos árbitros poderá servir para evitar eventuais conflitos de interesses entre a sua profissão civil e a missão de arbitrar jogos de algumas equipas. E é fácil de imaginar situações dessas. Confesso que não tenho opinião formada sobre o assunto da profissionalização dos árbitros, mas concordo que a questão do conflito de interesses tem de ser olhada mais de perto e tida em conta. Faz todo o sentido.

4- Saúdo aqui três treinadores portugueses que este fim de semana reagiram com grande fair Play a resultados desfavoráveis. Carlos Brito, do Rio Ave, que viu o Benfica anular a vantagem da sua equipa graças a um daqueles sempre subjectivos penalties de bola no braço, veio dizer que o penalty tinha sido bem assinalado - uma raridade. Pedro Martins, do Maritimo, não se desculpou com a inferioridade numérica nem culpou o azar pela derrota no Dragão: disse, sim, que ela tinha sido justa e a sua equipa tinha jogado mal quando ainda estava com onze. E Domingos Paciência não recorreu ao azar ou ao árbitro para justificar o empate em Coimbra, antes reconheceu erros próprios na origem do meio desaire.

5- Não consigo entender como é que uma equipa que vem de um terceiro lugar na fase de grupos da Liga dos Campeões e que é detentora do título da Liga Europa entra nos dezasseis avos desta competição sem o estatuto de cabeça-de-série. O critério de apenas o serem os quatro melhores terceiros classificados dos grupos da Champions não faz sentido e permite que equipas como o FC Porto tenham estatuto inferior ao Sporting, cujo currículo europeu não tem nada que ver com o dos portistas. Mas, mesmo mantendo essa regra, acho inadmissível que não haja lugar reservado como cabeça-de-série para o detentor do título.

E assim, uma série de conjugações negativas (e todas derivadas do dramático e injusto empate a zero com o Zénith no Dragão) fizeram com que o FC Porto, em lugar de ser cabeça-de-série nos oitavos-de-final da Champions seja já candidato a sair nos dezasseis avos-de-final da Liga Europa. Porque, infelizmente, não tenho grandes ilusões sobre a possibilidade de ultrapassar o pior de todos os adversários em prova, o Manchester City - que logo temi que nos haveria de calhar em sorte. Sorte teve o Sporting (por enquanto), face a um mais do que acessível Legia de Varsóvia. E sorte teve tambem, e como habitualmente, o Benfica, que vai enfrentar um Zenit acabado de regressar de dois meses de defeso. Não se prevê que Danny venha a ter ocasião para voltar a fazer de cão urinante, coisa a que o público da Luz certamente não iria achar muita graça.

6- Seis meses esteve o Santos a preparar-se para enfrentar o Barcelona. Reteve o Danilo, já vendido ao FC Porto, evitou a saída do Neymar, abdicou do campeonato, fez parar um país inteiro na expectativa de desfazer a lenda do Barcelona e de Leonel Messi. Saldou-se tudo por uma derrota por 4-0 que, só não foi maior, por delicadeza dos catalães. Não há volta a dar e só me resta repetir-me: nunca houve nem haverá uma equipa de futebol como esta. Tem razão Neymar, quando, no final, confessou: «Hoje aprendi o que é jogar futebol».

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